Narrativas coloniais que tratam da presença de cachorros europeus nos encontros entre índios e brancos nas Américas frequentemente retratam o papel instrumental desses animais como armas terríveis. Para os colonizadores, assim, cachorros foram eficazes ferramentas de submissão dos povos nativos que encontraram a partir do século XV. No entanto, analisar com atenção as narrativas indígenas de muitos desses primeiros encontros pode mostrar perspectivas distintas, que apresentam cães não apenas como instrumentos de conquista, mas também como agentes, atuando sobretudo como facilitadores do contato entre indígenas e não indígenas. Este artigo explora histórias sobre os primeiros cachorros conhecidos por duas populações nativas no estado de Rondônia (Brasil), com o objetivo de sugerir a agência canina nos encontros interétnicos. Argumenta-se, então, que os primeiros contatos entre indígenas e brancos são eventos que não incluem apenas dois grupos de humanos, posto que as ações dos cachorros têm papel crucial no desenvolvimento das interações humanas. Desse modo, encontros interétnicos podem ser também encontros multiespecíficos.
The colonial narratives addressing the presence of European dogs in encounters between natives and whites in the Americas often stress the instrumental role of those animals as terrible conquerors’ weapons. For those settlers, dogs were effective tools for the submission of the native peoples they met since the 15th century. But paying attention to some of the indigenous narratives about these first encounters with dogs may show distinct perspectives, which show dogs not only as instruments of conquest, but as agents acting to smooth out the contact between Native Americans and non-Natives. This article explores how narratives on the first dogs known to two native populations of Rondônia can demonstrate the canine agency in the interethnic encounters. The first contacts between Natives and non-Natives never include only two groups of human participants, since dogs’ actions have a crucial role in the development of human interactions: interethnic contacts can also be multispecific contacts.
Les récits coloniaux qui mentionnent la présence de chiens européens lors des rencontres entre indiens et blancs dans les Amériques dépeignent souvent le rôle essentiel de ces animaux comme de terribles armes. Pour les colonisateurs, les chiens sont donc des outils efficaces d’assujettissement des peuples indigènes qu’ils ont rencontré à partir du XVe siècle. Néanmoins, une analyse attentive des récits des indiens de plusieurs de ces premières rencontres peut indiquer des perspectives différentes, qui présentent les chiens non seulement comme des instruments de conquête, mais aussi comme agents qui favorisent le contact entre les indiens et les non indiens. Cet article explore les histoires à propos des premiers chiens connus par deux populations indigènes dans l’État de Rondônia (Brésil), dans le but de proposer l’intermédiation canine dans les rencontres interethniques. Nous soutenons, ensuite, que les premiers contacts entre indiens et blancs sont des événements qui n’incluent pas uniquement deux groupes humains, car les actions des chiens jouent un rôle crucial pour le développement des interactions humaines. Ainsi, les rencontres interethniques peuvent aussi être des rencontres multi spécifiques.