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Doenças Crônicas Pregressas e sua Relação com a Infecção por COVID-19

Palavras-chave
Diabetes Mellitus/prevalência; Hipertensão/prevalência; COVID-19; Pandemia; Fatores de Risco; Estudos Epidemiológicos; Atenção Primária a Saúde; Sistema Único de Saúde (SUS)

Prezado Editor,

O assunto abordado no estudo é de grande relevância em se tratando do atual período pandêmico enfrentado mundialmente. Sabe-se que existe uma certa urgência na produção e divulgação de dados científicos e epidemiológicos sobre o novo Coronavírus. Sendo assim, pesquisas que ajudem a traçar o perfil da população mais vulnerável a essa doença trazem uma grande contribuição para que se evite um número ainda maior de óbitos e sequelas decorrentes da COVID-19.

Apesar do coronavírus infectar pessoas de todas as idades, existe uma prevalência de complicações entre dois grupos: os idosos e os que têm comorbidades preexistentes. Considerando este último grupo, a hipertensão arterial sistêmica (HAS) e o diabetes mellitus (DM) são dois dos principais fatores de risco para a mortalidade por COVID-19.11 Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, Armstrong A, et al. Prevalência de hipertensão arterial sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: um estudo retrospectivo de obitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol. 2021;117(2):416-22. https://doi.org/10.36660/abc.20200885
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Em concordância a este dado, um estudo sobre a multimorbidade dos brasileiros publicado em Cadernos de Saúde Pública (CSP), demonstrou que aproximadamente 72% dos pacientes internados em UTI por COVID-19 apresentavam doenças crônicas pregressas em comparação àqueles que não necessitaram destes cuidados intensivos (37%).22 Nunes BP, Souza ASS, Nogueira J, Andrade FB, Teixeira E, Thume E, et al. Multimorbidade e população em risco para COVID-19 grave no estudo longitudinal da saúde dos idosos brasileiros. Cadernos de Saúde Pública. 2020;36(12):1-12. doi.org/10.1590/0102-311x00129620.
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Diante disso, evidencia-se um grande contingente de pessoas em risco da COVID-19 grave no país, reforçando que o perfil de comorbidades da população brasileira é um fator preocupante e que precisa ser levado em consideração. Nesse cenário, a adoção de intervenções não farmacológicas torna-se fundamental para a prevenção de casos graves da infecção,22 Nunes BP, Souza ASS, Nogueira J, Andrade FB, Teixeira E, Thume E, et al. Multimorbidade e população em risco para COVID-19 grave no estudo longitudinal da saúde dos idosos brasileiros. Cadernos de Saúde Pública. 2020;36(12):1-12. doi.org/10.1590/0102-311x00129620.
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uma vez que muitos dos fatores agravantes são preveníveis, e garantir um estilo de vida mais saudável para a população refletiria de forma positiva no combate a pandemia.

Portanto, os estudos epidemiológicos são ferramentas importantes para caracterizar o comportamento típico da doença, assim como orientar as tomadas de decisões no âmbito das políticas públicas em saúde e vigilância epidemiológica.33 de Moura, PH, da Luz RA, Gai MJP, Klokner S, Torrico G, Knapik J, et al. “Perfil epidemiológico da Covid-19 em Santa Catarina. Revista Interdisciplinar de Estudos em Saúde. 2020;9(1):163-80. https://doi.org/10.33362/ries.v9i1.2316
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Assim, a estimativa apresentada é importante para planejar as estratégias de monitoramento das pessoas com morbidades crônicas e de prevenção no enfrentamento do novo coronavírus.33 de Moura, PH, da Luz RA, Gai MJP, Klokner S, Torrico G, Knapik J, et al. “Perfil epidemiológico da Covid-19 em Santa Catarina. Revista Interdisciplinar de Estudos em Saúde. 2020;9(1):163-80. https://doi.org/10.33362/ries.v9i1.2316
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Nesse contexto, o Sistema Único de Saúde (SUS) e a atenção primária à saúde, por intermédio da coordenação do cuidado pela Estratégia Saúde da Família, continuarão a ter papel relevante para amenizar as iniquidades sociais em saúde, por meio da prevenção da infecção pelo vírus e o manejo de condições crônicas e multimorbidade durante e após a pandemia.22 Nunes BP, Souza ASS, Nogueira J, Andrade FB, Teixeira E, Thume E, et al. Multimorbidade e população em risco para COVID-19 grave no estudo longitudinal da saúde dos idosos brasileiros. Cadernos de Saúde Pública. 2020;36(12):1-12. doi.org/10.1590/0102-311x00129620.
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Referências

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    Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, Armstrong A, et al. Prevalência de hipertensão arterial sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: um estudo retrospectivo de obitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol. 2021;117(2):416-22. https://doi.org/10.36660/abc.20200885
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    Nunes BP, Souza ASS, Nogueira J, Andrade FB, Teixeira E, Thume E, et al. Multimorbidade e população em risco para COVID-19 grave no estudo longitudinal da saúde dos idosos brasileiros. Cadernos de Saúde Pública. 2020;36(12):1-12. doi.org/10.1590/0102-311x00129620
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    de Moura, PH, da Luz RA, Gai MJP, Klokner S, Torrico G, Knapik J, et al. “Perfil epidemiológico da Covid-19 em Santa Catarina. Revista Interdisciplinar de Estudos em Saúde. 2020;9(1):163-80. https://doi.org/10.33362/ries.v9i1.2316
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Carta-resposta

A transformação de dados em informações, de informações em conhecimento e de conhecimento em sabedoria, embora não seja uma tarefa fácil- sobretudo em tempos de pandemia-, é fundamental para a intervenção oportuna. Ainda mais quando essas intervenções podem salvar a vida de inúmeras pessoas [o termo ‘pessoas’ aqui aludido tem o sentido geométrico do ser sujeito. São seres reais, concretos e donos de projetos de vida e de felicidade]. Produzir ciência é, portanto, um ato de compromisso com esses sujeitos. O bem tutelado é a própria vida – nossa e dos nossos!

