Resumos
RACIONAL:
O câncer de pâncreas apresenta alta taxa de mortalidade por conta do diagnóstico tardio e comportamento agressivo. O prognóstico é reservado com sobrevida de cinco anos em menos de 5% dos casos.
OBJETIVO:
Analisar as características demográficas, as comorbidades, o tipo de procedimento e as intercorrências pós-operatórias precoces dos pacientes de câncer de pâncreas submetidos ao tratamento cirúrgico.
MÉTODOS:
Estudo transversal, que analisou 28 prontuários de pacientes portadores de tumores malignos do pâncreas, no período de 62 meses. A coleta de dados foi realizada a partir dos prontuários médicos do hospital.
RESULTADOS:
Do total de participantes 53,6% eram do sexo masculino. A média de idade foi de 60,25 anos. Em relação ao procedimento, 53,6% foram submetidos à duodenopancreactectomia e o restante à derivação biliodigestiva ou pancreatectomia corpo-caudal. O adenocarcinoma ductal ocorreu em 82,1% e 92,9% dos tumores estavam localizados na cabeça do pâncreas. As complicações pós-operatórias precoces ocorreram em 64,3%, e a mais prevalente foi abscesso intra-abdominal (32,1%). Entre as duodenopancreatectomias, 77,8% apresentaram complicações pós-operatórias precoces.
CONCLUSÃO:
Há necessidade de se incentivar a detecção precoce dos tumores de pâncreas para que se consiga realizar mais operações com intenção curativa. Também, é necessário o aprimoramento das técnicas operatórias e das equipes cirúrgicas para que as complicações pós-operatórias e a morbimortalidade operatória diminuam ao longo do tempo.
Neoplasias pancreáticas; Complicacões pós-operatórias; Duodenopancreactectomia
BACKGROUND:
Pancreatic cancer has a high mortality rate due to late diagnosis and aggressive behavior. The prognosis is poor, with 5-year survival occurring in less than 5% of cases.
AIM:
To analyze demographic characteristics, comorbidities, type of procedure and early postoperative complications of patients with pancreatic cancer submitted to surgical treatment.
METHODS:
Cross-sectional study with analysis of 28 medical records of patients with malignant tumors of the pancreas in a 62 month. Data collection was performed from the medical records of the hospital.
RESULTS:
Of the total, 53,6% were male and the mean age was 60.25 years. According to the procedure, 53,6% was submitted to duodenopancreactectomy the remainder to biliodigestive derivation or distal pancreatectomy. The ductal adenocarcinoma occurred in 82,1% and 92,9% of tumors were located in the pancreatic head. Early postoperative complications occurred in 64,3% of cases and the most prevalent was intra-abdominal abscess (32,1%). Among duodenopancreactectomies 77,8% had early postoperative complications.
CONCLUSION:
Its necessary to encourage early detection of tumors of the pancreas to raise the number operations with curative intent. Refinements in surgical techniques and surgical teams can diminish postoperative complications and, so, operative morbimortality can also decrease over time.
Pancreatic neoplasms; Postoperative complications; Duodenopancreactectomy
INTRODUÇÃO
A incidência de câncer de pâncreas em homens é de 13,6 por 100.000, e em mulheres, de
10,7 por 100.000 nos Estados Unidos1313. Howlader N, Noone AM, Krapcho M, Neyman N, Aminou R, Waldron W,
Altekruse SF, Kosary CL, Ruhl J, Tatalovich Z, Cho H, Mariotto A, Eisner MP, Lewis
DR, Chen HS, Feuer EJ, Cronin KA, Edwards BK (eds). SEER Cancer Statistics Review,
1975-2008, National Cancer Institute. Bethesda, MD, based on November 2010 SEER data
submission, posted to the SEER web site, 2011. [acesso 2011 Nov 06]. Disponível em:
http://seer.cancer.gov/csr/1975_2005/
http://seer.cancer.gov/csr/1975_2005/...
. No
Brasil, é responsável por cerca de 2% de todos os tipos de câncer diagnosticados e
por 4% do total de mortes por essa doença44. Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Instituto
Nacional de Câncer. Coordenação de Prevenção e Vigilância de Câncer. Estimativas
2008: Incidência de Câncer no Brasil. Rio de Janeiro: INCA; 2007. 94p. [acesso 2011
Nov 07]. Disponível em:
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/estimativa_incidencia_cancer_2008.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
. O
prognóstico é reservado, com sobrevida de cinco anos em menos de 5% dos casos77. Dragovich T, Harris JE. Pancreatic cancer. Updated: Sep 13, 2011.
