Acessibilidade / Reportar erro

Escore Inflamatório a partir de Biomarcadores na Hipertensão Resistente de Obesos

Palavras-chave
Hipertensão/fisiopatologia; Obesidade; Hipertensão/efeitos adversos; Citocinas; Adipocinas; Biomarcadores Farmacológicos

Hipertensão arterial resistente (HAR) é, segundo o Posicionamento Científico da American Heart Association (AHA) realizado em 2018,11 Carey RM, Calhoun DA, Bakris GL, Brook RD, Daugherty SL Dennison-Himmelfarb CR, et al. Resistant hypertension: detection, evaluation, and management: a scientific statement from the American Heart Association. Hypertension. 2018;72(5):e53-90. bem como observado no I Posicionamento Brasileiro de HAR em 2012,22 Alessi A, Brandão AA, Coca A, Cordeiro AC, Nogueira AR, Feitosa AM, et al.. First brazilian position on resistant hypertension. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(1):576-85. quando a pressão arterial (PA) de um indivíduo permanece elevada acima da meta pressórica, apesar da utilização de três medicamentos anti-hipertensivos de diferentes classes terapêuticas, comumente um antagonista de canais lentos de cálcio di-idropiridínico de longa duração; um bloqueador do sistema renina angiotensina aldosterona (SRAA), que pode ser um inibidor da enzima conversora da angiotensina II ou bloqueador dos receptores AT1 da angiotensina II) e; um diurético apropriado, todos administrados em doses máximas ou nas maiores doses possíveis toleradas, e respeitados os intervalos de administração prescritos. Estes pacientes são considerados de maior risco para morbidade e mortalidade cardiovascular e renal;33 Daugherty SL, Powers JD, Magid DJ, Tavel HM, Masoudi FA, Margolis KL, et al. Incidence and prognosis of resistant hypertension in hypertensive patients. Circulation. 2012;125(13):1635-42. mais propensos a apresentar eventos adversos em resposta a terapia medicamentosa, geralmente dose relacionados; e é neste grupo de indivíduos que se deve afastar uma causa secundária de hipertensão porque sua prevalência é significantemente maior que na população de hipertensos não resistentes.11 Carey RM, Calhoun DA, Bakris GL, Brook RD, Daugherty SL Dennison-Himmelfarb CR, et al. Resistant hypertension: detection, evaluation, and management: a scientific statement from the American Heart Association. Hypertension. 2018;72(5):e53-90.,22 Alessi A, Brandão AA, Coca A, Cordeiro AC, Nogueira AR, Feitosa AM, et al.. First brazilian position on resistant hypertension. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(1):576-85. Reconhece-se ainda, atualmente, a HAR controlada, como sendo aquela em que pacientes utilizando quatro ou mais medicações encontram-se na meta pressórica; e a HA refratária, entidade com fisiopatologia diversa da HAR, quando mesmo quatro medicamentos não são suficientes para o controle.44 Muxfeldt ES, Chedier B, Rodrigues CIS. Resistant and refractory hypertension: two sides of the same disease? J Bras Nefrol. 2018 Dec 6. Pii:S0101- 28002018005045101. Nesta nova classificação, os pacientes com pseudo-hipertensão devem ser excluídos, ou seja, é obrigatória para confirmação diagnóstica checar aderência e tolerância à medicação; afastar HA do avental branco, portanto é imperiosa a realização de medidas pressóricas sistematizadas fora do ambiente de consultório por meio da monitorização ambulatorial da pressão arterial (MAPA) ou medida residencial da pressão arterial (MRPA); e, finalmente, utilização de técnica de medida da PA correta e confiável.11 Carey RM, Calhoun DA, Bakris GL, Brook RD, Daugherty SL Dennison-Himmelfarb CR, et al. Resistant hypertension: detection, evaluation, and management: a scientific statement from the American Heart Association. Hypertension. 2018;72(5):e53-90.,22 Alessi A, Brandão AA, Coca A, Cordeiro AC, Nogueira AR, Feitosa AM, et al.. First brazilian position on resistant hypertension. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(1):576-85.,44 Muxfeldt ES, Chedier B, Rodrigues CIS. Resistant and refractory hypertension: two sides of the same disease? J Bras Nefrol. 2018 Dec 6. Pii:S0101- 28002018005045101.,55 Sheppard JP, Martin U, MacManus RJ. Diagnosis and management of resistant hypertension. Heart. 2017;103(16):1295-302.

