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Cartas ao Editor

Senhor Editor,

Foi com muito interesse que lemos o editorial entitulado "Tetralogia de Fallot no neonato. Correção operatória ou técnica paliativa?" nos Arq Bras Cardiol 1997; 68: 393-5 1. Nos últimos 10 a 20 anos, a cirurgia cardíaca pediátrica desenvolveu-se de forma notável, observando-se inúmeros avanços e refinamentos nas técnicas cirúrgicas, assim como na circulação extracorpórea, proteção cerebral e miocárdica e cuidados intensivos pré e pós-operatórios. Esta revolução possibilitou a reparação total de diversos defeitos cardíacos congênitos em pacientes de baixa faixa etária, incluindo neonatos. Em referência ao artigo em questão, o autor (Edmar Atik) percorre o assunto com muita propriedade, detalhando, brilhantemente, todas as vantagens teóricas da correção cirúrgica precoce da tetralogia de Fallot. Em alguns centros, os resultados imediatos deste tipo de abordagem são promissores, com baixos índices de mortalidade. De forma semelhante ao INCOR, o Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia tem reservado a reparação total do defeito para lactentes maiores que seis meses de vida. Procedimentos paliativos continuam válidos para pacientes em estado de mal hipoxêmico, e para lactentes menores de seis meses com crises incontroladas clinicamente, aliados ou não a outras anomalias (defeito do septo atrioventricular, por exemplo) e a grave hipoplasia da árvore pulmonar, com ou sem descontinuidades. A cirurgia de Blalock-Taussig é uma técnica segura e eficaz empregada para tal finalidade, apresentando resultados já bem conhecidos. Por outro lado, como foi bem comentado pelo Dr. Atik, obstruções progressivas destas anastomoses, distorções das artérias pulmonares, sobrecarga de volume de ventrículo esquerdo e possibilidade de desenvolvimento de doença vascular pulmonar são problemas associados a esta técnica e que podem comprometer os resultados futuros de uma correção definitiva. Baseados nestes fatos é que alguns começaram a investigar formas alternativas de paliação.

A valvoplastia pulmonar por cateter balão é hoje o procedimento de eleição para o tratamento da estenose pulmonar congênita, nas diversas faixas etárias. Em meados da década passada, alguns grupos, principalmente os de origem européias, começaram a utilizar este método para a paliação de portadores e Tetralogia de Fallot 2. Os resultados são animadores. O anel pulmonar, assim como os ramos pulmonares, apresentam um incremento significativo das suas dimensões, o fluxo pulmonar é aumentado, a hipoxemia é atenuada e a cirurgia definitiva pode ser realizada sob condições mais favoráveis. No Instituto Dante Pazzanese empregamos tal procedimento em cinco lactentes abaixo de um ano, com resultados favoráveis 7. As óbvias vantagens desta forma de paliação incluem um tempo menor de internação, menor custo para instituições e menor desconforto para o paciente, se comparada à cirurgia paliativa. Entretanto, o principal benefício que o método propicia é o aumento do fluxo anterógrado para a circulação pulmonar. Este padrão de fluxo, por ser mais fisiológico, desempenha um papel fundamental no remodelamento alvéolo-vascular pulmonar que ocorre nos primeiros meses de vida, permitindo que este processo se desenvolva de forma mais uniforme e efetiva. Este fenômeno fica bem ilustrado nos casos de atresia pulmonar com comunicação interventricular e ramos pulmonares diminutos, que são tratados precocemente de forma agressiva com o restabelecimento da conexão VD-TP e recuperação das artérias pulmonares 8.

Como qualquer procedimento intervencionista, o método não é isento de complicações. Crises hiopoxêmicas podem ser desencadeadas no laboratório de hemodinâmica, requerendo infusão intravenosa de betabloqueador ou, mais raramente, de cirurgia paliativa de urgência. Estima-se que cerca de 30% dos pacientes não respondem favoravelmente a esta abordagem inicial, necessitando de anastomoses cirúrgicas subseqüentes em seguimento variado 2-6.

