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Avaliação da Insuficiência Valvar Aórtica por Ecocardiografia: Conceitos Básicos e Novos

Insuficiência da Valva Aórtica; Regurgitação Aórtica; Velocidade do Fluxo Sanguíneo; Diagnóstico por Imagem/métodos; Ecocardiografia; Ecocardiografia Doppler; Ecocardiografia Tridimensional

O ecocardiograma continua sendo o padrão-ouro para o diagnóstico e classificação das cardiopatias valvares,11. Zoghbi WA, Adams D, Bonow RO, Enriquez-Sarano M, Foster e, Grayburn P, et al. Recommendations for Noninvasive Evaluation of Native Valvular Regurgitation: A Report from the American Society of Echocardiography Developed in Collaboration with the Society for Cardiovascular Magnetic Resonance. J Am Soc Echocardiogr. 2017;30(4):303‐71. apesar do avanço de outras modalidades de imagem. A insuficiência valvar aórtica (IA) é um distúrbio valvar comum22. Nishimura RA, Otto CM, Bonow RO, Carabello B, Erwin 3rd JP, Fleisher LA, et al. 2017 AHA/ACC Focused Update of the 2014 AHA/ACC Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines. Circulation. 2017;135(25):e1159‐e95. que também pode ser um dos mais desafiadores para quantificar-se com precisão. O ecocardiograma ajuda a avaliar a gravidade da IA utilizando várias técnicas bidimensionais, tridimensionais e de Doppler colorido, mas o mais importante é que oferece uma oportunidade única para a avaliação hemodinâmica, que é extremamente importante na classificação da gravidade da IA.

No artigo intitulado: “Integral velocidade-tempo da regurgitação aórtica: um novo marcador ecocardiográfico na avaliação da gravidade da insuficiência aórtica”,33. Abellán-Huerta J, Bonaque-González JC, Rubio-Patón R, García-Gómez J, Egea-Beneyto S, Soria-Arcos F, et al. Velocity-Time Integral of Aortic Regurgitation: A Novel Echocardiographic Marker in the Evaluation of Aortic Regurgitation Severity. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(2):253-260. os autores testaram, como prova de conceito, a correlação entre a integral velocidade-tempo (IVT) da IA e a gravidade da insuficiência aórtica em uma análise multivariada e mostraram a relação inversa entre a IVT da IA e a gravidade da IA, independente do diâmetro e volume do ventrículo esquerdo, frequência cardíaca, pressão arterial diastólica ou fração de ejeção do ventrículo esquerdo. Eles também mostraram que a IVT da IA é um método que pode ser facilmente obtido e reproduzido para avaliar a gravidade da IA, em comparação com outros métodos comumente utilizados, como a Área de Superfície da Isovelocidade Proximal (PISA). Este estudo apresenta um conceito interessante e promissor que aumentará o nível de confiança ao avaliar a gravidade da IA. Também faz sentido fisiologicamente, pois os pacientes com IA grave têm um gradiente diastólico menor entre a aorta e o ventrículo esquerdo (pressão diastólica final mais alta do ventrículo esquerdo e pressão arterial diastólica mais baixa) que teoricamente resultarão em um valor menor de IVT da IA devido à rápida equalização pressão entre a aorta e o ventrículo esquerdo.

Vale ressaltar, porém, que existem algumas limitações para este estudo. Primeiro, há uma falta de padrão ouro para a avaliação da gravidade da IA, além da “opinião de especialistas”. Segundo, o grupo com IA grave é provavelmente composto de dois grupos separados: o grupo IA grave aguda e o grupo IA grave crônica. É importante distinguir esses dois grupos, pois a IA grave, bem compensada e crônica é provavelmente hemodinamicamente semelhante à IA moderada, com um valor de IVT da IA maior do que aqueles com IA grave aguda. A falta de associação entre a gravidade da IA e o meio-tempo de pressão neste estudo confirma que o grupo com IA grave é provavelmente uma mistura de pacientes com cronicidade variável. Terceiro, alguns jatos de IA serão muito desafiadores para obter uma amostra por Doppler de onda contínua, dada sua excentricidade. Isso é principalmente significante em pacientes com válvulas aórticas bicúspides ou unicúspides que tendem a ter jatos regurgitantes muito excêntricos. Por fim, será necessário um acompanhamento clínico para avaliar a sobrevida, a necessidade de cirurgia valvar aórtica ou outros eventos adversos com base no valor da IVT da IA para verificar a utilidade do conceito.

