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A vítima de Quetzalcóatl. Consciência do gênero, resistência masculina e atitude analítica diante da violência

Quetzalcóatl’s victim. Gender awareness, male resistance and an analytical attitude towards violence

La víctima de Quetzalcóatl. Conciencia de género, resistencia masculina y actitud analítica ante la violencia

Resumo

Argumento que uma atitude política dos operadores de uma configuração transnacional de práticas discursivas sobre a violência e o pressuposto de uma dimensão psicológica como lócus de criação da consciência do gênero produzem um “efeito de teoria”: a identificação de homens que resistem em largar suas prerrogativas patriarcais. Tais enquadramentos legitimam o propósito de responsabilização de atos de violência contra a mulher, e implicam processos de conversão para provocar o reconhecimento da relação entre estrutura e ação que precede uma nova masculinidade. O propósito desencantador destas práticas colide com as relações vivas e a temporalidade que inspira a força de pais de família, protagonistas das brigas conjugais. Defendo que uma atitude analítica diante de práticas desprezíveis, à luz dos direitos humanos, desvela estruturas afetivas que ampliam o horizonte de compreensão da violência e brindam elementos para o julgamento acadêmico da resistência à adesão ao projeto feminista.

Palavras-chave:
Violência de gênero; Masculinidade; Estrutura e ação; Parentesco; Emoção; Resistência

Abstract

I argue that a political attitude by the operators of a transnational configuration of discursive practices on violence and the presupposition of a psychological dimension as the locus for the creation of gender consciousness produce a “theory effect”, through which men resist to abandon their prerogatives of patriarchal power. Such framings legitimize the purpose of accountability for acts of violence against women, and implicate these men in processes of conversion, enabling their conceptualization of the relationship between structure and action, thereby leading to the creation of a new masculinity. The disenchanting purpose of these practices clashes with the living relationships and temporality that inspire the força (strength) of fathers in their role as the protagonists of such conjugal quarrels. I argue that an analytical attitude towards despicable practices may reveal affective structures that broaden the horizon for understanding the phenomena of intramarital violence and provide elements for the academic comprehension of male resistance in adhering to the feminist project.

Keywords:
Gender violence; Masculinity; Structure and action; Kinship; Emotion; Resistance

Resumen

Sostengo que una actitud política de los operadores de una configuración transnacional de prácticas discursivas sobre la violencia y el presupuesto de una dimensión psicológica como locus para la creación de conciencia de género producen un “efecto teórico” de identificación de hombres que se resisten a desprenderse de sus prerrogativas de poder patriarcal. Estos encuadramientos legitiman el propósito de responsabilización los actos de violencia contra las mujeres e implican procesos de conversión para provocar el reconocimiento de la relación entre estructura y acción que precede a una nueva masculinidad. El propósito desencantador de estas prácticas choca con las relaciones vivas y la temporalidad que inspira la força (fuerza) de padres de familia, protagonistas de peleas conyugales. Argumento que una actitud analítica frente a las prácticas despreciables devela estructuras afectivas que amplían el horizonte de comprensión de fenómenos de violencia y aportan elementos para juzgar académicamente la resistencia a la adhesión al proyecto feminista.

Palabras claves:
Violencia de género; Masculinidad; Estructura y acción; Parentesco; Emoción; Resistencia

Introdução

Neste artigo, argumento que o privilégio de uma atitude política por parte dos operadores de uma configuração transnacional de práticas discursivas sobre a violência, inseparável do pressuposto de uma dimensão psicológica da pessoa humana como lócus da intervenção para a criação da consciência do gênero, produz um efeito de teoria de identificação e localização de homens que resistem a largar suas prerrogativas de poder patriarcal. Diante da percepção de uma repetição deste problema social - a resistência - por parte dos operadores dessa configuração, defendo que cultivar uma atitude analítica é relevante academicamente para ampliar o horizonte de compreensão de agência de categorias sociais entendidas, em nossa sociedade, enquanto representantes de ideologias e estruturas de poder conservadoras, pré- ou antimodernas, isto é, representantes dos críticos à liberalização dos costumes da família, particularmente no que se refere a questões de gênero e sexualidade, à produção científica e ao ideário de direitos humanos.

Parto da descrição de tal configuração e das vicissitudes que me obrigaram a tomar uma posição diante dela como antropólogo-cidadão para analisar o fenômeno da resistência masculina neste sentido. Continuo abaixo com a descrição de pressupostos epistemológicos e ontológicos modernos que legitimam inovações científicas e normativas sobre a interioridade humana, as relações de gênero e o desenvolvimento social. Estes, por sua vez, justificam os propósitos da transformação da cultura patriarcal e da responsabilização de atos de violência contra mulheres. Emergentes em oposição contrastiva à ideologia da patria potestas, sustento que tais enquadramentos exigem processos numa conversão individualizante para dar lugar ao reconhecimento da relação entre estrutura e ação, que permite a consciência do gênero e o exercício de uma nova masculinidade. Tal modo de construção social da pessoa moderna atualiza a relação entre civilizado e selvagem, ao definir a relação entre agressor e vítima como uma na qual a tradição impossibilitaria a agência humana - justificando, assim, processos de formação do Estado moderno.

Finalmente, argumento que o propósito desencantador da responsabilização contido na Lei Maria da Penha colide com a experiência corpórea e relacional que inspira a força de um pai de família. Baseado no meu acompanhamento etnográfico de homens judicializados, renovo a utilidade de descrever uma cena da violência para evidenciar uma tensão entre as perspectivas dos participantes de uma briga de casal e posições estruturais de categorias de parentesco. Sugiro que a ampliação da descrição e a análise das relações vivas e do tempo que enquadram as lutas do pai de família, na qual sua força é testada, brindam elementos para o julgamento acadêmico da resistência à adesão ao projeto feminista e dão pistas aos operadores daquela configuração transnacional para conduzir processos reflexivos.

Uma configuração transnacional de práticas discursivas sobre a violência de gênero

Esta fotografia foi tirada em 2015 na Cidade de México (Figura 1) durante um workshop de cinco dias, facilitado por uma ONG estadunidense de luta pelo empoderamento de mulheres oriundas de países em via de desenvolvimento. O objetivo do encontro era o treinamento de funcionários públicos, ativistas e profissionais de organizações não governamentais da América Latina em “boas práticas” para (1) melhor “reconhecer o desejo das vítimas” de violência de gênero e contra a mulher, na medida em que elas acudiam ao Judiciário, e (2) formular metodologias de intervenção psicossocial para a “transformação da cultura patriarcal”. Na foto, vemos a cabeça de Quetzalcóatl, a “serpente emplumada” em língua náhuatl, deidade civilizatória entre algumas culturas mesoamericanas. Seu culto passou por um processo iconoclasta durante a colonização espanhola, adquirindo uma conotação negativa ao estar associado ao sacrifício humano. No século XIX, a serpente emplumada foi reinterpretada como ícone da identidade nacional mexicana, glorificando um passado indígena estereotipado (Suárez 2019SUÁREZ, Carlos. 2019. La Guerra de los Templos. El proceso de sustitución religiosa en la “Provincia de Ávalos” (Nueva España/Nueva Galicia) y la “Provincia de Tunja” (Nuevo Reino de Granada), 1530-1630. Tese de Doutorado, Universidad de Guadalajara. ). No workshop daquele dia, Quetzalcóatl voltava a ter uma representação negativa: a deidade persegue uma mulher branca, cujo corpo e espectro fogem para não serem consumidos pelo monstro. Ela está acompanhada por homens que também tentam capturá-la, agora com uma rede de pesca.

Figura 1.
Quetzalcóatle a vítima

A imagem compunha a apresentação de Valentina1 1 Nomes fictícios. (consultora costarriquense da Organização Internacional do Trabalho), que interpelava a audiência para combater o dito “machismo latino-americano [...] que objetifica o corpo da mulher”. Esse machismo naturaliza as violências psicológica, física, sexual e patrimonial, além de casos de feminicídios. Apesar dos avanços normativos emanados da órbita de conferências sobre os direitos humanos das mulheres nas Nações Unidas - institucionalizados sob a forma de uma “perspectiva de gênero” em leis e políticas públicas nos Estados latino-americanos -, Valentina lamentava a dificuldade de incidir mudança nas “hierarquias de gênero tradicionais”. Este era um fato repetitivo em todos os contextos nacionais do continente, dizia, acompanhado da “resistência masculina” a abandonar seus lugares de poder. Era desejável, então, que os participantes do workshop trabalhassem na “transformação das masculinidades” nas suas localidades de origem.

No dia seguinte, Darko (consultor croata de uma ONG de desenvolvimento social internacional) apresentou um ambicioso programa pela equidade de gênero já implantado em dois países africanos e um do sudeste asiático, bem como no Brasil. Suas atividades apostavam na reformulação das atitudes masculinas relacionadas ao gênero através da “ressignificação da paternidade”, categoria de parentesco que perpetuava a transmissão vertical da “masculinidade hegemônica”, particularmente na relação entre pai e filho. O programa considerava que o engajamento masculino com a prática do “cuidado” repercutia na “presença ativa” dos homens no lar, na “valoração de afetos e emoções” pelos varões, na validação social de “masculinidades não convencionais” e, em última instância, na “prevenção da violência”. A reformulação da paternidade era a estratégia central para a “transformação cultural”, pois, como explicava Darko, “formava homens com consciência”: das desigualdades de gênero e do exercício dos direitos humanos, especialmente dos sexuais e reprodutivos. Um homem consciente largava seus “privilégios de gênero” e exercia uma “nova masculinidade”.

Eu participava do workshop como etnógrafo e colaborador na implantação do capítulo brasileiro daquele programa: o projeto Melhor pai. Liderado por Thor (terapeuta de família e psicanalista) dentro de uma ONG de psicólogos sistêmicos e construtivistas sociais, o projeto acolhia acusados do delito de “violência doméstica e familiar contra a mulher” de alguns juizados da Lei Maria da Penha no interior da Comarca do Rio de Janeiro. Acompanhando psicólogos e acusados, eu havia, durante meu doutorado, documentado a execução de uma das boas práticas formadoras de consciência: os ditos “grupos reflexivos de gênero”, cujo propósito era a responsabilização masculina em face dos atos de violência cometidos previamente (Martínez-Moreno 2018MARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2018. Civilizar a cultura. Questões de modernização e a afirmação da dignidade entre homens acusados de violência doméstica e familiar contra a mulher. Tese de Doutorado, Universidade de Brasília.). As pesquisas sobre a responsabilização no Brasil2 2 Para a relação bibliográfica dessas pesquisas, cf. Martínez-Moreno (2018). descrevem tais grupos como uma ferramenta que evita a reincidência de atitudes violentas e possibilita o exercício de masculinidades menos estereotipadas, tóxicas ou extremas, com repercussão positiva nas relações familiares. Consideram, ademais, que resistências à tal mudança na masculinidade são produto do machismo, que desqualifica a luta das mulheres. Por este motivo, pesquisadores do campo das masculinidades priorizam o estudo da efetividade de tais grupos. Neles, surgem “justificativas” que banalizam a violência por parte dos acusados e que fariam parte de uma “performance de vitimização machista”, cujo objetivo é transferir a culpa das agressões às próprias mulheres.

