Acessibilidade / Reportar erro

Melhor Tecnologia, Mais Gastos Piores Resultados

Palavras-chave
Revascularização Miocárdica / economia; Revascularização Miocárdica / mortalidade; Angioplastia Coronária com Balão; Procedimentos Cirúrgicos Robóticos / tendências; Stents Farmacológicos / economia; Salas Cirúrgicas / tendências

A revascularização cirúrgica do miocárdio vem experimentando mudanças tecnológicas substanciais desde o seu surgimento. De fato, técnicas cirúrgicas primitivas sem nenhum fundamento fisiológico foram empregados para criar condições de aumento da oferta de sangue ao miocárdio isquêmico. Nessas técnicas, incluíram-se a “talcagem” do pericárdio, a ligadura do seio venoso, a cirurgia de Beck, a cirurgia de Vineberg dentre outras. Contudo, dados seus resultados frustrantes, e por não corresponderem às expectativas, essas técnicas foram abandonadas.

O surgimento de uma nova técnica, mais racional - o bypass aorto-coronário com enxertos venosos, e posteriormente, com enxertos arteriais - permitiu maior fluxo de sangue no miocárdio isquêmico.

Por causa da morbidade cirúrgica e do alto dispêndio de recursos materiais e humanos, assistiu-se ao surgimento de técnicas percutâneas direcionadas a desobstruir as artérias coronárias. Nesse cenário, a angioplastia coronária percutânea, inicialmente por meio de balão e posteriormente pela colocação de stents, parece ter cumprido sua tarefa. Nesse período, desenvolveram-se dispositivos intra-arteriais tais como cateter de aterectomia, rotablator, laser, porém com resultados não satisfatórios. Adicionalmente, STENTS farmacológicos ou não, ganharam a preferência dos cardiologistas intervencionistas. Todavia, o avanço tecnológico desses dispositivos veio acompanhado de aumento de custos.11 Swaminathan M, Phillips-Bute BG, Patel UD, Shaw AD, Stafford-Smith M, Douglas PS, et al. Increasing healthcare resource utilization after coronary artery bypass graft surgery in the United States. Circ Cardiovasc Qual Outcomes. 2009;2(4):305-12. Além disso, estudos recentes revelaram que a revascularização percutânea não diminuiu a ocorrência e eventos cardiovasculares quando comparado com a revascularização cirúrgica convencional.22 Farkouh ME, Domanski M, Sleeper LA, Siami FS, Dangas G, Mack M, et al; FREEDOM Trial Investigators. Strategies for multivessel revascularization in patients with diabetes. N Engl J Med. 2012;367(25):2375-84.,33 Serruys PW, Morice MC, Kappetein AP, Colombo A, Holmes DR, Mack MJ, et al; SYNTAX Investigators. Percutaneous coronary intervention versus coronary-artery bypass grafting for severe coronary artery disease. N Engl J Med. 2009;360(10):961-72. Erratum in: N Engl J Med. 2013;368(6):584.

Adicionalmente, avanços tecnológicos na revascularização cirúrgica, incluindo o uso de robôs e sala cirúrgica híbrida, têm contribuído para o aumento de opções para revascularizar o miocárdio. Ainda que esse avanço tecnológico se mostrou um procedimento sofisticado e seguro, tal procedimento não trouxe, em contrapartida, contribuição para diminuição de eventos ou declínio de mortalidade cardiovascular.44 Zhao DX, Leacche M, Balaguer JM, Boudoulas KD, Damp JA, Greelish JP, et al; Writing Group of the Cardiac Surgery, Cardiac Anesthesiology, and Interventional Cardiology Groups at the Vanderbilt Heart and Vascular Institute. Routine intraoperative completion angiography after coronary artery bypass grafting and 1-stop hybrid revascularization results from a fully integrated hybrid catheterization laboratory/operating room. J Am Coll Cardiol. 2009;53(3):232-41. De fato, uma recente metanálise incluindo nove estudos comparativos entre cirurgias de revascularização praticada em sala convencional ou em sala híbrida, guiada ou não por robô, sinalizou um pior desempenho em sala híbrida em relação aos eventos e também em morte.55 Dong L, Kang YK, Xiang G Resultados clínicos de curto e médio prazo após revascularização coronariana híbrida versus revascularização miocárdica sem circulação extracorpórea: uma meta-análise. Arq Bras Cardiol. 2018; 110(4):321-330. Adicionalmente, nessa metanálise, observou-se ocorrência desproporcional de reoperação (3.5%) e instabilidade hemodinâmica (9.5%) durante a intervenção na sala híbrida obrigando a mudança de técnica para cirurgia a “céu aberto” com circulação extracorpórea.66 Hueb WA, Ramires JA. Complete, incomplete or no myocardial revascularization. Arq Bras Cardiol. 2006;87(4):e144-6. Além disso, foi observado nesse estudo, que a cirurgia realizada com técnica convencional alcançou maior completude de revascularização quando comparada com aquela realizada em sala híbrida.

