Acessibilidade / Reportar erro

Gestão pré-natal e resultados da taquicardia juncional ectópica acelerado e hidropisia

RELATO DE CASO

Gestão pré-natal e resultados da taquicardia juncional ectópica acelerado e hidropisia

Lutgardo García-DíazI; Félix CoserriaII; Susana CostaI; Guillermo AntiñoloI,III

IUnidad de Gestión Clínica de Genética, Reproducción y Medicina Fetal. Instituto de Biomedicina de Sevilla (IBIS) - Hospital Universitario Virgen del Rocío/CSIC/Universidad de Sevilla - Sevilla - Spain

IIUnidad de Gestión Clínica de Pediatría - Sección de Cardiología Infantil - Hospital Infantil - Hospital Universitario Virgen del Rocío - Sevilla - Spain

IIICentro de Investigación Biomédica en Red de Enfermedades Raras (CIBERER) - Sevilla - Spain

Correspondência Correspondência: Guillermo Antiñolo UGC de Genética, Reproducción y Medicina Fetal. Hospital Universitario Virgen del Rocio Avenida Manuel Siurot, s/n CEP 41013 - Sevilla, Spain E-mail: guillermo.antinolo.sspa@juntadeandalucia.es

Palavras-chave: Pré-Natal / utilização; taquicardia ectópica de junção; frequência cardíaca; hidropisia fetal.

Introdução

Arritmias fetais são relatadas em cerca de 1-2% de todas as gestações e é uma razão relativamente comum para o encaminhamento para centros de medicina fetal1-3. A taquicardia fetal é uma condição grave na qual o feto está em risco de insuficiência cardíaca congestiva e subsequente desenvolvimento de hidropisia1-4. Esta situação está associada com morbimortalidade significativa1-4. Em geral, o diagnóstico e a avaliação dessas arritmias podem ser feitos em forma precisa usando ultrassom 2-D de alta resolução em modo M e estudo com Doppler da relação entre as contrações atriais e ventriculares5. A taquicardia juncional ectópica (TJE) é uma forma rara de taquiarritmia fetal que normalmente ocorre no âmbito da cirurgia de cardiopatia congênita6. Além disso, uma variedade de congênita da TJE não relacionada com a cirurgia também tem sido descrita. Enquanto a TJE pós-cirúrgica tem uma mortalidade de até 14%, a TJE congênita tem uma mortalidade de até 34%6. A forma congênita da TJE tem sido raramente relatada durante o período pré-natal7,8. Nós descrevemos um caso em que o diagnóstico foi suspeitado no útero de uma paciente encaminhada ao nosso departamento por causa da presença de ascite fetal importante. O diagnóstico foi baseado na evidência de episódios de taquiarritmia moderada sem relação AV 1:1 e ausência intermitente da onda de contração atrial, consistente com dissociação atrioventricular (AV), juntamente com onda diastólica reversa do ducto venoso, indicando insuficiência cardíaca leve. O diagnóstico de TJE foi confirmado após o nascimento.