No México, identifiquei uma ressonância de sentido entre a imagem exposta acima, o objetivo do workshop e o projeto que eu acompanhava, implícita em uma configuração transnacional de práticas discursivas sobre o combate à violência de gênero, que revela modos de transposição de atributos da Modernidade inseparáveis de processos de formação do Estado (Simião 2015a SIMIÃO, Daniel. 2015a. As donas da palavra. Gênero, justiça e a invenção da violência doméstica em Timor Leste. Brasília: UnB. ). Tal configuração se constitui pela confluência de conceitos acadêmicos e jurídicos, pelo ativismo pela igualdade, pela formação de “recursos humanos” para a implantação de leis e políticas públicas transnacionais, pela criação de tecnologias para a transformação sociocultural e individual e pelo financiamento de projetos de desenvolvimento social do Norte para o Sul Global por agências das Nações Unidas e de cooperação internacional (Marry 2006MARRY, Sally. 2006. Human Rights and Gender Violence. Translating International Law into Local Justice. Chicago: The University of Chicago Press .; Silva 2012SILVA, Kelly. 2012. As Nações Desunidas. Práticas da ONU e a Estruturação do Estado em Timor-Leste. Belo Horizonte: UFMG.; Silva & Simião 2012SILVA, Kelly & SIMIÃO, Daniel. 2012. “Coping with ‘traditions’: the analysis of East-Timorese nation building from the perspective of a certain anthropology made in Brazil”. Vibrant, 9 (1):362-381.; Simião 2015SIMIÃO, Daniel. 2015a. As donas da palavra. Gênero, justiça e a invenção da violência doméstica em Timor Leste. Brasília: UnB. ). Os operadores dessa configuração são pessoas cosmopolitas que se identificam com valores da “sociedade civil”, conectadas a circuitos intelectuais internacionais que possibilitam sua agregação como comunidade transnacional. Eles compartilham uma postura laica e têm posições relevantes dentro das universidades, do Judiciário, das instituições de governo e de ONGs encarregadas da implantação de normas que emanam do sistema internacional dos direitos humanos.

Uma das características mais importantes desses operadores é que eles/as se pensam como agentes acadêmicos e políticos simultaneamente. Isto corresponde à forma como Strathern (2006STRATHERN, Marylin. 2006. O gênero da dádiva. Problemas com mulheres e problemas com a sociedade na Melanésia. Campinas: Unicamp.) e Butler (2007BUTLER, Judith. 2007. El género en disputa. El feminismo y la subversión de la identidad. Barcelona: Paidón. ) concebem as dimensões analíticas e políticas do uso da categoria de gênero: a serviço do projeto e da crítica feminista. Ao elaborarem um entendimento do campo do Direito como aquele que melhor manifesta a ordem moral de uma sociedade, os operadores o transformam em terreno de disputas políticas, apagando fronteiras entre academia e governo, isto é, via a judicialização das relações cotidianas (Debert & Gregori 2008DEBERT, Guita & GREGORI, Maria. 2008. “Violência e gênero: novas propostas, velhos dilemas”. RBCS, 23 (66):165-211.; Rifiotis 2014RIFIOTIS, Theophilos. 2014. “Judicialização dos direitos humanos, lutas por reconhecimento e políticas públicas no Brasil: configurações de sujeito”. Revista de Antropologia , São Paulo, 57 (1):119-144.), eles buscam desestabilizar ordens hierárquicas, normas e mandatos de gênero que perpetuam o patriarcado através de sistemas políticos, grupos hegemônicos e organizações sociais. Isto lhes exige o consumo de literatura sobre estudos de gênero e feminismo, oriunda de disciplinas como o direito, a antropologia, a sociologia, as várias psicologias e a psicanálise - e o fazem ora por meio de espaços formativos como o workshop, ora por meio de cursos de pós-graduação stricto ou lato sensu.

As reflexões sobre a violência de gênero e as diferentes masculinidades3 3 A produção acadêmica é enorme. Cito referências modelares dos debates sobre violência de gênero e masculinidades no Brasil: Acosta, Filho e Bronz, (2004), Bourdieu (2000), Butler (2007), Connell (2005), Corrêa (1983), Das (2008), Gilmore (1990), Godelier (2011), Gregori (1989, 2010), Kimmel (2006), Machado (2001), Moore (1994a, 1994b) Nascimento (2001), Segato (2003), Seidler (2006) e Viveros (2008). fornecem aos operadores da configuração ferramentas conceituais e critérios classificatórios para a formulação de metodologias de trabalho e para poderem afinar suas práticas de escuta, bem como analisar narrativas sobre a violência. Assim, eles/as se tornam mediadores entre as universidades e as instituições governamentais. Tais antecedentes, por um lado, criam um consenso sobre o entranhamento da violência na construção e na performance masculina, fundamentando uma oposição estruturante da dimensão jurídica dessa configuração. De um lado, estão homens que representam a cultura patriarcal, definidos pela hierarquia, por reproduzirem a tradição e por agirem como um grupo de interesse. Eles desconhecem o desejo e os direitos da mulher (situada no outro polo) que, ao contrário, é entendida como sujeito/indivíduo. Ao limitarem ou negarem sua capacidade de agência, os homens produzem a vitimização desta última. Tal oposição, por sua vez, ressoa com o argumento de Strathern (2006STRATHERN, Marylin. 2006. O gênero da dádiva. Problemas com mulheres e problemas com a sociedade na Melanésia. Campinas: Unicamp.) de que o projeto feminista concebe as categorias de gênero em estado de conflito permanente, ao estarem enquadradas na dialética entre indivíduo e sociedade.

Por outro lado, os antecedentes teóricos ajudam os operadores a conceberem as narrativas sobre a violência como ponto de partida de processos de transformação sociocultural e individual, ao pensá-las como veículo de afetos e emoções relativas às dinâmicas psíquicas de um determinado sujeito. Esta é a dimensão psicológica, objeto de intervenção para a criação da consciência do gênero. Tal dimensão diz respeito a discursos, ideologias e configurações culturais relativas às estruturas das quais dependem a capacidade de agência individual, os processos de subjetivação e identificação sexual e a performance de gênero de cada um (entendida como um efeito das relações de poder). Na configuração, há também um relativo consenso entre os operadores de que a reflexividade é o caminho a seguir para formar cidadãos com uma “perspectiva crítica” de situações de desigualdade, e para que eles possam, assim, categorizá-las como “violência”. O tema, além de gerar uma vasta produção intelectual que testemunha as mudanças individuais e sociais provocadas, com a pretensão de afetar a produção teórica4 4 Sobre esse movimento reverso de influência dos movimentos sociais na academia, cf. Guedes (2018). nas universidades, anima novos ciclos de intervenção para a emergência de posições de sujeito e agências subversivas e emancipatórias - isto é, de individualidades que imaginem sua vida num certo horizonte utópico, chamado por Segato (2003SEGATO, Rita. 2003. Las estructuras elementares de la violencia. Ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los derechos humanos. Buenos Aires: Universidad Nacional de Quilmes.) de “sociedade pós-patriarcal”.

A posição de um antropólogo-cidadão

O fenômeno da resistência masculina em assumir uma nova perspectiva quando inserido numa situação de conflito ou violência é tema frequente na literatura e motivo de denúncia pelos operadores da configuração moral acima descrita, maculando a mudança social almejada com uma aura de ceticismo. Venho refletindo sobre tal fenômeno desde 2004, quando iniciei meu exercício profissional como antropólogo em várias posições dentro dessa mesma configuração na Colômbia: enquanto facilitador de oficinas de masculinidades, como funcionário encarregado de processos de prevenção, além de consultor para a implementação de normas sobre as violências intrafamiliar e sexual e pesquisador em projetos universitários sobre violência, gênero e sexualidade (Jimeno et al. 2007JIMENO, Myriam; GÓNGORA, Andrés; MARTÍNEZ-MORENO, Marco Julián & SUÁREZ, Carlos José. 2007. Manes, mansitos y manazos. Una metodología de trabajo sobre violencia intrafamiliar y sexual. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia , Departamento Administrativo de Bienestar Social.; Barros & Martínez-Moreno 2010BARROS, Miguel & MARTÍNEZ-MORENO, Marco Julián. 2010. Educación sexual en la vida familiar. Currículo para la formación de familias. Bogotá: Alcaldía Mayor de Bogotá, CINDE.; Martínez-Moreno 2013aMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2013a. Da “cultura de la violencia” à “democracia familiar”: Masculinidade, cultura e conformação da alteridade em uma política pública de Bogotá, Colômbia. Dissertação em Antropologia Social, Departamento de Antropologia, Instituto de Ciências Sociais, Universidade de Brasília. , 2013bMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2013b. “Un nuevo primitivo. Cultura, género e igualdad en la transformación hacia una sociedad democrática”. Revista de Antropologia, Universidade de São Paulo, 56 (1):147-180, 2016aMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2016a. “‘Ser macho neste país é coisa de macho’: a culturalização da masculinidade e sua relação assimétrica com a igualdade”. Anuário Antropológico, Universidade de Brasília, 41 (2):33-56; Serrano et al. 2010SERRANO, José Fernando; PINILLA, María Yaneth; MARTÍNEZ-MORENO, Marco Julián & RUIZ, Alejandro. 2010. Panorama Derechos Sexuales y Derechos Reproductivos y Políticas Públicas Colombia. Bogotá: Centro Latinoamericano de Sexualidad y Derechos Humanos, Universidade do Estado do Río de Janeiro, Universidad Nacional de Colombia.). Nessa trajetória, notava que, diante do convite para assumir uma nova masculinidade, varões, donos de diversos pertencimentos socioculturais, alvos de políticas governamentais de atenção a “populações vulneráveis”, resgatavam suas relações e falavam de si como pais, avôs, filhos ou irmãos. Assim, eles se posicionavam diante daquilo que percebiam como uma acusação dos operadores: “ser machista”. Respostas do tipo foram documentadas em contextos muito variados e afastados da Colômbia, como o Timor Leste (Simião 2015SIMIÃO, Daniel. 2015b. “Reparação, justiça e violência doméstica: perspectivas para a reflexão e ação. Vivência, 46:53-74.), e também se deram na minha experiência etnográfica no Rio de Janeiro.

Em vez de explicar e relatar as formas dos “abusos de poder” - sempre associados a descontroles “emocionais” fundamentados pelo patriarcado -, durante meus estudos de pós-graduação, eu levava ao debate público os “argumentos” para os acusados terem cometido as agressões nas brigas de casal (Martínez-Moreno 2016bMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2016b. “A violência não tem gênero: indignação e vitimização de homens autores de violência contra a mulher na judicialização das relações sociais. In: J Melo; D Simião & S Baines (orgs.), Ensaios sobre justiça, reconhecimento e criminalidade. Natal: ABA Publicações, EdUFRGN. pp. 283-306.). O posicionamento desde o polo da “razão” era o modo privilegiado que os últimos tinham para criar uma relação com os operadores no Judiciário e junto ao etnógrafo. Contudo, isto desvelava um limite de compreensão antropológica por parte dos meus pares acadêmicos, transgredido quando uma “alteridade desconfortável” destoava da caracterização esperada sobre condições de opressão e de possíveis propostas para a criação de empatia pela mulher vítima de violência (Forero Angel & Martínez-Moreno 2024FORERO ANGEL, Ana & MARTÍNEZ-MORENO, Marco J. 2024. “Empatía y contaminación en la etnografía incómoda: expansión de los límites de comprensión en la Antropología”. Documento de trabalho.). Este problema era agravado pelo meu gênero, o masculino, que levantava a suspeita de minha “cumplicidade” com práticas repugnantes e gerava um alerta sobre os riscos de contaminação moral da academia (Martínez-Moreno 2022aMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2022a. “‘Cosas que no están escritas en el texto’: una exploración sobre la investigación antropológica con los violentos”. In: M. Jimeno; A. Góngora; M. Martínez-Moreno & A. Olmos (orgs.), Antropología, violencia y actores sociales en América Latina. Bogotá: Univeridad Nacional de Colombia. pp. 279-305.).