[acesso 2011 Nov 07]. Disponível em:
http://emedicine.medscape.com/article/280605-overview
http://emedicine.medscape.com/article/28...
.
O adenocarcinoma ductal localiza-se preferencialmente na cabeça (47-65%) seguida do
corpo e da cauda (15% e 18%)88. Eloubeidi MA, Desmond RA, Wilcox CM, Wilson RJ, Manchikalapati P,
Fouad MM, Eltoum I, Vickers SM. Prognostic factors for survival in pancreatic cancer:
a population-based study. Am J Surg. 2006;192(3):322-9.. O tratamento de
escolha é o cirúrgico1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
, apesar de que nem
todos os pacientes serem candidatos a esse tipo de tratamento, cujas complicações
pós-operatórias ocorrem em cerca de 33,6% e as infecções são as causas mais comuns
(13,8%), seguidas de derrame pleural em 9,8%1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
.
Há muito tempo os portadores de câncer de pâncreas são estudados e observados, e os
estudos relatam a doença está em crescente incidência3030. Winter JM, Brennan MF, Tang LH, D'Angelica MI, Dematteo RP, Fong Y,
Klimstra DS, Jarnagin WR, Allen PJ. Survival after Resection of Pancreatic
Adenocarcinoma: Results from a Single Institution over Three Decades. Ann Surg Oncol
[Internet]. 2011 Julho [Acesso em 2011 Ago 30];1900-3. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21761104
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21761...
,
1717. Lefebvre AC, Maurel J, Boutreux S, Bouvier V, Reimund JM, Launoy G,
Arsene D. Pancreatic cancer: incidence, treatment and survival trends--1175 cases in
Calvados (France) from 1978 to 2002. Gastroenterol Clin Biol.
2009;33(10-11):1045-51.
. Contudo, também existe estudo mostrando sua redução2222. Luke C, Price T, Karapetis C, Singhal N, Roder D. Pancreatic cancer
epidemiology and survival in an Australian population. Asian Pac J Cancer Prev.
2009;10(3):369-74.. De qualquer forma, ele possui prognóstico
sombrio1010. Gupta S, Wang F, Holly EA, Bracci PM. Risk of pancreatic cancer by
alcohol dose, duration, and pattern of consumption, including binge drinking: a
population- based study. Cancer Causes Control. 2010;21(7):1047-59., mas com aumento da sobrevida em
longo prazo2222. Luke C, Price T, Karapetis C, Singhal N, Roder D. Pancreatic cancer
epidemiology and survival in an Australian population. Asian Pac J Cancer Prev.
2009;10(3):369-74.
,
3030. Winter JM, Brennan MF, Tang LH, D'Angelica MI, Dematteo RP, Fong Y,
Klimstra DS, Jarnagin WR, Allen PJ. Survival after Resection of Pancreatic
Adenocarcinoma: Results from a Single Institution over Three Decades. Ann Surg Oncol
[Internet]. 2011 Julho [Acesso em 2011 Ago 30];1900-3. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21761104
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21761...
,
66. Cronin-Fenton DP, Erichsen R, Mortensen FV, Dikinis S, Norgaard M,
Jacobsen J. Pancreatic cancer survival in central and northern Denmark from 1998
through 2009: a population-based cohort study. Clin. 2011; 3(Suppl 1):19-25. .
Assim, o objetivo deste estudo foi o de apresentar as características demográficas, comorbidades, o tipo de procedimento e as intercorrências pós-operatórias precoces dos pacientes de câncer de pâncreas submetidos ao tratamento cirúrgico.
MÉTODOS
É estudo do tipo transversal realizado no Serviço de Cirurgia Geral do Hospital Governador Celso Ramos, Florianópolis, SC, Brasil e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa do hospital.
