Acessibilidade / Reportar erro

Outro Ator no Aumento da Circulação Colateral no Coração – Outro Potencial Alvo Terapêutico na Medicina Cardiovascular?

Circulação Colateral; Neovascularização Fisiológica; Adropina; Isquemia Miocárdica; Doença Arterial Coronariana

Richard Lower, de Amsterdã, chamou a atenção em 1669 pela primeira vez para os canais que conectam as artérias coronárias direita e esquerda. O anatomista suíço Albrecht von Haller demonstrou essas anastomoses dissecando as artérias coronárias. Assim, há séculos, a presença de uma rede colateral bem desenvolvida fornecendo suprimento sanguíneo para um miocárdio subperfundido ganhou interesse significativo na fisiologia e fisiopatologia e, posteriormente, na terapêutica.11. Pitt B. Interarterial coronary anastomoses. Occurrence in normal hearts and in certain pathologic conditions. Circulation. 1959d;20(5):816–22. //doi.org/10.1161/01.CIR.20.5.816 Muitas questões mantiveram os cientistas trabalhando incansavelmente para desvendar os principais atores que favorecem o desenvolvimento de vasos colaterais no coração.22. Allahwala UK, Khachigian LM, Nour D, Ridiandres A, Billah M, Ward M, et al. Recruitment and maturation of the coronary collateral circulation: Current understanding and perspectives in arteriogenesis. Microvasc Res. 2020;132:104058. doi: 10.1016/j.mvr.2020.104058.

A circulação colateral coronariana é uma rede pré-formada de anastomoses imaturas que conectam o território suprido por uma artéria coronária epicárdica com o suprido por outra. Em 1959, Pitt et al.,11. Pitt B. Interarterial coronary anastomoses. Occurrence in normal hearts and in certain pathologic conditions. Circulation. 1959d;20(5):816–22. //doi.org/10.1161/01.CIR.20.5.816 estudaram a prevalência de anastomoses coronárias interarteriais em setenta e cinco corações obtidos de autópsia. Dos 15 corações normais, apenas um (6%) apresentou tais anastomoses. Nos casos com doença arterial coronariana oclusiva, fibrose do miocárdio ou infarto, as anastomoses foram encontradas em 75% a 100% dos casos. Ficou claro, desde o início, que a presença de períodos sustentados de isquemia tecidual era um pré-requisito para incitar o estabelecimento de circulação colateral.

Por outro lado, muitos pacientes com angina ou evidência objetiva de isquemia miocárdica não desenvolvem tal rede de vasos. Os pacientes respondem diferentemente em sua capacidade de colateralização na presença de isquemia.33. Shen Y, Ding FH, Dai Y, Wang XQ, Zhang RY, Lu L, et al. Reduced coronary collateralization in type 2 diabetic patients with chronic total occlusion. Cardiovasc Diabetol. 2018;17(1):26. doi: 10.1186/s12933-018-0671-6. Uma busca começou a compreender por que...

A formação de vasos sanguíneos no sistema cardiovascular maduro ocorre por meio de três processos dinâmicos distintos: vasculogênese, angiogênese e arteriogênese. Esses sistemas são influenciados por vários fatores, incluindo sinalização e controle transcricional, mediadores solúveis e seus receptores, forças biomecânicas e hipóxia.22. Allahwala UK, Khachigian LM, Nour D, Ridiandres A, Billah M, Ward M, et al. Recruitment and maturation of the coronary collateral circulation: Current understanding and perspectives in arteriogenesis. Microvasc Res. 2020;132:104058. doi: 10.1016/j.mvr.2020.104058.

Por exemplo, a relação entre o índice de imunoinflamação sistêmica (SII) e a circulação colateral coronariana (CCC) em pacientes com DAC estável e oclusão total crônica (OTC) foi estudada por Adali et al.44. Adali MK, Buber I, Sen G, Yilmaz S. Relationship between systemic immune-inflammation index and coronary collateral circulation in patients with chronic total occlusion. Arq Bras Cardiol. 2022;119(1):69–75. doi:10.36660/abc.20210414.
https://doi.org/10.36660/abc.20210414...
Eles descobriram que um nível elevado de SII era significativamente relacionado à má circulação colateral coronariana. Portanto, um índice simples baseado em poucos exames laboratoriais pode ser muito informativo na prática clínica como preditor da capacidade de formação de colaterais de um paciente.

Agora, outro ator potencial no desenvolvimento de colateral coronariana emerge do trabalho de Akkaya et al.,55. Akkaya H, Güntürk EE, Akkaya F, Karabıyık U, Güntürk İ, Yılmaz S. Assessment of the relatıonshıp between the adropın levels and the coronary collateral cırculatıon in patıents wıth chronıc coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2022; 119(3):402-410. publicado nesta edição dos ABC.55. Akkaya H, Güntürk EE, Akkaya F, Karabıyık U, Güntürk İ, Yılmaz S. Assessment of the relatıonshıp between the adropın levels and the coronary collateral cırculatıon in patıents wıth chronıc coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2022; 119(3):402-410. Eles procuraram determinar a associação entre os níveis de adropina com a presença de circulação colateral em pacientes com síndrome coronariana crônica. Encontraram um aumento de 27% nos níveis médios de adropina em pacientes com boa circulação colateral coronariana em comparação com pacientes com má circulação colateral coronariana. Como os autores corretamente notaram, desenvolver uma boa rede de colaterais demanda tempo, e um único instante desse processo deve ser entendido como reflexo daquele momento específico. Se deixarmos passar tempo suficiente, talvez o quadro seja diferente.