Seguindo lições aprendidas com Dumont (1970DUMONT, Louis. 1970. Homo Hierarchicus. The Caste System and its Implications. Chicago: The University of Chicago Press .) e Strathern (2006STRATHERN, Marylin. 2006. O gênero da dádiva. Problemas com mulheres e problemas com a sociedade na Melanésia. Campinas: Unicamp.), meu esforço consistia em criar “apercepção sociológica”. Ao simpatizar com o ideário igualitário, precisava delimitar meus interesses na análise da relação de alteridade presente em meu campo: o dissenso entre os agentes psicossociais e os acusados. “Levar a sério” aquilo que ambos os operadores da configuração e acusados tinham a dizer era um desafio. Por um lado, eu não buscava caracterizar como politicamente incorretas as narrativas que não celebravam uma agência emancipadora (Dullo 2015DULLO, Eduardo. 2015. “Seriously enough? Describing or analysing the Native(s)’s Point of View”. In: J. Carrier (ed.), After the Crisis. Anthropological thought, Neoliberalism and the aftermath. London: Routledge. pp. 133-153.), isto é, que contrariavam um projeto social considerado necessário e benéfico. De outro lado, queria entender o que havia na prática dos operadores para gerar essa resistência. Para fazê-lo, tomar distância dos agentes psicossociais foi uma atitude que considerei prudente. Isto se reverteu na percepção dos meus próprios preconceitos e afinidades, presentes ao analisar as informações do campo e indo além do empiricamente observável (Martínez-Moreno 2022bMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2022b. “Por el Jardín de las Delicias. Emocionalismo, acercamiento a la interioridad y alianza con la força”. In: F Jacobo & MJ Martínez-Moreno (orgs.), Las emociones de ida y vuelta. Experiencia etnográfica, método y conocimiento antropológico. México D.F.: Editora de la Facultad de Ciencias Políticas y Sociales de la Universidad Nacional Autónoma de México.) - posição que compartilho com Segato (2003SEGATO, Rita. 2003. Las estructuras elementares de la violencia. Ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los derechos humanos. Buenos Aires: Universidad Nacional de Quilmes.).

Vivi um conflito, portanto, entre uma atitude política e uma analítica. Ao assumir a crítica social das desigualdades, via duas necessidades: a primeira exigia uma férrea defesa do ideário liberal que, concordando com Graeber (2018GRAEBER, David. 2018. Hacia una teoría antropológica del valor. La moneda falsa de nuestros sueños. México D.F.: Fondo de Cultura Económica.), poderia balizar um cinismo, conduzindo a pensar que tudo estava tão marcado pelo poder e pela dominação que qualquer mudança positiva (em termos de diminuição da violência doméstica, por exemplo) seria impossível. Agora, a segunda, por mim privilegiada, buscava descrever arranjos institucionais alternativos e, assim, seguindo aquele mesmo autor, comparar e historicizar a inquestionável verdade da razão moderna no que tangia os casos analisados. No entanto, uma atitude analítica também provocava a denúncia militante do “culturalismo”, sempre associado a um insuportável relativismo moral dos sentidos da violência, do qual queria escapar. Encontrava-me diante de um impasse moral. Mahmood (2019MAHMOOD, Saba. 2019. “Razão religiosa e afeto secular: uma barreira incomensurável”. Debates do NER, 19 (36):17-56.), autora que também reconhece as dimensões analíticas e políticas do projeto feminista, considera que esses impasses, mais do que ajudar a resolver problemas sociais mediante a reflexão, revelam julgamentos e avaliações normativas sobre o sujeito, a lei e a linguagem que restringem as condições para descrever um fenômeno social, como a resistência masculina à configuração moral sugerida, isto é, tais impasses criam limites intoleráveis sobre certas caracterizações, mostrando tabus discursivos acadêmicos (Shoshan 2021SHOSHAN, Nitzan. 2021. “Epílogo: Desafíos comparativos en el estudio de la ultraderecha. Una mirada desde Europa”. Población y Sociedad, 28 (2):127-137.).

Na história da teoria antropológica, Robbins (2013ROBBINS, Joel. 2013. “Beyond the suffering subject: toward an anthropology of the good”. Journal of the Royal Anthropological Institute, 19 (3):447-462.) e Ortner (2016ORTNER, Sherry. 2016. “Dark anthropology and its others. Theory since the eighties”. Hau: Journal of Ethnographic Theory, 6 (1):47-79.) notam um descompasso entre uma atitude política e uma analítica por parte dos antropólogos a partir da década de 1980, como consequência das críticas à autoridade etnográfica - decorrentes, entre outras coisas, das reivindicações dos movimentos de descolonização e de direitos civis mundo afora. Ao abraçar a ideia de uma única humanidade, produziu-se uma “virada”, dizem os autores, na qual antropólogos teriam deixado de problematizar culturalmente a alteridade, dedicando-se mais a caracterizar a subjetividade dos seus (agora) interlocutores. Dimensões “obscuras” da experiência humana, caracterizadas pela universalidade da dor e do sofrimento, mostravam um conflito entre selfs e estruturas de relações de poder nos processos de cristianização, expansão do capitalismo e consolidação dos Estados pós-coloniais. A estes vetores de expansão do ideário moderno adicionaria o da razão humanitária, que acompanha a emergência da identidade política da vítima, as demandas por visibilidade de novas categorias sociais e a instauração de uma ética do reconhecimento para a consolidação da sociedade civil (Fassin & Rechtman 2009FASSIN, Didier & RECHTMAN, Richard. 2009. The Empire of Trauma. An Inquiry into the Condition of Victimhood. Princeton: Princeton University Press.; Jimeno 2010 JIMENO, Myriam. 2019. “Unos cuantos piquetitos: violencia, mente y cultura”. In: JIMENO, Myriam, Cultura y violencia: hacia una ética social del reconocimiento. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia. pp. 119-146.; Losonczy 2016LOSONCZY, Anne Marie. 2016. “Murderous returns: armed violence, suicide and exhumation in the Emberá Katío economy of death (Chocó and Antioquia, Colombia)”. Human Remains and Violence, 2 (2):67-83.; Merriman 2018MERRIMAN, Danielle. 2018. Critical Visibility in Colombia: Victimhood, Reparations, and the Challenge of Visibilizarse. Ph.D. Dissertation, University of Colorado.). Finalmente, essa virada consolidou uma antropologia que trasladou o imaginário geográfico acerca do “bom” e do “mal selvagem” para a sociedade do etnógrafo (Trouillot 2003TROUILLOT, Michel-Rolph. 2003. Global transformations: anthropology and the moderns world. New York: Palgrave Macmillan.).

Jimeno (2018JIMENO, Myriam. 2018. “Colombia: Citizens and Anthropologist”. In: D. Poole (ed.), A Companion to Latin American Anthropology. Oxford: Blackwell. pp. 72-89.) considera essa tensão entre atitude política e analítica uma das características centrais da antropologia praticada na América Latina desde sua institucionalização na década de 1940. Participantes dos debates sobre a construção da nação, antropólogos latino-americanos problematizaram o lugar subordinado das diferenças culturais, raciais, de gênero e de classe nas hierarquias de poder, bem como no papel da agenda desenvolvimentista para a inclusão social. Isto mostrou uma dissonância entre as orientações teóricas universais da disciplina e seus engajamentos práticos, que localizavam antropólogos como “pesquisadores-cidadãos” em sociedades em permanente estado de conflito e guerra. Enquanto antropólogo-cidadão, entendo que a categoria de gênero compartilha de tal desarmonia, dada uma distribuição diferencial de valor entre as atitudes políticas e analíticas de nossa disciplina. Na configuração de práticas discursivas em que gênero é operacionalizado, há uma precedência da primeira sobre a segunda categoria (da política sobre a analítica), que se reverte na prática de apontar aqueles homens representantes do patriarcado e resistentes ao projeto feminista. Considero este como um efeito de teoria (Bourdieu 1989BOURDIEU, Pierre. 1989. O poder simbólico. São Paulo: Difel.) - o papel desempenhado pelas descrições científicas na construção da realidade observada - da conceitualização das dimensões jurídicas e psicológicas da pessoa humana implícitas na configuração moral que descrevo, dimensões estas que produzem a percepção de um problema social repetitivo, independentemente do contexto cultural ou histórico específico.

Sugiro, então, uma inversão metodológica dos polos: submeter a análise aos pressupostos epistemológicos e ontológicos da configuração moral para vislumbrar sua política de produção de alteridade e seus compromissos afetivos na constituição do problema da resistência. Acompanhando a reivindicação de Mahmood (2019MAHMOOD, Saba. 2019. “Razão religiosa e afeto secular: uma barreira incomensurável”. Debates do NER, 19 (36):17-56.) de uma antropologia com atitude crítica, busco ampliar as possibilidades de descrição da relação entre as posições e as práticas de certos homens e seu julgamento moral pelos facilitadores de grupos reflexivos de gênero durante o processo de judicialização da Lei Maria da Penha. Em diálogo com a antropologia do secularismo descrita por Dullo (2019DULLO, Eduardo. 2019. “O tempo da crítica”. Debates do NER, 19 (36):119-134.), caracterizo os propósitos da conscientização do gênero e da responsabilização dos atos de violência como práticas político-ideológicas pertencentes a uma episteme na qual a ciência e o direito são conceitos modernos, que emergem em oposição distintiva aos domínios da religião e da cultura. Tais práticas criam relações de poder e efeitos de verdade, que concretizam a experiência euro-americana at home ao localizar e corporificar alteridades que ameaçam uma sensibilidade moderna.

Este enfoque implica historicizar alguns pressupostos ocidentais modernos, empreendimento realizado por Jimeno (2007JIMENO, Myriam. 2007. Crimen Pasional. Una contribución a la antropología de las emociones. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia .) quando aquela autora analisava a “configuração emotiva” implícita na gestão jurídica dos crimes passionais na Colômbia e no Brasil; e por Simião (2015SIMIÃO, Daniel. 2015b. “Reparação, justiça e violência doméstica: perspectivas para a reflexão e ação. Vivência, 46:53-74.), quando este descreveu a criação da sensibilidade moderna do gender (oposta à kultura) que justificava a construção do Estado-nação timorense. Para o Rio de Janeiro, Duarte (1986DUARTE, Luiz F. 1986. Da vida nervosa nas classes trabalhadoras urbanas. Rio de Janeiro: Zahar Editor., 1998DUARTE, Luiz F. 1998. “Pessoa e dor no Ocidente (o “holismo metodológico” na antropologia da saúde e doença) ”. Horizontes Antropológicos, 4 (9):13-28., 2003DUARTE, Luiz F. 2003. “Sujeito, soberano, assujeitado: paradoxos da Pessoa ocidental moderna”. In: M. Arán (org.), Soberanias. Rio de Janeiro: Contracapa. pp. 179-194., 2004DUARTE, Luiz F. 2004. “A sexualidade nas ciências sociais: leitura crítica das convenções”. In: A. Piscitelli; M.Gregori & S. Carrara (orgs.), Sexualidade e saberes: convenções e fronteiras. Rio de Janeiro: Garamond. pp. 39-80., 2009DUARTE, Luiz F. 2009. “Família, moralidade e religião: tensões contrastivas contemporâneas em busca de um modelo. In: G. Velho & L. Duarte (orgs.), Gerações, família e sexualidade. Rio de Janeiro: 7Letras. pp. 17-45.) e Salem (1992SALEM, Tânia. 1992. “A ‘despossessão subjetiva’: Dos paradoxos do individualismo”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 7 (18):62-77., 2006SALEM, Tânia. 2006. “Tensões entre gêneros na classe popular: uma discussão com o paradigma holista”. Mana, 12 (2):419-447.) também descreveram processos de construção social da pessoa moderna, apontando para diferenças nas precedências hierárquicas das relações familiares, nas concepções sobre o corpo, nas justificativas religiosas e práticas econômicas entre agentes do individualismo ético das classes mais abastadas e pessoas das classes populares. Isto permitiu a Duarte et al. (1993DUARTE, Luiz; BARSTED, Leila; TAULOIS, Maria & GARCIA, Maria. 1993. “Vicissitudes e limites da conversão à cidadania nas classes populares brasileiras”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 8 (22). ), por sua vez, advertirem sobre as vicissitudes das populações que são alvo de projetos de desenvolvimento social para conscientização do ideário da cidadania liberal, institucionalizado pela Constituição Política Federal do Brasil de 1988. Tal documento pressupõe a existência de “indivíduos”, guiados pelo valor da igualdade e possuidores de uma interioridade na qual residem seus direitos e emoções, isto é, de uma dimensão psicológica, objeto que caracterizo na seção seguinte.