Conclusão

A introdução de novos conceitos ou técnicas que ajudam na classificação da gravidade da IA é um recurso valioso. A IVT da IA é um conceito promissor que é fisiologicamente correto e parece ser reproduzível. Serão necessários ensaios clínicos maiores para avaliar melhor seu papel e, mais importante, seu valor prognóstico e correlação com os resultados clínicos.

É indispensável, no entanto, ter em mente que é muito improvável que encontremos um marcador ecocardiográfico único que seja um padrão ouro na avaliação da gravidade da IA. Os ecocardiografistas devem manter a mente aberta e integrar todos os dados disponíveis para chegar a uma conclusão final. Isso inclui o seguinte:11. Zoghbi WA, Adams D, Bonow RO, Enriquez-Sarano M, Foster e, Grayburn P, et al. Recommendations for Noninvasive Evaluation of Native Valvular Regurgitation: A Report from the American Society of Echocardiography Developed in Collaboration with the Society for Cardiovascular Magnetic Resonance. J Am Soc Echocardiogr. 2017;30(4):303‐71.

  1. Dados clínicos (pressão de pulso ampla, frequência cardíaca, sintomas)

  2. Avaliação bidimensional e tridimensional da válvula aórtica (avaliação da anatomia valvar quanto ao número de folhetos, perfurações, vegetação, prolapso da cúspide etc.) e câmaras cardíacas (tamanho e função do VE e VR, tamanho do AE)

  3. Doppler colorido (Vena Contracta,44. Tribouilloy CM, Enriquez-Sarano M, Bailey KR, Seward JB, Tajik AJ. Assessment of severity of aortic regurgitation using the width of the vena contracta: A clinical color Doppler imaging study. Circulation. 2000;102(5):558‐64. largura do jato comparado à largura da VSVE, avaliação PISA55. Tribouilloy CM, Enriquez-Sarano M, Fett SL, Bailey KR, Seward JB, Tajik AJ. Application of the proximal flow convergence method to calculate the effective regurgitant orifice area in aortic regurgitation. J Am Coll Cardiol. 1998;32(4):1032‐9. quando possível e quantificação 3D com Doppler colorido66. Pirat B, Little SH, Igo SR, Igo SR, McCulloch M, Nose Y, et al. Direct measurement of proximal isovelocity surface area by real-time three-dimensional color Doppler for quantitation of aortic regurgitant volume: an in vitro validation. J Am Soc Echocardiogr. 2009;22(3):306‐13. )

  4. Doppler espectral (densidade do sinal do jato, meio-tempo de pressão, IVT da IA, IVT da VSVE, IVT valvar aórtica, padrão de influxo mitral, estimativa da pressão sistólica do ventrículo direito, etc.).

Entretanto, como em outras lesões valvares, ecocardiografistas e estagiários devem evitar diagnosticar a gravidade da IA com base apenas no Doppler colorido, mesmo que seja tentador fazê-lo inicialmente. A avaliação das consequências hemodinâmicas da IA deve ser um componente-chave da avaliação. Por exemplo, é improvável que o diagnóstico de IA grave com tamanho diastólico final normal do ventrículo esquerdo, sem reversão do fluxo diastólico na aorta torácica descendente ou abdominal ou com uma pressão de pulso normal seja preciso e deve ser reavaliado.