Foi realizado censo de 28 prontuários de pacientes portadores de tumores pancreáticos, submetidos a tratamento cirúrgico, entre janeiro de 2008 até fevereiro de 2013. Os prontuários foram obtidos no Serviço de Arquivo Médico, bem como no arquivo eletrônico do hospital. Os dados foram registrados em instrumento de coleta de dados construído exclusivamente para esse estudo, contndo variáveis biológicas, clínicas, das características tumorais e pós-operatórias.
Foram incluídos todos os prontuários de pacientes portadores de câncer de pâncreas submetidos a algum tipo de tratamento cirúrgico e excluídos aqueles cuja descrição cirúrgica tratou de carcinomatose peritoneal e os com dados insuficientes no prontuário.
Os resultados foram digitados no programa Microsoft Excel (OU Epi-DATA) e exportados para o programa Statistical Package for the Social Sciences (SPSS) 16.0. Foram analisados e descritos sob a forma de frequência relativa e absoluta. O teste do qui-quadrado ou o exato de Fisher foram utilizados para testar a homogeneidade de proporções. O nível de significância estabelecido foi de valor de p<0,05.
RESULTADOS
Foram analisados os prontuários de 28 pacientes. Deles, 15 (53,6%) eram homens. A média de idade foi de 60,25 anos (39-89). O peso variou entre 44 e 90 kg, com a média de 64,8 kg. Foram estudados três tipos de procedimentos cirúrgicos.
A maioria dos pacientes (53,6%) foi submetida à duodenopancreatectomia. A derivação biliodigestiva, para tratamento paliativo, foi realizada em 39,3%. Nos dois grupos a neoplasia estava localizada na cabeça do pâncreas. Em 7,1% dos pacientes foi realizado pancreatectomia corpo-caudal, já que a localização da neoplasia era em corpo/cauda.
Foram estudados, como comorbidades dos participantes, tabagismo, diabete melito, alcoolismo e hipertensão arterial sistêmica (Tabela 1).
As características tumorais analisadas foram tipo histológico, localização estadiamento T e estadiamento linfonodal N (Tabela 2).
Foram coletados os valores do marcador tumoral CA 19-9 em 24 pacientes. A análise mostrou que 50% dos pacientes possuíam valor ≤37 U/ml; 20,8% entre 37,1 e 369,9 U/ml; 29,2 ≥ 370 U/ml, e 14,2% não possuíam informações sobre o marcador nos prontuários. Os valores variaram entre 1,2 a 84476,5 U/ml.
A complicação cirúrgica precoce mais frequente foi o abscesso intra-abdominal (32,1%), seguido de retardo do esvaziamento gástrico (25,0%) e fístula pancreática (21,4%). Entre pacientes que realizaram duodenopancreatectomia, quatro apresentaram fístula pancreática e dois fístula pancreática e biliar. Reintervenção cirúrgica, por algum tipo de complicação pós-operatória precoce, ocorreu em cinco pacientes. As complicações não-cirúrgicas precoces que mais se destacaram foram a respiratória (50,0%) - pneumonia e insuficiência respiratória -, seguida das cardiológicas - infarto agudo do miocárdio e fibrilação atrial - e renais - hipopotassemia e acidose metabólica (Tabela 3).
Os pacientes masculinos apresentaram 55,6% do total das complicações pós-operatórias precoces. Os diabéticos tiveram 44,4% de complicações, e os fumantes 33,3% (Tabela 4).
Entre os participantes com o estadiamento T3, 35,4% apresentaram complicações, dos T4, apenas 17,6% apresentaram complicações, dos T1 e T2, todos apresentaram complicações pós-operatórias precoces. Ocorreu associação estatisticamente significativa entre o tamanho do tumor e todas as complicações pós-operatórias precoces (p=0,018) (Tabela 5).
Associação entre as características tumorais com as complicações pós-operatórias precoces
Entre as duodenopancreatectomias, 77,8% apresentaram complicações; as derivações biliodigestivas, 16,7%, e as pancreatectomias corpo-caudal, 5,6%.
Diabete melito esteve associada com as seguintes intercorrências pós-operatórias: fístulas (os três tipos estudados), infecções (sepse, infecção da ferida operatória e abcesso intra-abdominal), retardo no esvaziamento gástrico e complicação renal. O tabagismo associou-se com reintervenção cirúrgica, fístulas e complicação respiratória, e asma com fístulas (Tabela 6).