Relato do Caso

Uma mulher de 32 anos de idade, grávida 1, foi encaminhada ao nosso Departamento com 23 semanas de idade gestacional por causa da presença de ascite fetal importante. No exame de ultrassom (Voluson e8, GE), não foram observadas anomalias no coração nem outras anomalias estruturais, o crescimento fetal era adequado para a idade gestacional, e polihidrâmnios bem como ascite foram observados, indicando hidropisia fetal. Episódios de taquicardia ventricular sem relação AV 1:1 e dissociação atrioventricular (AV) foram observados (Figura 1). Além disso, também foi observada uma onda diastólica reversa do ducto venoso. O diagnóstico fetal foi de dissociação AV com TJE ou taquicardia ventricular. A TJE fetal foi suspeitada com base em episódios de taquicardia ventricular raramente excedendo 190 bpm sem relação AV 1:1 e dissociação atrioventricular (AV), juntamente com onda diastólica reversa do ducto venoso e hidropisia, indicando falha cardíaca. Assim, o feto foi diagnosticado como tendo taquiarritmia, consistente com a TJE, e hidropisia. A gestante foi hospitalizada para uma tentativa de cardioversão com digoxina. Depois do ECG e eletrólitos maternos normais, o tratamento foi iniciado com digoxina oral 0,25 mg a cada 6 horas, para um total de 2 mg, seguido por uma dose diária de 0,25 mg a cada 8 horas. Uma vez que a digoxina esteve dentro da faixa terapêutica (0,8-2 ng/ml), a paciente recebeu alta e a terapia de monitoramento materno-fetal foi realizada em forma ambulatorial. O tratamento de controle foi baseado em digoxinemia e ECG maternos, bem como ultrassonografia fetal duas vezes por semana. O nível de digoxina em sangue manteve-se dentro da faixa terapêutica durante o tratamento, o volume de líquido amniótico retornou ao valor normal, e a ascite fetal foi reduzida e manteve-se estável, apesar da onda diastólica reversa do ducto venoso indicar insuficiência cardíaca leve. Apesar da resposta, na 28ª semana de gestação, decidimos administrar injeções de betametasona para promover a maturação pulmonar, uma vez que a continuação da gravidez não estava garantida devido ao prognóstico geral desfavorável e a dificuldade da gestão da TJE ou taquicardia ventricular. Na 34ª semana de gestão, uma cesariana foi realizada devido ao aparecimento de taquicardia fetal súbita e permanente, apesar da terapia com digoxina. Nasceu uma criança de sexo masculino, pesando 2.500 g, com índice de Apgar 10/10/10, e o neonato foi internado para estudo no Departamento de Neonatologia. Na admissão, o ECG neonatal mostrou taquicardia regular com QRS estreito, dissociação AV, e o diagnóstico de TJE foi estabelecido (Figura 2). O tratamento com adenosina foi iniciado para descartar completamente um flutter atrial. Na medida em que o diagnóstico de TJE foi confirmado, utilizamos apenas propranolol, e também amiodarona associada ao propranolol, mas com pobres resultados. Atualmente, o recém-nascido tem 9 meses de idade, apresenta um ECG com característica semelhante, e está sendo tratado com propranolol e flecainida. Ele apresenta uma função ventricular muito boa (FE 72%) pelo ecocardiograma e um Holter com uma frequência média de 138 bpm.



Discussão

As arritmias cardíacas são detectadas em aproximadamente 1% de todos os fetos1,2. A maioria destes distúrbios do ritmo é resultado de extrassístoles e de pouco significado clínico1,2. A incidência de taquicardia fetal é de 1:10.000 a 1:25.000. As taquiarritmias fetais podem resultar no desenvolvimento de insuficiência cardíaca congestiva e, portanto, a intervenção pré-natal pode ser necessária1,2. A taquicardia juncional ectópica é geralmente vista em crianças durante o período pós-operatório imediato de cirurgia cardíaca congênita. A forma congênita é menos frequente e tem sido raramente relatada no período pré-natal7,8. Acredita-se que a TJE congênita seja causada por um foco ectópico automático na junção AV3. Em geral o diagnóstico diferencial pré-natal entre TJE e taquicardia ventricular, em ecocardiograma fetal é um desafio. No nosso caso, o diagnóstico da TJE fetal foi suspeitada com base em episódios de taquicardia ventricular raramente excedendo 190 bpm sem relação AV 1:1 e dissociação atrioventricular (AV), juntamente com onda diastólica reversa do ducto venoso e hidropisia, indicando falha cardíaca.

O tratamento ideal de taquiarritmias fetais permanece indeterminado. A segurança da mãe é de grande preocupação na gestão de taquicardia fetal, uma vez que a administração de drogas antiarrítmicas para o tratamento intrauterino pode causar pró-arritmia e ameaçar a mãe. A digoxina tem sido amplamente aceita como pilar da terapia, por causa de sua segurança e administração conveniente1,2,5. Flecainida, sotalol e amiodarona também têm sido utilizadas no tratamento de taquiarritmias fetais5,9,10. No entanto, preocupam os efeitos secundários mais sérios sobre a mãe e o feto5.

O resultado na TJE congênita mostra que é uma taquiarritmia maligna, que causa cardiomiopatia induzida por taquicardia e morte súbita6. Devido à eficiência limitada da maioria dos fármacos antiarrítmicos na TJE, a gestão intrauterina desses casos é difícil, e deverá ter como objetivo manter o débito cardíaco adequado para permitir o prolongamento da gravidez até que a maturação pulmonar seja alcançada7,8. Além disso, a presença de hidropisia no nosso caso sugeria um prognóstico desfavorável, apesar do fato de que, antes da terapia com digoxina, a taquiarritmia foi episódica e s frequência ventricular raramente excedeu 190 batimentos/min.