Consciência da relação entre estrutura e ação

Adquirir consciência de novas regras para interpretar a realidade e permitir formas de incidência pessoal no mundo faz parte do que Asad (1996ASAD, Talal. 1996. “Comments on Convertion”. In: P. Van der Veer (org.), Conversion to Modernities: The Globalization of Christianity. New York: Routledge. pp. 263-273.) chamou de “doutrina da ação”: um processo histórico-cultural que combina preceitos científicos e protestantes, visando retirar as pessoas de um mundo de acasos para integrá-las a um no qual as ações individuais são pensadas como causas com efeitos, o que ampara um imperativo de responsabilidade moral e legal. Keane (2003KEANE, Webb. 2003. “Self-Interpretation, Agency, and the Objects of Anthropology: Reflections on a Genealogy”. Comparative Studies in Society and History, 45 (2):222-248., 2007KEANE, Webb. 2007. Christian Moderns. Freedom and Fetish in the Mission Encounter. Berkeley: University of California Press ., 2018KEANE, Webb. 2018. “On Semiotic Ideology”. Signs and Society, 6 (1):64-87.) relaciona tal doutrina aos movimentos iconoclastas que promoveram o questionamento da estratificação social, a rejeição às relações de dominação e a crítica ao status herdado, consolidando uma atitude de desprezo diante da desigualdade. Também os relaciona à definição dos critérios de civilidade que privilegiam a precedência do self, da novidade e da liberdade perante outros elementos - como critérios comunitários/sociais, a tradição e a servidão. Por fim, tal doutrina está ligada à prática da oração carregada de intensidade emocional, na qual a calibração entre intenção, palavra e ato mostrava qualidades internas valorizadas na vida pública: a autonomia e a autenticidade. Para Asad, esta é a “performance”, prática religiosa inseparável da formação do mundo secular, que oferece signos de agência humana.

Graças à doutrina da ação, podemos distinguir uma dicotomia fundadora das ciências sociais: a relação entre estrutura e ação, que inspira uma vasta produção intelectual sobre as formas sociais que adquirem o poder e a dominação, assim como a aspiração civilizatória de dar vida à ideia-valor do “indivíduo-no-mundo”, ou cidadão liberal (Dumont 1970DUMONT, Louis. 1970. Homo Hierarchicus. The Caste System and its Implications. Chicago: The University of Chicago Press .). A doutrina exige a operacionalização do conhecimento científico para contornar a dimensão jurídica da ideologia do individualismo moderno, aquela que impõe o contrato como modo de regulação social entre cidadãos. Isto permite a Strathern (2016SIMIÃO, Daniel. 2015a. As donas da palavra. Gênero, justiça e a invenção da violência doméstica em Timor Leste. Brasília: UnB. ) caracterizar o cidadão como uma “entidade política”, descrita através de uma linguagem de direitos privados que visam ao seu reconhecimento social como pessoa humana, nos conduzindo à segunda dimensão do individualismo: a psicológica. Menos problematizada pelas ciências sociais na versão de Salem (1992ROHDEN, Fabíola. 2001. Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher. Rio de Janeiro: Fiocruz.), esta última exige a formação de uma psique e se relaciona com a valorização da afirmação emocional na consolidação da sociedade civil.

Herdeira de discussões teológicas sobre a verdade, interioridade e vontade da “alma” (valor que complementa ao corpo), a genealogia da categoria emoção traça uma continuidade entre as noções de pessoa cristã e a moderna, além de estabelecer um importante critério para o entendimento contemporâneo acerca do humano (Duarte & Giumbelli 1994DUARTE, Luiz & GIUMBELLI, Émerson. 1995. “As concepções cristã e moderna da Pessoa: paradoxos de uma continuidade”. Anuário Antropológico, 93:77-111.). Para Duarte (2004DUARTE, Luiz F. 2004. “A sexualidade nas ciências sociais: leitura crítica das convenções”. In: A. Piscitelli; M.Gregori & S. Carrara (orgs.), Sexualidade e saberes: convenções e fronteiras. Rio de Janeiro: Garamond. pp. 39-80.) e Salem (1992SALEM, Tânia. 1992. “A ‘despossessão subjetiva’: Dos paradoxos do individualismo”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 7 (18):62-77.), a uma definição iluminista da emoção sobre processos fisiológicos do sistema nervoso se opôs uma romântica, relativa a tecnologias do cultivo de si, que mostravam uma mancha semântica entre conceitos como consciência, subjetividade, fantasia, sexualidade, poder, memória, afetos e desejo. Essas noções contribuem, na visão romântica, à formação de uma “psicomaquia” ou batalha da alma conducente ao autocontrole, própria do processo civilizatório descrito por Elias (1994ELIAS, Norbert. 1994. El proceso de la civilización. Investigaciones sociogenéticas y psicogenéticas. Bogotá: F.C.E.), cujo propósito é distinguir o indivíduo dos papéis sociais atribuídos pelo parentesco e pela religião. Assim, um ser consciente é um que sai de um estado de alienação, modo de entender a emergência da pessoa no Ocidente, no qual a expressividade do corpo mecânico permite identificar essências por trás das aparências (Leavitt 1996LEAVITT, John. 1996. “Meaning and Feeling in the Anthropology of Emotions”. American Ethnologist, 23 (3):514-539.). Mais bem conhecido a partir da obra de Freud (1996a FREUD, Sigmund. 1996a. “Psicología de las mases y análisis del yo”. In: Obras completas 18. Buenos Aires: Amorrortu. pp. 65-136., 1996bFREUD, Sigmund. 1996b. “El porvenir de una ilusión”. In: Obras completas 21. Buenos Aires: Amorrortu . pp. 15-39.), nesse modelo, o corpo é uma entidade físico-moral que surge da oposição entre poderosas energias internas que sinalizam a intenção do sujeito e forças externas opressoras que impedem que as primeiras fiquem fora de controle (Jimeno 2019 JIMENO, Myriam. 2019. “Unos cuantos piquetitos: violencia, mente y cultura”. In: JIMENO, Myriam, Cultura y violencia: hacia una ética social del reconocimiento. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia. pp. 119-146.). Do confronto, surge o self: a percepção de uma unidade de si em contínuo processo de incorporação. Trata-se de uma concepção de uma pessoa que deve aprender a lidar com sua incompletude e com a incerteza de viver num mundo cujas regras ele/a não controla.

Esta concepção da pessoa corresponde àquilo que Mahmood (2001MAHMOOD, Saba. 2001. “Feminist Theory, Embodiment, and the Docile Agent: Some Reflections on the Egyptian Islamic Revival”. Cultural Anthropology, 16 (2):202-236) chamou de “arquitetura liberal do self”, fenômeno que coloca problemas metodológicos para a descrição e análise antropológica de manifestações de agência que não oferecem signos de resistência à dominação. Tal arquitetura é protagonista dos conflitos de um mundo em processo de secularização, no qual tradições religiosas como o Islã disputam com o liberalismo e o pós-modernismo na definição da relação conceitual entre desejo, produção de si, performance, constituição do sujeito, ação moral e processos de incorporação. Em outras palavras, tal forma da pessoa faz parte de uma metanarrativa que sustenta a Razão e a Realidade da Modernidade, conceitos citados (e capitalizados) por Trouillot (2003TROUILLOT, Michel-Rolph. 2003. Global transformations: anthropology and the moderns world. New York: Palgrave Macmillan.). Eles dão inteligibilidade ao contraste entre o civilizado (possuidor de verdade, interioridade e vontade) e o selvagem (um ser cuja alma deve ser formada). A arquitetura liberal do self serve como critério de universalização das dimensões jurídicas e psicológicas do individualismo moderno através das práticas científicas e jurídicas que buscam a consolidação dos direitos humanos e do projeto de sociedade pós-patriarcal.

Para Mahmood (2001MAHMOOD, Saba. 2001. “Feminist Theory, Embodiment, and the Docile Agent: Some Reflections on the Egyptian Islamic Revival”. Cultural Anthropology, 16 (2):202-236), a ausência de signos de agência humana no mundo moderno denota fundamentalismo, falsa consciência, subjugação da mulher, conservadorismo social, ativismo reacionário, atraso cultural e vulnerabilidade social. Estes são modos de objetivação conceitual, isto é, de estranhamentos da tradição patriarcal que, desde o século XVIII, animaram reformas jurídicas e inovações científicas na Europa para eliminar qualquer traço da ideologia do patria potestas, ou seja, esses modos de objetivação buscam desinstitucionalizar o pater famílias como mediador entre Estado e família - que deve ser concebida como nuclear e cujos membros passam a ser reconhecidos como “sujeitos de direito”, condição necessária para a sua atuação como cidadãos e trabalhadores no espaço público (Foucault 1984FOUCAULT, Michel . 1984. “A política da saúde no século XVIII”. In: FOUCAULT, Michel, Microfísica do poder. São Paulo: Graal. pp. 193-208.; Rodhen 2001ROHDEN, Fabíola. 2001. Uma ciência da diferença: sexo e gênero na medicina da mulher. Rio de Janeiro: Fiocruz.). Uma das inovações deste tipo foi a reapropriação, no século XIX, do mito de Édipo, na interseção das ciências jurídicas, psiquiátricas e sociais. Ele guia a compreensão dos conflitos sobre a natureza de ordem simbólica no Ocidente, conceitualizando um complexo imaginário sobre a regulação do desejo, o propósito de reorientar as relações entre gêneros e gerações e, particularmente, a luta de um indivíduo para libertar-se da ordem de um “pai despótico” - processo emancipador que cria a lei e a moral.

Para Borneman (2015BORNEMAN, John. 2015. Cruel Attachments. The Ritual Rehab of Child Molesters. Chicago: The University of Chicago Press.), o mito do Édipo é uma tese científica moderna sobre a origem da humanidade a partir da conformação de um trauma original que, independentemente da cultura, separa a criança do estado de natureza e a obriga a se posicionar como um “sujeito”. Este último, ao fazer uso da linguagem, funda a subjetividade, a reflexividade e as relações éticas. O Édipo promoveu novos critérios sobre a transgressão da intimidade burguesa, reformulando tabus sobre o “simbolismo do sangue” para validar os da “análise do sexo”, contribuindo para que o campo jurídico castigasse homens que reduziam a mulher ao status de “objeto” sexual, de posse ou manipulação. Da perspectiva civilizatória, a “objetivação”, entendida como reificação (Keane 2003KEANE, Webb. 2003. “Self-Interpretation, Agency, and the Objects of Anthropology: Reflections on a Genealogy”. Comparative Studies in Society and History, 45 (2):222-248.), é uma atitude que viola o espírito do contrato social e nega a condição da mulher como pessoa dotada de reflexividade, autodeterminação e livre arbítrio. Assim, somando-se às inovações científicas, a “metáfora da mercadoria”, comenta Strathern (2006STRATHERN, Marylin. 2006. O gênero da dádiva. Problemas com mulheres e problemas com a sociedade na Melanésia. Campinas: Unicamp., 2016STRATHERN, Marylin. 2016. “Sex and the Concept of the Person”. In: STRATHERN, Marylin. Before and After Gender. Chicago: Hau Books. pp. 175-244.), problematizou a tensão entre a liberdade humana e a dominação masculina, ao transformar as mulheres em “coisas” nos circuitos de reciprocidade controlados por varões.