Há que se considerar, todavia, que a eficácia da revascularização miocárdica completa ou incompleta permanece, ainda, em debate. Estudos comparativos entre revascularização chamada completa, incompleta ou nenhuma revascularização alcançaram similaridade de resultados.77 Bonatti JO, Zimrin D, Lehr EJ, Vesely M, Kon ZN, Wehman B, et al. Hybrid coronary revascularization using robotic totally endoscopic surgery: perioperative outcomes and 5-year results. Ann Thorac Surg. 2012;94(6):1920-6.

Por fim, passaram-se 40 anos após a publicação do CASS-Trial88 Coronary Artery Surgery Study (CASS): a randomized trial of coronary artery bypass surgery: survival data. Circulation. 1983;68(5):939-50. o qual sinalizou que independentemente do número de artérias comprometidas, e do grau de comprometimento arterial, em pacientes com função ventricular preservada e angina estável, o tratamento clínico ou cirúrgico tem resultados semelhantes com mortalidade anual de aproximadamente 2%. Desta forma, no estudo CASS-Trial,88 Coronary Artery Surgery Study (CASS): a randomized trial of coronary artery bypass surgery: survival data. Circulation. 1983;68(5):939-50. considerando-se que o tratamento clínico se baseava somente em betabloqueadores e nitratos de ação prolongada, podemos ponderar que a cirurgia foi comparada com grupo controle (placebo).

References

  • 1
    Swaminathan M, Phillips-Bute BG, Patel UD, Shaw AD, Stafford-Smith M, Douglas PS, et al. Increasing healthcare resource utilization after coronary artery bypass graft surgery in the United States. Circ Cardiovasc Qual Outcomes. 2009;2(4):305-12.
  • 2
    Farkouh ME, Domanski M, Sleeper LA, Siami FS, Dangas G, Mack M, et al; FREEDOM Trial Investigators. Strategies for multivessel revascularization in patients with diabetes. N Engl J Med. 2012;367(25):2375-84.
  • 3
    Serruys PW, Morice MC, Kappetein AP, Colombo A, Holmes DR, Mack MJ, et al; SYNTAX Investigators. Percutaneous coronary intervention versus coronary-artery bypass grafting for severe coronary artery disease. N Engl J Med. 2009;360(10):961-72. Erratum in: N Engl J Med. 2013;368(6):584.
  • 4
    Zhao DX, Leacche M, Balaguer JM, Boudoulas KD, Damp JA, Greelish JP, et al; Writing Group of the Cardiac Surgery, Cardiac Anesthesiology, and Interventional Cardiology Groups at the Vanderbilt Heart and Vascular Institute. Routine intraoperative completion angiography after coronary artery bypass grafting and 1-stop hybrid revascularization results from a fully integrated hybrid catheterization laboratory/operating room. J Am Coll Cardiol. 2009;53(3):232-41.
  • 5
    Dong L, Kang YK, Xiang G Resultados clínicos de curto e médio prazo após revascularização coronariana híbrida versus revascularização miocárdica sem circulação extracorpórea: uma meta-análise. Arq Bras Cardiol. 2018; 110(4):321-330.
  • 6
    Hueb WA, Ramires JA. Complete, incomplete or no myocardial revascularization. Arq Bras Cardiol. 2006;87(4):e144-6.
  • 7
    Bonatti JO, Zimrin D, Lehr EJ, Vesely M, Kon ZN, Wehman B, et al. Hybrid coronary revascularization using robotic totally endoscopic surgery: perioperative outcomes and 5-year results. Ann Thorac Surg. 2012;94(6):1920-6.
  • 8
    Coronary Artery Surgery Study (CASS): a randomized trial of coronary artery bypass surgery: survival data. Circulation. 1983;68(5):939-50.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Abr 2018
Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@cardiol.br