À medida que as pesquisas avançam, novos fatores angiogênicos são relatados com maior frequência, expondo a complexidade do crescimento vascular em condições isquêmicas. Em algum momento, os cientistas sentiram-se confiantes de que poderiam recapitular o processo natural de crescimento vascular através da hiperexpressão de fatores angiogênicos específicos no novo campo da terapia gênica.66. Sabra M, Karbasiafshar C, Aboulgheit A, Raj S, Abid MR, Sellke FW. Clinical application of novel therapies for coronary angiogenesis: overview, challenges, and prospects. Int J Mol Sci. 2021 Apr 2;22(7):3722. doi: 10.3390/ijms22073722. Infelizmente, os ensaios clínicos randomizados com essa abordagem não tiveram o sucesso esperado, e o entusiasmo inicial foi substituído pela decepção.

O trabalho de Akkaya et al.,55. Akkaya H, Güntürk EE, Akkaya F, Karabıyık U, Güntürk İ, Yılmaz S. Assessment of the relatıonshıp between the adropın levels and the coronary collateral cırculatıon in patıents wıth chronıc coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2022; 119(3):402-410. acrescenta à crescente literatura explorando o papel da adropina, um hormônio peptídico secretado principalmente pelo fígado, em condições clínicas tão diversas como cardiomiopatia diabética, apneia obstrutiva do sono ou doença inflamatória intestinal.77. Bozic J, Kumric M, Ticinovic Kurir T, Males I, Borovac JA, Martinovic D, et al. Role of adropin in cardiometabolic disorders: from pathophysiological mechanisms to therapeutic target. Biomedicines. 2021 Oct 7;9(10):1407. doi: 10.3390/biomedicines9101407. Como a adropina surgiu como um componente regulatório essencial do endotélio vascular, afetando a síntese endotelial de NO, podemos prever que é uma questão de tempo para que a adropina seja considerada um alvo terapêutico na medicina cardiovascular.

Se precisarmos de outro exemplo da importância de se manter um diálogo aberto entre a ciência básica e a clínica, o artigo de Akkaya et al.,55. Akkaya H, Güntürk EE, Akkaya F, Karabıyık U, Güntürk İ, Yılmaz S. Assessment of the relatıonshıp between the adropın levels and the coronary collateral cırculatıon in patıents wıth chronıc coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2022; 119(3):402-410. oferece exatamente isso.

Referências

  • 1
    Pitt B. Interarterial coronary anastomoses. Occurrence in normal hearts and in certain pathologic conditions. Circulation. 1959d;20(5):816–22. //doi.org/10.1161/01.CIR.20.5.816
  • 2
    Allahwala UK, Khachigian LM, Nour D, Ridiandres A, Billah M, Ward M, et al. Recruitment and maturation of the coronary collateral circulation: Current understanding and perspectives in arteriogenesis. Microvasc Res. 2020;132:104058. doi: 10.1016/j.mvr.2020.104058.
  • 3
    Shen Y, Ding FH, Dai Y, Wang XQ, Zhang RY, Lu L, et al. Reduced coronary collateralization in type 2 diabetic patients with chronic total occlusion. Cardiovasc Diabetol. 2018;17(1):26. doi: 10.1186/s12933-018-0671-6.
  • 4
    Adali MK, Buber I, Sen G, Yilmaz S. Relationship between systemic immune-inflammation index and coronary collateral circulation in patients with chronic total occlusion. Arq Bras Cardiol. 2022;119(1):69–75. doi:10.36660/abc.20210414.
    » https://doi.org/10.36660/abc.20210414
  • 5
    Akkaya H, Güntürk EE, Akkaya F, Karabıyık U, Güntürk İ, Yılmaz S. Assessment of the relatıonshıp between the adropın levels and the coronary collateral cırculatıon in patıents wıth chronıc coronary syndrome. Arq Bras Cardiol. 2022; 119(3):402-410.
  • 6
    Sabra M, Karbasiafshar C, Aboulgheit A, Raj S, Abid MR, Sellke FW. Clinical application of novel therapies for coronary angiogenesis: overview, challenges, and prospects. Int J Mol Sci. 2021 Apr 2;22(7):3722. doi: 10.3390/ijms22073722.
  • 7
    Bozic J, Kumric M, Ticinovic Kurir T, Males I, Borovac JA, Martinovic D, et al. Role of adropin in cardiometabolic disorders: from pathophysiological mechanisms to therapeutic target. Biomedicines. 2021 Oct 7;9(10):1407. doi: 10.3390/biomedicines9101407.
  • Minieditorial referente ao artigo: Avaliação da Relação entre Níveis de Adropina e Circulação Colateral Coronária em Pacientes com Síndrome Coronariana Crônica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Set 2022
  • Data do Fascículo
    Set 2022
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br