Um dos efeitos mais notáveis ​​dos movimentos de reforma jurídica e inovações científicas foi a idealização do modelo familiar do parentesco euro-americano descrito por Schneider (2016SCHNEIDER, David. 2016. Parentesco americano. Uma abordagem cultural. Petrópolis: Vozes.), também chamado de moderno por Strathern (1992STRATHERN, Marylin. 1992. After nature: English kinship in the late twentieth century. Cambridge: Cambridge University Press .). Nele, a família é definida pelo cruzamento de dois vínculos, o conjugal (a relação erótica e suprema entre os cônjuges, que voluntariamente constituem a intimidade do casal) e o cognático (que estabelece a identidade natural entre pais e filhos, concebidos como seres independentes fisicamente e com os quais se criam laços afetivos). Aqui, o “amor” é um valor espiritual que liga as pessoas e não as coisas, denotando uma solidariedade difusa e duradoura entre individualidades. Para Strathern (1992STRATHERN, Marylin. 1992. After nature: English kinship in the late twentieth century. Cambridge: Cambridge University Press .), este é um modelo que promove perspectivas ao conceber a sociedade em contínuo processo de diferenciação, dada a separação entre a “continuidade/tradição/convenção” dos pais e a “mudança/novidade/escolha” que assumirão os filhos, isto é, na medida em que a família produz perspectivas, ela agrega complexidade à vida social, colocando a “diversidade” como novo valor do modelo.

Colidindo com o propósito da diferenciação está a pessoa do pater familias: uma categoria da organização social e do parentesco do Mediterrâneo, investida de uma função jurídico-magistral que lhe confere autoridade para controlar os direitos da esposa, dos filhos e descendentes mais remotos da linhagem masculina, entendidos como seu patrimônio (Borneman 2015BORNEMAN, John. 2015. Cruel Attachments. The Ritual Rehab of Child Molesters. Chicago: The University of Chicago Press.). O pater familias carrega consigo alusões ao homem livre romano, aquele que protege códigos de conduta sexual relacionados ao mundo público (Duarte & Giumbelli 1994DUARTE, Luiz & GIUMBELLI, Émerson. 1995. “As concepções cristã e moderna da Pessoa: paradoxos de uma continuidade”. Anuário Antropológico, 93:77-111.). Ademais, inclui predicados do patriarca judaico, mediador do sacrifício da vítima que atualiza a aliança entre Deus e o homem, numa forma da reciprocidade que permite a antropólogas como Magli (1993MAGLI, Ida. 1993. De la dignidad de la mujer. La violencia contra las mujeres, el pensamento de Wojtyla. Barcelona: Icaria.) ou Segato (2003SEGATO, Rita. 2003. Las estructuras elementares de la violencia. Ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los derechos humanos. Buenos Aires: Universidad Nacional de Quilmes.) conceitualizarem a mulher enquanto o tributo - uma coisa - que atualiza o patriarcado.

Na antropologia, estas descrições se somam a instrumentos de compreensão que, durante o século XX, descreveram “códigos de honra e vergonha” como resquícios de arcaísmos culturais. Para Pina Cabral (1991PINA CABRAL, João. 1991. Os contextos da antropologia. Lisboa: Etnográfica.), tais caracterizações, feitas por etnógrafos estadunidenses e ingleses, explicavam a suposta “débil identidade de gênero masculina” do homem ibérico, que necessitava da constante reafirmação da sua virilidade. Do outro lado do Atlântico, Gutmann (2017GUTMANN, Matthew. 2017. Os significados de ser homem em uma colônia popular na Cidade do México. Niterói: Universidade Federal Fluminense.) afirma que esses “traços culturais” se somaram à caracterização “antissocial” do contingente indígena que integrou segmentos campesinos e populares urbanos no México. Junto a um profundo sentimento de Destino Manifesto nos Estados Unidos, tal distinção teria legitimado o racismo antimexicano, diz o autor, sob a forma da denúncia de um certo sexismo que, dentro das universidades, passou a designar o “androcentrismo” atribuído aos sistemas políticos latino-americanos. Nas últimas décadas do século XX, o contraste entre tal individualismo ético e traços culturais específicos propiciou a transformação do valor social do “macho” na acusação de “machismo” formulada por segmentos intelectualizados transnacionais.

Essas representações da diferença cultural acompanharam políticas de desenvolvimento social nas quais o prisma da pessoa humana, possuidora de dimensões jurídica, psicológica e de agência humana, diagnosticava - por oposição, à sombra da pátria potestas - localidades dispersas pelo globo, definidas pela sua estratificação social, status e relações de dominação. Isto permite compreender a afirmação de Seidler (2006SEIDLER, Victor. 2006. “Men, feminism and power”. In: J. Hearn & D. Morgan (eds.), Men Masculinities & Social Theory. London: Routledge . pp. 215-228.) de que a principal contribuição da análise feminista é conceber o patriarcado como uma estrutura de poder que transpassa diferentes culturas - assim como o conceito de trauma. Em tal estrutura, agentes do machismo reduzem as demais pessoas a uma matéria na qual depositam seu desejo sexual. Assim, afirma o autor, qualquer homem ou mulher pode ser uma “vítima do patriarcado”, pois ela ou ele possui uma perspectiva que dificilmente pode expressar perante grupos de homens que se negam a abandonar a própria posição de poder. Ademais, podemos entender os postulados de Segato (2003SEGATO, Rita. 2003. Las estructuras elementares de la violencia. Ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los derechos humanos. Buenos Aires: Universidad Nacional de Quilmes.), quando compara a cultura (qualquer uma) à programação de um chip instalado na mente pelo hábito e considera que a reflexividade promovida nas leis das Nações Unidas possibilita a reforma profunda dos afetos que sustentam a moralidade tradicional, formando novas subjetividades.

Ao conceber a violência contra as mulheres como profundamente entranhada nos sistemas de parentesco, religiosos e políticos não modernos, as normas transnacionais erigidas para enfrentá-la buscam criar uma oposição distintiva entre perspectiva (subjetiva) e valor (social), isto é, incentivam a formação de uma posição crítica individual à cultura ou promovem posições (parciais e localizadas) subversivas diante da pretensão totalizadora de normas que limitam a agência individual. Este é um processo no qual a conscientização do antagonismo entre estrutura e ação passa a definir os domínios do parentesco e da religião nos termos da continuidade/tradição/convenção, conduzindo ao reconhecimento individual do confronto entre sujeito e objeto. Trata-se de uma conversão de um estado de alienação para um de esclarecimento individualizante e emancipatório, indicador de uma fronteira política e religiosa que desvela um modo de formação do Estado moderno (Comaroff & Comaroff 1991COMAROFF, Jean & COMAROFF, John. 1991. Of Revelation and Revolution. Christianity, Colonialism, and Consciousness in South Africa. Chicago: The Chicago University Press. ; Duarte et al. 1993DUARTE, Luiz; BARSTED, Leila; TAULOIS, Maria & GARCIA, Maria. 1993. “Vicissitudes e limites da conversão à cidadania nas classes populares brasileiras”. Revista Brasileira de Ciências Sociais, 8 (22). ; Keane 2007KEANE, Webb. 2007. Christian Moderns. Freedom and Fetish in the Mission Encounter. Berkeley: University of California Press .). Seus operadores valorizam os signos de agência humana e promovem a emergência de perspectivas singulares, apreensíveis através de narrativas emocionais, erigindo-as como critério acadêmico e político de verificação da realidade. Agora, voltemos à etnografia.

Os grupos reflexivos de gênero e a força de um pai de família

Entre 2014 e 2016, documentei a implantação dos grupos reflexivos de gênero no âmbito do Judiciário no Rio de Janeiro. Sua história social permite traçar laços de cooperação entre agências progressistas norte-americanas e universidades brasileiras que, desde a década de 1970, ajudaram a posicionar a “perspectiva de gênero” no país, dado o protagonismo de acadêmicas e ativistas feministas (Heilborn & Sorj 1999HEILBORN, Maria & SORJ, Bila. 1999. “Estudos de gênero no Brasil”. In: S. Miceli (org.), O que ler na ciência social brasileira (1970-1995). São Paulo: Sumaré. pp. 183-221.; Sarti 2012SARTI, Cynthia. 2004. “O feminismo brasileiro desde os anos 1970: revisitando uma trajetória”. Revista Estudos Feministas, 12 (2):35-50.). Desde a década de 1960, estas mulheres haviam criado instrumentos conceituais, políticos e jurídicos para combater o autoritarismo característico da ditadura brasileira, facilitando a redemocratização durante os anos 1980. Após intensos debates na década de 1990, o movimento de mulheres no Brasil formalizou o objeto jurídico da “violência doméstica e familiar contra a mulher” na forma da Lei Maria da Penha de 2006. Para Gregori (1989GREGORI, Maria. 1989. “Cenas e queixas. Mulheres e relações violentas”. Novos Estudos CEBRAP, 23:163-175., 2010GREGORI, Maria. 2010. “Violence and gender. Political paradoxes, conceptual shifts”. Vibrant, 7 (2):2016-235., 2023GREGORI, Maria. 2023. “Gênero, Erotismos e Violência: backlash e intolerâncias no Brasil atual”.), esta foi uma das estratégias mais importantes para promover o equilíbrio das relações de poder entre os gêneros e a plena cidadania das mulheres brasileiras. Tal movimento foi acompanhado pela expansão de um campo de estudos sobre os limites, os riscos e os perigos da transgressão de normas do erotismo e da sexualidade na qual o consentimento deixa de mediar as relações. O campo demonstrou, assim, a vulnerabilidade social do corpo da mulher, problematizando perversas convenções que a relacionavam com a identidade da vítima.

Entre os anos 1980 e 1990 no Brasil, surgiu um movimento de homens intelectualizados, em sua maioria psicólogos, que buscavam revisar “comportamentos autoritários” atribuídos a uma “masculinidade hegemônica” da qual participavam seus próprios pais, os militares e os políticos da ditadura. Esta última camada social era caracterizada por alguns deles como constituidora da “violência estrutural” mais ampla da sociedade, opressora de formas dissidentes de “ser homem” que buscavam a livre afirmação de seu desejo. Através de práticas artísticas e alternativas terapêuticas, porém, eles, os filhos, podiam agora contemplar sua própria “violência interior”, institucionalizando um dispositivo reflexivo de adesão voluntária para ressignificar suas masculinidades. À luz da literatura feminista da época, interpretavam a posição que assumiam nos conflitos familiares e diante de outros homens como “marcada pelo gênero”. Começavam, assim, a se conceber como “sujeitos” enquadrados por relações de poder e dominação, obrigando-os, de certa forma, a se diferenciar da categoria de “ser humano” (que incluía as mulheres). Tais encontros proporcionaram uma “experiência de transformação” que, durante os anos 1990 e 2000, esses homens buscaram levar a moradores de subúrbios e favelas brasileiras, alvos de projetos de desenvolvimento social nos quais se deram os primeiros grupos reflexivos de gênero. A metodologia incluía orientações sobre a educação popular freiriana, o construtivismo social da terapia familiar, a desnaturalização dos papéis de gênero de autoras feministas e a noção de performance desenvolvida por Butler. O objetivo era a formação de pessoas produtoras de conhecimento, conscientes dos próprios “privilégios de gênero patriarcais” e transformadoras da realidade através da linguagem (Beiras & Bronz 2016BEIRAS, Adriano & BRONZ, Alan. 2016. Metodologia de grupos reflexivos de gênero. Rio de Janeiro: Noos .).

Com a institucionalização da Lei Maria da Penha, os grupos mudaram sua natureza: de adesão voluntária para a participação compulsória, por parte de homens judicializados por violência contra a mulher. No Judiciário, os facilitadores dos grupos buscavam que os infratores narrassem sua trajetória de vida fazendo o uso de categorias emocionais. Thor, um desses psicólogos, formulava perguntas reflexivas, principalmente “o que é ser homem?”, para então propiciar narrativas sobre experiências violentas na família, na relação entre pai e filho, entre homens no espaço público e com as próprias parceiras. A partir desse material, ele continuava com o processo de “elaboração”: a descrição das sensações corporais e dos sentimentos vividos em tais situações, necessária para que os acusados expressassem suas “emoções reprimidas”. Efeito disso era o reconhecimento da materialidade e das fronteiras do corpo; para Thor, era um momento de suma importância, no qual emergia o “verdadeiro ser” dos acusados, censurado pela norma patriarcal. O processo grupal geralmente chegava ao fim com a “mobilização” ou a ressignificação das situações vivenciadas por cada um. Thor esperava que uma concepção tradicional de ser homem, definido enquanto “provedor econômico”, passasse a incluir o atributo do “cuidado na criação dos filhos” - modo de desestabilizar as “hierarquias” que se reproduziam através da família. A consciência da intensidade de emoções como a “raiva”, entranhada no ato de agressão, podia aqui se transformar em palavra - mudança indicadora de uma nova narração de si, mencionava Thor, sendo prelúdio para uma performance masculina com maiores possibilidades de ação.