Mesmo na HA primária é reconhecida a existência de processo inflamatório sistêmico, ainda que subclínico, sendo que esta condição tem sido identificada em maior intensidade em doenças cardiovasculares e renais como a HAR e a doença renal crônica.66 de la Sierra A, Larrousse M. Endothelial dysfunction is associated with increased levels of biomarkers in essential hypertension. J Hum Hypertens. 2010;24(6):373-9. Especificamente no caso da HAR, que é uma entidade de etiologia multifatorial e poligênica, frequentemente associada a doenças metabólicas que cursam com resistência insulínica como diabetes e obesidade, processos inflamatórios propiciados por mediadores podem estar envolvidos levando à importante disfunção endotelial da microvasculatura e aumento do estresse oxidativo.77 Shere A, Eletta O, Goyal H. Circulating blood biomarkers in essential hypertension: a literature review. J Lab Precis Med. 2017;2:99.

Biomarcadores, por sua vez, são características quantificáveis dos processos biológicos, que podem ser medidos com acurácia e reprodutibilidade, podendo ou não se correlacionar à sintomatologia clínica.88 Strimbu K, Tavel JA. What are biomarkers? Curr Opin HIV AIDS. 2010;5(6):463-6.

Nos últimos anos, a busca por esses mediadores que pudessem estar envolvidos na predição, início, desenvolvimento, diagnóstico, progressão e acompanhamento da eficácia terapêutica da HA tem sido intensa e de grande valor, a medida que se progride em conhecimento. Mesmo no Brasil, recentemente, uma pesquisa mostrou que pacientes portadores de HA grave e sem controle, apresentam disfunção microvascular associada, bem como níveis elevados de proteína C reativa e endotelina (naqueles pacientes sem uso de estatina).99 Junqueira CLC, Magalhães MEC, Brandão AA, Ferreira E, Cyrino FZGA, Maranhão PA, et al. Microcirculation and biomarkers in patients with resistant or mild-to-moderate hypertension: a cross-sectional study. Hypertens Res. 2018;41(7):515-23.

O artigo Proposta de um Escore Inflamatório de Citocinas e Adipocinas Plasmáticas Associado à Hipertensão Resistente, mas Dependente dos Parâmetros de Obesidade publicado neste volume,1010 de Faria APC, Ritter AMV, Gasparetti CS, et al. Proposta de um Escore Inflamatório de Citocinas e Adipocinas Plasmáticas Associado à Hipertensão Resistente, mas Dependente de Parâmetros de Obesidade. Arq Bras Cardiol. 2019; 112(4):383-389. traz notícias promissoras quanto ao papel de citocinas e adipocinas inflamatórias (TNF-α, IL-6, IL-8, IL-10, leptina e adiponectina) que possam estar implicadas na fisiopatologia da HAR. A partir da dosagem desses biomarcadores, foi possível construir um escore inflamatório que se correlacionou mais com a presença de sobrepeso e obesidade do que da própria hipertensão. A razão para esses achados é possivelmente a produção destas substâncias pelo tecido adiposo visceral que se torna resistente à insulina e leptina provocando respostas imunes que, por sua vez, ativam cascatas inflamatórias, pró-trombóticas e vasoconstritoras com hiperatividade do sistema nervoso simpático, retenção de sódio e ativação do SRAA e, assim, cursando com resistência ao tratamento da HA.1111 Chaudhary K, Buddinemi JP, Nistala R, Whaley-Connell A.. Resistant hypertension in the high-risk metabolic patient. Curr Diab Rep. 2011;11(1):41-6.,1212 DeMarco VG, Arooor AR, Sowers JR. The pathophysiology of hypertension in patients with obesity. Nat Rev Endocrinol. 2014;10(6):364-76.