DISCUSSÃO
O câncer de pâncreas tem prevalência maior em homens1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
,
1717. Lefebvre AC, Maurel J, Boutreux S, Bouvier V, Reimund JM, Launoy G,
Arsene D. Pancreatic cancer: incidence, treatment and survival trends--1175 cases in
Calvados (France) from 1978 to 2002. Gastroenterol Clin Biol.
2009;33(10-11):1045-51.
,
2222. Luke C, Price T, Karapetis C, Singhal N, Roder D. Pancreatic cancer
epidemiology and survival in an Australian population. Asian Pac J Cancer Prev.
2009;10(3):369-74.. Lowenfels e Maisonneuve atribuem-na,
provavelmente pela diferença entre fumantes, maior no masculino. Esta diferença tende
a desaparecer pelo aumento do tabagismo entre as mulheres2020. Lowenfels AB, Maisonneuve P. Epidemiology of pancreatic cancer. In
Beger HG, Matsuno S, Cameron JL. Diseases of the pancreas: current surgical therapy.
Germany: ed. Springer-Verlag Berlin Heidelberg; 2008:489-94. ou pela tendência de as mulheres viverem mais que os
homens1717. Lefebvre AC, Maurel J, Boutreux S, Bouvier V, Reimund JM, Launoy G,
Arsene D. Pancreatic cancer: incidence, treatment and survival trends--1175 cases in
Calvados (France) from 1978 to 2002. Gastroenterol Clin Biol.
2009;33(10-11):1045-51.
,
99. Guarita DR, Felga GEG, Cunha JEM, Rocha MS. Tumores do pâncreas. In
Autores. Clínica médica, vol 4: doenças do aparelho digestivo, nutrição e doenças
nutricionais. SP - Barueri: ed. Manole; 2009.. Vários autores apontam que a prevalência de
idade dos pacientes com câncer de pâncreas é acima de 60 anos1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
,
2222. Luke C, Price T, Karapetis C, Singhal N, Roder D. Pancreatic cancer
epidemiology and survival in an Australian population. Asian Pac J Cancer Prev.
2009;10(3):369-74.
,
1818. Lermite E, Pessaux P, Teyssedou C, Etienne S, Brehant O, Arnaud JP.
Effect of preoperative endoscopic biliary drainage on infectious morbidity after
pancreatoduodenectomy: a case- control study. Am J Surg.
2008;195(4):442-6.
,
1111. Hartwig W, Hackert T, Hinz U, Gluth A, Bergmann F, Strobel O,
Büchler MW, Werner J. Pancreatic Cancer Surgery in the New Millennium Better
Prediction of Outcome. Ann Surg. 2011;254(2):311-9.. Rocha et al.
2626. Rocha LCG, Queiroz FL, Eudes Magalha~es EA, Santos FAV, Caldeira
DAM, Ribas MA. Duodenopancreatectomia: Avaliação dos resultados em 41 pacientes. Rev.
Col. Bras. Cir. 2006;33(6):387-92. , analisando pacientes em Belo Horizonte,
encontraram a média 59 anos, coincidindo no Brasil as tendências mundiais.
Os pacientes submetidos à duodenopancreatectomia estavam até no estadiamento
II-B2929. Union for International Cancer Control - UICC. TNM Classification of
Malignant Tumours -7th ed. 2010. [acesso em: 2012 Mar 15]. Disponível em:
http://www.uicc.org/resources/tnm
http://www.uicc.org/resources/tnm...
, e o T3N1M0 ocorreu com mais
frequência. Quando se estadiou o tumor isoladamente, constatou-se que a maioria
(38,5%) estava agrupada no estadiamento T4. Entretanto, quando se analisou o
procedimento cirúrgico, constatou-se que a maioria dos pacientes foi submetida à
duodenopancreatectomia, pois estavam nos estadiamentos de T1 a T3, ou seja, a soma
total dos tumores estadiados em T1 a T3 foi maior que os estadiados em T4
isoladamente, justificando o porquê da duodenopancreatectomia como procedimento
cirúrgico prevalente, neste estudo, e não de procedimento cirúrgico paliativo. Tal
dado está de acordo com outros estudos1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
,
1111. Hartwig W, Hackert T, Hinz U, Gluth A, Bergmann F, Strobel O,
Büchler MW, Werner J. Pancreatic Cancer Surgery in the New Millennium Better
Prediction of Outcome. Ann Surg. 2011;254(2):311-9., que recomendam a ressecção até o
estadiamento II-B. Contudo, Lefebvre et al.