Um dos efeitos dessa “hermenêutica da emoção” - como diz Abu-Lughod (1990ABU-LUGHOD, Lila. 1990. “Shifting politics in Bedouin love poetry”. In: L. Abu-Lughod & C. Lutz (eds.), Language and the Politics of Emotion. Cambridge: Cambridge University Press. pp. 24-45.) ao se referir à interpelação intencional quando a emoção é colocada no discurso - era um posicionamento na primeira pessoa do singular: um eu dono das suas palavras e atos, que não distribuía a própria responsabilidade para outros pronomes, sujeitos ou agências. Para Thor, a afirmação de um eu permitia a definição do “desejo”, veículo da “verdade individual” do acusado, alguém que dava conta da própria “perspectiva”. Thor estabelecia um parâmetro de igualdade entre os seres humanos (pois “todo mundo tem emoções”) para então comparar as trajetórias dos acusados e visibilizar as “várias masculinidades” que entrevia. A perspectiva de cada participante do grupo era essencial para poder proceder à crítica das normas religiosas ou culturais, como a “crença” na complementaridade entre os cônjuges, por exemplo - algo que “mistificava” a relação e os impedia de reconhecer o abuso encoberto na troca entre amor e proteção. Nisso, explicava Roberto (professor de psicologia de uma universidade federal, reconhecido como expert entre seus pares), estava a relevância da geração de perspectivas, para a qual seu trabalho como facilitador era o de “generificar” a situação de violência, isto é, evidenciar as desigualdades presentes por meio do contraste entre a sensação masculina em exercer poder e a experiência de dor da mulher, testemunho de sofrimento que ele, o homem, deveria validar. Assim, o agressor devia “descobrir a dimensão do dano que causava nos outros”, preâmbulo para o exercício da “empatia” pela vítima, essencial para evidenciar privilégios masculinos e a vulnerabilidade da mulher. Era desse modo que Thor e Roberto geravam a consciência do gênero.

O reconhecimento da estrutura do gênero, não obstante, gerou posições críticas por parte de vários dos acusados. Vídeos pedagógicos utilizados por Thor e seus estagiários (estudantes de psicologia e serviço social), que partiam do pressuposto de que o gênero era uma construção social, encenavam “trocas de papéis”:5 5 Acorda Raimundo, Acorda! de Alfredo Alves (1990) e Maiorité opprimé de Eléonore Pourriat (2010). homens agiam como mulheres, criavam os filhos (inclusive, um ficava grávido) e eram objeto de violência psicológica, física e sexual por parte das companheiras. A representação do patriarcado nos curtas, no entanto, era a de uma figura ilusória, o que não interpelava a experiência dos acusados. Estes achavam a atuação masculina das atrizes “exagerada”, opinião que talvez decorresse não só do questionamento moral ao qual estavam submetidos no Judiciário, mas porque diziam que “o corpo biológico era necessário para reconhecer o gênero”. Além disso, nem todo homem era agressivo, muito menos um estuprador, como sugeria um dos curtas, o que causava certo estranhamento. Sendo assim, depois do vídeo, ao serem instados pelos facilitadores a se imaginarem como mulheres, os acusados insistiam na impossibilidade de mudarem de posição, isto é, de “se colocarem nos sapatos do outro”, praticando, assim, empatia pela vítima. Aqueles que davam seus “pontos de vista como mulher” descreviam as próprias mães, algo que atrapalhava os facilitadores, que esperavam descrições objetificadoras do corpo da mulher.

Os acusados então se descreviam em relação às próprias parentes: mães, filhas e companheiras. Elas eram as boas mulheres, vítimas potenciais de abusos de terceiros, as quais deveriam proteger com a força física, principal atributo de um pai de família (a denunciante era geralmente excluída desta classificação, acusada de ser uma “má mãe”). O pai era a pessoa interpelada no Judiciário para falar de suas emoções, e acumulava prestígio aos olhos dos seus parentes, amigos e vizinhos na medida em que estes últimos reconheciam sua ação de “proteção”, colocada em oposição à agressão - que, ao contrário, gerava desconfortáveis silêncios dentro e fora do grupo reflexivo ao ser narrada. Eles sabiam de uma desproporção de força entre os sexos, o que exigia seu autocontrole, justificava o amparo paterno e os diferenciava em relação à força da mulher, focalizada no “cuidado”. A qualidade humana da força era, portanto, descrita como a mesma para ambos os sexos, e se referia à “intenção” de fazer bem ou mal à outra pessoa, explicava Celso (um bem-sucedido empreendedor morador da Tijuca), mas o dimorfismo sexual e processos hormonais invisíveis diferenciavam suas manifestações no mundo. O mais importante: ambas as forças (de ambos os gêneros) serviam à reprodução e à conformação da família, uma entidade idealizada por todos os acusados.

“A capacidade única da mulher de gerar vida”, como explicava Rony (vendedor como camelô do centro do Rio), era o maior símbolo da diferença entre homens e mulheres. Fonte do significado classificatório do parentesco, a gravidez se relacionava ao domínio da “natureza” e criava uma precedência misteriosa dificilmente explicável, da qual pais e filhos tinham surgido como efeito. Ademais, gerava uma incomensurabilidade que deslegitimava os ditos “direitos sexuais”, como o reconhecimento de pessoas trans, tema de discussão de uma das sessões grupais. Apesar dos artifícios médicos e estéticos para assumir uma identidade “oposta” com a qual se nasceu, uma mulher trans não podia engravidar, diziam; e quando um homem trans o fazia, revelava sua “verdadeira natureza”. Na mesma província dos direitos, a homossexualidade masculina era questionada. Não o era tanto pela sua dimensão erótica, qualidade mais enfatizada pelos facilitadores, senão porque impedia “formar o caráter” da descendência: a transmissão das qualidades do pai para seus filhos e netos. Assim, Seu Francisco (gari morador do centro do Rio) explicava afetuosamente sua relação com os netos, vínculo que não tivera com seus próprios filhos, e que também permitia a Seu José (serralheiro morador do Complexo do Alemão), o avô de Jonatas, Cauê e Maria Eduarda, a idealização de uma velhice abençoada.

O desenvolvimento da força começava desde cedo, com a obrigação do jovem de trabalhar. Esse treinamento impedia que se virasse “bandido”, explicavam vários dos acusados do grupo de Niterói, facilitado por Aline (teóloga e psicóloga, profissional da equipe psicossocial do juizado). O trabalho forjava a capacidade de suportar exaustivas jornadas, nas quais era prioritário “lutar” para ganhar o dinheiro demandado por mães e companheiras. Fora da casa, eles também se relacionavam com outros pais e trabalhadores, cuja conjunção de identidades resultava na idealização do “cidadão de bem”. Na rua, tanto o Barrigudo (gari, morador de uma comunidade de Niterói) quanto Herbert (“marítimo”, como gostava de definir sua ocupação: capitão de um pequeno barco na Baía de Guanabara) frequentavam espaços lúdicos, como o campo de futebol ou o boteco, onde se divertiam, xingavam, e conversavam com amigos, esquecendo as reclamações que saturavam a vida em casa. Na rua, estes e outros acusados se entregavam a prazeres furtivos, motivo de intermináveis brigas com as parceiras por “ciúmes”. Era um estado emocional complexo, pois também indicava que “a mulher gosta de você”, explicava o Barrigudo. Com certas “amigas”, por fim, eles reviviam o “namoro”, uma mistura de sexo e carinho que prometia a plenitude, um tipo de paixão perdida após a gravidez do primeiro filho, quando “a mulher destrói o corpo para ser mãe”. Explicações como a última (feita por Rony), por sua vez, permitiam aos estagiários denunciarem o processo de objetificação feminina.

Amar a outra era vê-la feliz e satisfeita, sugerindo uma precedência feminina descrita pelos acusados com afetividade, uma linguagem que contemplava as relações com as boas mulheres. A elas era oferecido o mais precioso de si: “as emoções”, afirmava Wesley (cozinheiro, morador de uma favela do centro de Niterói). Para Anderson (vendedor de caipirinhas das praias de Ipanema), demonstrar “sentimentos puros” denotava a força do coração que eles deveriam transparecer, apesar da aparência física de um “favelado” sem dinheiro, roupas de grife, carros ou uma casa. Em um mundo dominado pelo “individualismo” e o “materialismo”, esses bens de consumo eram apenas o que interessava às mulheres, dizia. Assim, ele descrevia seu azar no amor, gerando simpatia em Seu Francisco, Seu José e Rony ao se comparar com o ogro Shrek.6 6 Protagonista do filme de animação homônimo de 2001, produzido pela Dream Works. O amor contemplava, ademais, o alívio de ser compreendido e a realização de estarem juntos nas relações sexuais, nas reuniões familiares, nos conselhos dados pelos pais a seus filhos e filhas e na intimidade da casa, definida por Wesley como um “refúgio” do competitivo mundo da rua.

Assumir uma nova masculinidade contrariava o esforço que Heitor (bombeiro militar, morador da cidade de Maricá) ou Josué (advogado, morador de São Gonçalo, originário de uma cidade costeira da Bahia) tinham feito para serem identificados como pais exemplares. Com eles, registrei trajetórias de “superação”, inseparáveis do cultivo de um vínculo reflexivo com a força de Deus. Após a morte do seu pai, Heitor trabalhou e estudou para se formar como enfermeiro, passar em concurso público e comprar uma casa para a mãe. Seu interesse pela literatura espírita e sobre “geração de consciência” lhe brindara ferramentas para superar a “culpa” causada pelo que vivera com Joana, mãe de sua única filha, com quem tinha quatro processos nos tribunais. Já Josué, após anos “ajudando” políticos no Rio de Janeiro, acumulara uma considerável fortuna, fonte da sua atual “desgraça”. Contava que a ex-esposa, uma influente funcionária do Judiciário, depois de acusá-lo de “violência psicológica”, apropriara-se dos seus bens, contas bancárias e do mais importante, seus filhos, propiciando sua conversão ao judaísmo. Graças às palavras do D’us de Israel, Josué encontrara um “novo estado de consciência” para reavaliar seu passado e não se deixar dominar pelas “artimanhas de uma mulher mesquinha, que nem merecia ser chamada de animal” (afirmação que mereceu fortes críticas de Aline).

A força de Deus também inspirava as árduas jornadas de Seu Francisco e Seu José. Ambos haviam se estabilizado em uma casa, motivo de orgulho pessoal. Os dois idosos dedicavam tempo para “pensar” sobre as encruzilhadas da vida - o primeiro na Igreja Universal, o segundo no boteco. Assim, avaliavam suas ações passadas para procederem com cautela no presente. O corpo, afinal, não era mais o mesmo da juventude, obrigando-os a cuidar do trabalho que sustentava a família de outras formas. Pensar também era uma introspecção que depurava a “mágoa” produzida pelas “provocações” das mulheres, que possuíam um conhecimento íntimo da relação, sempre manipulado a seu favor, contavam. Como dizia Wesley: “ela pode te alçar e levar para cima; ela, com raiva, pode usar sua força para te arruinar”. Sendo assim, era melhor não expressar emoções. Dada a “racionalidade” das mulheres, “arquitetas da violência sutil” (palavras de Heitor), após anos de experiência, Seu José e Seu Francisco mantinham uma postura hermética. Pensando, eles criavam “coragem” e renovavam sua força para continuar “na luta”, no caso do primeiro, ou para “vencer a batalha contra as adversidades”, no caso do segundo. “Deus só dá o fardo para quem pode carregar”, comentava Seu Francisco: o sofrimento não era um castigo, mas um desígnio divino, que brindava a consciência das suas próprias capacidades como um “homem de fé”.