Além disso, a utilização de outras modalidades para avaliar a gravidade da IA pode ser necessária quando os dados ecocardiográficos e clínicos forem inconclusivos ou contraditórios. A ressonância magnética cardíaca (RMC) tem um papel importante e promissor na avaliação da gravidade da IA, especialmente com jatos excêntricos ou vazamentos valvares periprotéticos. Ajuda a avaliar a fração regurgitante, utilizando imagens de contraste de fase e o tamanho e a função dos ventrículos esquerdo e direito com boa precisão.77 Kammerlander AA, Wiesinger M, Duca F, Aschauer S, Binder C, Tufaro CZ, et al. Diagnostic and Prognostic Utility of Cardiac Magnetic Resonance Imaging in Aortic Regurgitation. JACC Cardiovasc Imaging. 2019;12(8 Pt 1):1474‐83. A tomografia computadorizada (TC) cardíaca também pode ser útil para identificar vazamentos periprotéticos e orientar procedimentos cirúrgicos e percutâneos.88. Lesser JR, Han BK, Newell M, Schwartz RS, Pedersen W, Sorajja P. Use of cardiac CT angiography to assist in the diagnosis and treatment of aortic prosthetic paravalvular leak: a practical guide. J Cardiovasc Comput Tomogr. 2015;9(3):159‐64. Finalmente, um aortograma bem executado, realizado no laboratório de cateterização, pode ser muito valioso quando outras modalidades de teste são inconclusivas.

Referências

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    Zoghbi WA, Adams D, Bonow RO, Enriquez-Sarano M, Foster e, Grayburn P, et al. Recommendations for Noninvasive Evaluation of Native Valvular Regurgitation: A Report from the American Society of Echocardiography Developed in Collaboration with the Society for Cardiovascular Magnetic Resonance. J Am Soc Echocardiogr. 2017;30(4):303‐71.
  • 2
    Nishimura RA, Otto CM, Bonow RO, Carabello B, Erwin 3rd JP, Fleisher LA, et al. 2017 AHA/ACC Focused Update of the 2014 AHA/ACC Guideline for the Management of Patients With Valvular Heart Disease: A Report of the American College of Cardiology/American Heart Association Task Force on Clinical Practice Guidelines. Circulation. 2017;135(25):e1159‐e95.
  • 3
    Abellán-Huerta J, Bonaque-González JC, Rubio-Patón R, García-Gómez J, Egea-Beneyto S, Soria-Arcos F, et al. Velocity-Time Integral of Aortic Regurgitation: A Novel Echocardiographic Marker in the Evaluation of Aortic Regurgitation Severity. Arq Bras Cardiol. 2020; 115(2):253-260.
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    Tribouilloy CM, Enriquez-Sarano M, Bailey KR, Seward JB, Tajik AJ. Assessment of severity of aortic regurgitation using the width of the vena contracta: A clinical color Doppler imaging study. Circulation. 2000;102(5):558‐64.
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    Tribouilloy CM, Enriquez-Sarano M, Fett SL, Bailey KR, Seward JB, Tajik AJ. Application of the proximal flow convergence method to calculate the effective regurgitant orifice area in aortic regurgitation. J Am Coll Cardiol. 1998;32(4):1032‐9.
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    Pirat B, Little SH, Igo SR, Igo SR, McCulloch M, Nose Y, et al. Direct measurement of proximal isovelocity surface area by real-time three-dimensional color Doppler for quantitation of aortic regurgitant volume: an in vitro validation. J Am Soc Echocardiogr. 2009;22(3):306‐13.
  • 7
    Kammerlander AA, Wiesinger M, Duca F, Aschauer S, Binder C, Tufaro CZ, et al. Diagnostic and Prognostic Utility of Cardiac Magnetic Resonance Imaging in Aortic Regurgitation. JACC Cardiovasc Imaging. 2019;12(8 Pt 1):1474‐83.
  • 8
    Lesser JR, Han BK, Newell M, Schwartz RS, Pedersen W, Sorajja P. Use of cardiac CT angiography to assist in the diagnosis and treatment of aortic prosthetic paravalvular leak: a practical guide. J Cardiovasc Comput Tomogr. 2015;9(3):159‐64.
  • Minieditorial referente ao artigo: Integral Velocidade-Tempo da Insuficiência Aórtica: Um Novo Marcador Ecocardiográfico na Avaliação da Gravidade da Insuficiência Aórtica

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    Ago 2020
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