1717. Lefebvre AC, Maurel J, Boutreux S, Bouvier V, Reimund JM, Launoy G,
Arsene D. Pancreatic cancer: incidence, treatment and survival trends--1175 cases in
Calvados (France) from 1978 to 2002. Gastroenterol Clin Biol.
2009;33(10-11):1045-51. e Abraham et al.
11. Abraham A, Al-Refaie WB, Parsons HM, Dudeja V, Vickers SM, Habermann
EB. Disparities in Pancreas Cancer Care. Ann Surg Oncol [Internet]. 2013 Abril
[acesso em 2013 Maio 15];10434-012. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23579872
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/23579...
demonstraram possibilidade semelhante de
operação curativa em seus estudos, em torno de 11%.
O tabagismo é considerado responsável por cerca de 20-30% das neoplasias pancreáticas da população ocidental1616. La Torre G, de Waure C, Specchia ML, Nicolotti N, Capizzi S, Bilotta A, Clemente G, Ricciardi W. Does quality of observational studies affect the results of meta-analysis? The case of cigarette smoking and pancreatic cancer. Pancreas. 2009 Apr;38(3):241-7. . Lowenfels et al. 2121. Lowenfels AB, Maisonneuve P, Whitcomb DC, Lerch MM, DiMagno EP. Cigarette smoking as a risk factor for pancreatic cancer in patients with hereditary pancreatitis. JAMA. 2001 Jul 11;286(2):169-70. demonstraram que fumantes desenvolveram câncer pancreático entre três e nove anos antes dos não-fumantes. A população tabagista tem risco 70% maior de malignidade pancreática que a não-tabagista. Não fumar ou cessar o tabagismo é considerado fator preventivo2121. Lowenfels AB, Maisonneuve P, Whitcomb DC, Lerch MM, DiMagno EP. Cigarette smoking as a risk factor for pancreatic cancer in patients with hereditary pancreatitis. JAMA. 2001 Jul 11;286(2):169-70. , 2525. Muscat JE, Stellman SD, Hoffmann D, Wynder EL. Smoking and pancreatic cancer in men and women. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 1997;6(1):15-9..
A incidência de diabete melito está aumentada em pacientes com câncer pancreático, mas a relação entre ele e câncer é controversa. Alguns estudos indicam que o diabete é fator de risco para o desenvolvimento de câncer no pâncreas, enquanto outros argumentam que ele pode ser manifestação do próprio câncer. Liao et al. 1919. Liao KF, Lai SW, Li CI, Chen WC. Diabetes mellitus correlates with increased risk of pancreatic cancer: A population-based cohort study in Taiwan. J Gastroenterol Hepatol. 2012;27(4):709-13. demonstraram que pacientes diabéticos com diagnóstico de menos de dois anos possuem incidência aumentada para câncer de pâncreas; todavia, os pacientes com diagnóstico acima desse tempo não apresentaram diferença significativa. Chiari et al. 55. Chari ST, Leibson CL, Rabe KG, Timmons LJ, Ransom J, de Andrade M, Petersen GM. Pancreatic cancer-associated diabetes mellitus: prevalence and temporal association with diagnosis of cancer. Gastroenterology. 2008;134(1):95-101. observou que o diabete melito pode ser manifestação precoce do câncer de pâncreas em vez de um fator de risco.
Os participantes alcoolistas no pré-operatório consistiam de 1/4 do total, mas não existiam registros mencionando a quantidade de bebida alcoólica ingerida. A Agência Internacional de Pesquisa em Câncer publicou monografia sobre a avaliação dos riscos cancerígenos para os seres humanos e concluiu que não havia provas suficientes para atribuir o risco do álcool ao desenvolvimento do câncer do pâncreas2727. Secretan B, Straif K, Baan R, Grosse Y, El Ghissassi F, Bouvard V, Benbrahim-Tallaa L, Guha N, Freeman C, Galichet L, Cogliano C. A review of human carcinogens-Part E: tobacco, areca nut, alcohol, coal smoke, and salted fish. Lancet Oncol. 2009;10(11):1033-4. . No entanto, Gupta et al. 1010. Gupta S, Wang F, Holly EA, Bracci PM. Risk of pancreatic cancer by alcohol dose, duration, and pattern of consumption, including binge drinking: a population- based study. Cancer Causes Control. 2010;21(7):1047-59. sustentam a ocorrência do câncer pancreático no subgrupo de pacientes com consumo excessivo de álcool, independente do tabagismo.