A cena da violência e as tensões estruturais das relações vivas

Diferentemente da representação distanciada do patriarcado mostrada nos vídeos,7 7 Entre outros recursos pedagógicos como cartilhas sobre a Lei Maria da Penha e matérias de jornal sobre o machismo e os feminicídios. estas passagens sobre a força remetem às relações vivas dos acusados enquanto pais de família, isto é, dizem respeito às participações íntimas, com conotações psicofisiológicas e emocionais, que falam do sentido de pertencimento familiar, vinculam categorias de parentes e conectam esses homens com os domínios de Deus e da natureza. Para Mahmood (2019MAHMOOD, Saba. 2019. “Razão religiosa e afeto secular: uma barreira incomensurável”. Debates do NER, 19 (36):17-56.), tais participações traçam uma estrutura de afetos, o que, para Duarte e Menezes (2017DUARTE, Luiz & MENEZES, Rachel. 2017. “Transpersonal Ether: Personhood, Family and Religion in Modern Societies”. Vibrant, 14 (1):1-17.), possibilita entender a experiência do parentesco como de caráter religioso. Estas relações vivas mostram uma forma da pessoa que vai além da unidade corporal, racional e autônoma privilegiada pela ciência e pelo direito moderno. Ao conceberem os vínculos familiares como participações, estes três autores complementam uma definição das relações de gênero como categorias em oposição e conflito permanente.

Porém, a força também se refere à fúria produzida pela transgressão de acordos que regulam a troca entre o cuidado materno e a proteção paterna. Para Roberto, tal reciprocidade produz no homem uma “insaciável sede de poder”, um “narcótico” que não lhe permite enxergar a realidade, razão pela qual ele deve se submeter ao processo reflexivo. Contudo, publicizar a intimidade, mais do que um sinal de agência humana, remetia à experiência de “humilhação” dos acusados - de quando seus nomes circulavam de forma negativa e a reputação das mães era maculada em circuitos de fofocas. Esta era uma queixa bastante recorrente dentro e fora do juizado: denunciava um uso inadequado da força da mulher, exercido ao ventilarem publicamente suspeitas de homossexualidade, casos de impotência sexual e de infidelidade dos seus maridos. Assim, a expressão afetiva desses homens - momento de máxima exposição de si, no qual ele se colocava numa posição de deferência para satisfazer sua companheira ou ser filho devoto da mãe - era, de sua perspectiva, ridicularizada.

Considero essa dinâmica como parte da construção da cena, definida por Gregori (1989GREGORI, Maria. 1989. “Cenas e queixas. Mulheres e relações violentas”. Novos Estudos CEBRAP, 23:163-175.) como a delimitação de um momento de crescente excitação na relação de casal no qual réplicas verbais, xingamentos e agressões ordenadas buscam a imposição de uma das partes sobre a outra, isto é, não há uma procura de consenso pela quebra de expectativas de um sobre o outro: ser um marido fiel ou boa mãe, por exemplo. As “provocações” da mulher e as respostas “espicaçantes” do parceiro preparam os corpos para a exposição de uma energia intensa, que conduz, segundo Gregori, para um gozo perverso ou uma fusão erótica, dando a última palavra à mulher, quando esta assume a posição de vítima. Para os acusados, tal consagração mostrava a denunciante como um ser abnegado perante o público, a fofoca e o Judiciário. Ademais, os colocava numa espécie de beco sem saída, mobilizando densas energias com significados entranhados de difícil articulação verbal. Diferente da linguagem sobre o amor, que contempla um código de tensão crescente cuja resolução conduz à plenitude (o gozo), a cena contempla a expressão do inefável para afirmar um limite, uma catarse que manifesta um desencontro com o mundo.

Entendida como ato, a agressão é uma performance infeliz para a doutrina da ação, na qual a estrutura, corporificada pelo varão, anula a subjetividade da mulher, isto é, Quetzalcóatl persegue a vítima para consumi-la, renovando o circuito de contraprestações do patriarcado. Na judicialização, a agressão então se torna objeto de caracterização, análise e julgamento pelos operadores da configuração moral, que assumem uma atitude antifetichista para romper o “ciclo da violência”.8 8 Descreve o processo de aumento da tensão entre os membros do casal, seguido do ato de agressão e do posterior arrependimento do agressor (a lua de mel), prelúdio de outro ciclo. O acusado deve narrar a intensidade do ocorrido, transformando estruturas de afetos holísticos em uma sequência linear de causas e efeitos, para que possam experimentar a “culpa” e então obter o consolo de “liberar suas emoções”, demonstrando seus “pecados”. O agressor precisa demonstrar uma investigação moral sobre a continuidade entre sentimentos, desejos e faltas na conduta (Gregori 1989GREGORI, Maria. 1989. “Cenas e queixas. Mulheres e relações violentas”. Novos Estudos CEBRAP, 23:163-175.), manifestação obrigatória de arrependimento que conduz ao perdão judicial. Os operadores buscam assim a pacificação da força do pai de família para restabelecer a ordem perdida da sociedade civil.

O desencantamento é uma prática que indica ao antropólogo um fato social total, no qual a categoria de “violência” surge como efeito do processo da individuação que caracteriza os processos de formação do Estado moderno. A consciência da relação entre estrutura e ação faz da violência um significante central para nomear os acontecimentos da trajetória de vida, produzir o sentido de si e, posteriormente, oferecer testemunhos de transformação que animem novos ciclos missionais. Finalmente, a violência oferece critérios para classificar, denunciar e julgar pessoas e práticas que corporificam a estrutura. Como outro efeito do desencantamento, a descrição das relações nas quais a força se manifesta permite corroborar as reflexões de Salem (2006SALEM, Tânia. 2006. “Tensões entre gêneros na classe popular: uma discussão com o paradigma holista”. Mana, 12 (2):419-447.) sobre uma tensão estrutural entre os gêneros. O privilégio da relação de filiação entre as mães e os acusados em sua posição enquanto filhos coloca em segundo plano a relação de aliança entre os membros do casal. Esta última, porém, é justamente objeto da reforma moral da Lei Maria da Penha, na qual o acusado insiste em colocar os predicados da própria mãe no lugar da parceira. Isto conduz à crítica de Salem: uma descrição da antropologia das classes populares, diz, mediada por instrumentos de pesquisa que incitam colocar a subjetividade no discurso, e assim tendem a subestimar a importância da análise das relações das mulheres enquanto filhas, idealizadoras dos seus pais, e como mães, formadoras de filhos que devem ser futuros pais responsáveis.

Salem chama a atenção para o processo de diferenciação e radicalização do comportamento individual, resultado da interação cumulativa entre as disposições simbólicas de cada gênero, que se reforçam mutuamente. Isto conduz à polarização e à especialização de comportamentos, que passam a ser considerados como exclusivos de cada gênero, concomitante à ausência de entendimento da perspectiva e das reações emocionais do outro (cf. Bateson 2006BATESON, Gregory. 2006. Naven. Um esboço de problemas surgidos por um retrato compósito realizado a partir de três perspectivas, da cultura de uma tribo de Nova Guiné. São Paulo: EdUSP.). Esse processo dialoga com a conceitualização da cena e ajuda a definir as descrições dos acusados sobre as brigas de casal como um confronto entre vocações diferenciadas da força do homem e da mulher. Torna-se um conflito entre individualidades que corporificam posições de uma estrutura afetiva em que pais/filhos se relacionam com mães/filhas. Desde a posição do acusado, a briga surge como um conflito entre a individualidade da mãe que a companheira busca ser e aquilo que o parceiro entende que deveria ser uma mãe, baseado na sua própria experiência de filiação. Então, as companheiras nunca chegam a ser uma verdadeira mãe para os acusados, em seu entendimento, mas buscariam impor seus parâmetros de responsabilidade paterna no parceiro, particularmente o da exclusividade sexual; eles buscam reviver uma plenitude idealizada com suas amigas; elas sabem como “cutucar o coração” do parceiro, desprestigiando suas mães e sua performance sexual; eles respondem com contundência, ato de agressão que simultaneamente interdita a parceira e valida o fluxo moral da relação entre ele e sua própria mãe (cf. Whitmarsh 2014WHITMARSCH, Ian. 2014. “The No/Name of the Institution”. Anthropological Quarterly, 87 (3):855-881.); elas assumem a posição de vítima, obrigando-o publicamente a renovar seu papel protetor - ora na comunidade de vizinhos, ora no Judiciário (Simião 2015b SIMIÃO, Daniel. 2015b. “Reparação, justiça e violência doméstica: perspectivas para a reflexão e ação. Vivência, 46:53-74.).

Ao compartilhar estas apreciações com Thor, ele afirmava que tal dinâmica poderia se enquadrar no mito de Édipo, o que implicava assumir o acusado como um sujeito. Isto gerava certo desconforto nos espaços de discussão da Lei Maria da Penha. Por isso, Thor se permitia ir além do “discurso manifesto” dentro da intimidade do seu consultório. Já quando eu conversava com Aline, ela me contava saber da importância de acolher a versão do acusado, dedicando parte do seu limitado tempo para entrevistá-los “sem censura”. Apesar da rejeição das suas supervisoras da subsecretaria da mulher, que acreditavam que ela devia atender exclusivamente às vítimas, Aline precisava das duas versões para proceder adequadamente em cada caso. Ambos os operadores entendiam, portanto, que a transposição da dicotomia agressor-vítima para o histórico do casal não era automática, estando sujeitos a vicissitudes entre as dimensões políticas e analíticas da configuração. A ambos, devo a elaboração de ideias desta seção do artigo.

O tempo da força: uma janela analítica para o papel das políticas da Antropologia

A atenção dada à força em minha pesquisa me permitiu compreender porque, em vez de se tornarem empáticos com a vítima, os acusados recriavam seu valor como pai de família. Aderir a uma nova masculinidade implicava reviver a humilhação de exporem emoções diante de um público desconhecido no Juizado. Era por isso, afirmava Maykson (pedreiro, morador de uma comunidade de São Gonçalo), que “a Lei Maria da Penha era uma arma muito poderosa nas mãos equivocadas [...] usada para fuder o cara”. De outro lado, virar um novo homem sugeria aos acusados a redefinição de limites espaço-temporais de um certo hedonismo, onde se deveria valorizar o que, para muitos deles, era um “prazer egoísta” próprio de situações transgressoras e potencialmente “corruptoras” da pessoa - como o Carnaval, os bailes funk e as surubas. Nelas, era possível fazer “putaria”, o que, dependendo do interlocutor, podia ser vivida no “sigilo”, inclusive pelas mulheres. Heitor, Herbert, Seu José, Wesley, Rony e o Barrigudo, com nuances, concordaram com esta afirmação. Já figuras comprometidas com a própria fé, como Josué, Seu Francisco ou Maykson, colocaram veementes reservas. O prazer sexual não era negado, apenas não deveria comprometer a dedicação à família e a manutenção da casa. Para garantir a separação entre os domínios da putaria e da casa, nos quais se manifestam distintas faces da idealização da pessoa da mãe, os acusados precisavam de toda a sua força de vontade, que era assim indicadora da maturidade esperada de um pai de família. Tratava-se de uma luta para não se prender/perder na luxúria nem nas provocações femininas, da qual nem sempre saíam vitoriosos.