O interesse na dosagem de biomarcadores pode ser de grande utilidade na compreensão de todas as variáveis do fenômeno hipertensivo, particularmente em sua patogênese.77 Shere A, Eletta O, Goyal H. Circulating blood biomarkers in essential hypertension: a literature review. J Lab Precis Med. 2017;2:99. Deve-se ponderar, no entanto, que esta dosagem ainda não está disponível na prática clínica de forma rotineira, nem sequer nos centros especializados em HA; apresentam custos proibitivos; tem seu uso ainda restrito a pesquisas; ainda não foram testados em larga escala do ponto de vista epidemiológico e; necessitam de expertise técnica para que seus resultados sejam fidedignos. Compreender seus papéis, graus de acurácia e reprodutibilidade, bem como correlação com desfechos cardiovasculares e renais é tarefa que ainda dependerá de estudos futuros.

Apesar das dificuldades expostas, podemos afirmar que estamos nos encaminhando para a dosagem desses biomarcadores de forma sistemática a medida que ganhem credibilidade e disponibilidade. A partir disso, a construção de escores podem auxiliar na detecção de situações de inflamação incipiente em que se poderia atuar precocemente na estratificação de risco com consequentes intervenções tempestivas.

Espera-se assim que, com brevidade, possamos entender melhor a fisiopatogenia da hipertensão resistente na presença de obesidade e os fenômenos biológicos que culminam em estresse oxidativo, inflamação e disfunção microvascular endotelial. A pesquisa publicada neste número colabora qualitativamente para esta compreensão.

  • Minieditorial referente ao artigo: Proposta de um Escore Inflamatório de Citocinas e Adipocinas Plasmáticas Associado à Hipertensão Resistente, mas Dependente dos Parâmetros de Obesidade

References

  • 1
    Carey RM, Calhoun DA, Bakris GL, Brook RD, Daugherty SL Dennison-Himmelfarb CR, et al. Resistant hypertension: detection, evaluation, and management: a scientific statement from the American Heart Association. Hypertension. 2018;72(5):e53-90.
  • 2
    Alessi A, Brandão AA, Coca A, Cordeiro AC, Nogueira AR, Feitosa AM, et al.. First brazilian position on resistant hypertension. Arq Bras Cardiol. 2012; 99(1):576-85.
  • 3
    Daugherty SL, Powers JD, Magid DJ, Tavel HM, Masoudi FA, Margolis KL, et al. Incidence and prognosis of resistant hypertension in hypertensive patients. Circulation. 2012;125(13):1635-42.
  • 4
    Muxfeldt ES, Chedier B, Rodrigues CIS. Resistant and refractory hypertension: two sides of the same disease? J Bras Nefrol. 2018 Dec 6. Pii:S0101- 28002018005045101.
  • 5
    Sheppard JP, Martin U, MacManus RJ. Diagnosis and management of resistant hypertension. Heart. 2017;103(16):1295-302.
  • 6
    de la Sierra A, Larrousse M. Endothelial dysfunction is associated with increased levels of biomarkers in essential hypertension. J Hum Hypertens. 2010;24(6):373-9.
  • 7
    Shere A, Eletta O, Goyal H. Circulating blood biomarkers in essential hypertension: a literature review. J Lab Precis Med. 2017;2:99.
  • 8
    Strimbu K, Tavel JA. What are biomarkers? Curr Opin HIV AIDS. 2010;5(6):463-6.
  • 9
    Junqueira CLC, Magalhães MEC, Brandão AA, Ferreira E, Cyrino FZGA, Maranhão PA, et al. Microcirculation and biomarkers in patients with resistant or mild-to-moderate hypertension: a cross-sectional study. Hypertens Res. 2018;41(7):515-23.
  • 10
    de Faria APC, Ritter AMV, Gasparetti CS, et al. Proposta de um Escore Inflamatório de Citocinas e Adipocinas Plasmáticas Associado à Hipertensão Resistente, mas Dependente de Parâmetros de Obesidade. Arq Bras Cardiol. 2019; 112(4):383-389.
  • 11
    Chaudhary K, Buddinemi JP, Nistala R, Whaley-Connell A.. Resistant hypertension in the high-risk metabolic patient. Curr Diab Rep. 2011;11(1):41-6.
  • 12
    DeMarco VG, Arooor AR, Sowers JR. The pathophysiology of hypertension in patients with obesity. Nat Rev Endocrinol. 2014;10(6):364-76.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    15 Abr 2019
  • Data do Fascículo
    Abr 2019
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br