RESUMO A principal medida do Estado brasileiro para conter os efeitos do cenário pandêmico sobre os mais desprotegidos é o Auxílio Emergencial. A expectativa inicial foi a de conceder cerca de 50 milhões de beneficiários, porém, trabalhou-se com a possibilidade de atender até 80 milhões, causando espanto entre os técnicos do governo. Como explicar a imensa disparidade entre a expectativa inicial do governo para a concessão do auxílio e a realidade existente? Neste artigo analisamos a percepção e construção desses “invisíveis” no Brasil do Covid-19, buscando compreender, a partir do auxílio emergencial e seu repasse, um Brasil imenso de trabalhadores ignorados pelos dados oficiais. Inicialmente, apresentamos um breve histórico das políticas de abertura neoliberal que contribuíram para a precarização das relações de trabalho. E, mesmo com um discurso "modernizador", essas relações fragilizaram o arcabouço de proteção social, resultando na ampliação dos desamparados que “surpreende” ao governo federal. Em seguida, como a pobreza coaduna com a desigualdade urbana e os desafios para o acesso ao benefício emergencial expõe um retrato de disparidades ou negligências tradicionais da ação estatal. Por fim, propomos uma reflexão pós pandemia: lições para planejar cenários futuros como contribuição na busca de superar deficiências sociais históricas recompondo um novo “viver urbano no Brasil”.
ABSTRACT The Brazilian State's main measure to contain the effects of the pandemic scenario on the most unprotected is the Emergency Aid. The initial expectation was to grant around 50 million beneficiaries, however, the possibility of serving up to 80 million was worked on, causing astonishment among government technicians. How to explain the huge disparity between the government's initial expectation for granting the aid and the existing reality? In this article, we analyze the perception and construction of these "invisibles" in the Brazil of Covid-19, seeking to understand, based on emergency aid and its distribution, a huge Brazil of workers ignored by official data. Initially, we present a brief history of the neoliberal opening policies that contributed to the precarization of labor relations. And, even with a "modernizing" discourse, these relations have weakened the social protection framework, resulting in an increase in the number of the destitute that "surprises" the federal government. Next, how poverty coexists with urban inequality and the challenges to access the emergency benefit exposes a picture of disparities or traditional negligence of state action. Finally, we propose a post-pandemic reflection: lessons for planning future scenarios as a contribution in the search to overcome historical social deficiencies by recomposing a new "urban living in Brazil".