Se há algo que possa sugerir uma dimensão psicológica - ou uma alma cristã que convide à contemplação dos próprios movimentos internos, como já sugeria Santo Agostinho no século V -, as narrativas sobre as lutas desses pais de família, nas quais a força é testada, iluminam o começo de um caminho que permite aderir à doutrina da ação, criar consciência da relação entre estrutura afetiva e agência e descrever relações vivas entre os gêneros desde um “ponto de vista nativo”. Diante do projeto de consolidação de uma sociedade civil, a resistência dos acusados aponta para a oposição formulada por Latour (1983LATOUR, Bruno. 1983. “Comment Redistribuer Le Grand Partage”. Revue de Synthése, IIIe. S. (110):204-236.) entre a distinção moderna de “representação” (de um homem agente do patriarcado) e o modo de comunicação de “transporte” (entranhado nas relações vivas e nas experiências de um pai, filho e amante). Este último remete a um sentido concreto da vida relacionado a uma concepção fechada do tempo, relativa à cosmologia cristã, que contém um passado idealizado, indissociável ​​da confiança no destino final do “cidadão de bem” (Duarte & Martínez-Moreno 2024DUARTE, Luiz & MARTÍNEZ-MORENO, Marco Julián. 2024. “Configurações da pessoa em contextos contemporâneos de populismo de direita: uma pesquisa incômoda”. Documento de trabalho.). Tal concepção holística, por sua vez, colide com a linearidade progressiva do tempo moderno, na qual a análise do passado busca a emergência de um sujeito protagonista da História e agente de transformação de problemas sociais, como bem mostram os contornos políticos e analíticos da categoria de gênero.

Mais do que fazer uma apologia à violência de gênero, interessou-me, neste artigo, problematizar pressupostos modernos sobre a cultura patriarcal que conduzem ao efeito teórico de iteração da resistência masculina diante do projeto de sociedade feminista. Junto a Duarte (1998DUARTE, Luiz F. 1998. “Pessoa e dor no Ocidente (o “holismo metodológico” na antropologia da saúde e doença) ”. Horizontes Antropológicos, 4 (9):13-28.), considero importante a desconstrução da percepção de naturalidade e universalidade dos fenômenos de dor e sofrimento para poder assumir uma postura analítica, que implica o reconhecimento das possibilidades e dos limites epistemológicos do sistema ideológico que sustenta a categoria de pessoa humana no Ocidente. Uma atitude analítica diante dos fenômenos de violência possibilita “deslocamentos imaginativos” para entender o conjunto de relações no qual estamos imersos durante o trabalho de campo, gerando novas perguntas que ampliem o horizonte de compreensão desses cenários (Forero Angel & Martínez-Moreno 2024). Uma exploração etnográfica da força da mulher, admirada e temida pelos acusados, poderia complementar uma abordagem mais usual, centrada na subjetividade, para descrever os processos de vitimização (no sentido literal, de criação da vítima)? Quais outras relações vivas permitiriam ampliar a descrição do conflito entre as concepções do tempo fechado e do tempo progressivo, fundamentais para entender resistências à adesão ao ideário científico e jurídico da Modernidade?

Juntando-me ao chamado de Mahmood (2001MAHMOOD, Saba. 2001. “Feminist Theory, Embodiment, and the Docile Agent: Some Reflections on the Egyptian Islamic Revival”. Cultural Anthropology, 16 (2):202-236, 2019MAHMOOD, Saba. 2019. “Razão religiosa e afeto secular: uma barreira incomensurável”. Debates do NER, 19 (36):17-56.), acredito que, para que os antropólogos e outros cientistas sociais possam julgar aquilo que ameaça sua sensibilidade moderna, eles e elas devem levar em consideração as posições subjetivas, relações sociais, posições estruturais e princípios cosmológicos que informam os desejos, as motivações, os compromissos práticos e as aspirações importantes dos protagonistas dos problemas sociais em questão. Em outras palavras, uma atitude analítica contribui para a definição da face política da Antropologia, participante direta de uma narrativa sobre a emancipação humana e fomentadora de práticas de validação dos direitos humanos. Isto se reveste de especial relevância diante da reconfiguração de poderosos vetores políticos mundiais que contestam, local e globalmente, a conformação do mesmo campo afetivo intersubjetivo que possibilita uma ética do reconhecimento da dor e do sofrimento das vítimas, sem o qual não podemos entender a conformação de uma sociedade civil (Jimeno 2010JIMENO, Myriam. 2010. “A vítima e a construção de comunidades emocionais”. Mana 16 (1):99-121.), isto é, sem a qual não podemos pensar a formação de uma comunidade emocional transnacional em que os valores do individualismo moderno sejam vividos como uma “espiritualidade laica de redenção intramundana” (Duarte 2020DUARTE, Luiz F. 2020. “Alhures em Mim: a Espiritualidade na Cosmologia Ocidental Moderna”. In: S. Carneiro; R. Toniol& C. Brito (orgs.), Religião e Espiritualidade: Desafios e Atravessamentos Conceituais. Rio de Janeiro: Mórula .), que reencanta o mundo frio da Razão e facilita a experiência sensível da agência humana.

Porém, como foi meu interesse mostrar, esse projeto de reconhecimento pressupõe a universalização de uma dimensão psicológica que mostre a continuidade entre a alma cristã, a verdade interior e a perspectiva individual moderna. Considero importante problematizar esta forma da pessoa porque ela informa o interesse acadêmico em documentar etnograficamente a vida daqueles interlocutores que dão signos, justamente, de agência humana (as pessoas com as quais simpatizamos), ao passo que descarta aqueles sujeitos desconfortáveis que necessariamente participam das relações no campo (Dullo 2015DULLO, Eduardo. 2015. “Seriously enough? Describing or analysing the Native(s)’s Point of View”. In: J. Carrier (ed.), After the Crisis. Anthropological thought, Neoliberalism and the aftermath. London: Routledge. pp. 133-153.; Martínez-Moreno 2022aMARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2022a. “‘Cosas que no están escritas en el texto’: una exploración sobre la investigación antropológica con los violentos”. In: M. Jimeno; A. Góngora; M. Martínez-Moreno & A. Olmos (orgs.), Antropología, violencia y actores sociales en América Latina. Bogotá: Univeridad Nacional de Colombia. pp. 279-305.). Assim, chamo a atenção para estarmos atentos à naturalização do processo civilizatório que nos constitui como antropólogos, para compreendermos as manifestações da violência de gênero - que, muito seguramente, aparecerão como fenômenos presentes em qualquer campo etnográfico. Dada a nossa predisposição para ler a realidade a partir da relação entre estrutura e ação, tais fenômenos fazem parte do nosso Zeitgeist, sendo, portanto, inseparáveis ​​de qualquer empreendimento antropológico contemporâneo.

Nota de agradecimento

Agradeço a leitura e os comentários de versões anteriores deste artigo às/aos professoras/es Kelly Cristiane da Silva e Luiz Abreu (Universidade de Brasília), Myriam Jimeno e Andrés Góngora (Universidade Nacional de Colômbia), Frida Jacobo Herrera e Oliva López Sánchez (Universidade Nacional Autônoma de México), Luiz Fernando Dias Duarte (Universidade Federal do Rio de Janeiro) e André Dumans Guedes (Universidade Federal Fluminense).

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Notas

  • 1
    Nomes fictícios.
  • 2
    Para a relação bibliográfica dessas pesquisas, cf. Martínez-Moreno (2018MARTÍNEZ-MORENO, Marco. 2018. Civilizar a cultura. Questões de modernização e a afirmação da dignidade entre homens acusados de violência doméstica e familiar contra a mulher. Tese de Doutorado, Universidade de Brasília.).
  • 3
    A produção acadêmica é enorme. Cito referências modelares dos debates sobre violência de gênero e masculinidades no Brasil: Acosta, Filho e Bronz, (2004ACOSTA, Fernando; ANDRADE FILHO, Antônio & BRONZ, Alan. 2004. Conversas homem a homem: grupo reflexivo de gênero. Rio de Janeiro: Noos.), Bourdieu (2000BOURDIEU, Pierre. 2000. La dominación masculina. Barcelona: Anagrama.), Butler (2007BUTLER, Judith. 2007. El género en disputa. El feminismo y la subversión de la identidad. Barcelona: Paidón. ), Connell (2005CONNELL, Raewyn. 2005. Masculinities. Berkeley: University of California Press.), Corrêa (1983CORRÊA, Mariza. 1983. Morte em Família. Representações Jurídicas de Papéis Sexuais. Rio de Janeiro: Graal.), Das (2008DAS, Veena. 2008. “El acto de presenciar. Violencia, conocimiento envenenado y subjetividad” In: F. Ortega (ed.), Veena Das: Sujetos del dolor, agentes de dignidad. Bogotá: Universidad Nacional de Colombia. pp. 217-250.), Gilmore (1990GILMORE, David. 1990. Manhood in the Making. Cultural Concepts of Masculinity. New Haven: Yale University Press.), Godelier (2011GODELIER, Maurice. 2011. La producción de grandes hombres. Poder y dominación masculina entre los Baruya de Nueva Guinea. Madrid: Akal.), Gregori (1989GREGORI, Maria. 1989. “Cenas e queixas. Mulheres e relações violentas”. Novos Estudos CEBRAP, 23:163-175., 2010GREGORI, Maria. 2010. “Violence and gender. Political paradoxes, conceptual shifts”. Vibrant, 7 (2):2016-235.), Kimmel (2006KIMMEL, Michael. 2006. Manhood in America. A Cultural History. Oxford: Oxford University Press.), Machado (2001MACHADO, Lia. 2001. “Masculinidades e violências. Gênero e mal-estar na sociedade contemporânea”. Série Antropologia, 290.), Moore (1994aMOORE, Henrietta. 1994a. A passion for difference. Essays in Anthropology and Gender. Bloomington: Indiana University Press., 1994bMOORE, Henrietta. 1994b. “The problem of explaining violence in the social sciences”. In: M.P. Harvey & P. Gow (orgs.), Sex and violence. Issues in representation and experience. London: Routledge . pp. 138-155.) Nascimento (2001NASCIMENTO, Marcos. 2001. Desaprendendo o silêncio: uma experiência de trabalho com grupos de homens autores de violência contra a mulher. Dissertação de Mestrado, Universidade do Estado do Rio de Janeiro.), Segato (2003SEGATO, Rita. 2003. Las estructuras elementares de la violencia. Ensayos sobre género entre la antropología, el psicoanálisis y los derechos humanos. Buenos Aires: Universidad Nacional de Quilmes.), Seidler (2006SEIDLER, Victor. 2006. “Men, feminism and power”. In: J. Hearn & D. Morgan (eds.), Men Masculinities & Social Theory. London: Routledge . pp. 215-228.) e Viveros (2008VIVEROS, Mara. 2008. “Teorias feministas y estudios sobre varones y masculinidades. Dilemas y desafíos recientes”. In: J. Ramírez & G. Uribe (coords.), Masculinidades. El juego de género de los hombres en el que participan las mujeres. México D.F.: Plaza y Valdés Editores, Universidad de Guadalajara. pp. 25-42.).
  • 4
    Sobre esse movimento reverso de influência dos movimentos sociais na academia, cf. Guedes (2018GUEDES, André. 2018. “Da terra ao território: notas para uma sociologia da crítica ao desenvolvimento. In: A. Souza Lima; J. Beltrão; A. Lobo; S. Castilho; P. Lacerda & P. Osorio (orgs.), A antropologia e a esfera pública no Brasil. Rio de Janeiro: ABA. pp. 197-218.).
  • 5
    Acorda Raimundo, Acorda! de Alfredo Alves (1990) e Maiorité opprimé de Eléonore Pourriat (2010).
  • 6
    Protagonista do filme de animação homônimo de 2001, produzido pela Dream Works.
  • 7
    Entre outros recursos pedagógicos como cartilhas sobre a Lei Maria da Penha e matérias de jornal sobre o machismo e os feminicídios.
  • 8
    Descreve o processo de aumento da tensão entre os membros do casal, seguido do ato de agressão e do posterior arrependimento do agressor (a lua de mel), prelúdio de outro ciclo.

Editado por

Editora-Chefe:

María Elvira Díaz Benítez

Editor Associado:

John Comeford

Editora Associada:

Adriana Vianna

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    10 Maio 2024
  • Data do Fascículo
    2024

Histórico

  • Recebido
    21 Dez 2021
  • Aceito
    08 Mar 2024
Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social - PPGAS-Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro - UFRJ Quinta da Boa Vista s/n - São Cristóvão, 20940-040 Rio de Janeiro RJ Brazil, Tel.: +55 21 2568-9642, Fax: +55 21 2254-6695 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
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