No Brasil, desde o ano de 2006 vem sendo publicada a mais importante pesquisa sobre fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 e estados e no Distrito Federal, totalizando 27 cidades (Vigitel- Vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico).11 Mássimo EAL, Souza HNF, Freitas MIF. Doenças crônicas não transmissíveis, risco e promoção da saúde: construções sociais de participantes do Vigitel. Ciênc saúde coletiva.2015;20(3):679-88. DOI https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.14742014.
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Os dados coletados em 2020, embora demonstrem avanços, ainda são preocupantes:

  1. a frequência de adultos (≥18 anos) fumantes nas 27 cidades foi de 9,5%;

  2. o excesso de peso foi (IMC ≥ 25 kg/m2) observado em 57,5% da população e a obesidade (IMC ≥ 30 kg/m2) em 21,5% dos indivíduos;

  3. a prática de atividade física no tempo livre equivalente a 150 minutos de atividade moderada por semana foi relatava por pouco mais de um terço da população (36,8%);

  4. a frequência de hipertensão arterial alcançou ¼ da população (25,2%); e

  5. a frequência de Diabetes Mellitus foi de 8,2%.22 Brasil. Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2019: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2019. Brasília – DF;2020 .137p.

O aumento da prevalência de fatores de risco e das próprias doenças crônicas é uma realidade preocupante, não somente no Brasil, mas em todo o mundo. Somente em 2019, 54,7% das mortes registradas no Brasil tiveram como causa as doenças crônicas não-transmissíveis.33 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas e agravos não transmissíveis no Brasil. Brasília – DF; 2020. vol.1,122p. Esse cenário exige um esforço coletivo – gestores, profissionais de saúde e sociedade civil –, e intersetorial, envolvendo todos os níveis de atenção e de prevenção. Somente um amplo conjunto de políticas é capaz de impactar satisfatoriamente nesse cenário.

Considerando tal contexto, o Brasil lançou em 2021 o “Plano de Ações Estratégicas para o Enfrentamento das Doenças Crônicas e Agravos não Transmissíveis no Brasil 2021-203044 Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, et al. Prevalência de Hipertensão Arterial Sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: Um Estudo Retrospectivo de Óbitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol.2021;117(2):416-22. DOI https: https://doi.org/10.36660/abc.20200885.
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com o objetivo de “fortalecer a agenda de enfrentamento das DCNT, das violências e dos acidentes nas esferas federal, estaduais, municipais e do Distrito Federal, bem como pautar a promoção da saúde nas ações de saúde”.44 Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, et al. Prevalência de Hipertensão Arterial Sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: Um Estudo Retrospectivo de Óbitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol.2021;117(2):416-22. DOI https: https://doi.org/10.36660/abc.20200885.
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Cabe salientar que o plano em tela está em consonância com as recomendações mundiais e adota um arrojado sistema de monitoramento dos indicadores.

O lançamento do plano dialoga com a necessidade de produção do conhecimento sobre a influência dos fatores de risco (obesidade, sedentarismo e tabagismo, por exemplo) e doenças crônicas no desfecho clínico de indivíduos com COVID-19, bem como o impacto da pandemia – e suas medidas de controle – na prevalência desses fatores de risco e doenças. Tem-se uma via de mão dupla, com muitos questionamentos a serem respondidos.

Por fim, ficamos honrados ao receber o comentário referente ao nosso texto44 Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, et al. Prevalência de Hipertensão Arterial Sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: Um Estudo Retrospectivo de Óbitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol.2021;117(2):416-22. DOI https: https://doi.org/10.36660/abc.20200885.
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e agradecemos pelo momento de discussão.

Referências

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    Mássimo EAL, Souza HNF, Freitas MIF. Doenças crônicas não transmissíveis, risco e promoção da saúde: construções sociais de participantes do Vigitel. Ciênc saúde coletiva.2015;20(3):679-88. DOI https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.14742014
    » https://doi.org/10.1590/1413-81232015203.14742014
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    Brasil. Ministério da Saúde. Vigitel Brasil 2019: vigilância de fatores de risco e proteção para doenças crônicas por inquérito telefônico: estimativas sobre frequência e distribuição sociodemográfica de fatores de risco e proteção para doenças crônicas nas capitais dos 26 estados brasileiros e no Distrito Federal em 2019. Brasília – DF;2020 .137p.
  • 3
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Vigilância em Saúde. Departamento de Análise em Saúde e Vigilância de Doenças Não Transmissíveis. Plano de ações estratégicas para o enfrentamento das doenças crônicas e agravos não transmissíveis no Brasil. Brasília – DF; 2020. vol.1,122p.
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    Santos LG, Baggio JAO, Leal TC, Costa FA, Fernandes TRMO, Silva RV, et al. Prevalência de Hipertensão Arterial Sistêmica e Diabetes Mellitus em Indivíduos com COVID-19: Um Estudo Retrospectivo de Óbitos em Pernambuco, Brasil. Arq Bras Cardiol.2021;117(2):416-22. DOI https: https://doi.org/10.36660/abc.20200885
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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    05 Ago 2022
  • Data do Fascículo
    Ago 2022

Histórico

  • Recebido
    07 Out 2021
  • Revisado
    17 Nov 2021
  • Aceito
    17 Nov 2021
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