Para finalizar, acreditamos que a valvoplastia pulmonar pode ser empregada como uma alternativa à cirurgia paliativa (anastomose de Blalock-Taussig) para casos selecionados de tetralogia de Fallot.

Carlos Augusto Pedra, Simone Rolim Fernandes Fontes Pedra, César Augusto Esteves, Sérgio Luis Navarro Braga, Valmir Fernandes Fontes

Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia - São Paulo, SP

Referências

1. Atik E - Tetralogia de Fallot no neonato. Correção operatória ou técnica paliativa? Arq Bras Cardiol 1997; 68: 393-5.

2. Qureshi AS, Kirk CR, Lamb RK, Arnold R, Wilkinson JL - Balloon dilatation of the pulmonary valve in the first year of life in patients with tetralogy of Fallot: a preliminary study. Br Heart J 1988; 60: 232-5.

3. Boucek MM, Webster HE, Orsmond GS, Ruttenberg HD - Balloon pulmonary valvotomy: palliation for cyanotic heart disease. Am Heart J 1988; 115: 318-22.

4. Rao PS, Brais M - Balloon pulmonary valvuloplasty for congenital cyanotic heart defects. Am Heart J 1988; 115: 1105-10.

5. Sreeram N, Salleem M, Jackson M et al - Results of balloon valvuloplasty as a palliative procedure in tetralogy of Fallot. J Am Coll Cardiol 1991; 18: 159-65.

6. Sluysmans T, Neven B, Rubay J et al - Early balloon dilatation of the pulmonary valve in infants with tetralogy of Fallot. Circulation 1995; 95: 1506-11.

7. Fontes VF, Esteves CA, Braga SLN, Pedra SRFF - Novas técnicas intervencionistas para o tratamento das cardiopatias congênitas. In: Sousa AGMR, Mansur AJ - Cardiologia. Ed SOCESP, 2º vol. São Paulo: Atheneu, 1996: 850-1.

8. Rome JJ, Mayer JE, Castaneda AR et al - Tetralogy of Fallot with pulmonary atresia: rehabilitation of diminutive pulmonary arteries. Circulation 1993; 88: 1691-702.

Senhor Editor,

As observações feitas pelo Dr Carlos Augusto C. Pedra e col, acerca da conduta na tetralogia de Fallot, determinada em vários centros especializados em cardiologia pediátrica e salientada no nosso editorial, reenfatizam a necessidade de correções mais precoces desta anomalia, até no período neonatal. Deve-se essa conduta, em especial, às desvantagens das anastomoses sistêmico-pulmonares, principalmente, quando estas permanecem pérvias por longo tempo.

No entanto, este procedimento paliativo torna-se obrigatório em várias situações anatomofuncionais associadas à tetralogia de Fallot, destacando-se a presença de árvore arterial pulmonar hipoplásica, do defeito total do septo atrioventricular e de trajetos anômalos das artérias coronárias, quando estas cruzam a via de saída do ventrículo direito (VD), além de estados hipoxêmicos acentuados, dentre outras.

Penso que o procedimento sugerido pelo Dr. Carlos Augusto C. Pedra e col, a valvoplastia pulmonar por cateter-balão, constitui-se em outra opção à operação de Blalock-Taussig, a fim de dilatar a via de saída do VD com conseqüente aumento do fluxo anterógrado desta cavidade à árvore arterial pulmonar. Lembro, no entanto, que tal conduta não deve ser rotina em todos os portadores de tetralogia de Fallot, em face dos óbices e complicações decorrentes e já bem salientados.

Contudo, há que se estimular a idéia de que nesses pacientes possa-se criar maior fluxo anterógrado, a partir do próprio VD, a fim de desenvolver e adequar melhor a árvore pulmonar a uma intervenção corretiva futura.

Congratulo-me com os autores pelo resultados obtidos sob essa técnica intervencionista nos cinco lactentes portadores de tetralogia de Fallot, no Instituto Dante Pazzanese de Cardiologia, salientando-se como técnica alternativa em alguma situações.

Edmar Atik

Instituto do Coração do Hospital das Clínicas-FMUSP

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    08 Jan 2002
  • Data do Fascículo
    Jan 1998
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