No caso aqui relatado, a terapia com digoxina foi suficiente para controlar a frequência cardíaca fetal, reduzir a ascite fetal e manter o líquido amniótico dentro da normalidade, apesar da onda diastólica reversa do ducto venoso, indicando insuficiência cardíaca leve. Finalmente, às 34 semanas de gestação o feto passou a não responder à terapia com digoxina e decidimos interromper a gravidez para evitar uma maior deterioração cardíaca fetal.

Em conclusão, relatamos um caso de TJE fetal complicada, com terapia fetal transplacentária com digoxina. A gestão perinatal da arritmia fetal é importante para melhorar o resultado do feto afetado. Um diagnóstico pré-natal preciso é crucial para a seleção dos tratamentos pré-natal e pós-natal adequados. A TJE fetal é uma condição rara e o diagnóstico pré-natal continua sendo um desafio, no entanto o diagnóstico diferencial de taquiarritmia fetal deve incluir esse distúrbio.

Potencial Conflito de Interesses

Declaro não haver conflito de interesses pertinentes.

Fontes de Financiamento

O presente estudo não teve fontes de financiamento externas.

Vinculação Acadêmica

Não há vinculação deste estudo a programas de pós-graduação.

Artigo recebido em 12/11/11; revisado em 12/11/11; aceito em 09/04/12.

  • 1. Simpson JM, Sharland GK. Fetal tachycardias: management and outcome of 127 consecutive cases. Heart. 1998;79(6):576-81.
  • 2. Simpson LL. Fetal supraventricular tachycardias: diagnosis and management. Semin Perinatol. 2000;24(5):360-72.
  • 3. Boldt T, Eronen M, Andersson S. Long-term outcome in fetuses with cardiac arrhythmias. Obstet Gynecol. 2003;102(6):1372-9.
  • 4. Maeno Y, Hirose A, Karibe T, Hori D. Fetal arrhythmia: prenatal diagnosis and perinatal management. J Obstet Gynaecol Res. 2009;35(4):623-9.
  • 5. Api O, Carvalho JS. Fetal dysrhythmias. Best Pract Res Clin Obstet Gynaecol. 2008,22(1):31-48.
  • 6. Villain E, Vetter VL, Garcia JM, Herre J, Cifarelli A, Garson A Jr. Evolving concepts in the management of congenital junctional ectopic tachycardia: a multicenter study. Circulation. 1990;81(5):1544-9.
  • 7. Villazon E, Fouron JC, Fournier A, Proulx F. Prenatal diagnosis of junctional ectopic tachycardia. Pediatr Cardiol. 2001;22(2):160-2.
  • 8. Ishikawa K, Kikuchi A, Matsui H, Tamaru S, Imada S, Horikoshi T, et al. Transplacental fetal therapy for junctional ectopic tachycardia. J Clin Ultrasound. 2012;40(2):119-23.
  • 9. Jaeggi ET, Carvalho JS, De Groot E, Api O, Clur SA, Rammeloo L, et al. Comparison of transplacental treatment of fetal supraventricular tachyarrythmias with digoxin, flecainide, and sotalol: results of a nonrandomized multicenter study. Circulation. 2011;124(16):1747-54.
  • 10. Strasburger JF, Cuneo BF, Michon MM, Gotteiner NL, Deal BJ, McGregor SN, et al. Amiodarone therapy for drug-refractory fetal tachycardia. Circulation. 2004;109(3):375-9.
  • Correspondência:

    Guillermo Antiñolo
    UGC de Genética, Reproducción y Medicina Fetal. Hospital Universitario Virgen del Rocio
    Avenida Manuel Siurot, s/n
    CEP 41013 - Sevilla, Spain
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      30 Out 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2012
    Sociedade Brasileira de Cardiologia - SBC Avenida Marechal Câmara, 160, sala: 330, Centro, CEP: 20020-907, (21) 3478-2700 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil, Fax: +55 21 3478-2770 - São Paulo - SP - Brazil
    E-mail: revista@cardiol.br