Estudos comprovam a maior incidência de adenocarcinoma em relação aos outros tipos histológicos22. Amico EC, Alves JR, João SA, Guimarães PL, Barreto EJ, Barreto LS, Costa PR, Medeiros JA. Complications after pancreatectomies: prospective study after ISGFP and ISGPS new classifications. Arq Bras Cir Dig. 2013 Jul-Sep;26(3):213-8. e a localização na cabeça do pâncreas88. Eloubeidi MA, Desmond RA, Wilcox CM, Wilson RJ, Manchikalapati P, Fouad MM, Eltoum I, Vickers SM. Prognostic factors for survival in pancreatic cancer: a population-based study. Am J Surg. 2006;192(3):322-9. , 1717. Lefebvre AC, Maurel J, Boutreux S, Bouvier V, Reimund JM, Launoy G, Arsene D. Pancreatic cancer: incidence, treatment and survival trends--1175 cases in Calvados (France) from 1978 to 2002. Gastroenterol Clin Biol. 2009;33(10-11):1045-51. , 1111. Hartwig W, Hackert T, Hinz U, Gluth A, Bergmann F, Strobel O, Büchler MW, Werner J. Pancreatic Cancer Surgery in the New Millennium Better Prediction of Outcome. Ann Surg. 2011;254(2):311-9..
O marcador tumoral mais comumente utilizado no diagnóstico e prognóstico do câncer de pâncreas exócrino é o carboidrato antigênico associado ao tumor (CA 19-9). Cerca de 70-90% dos pacientes com câncer de pâncreas irão expressar este marcador e a sensibilidade está relacionada ao estadiamento2525. Muscat JE, Stellman SD, Hoffmann D, Wynder EL. Smoking and pancreatic cancer in men and women. Cancer Epidemiol Biomarkers Prev. 1997;6(1):15-9.. Não é incomum encontrar pacientes com tumores pequenos e com valores normais de CA19-9. Estima-se que o marcador esteja elevado em apenas metade dos pacientes com tumores de 2 cm ou menos33. Beger HG, Matsuno S, Cameron JL. Diseases of the Pancreas - Current Surgical Therapy. Berlin: Springer, 2008.. Kim et al. 1515. Kim HJ, Kim MH, Myung SJ, Lim BC, Park ET, Yoo KS, Seo DW, Lee SK, Min YI. A new strategy for the application of CA19-9 in the differentiation of pancreaticobiliary cancer: analysis using a receiver operating characteristic curve. Am J Gastroenterol. 1999;94(7):1941-6. constataram que, em valor de corte de 37 U/ml, a sensibilidade e especificidade foram de 76,7% e 87,1%, respectivamente. Pacientes com níveis muito elevados de CA19-9 (maior de 1000 U/ml) têm alta probabilidade de irressecabilidade cirúrgica33. Beger HG, Matsuno S, Cameron JL. Diseases of the Pancreas - Current Surgical Therapy. Berlin: Springer, 2008..
Lermite et al. 1818. Lermite E, Pessaux P, Teyssedou C, Etienne S, Brehant O, Arnaud JP. Effect of preoperative endoscopic biliary drainage on infectious morbidity after pancreatoduodenectomy: a case- control study. Am J Surg. 2008;195(4):442-6. afirmaram que os abscessos intra-abdominais estão frequentemente associados à fístula pancreática e biliar. A suspeita diagnóstica da fístula pode ser feita por dados clínicos e confirmada por métodos bioquímicos e de imagem. No presente estudo, o diagnóstico desta intercorrência foi baseado apenas em observação clínica, pois, conforme os registros de prontuário, não se mencionava o método utilizado para confirmação diagnóstica, apenas a presença ou não da complicação. Portanto, para o diagnóstico de fístula considerou-se o aspecto do líquido drenado; exceto em poucos casos em que se dosou a amilase no líquido drenado, nenhum exame laboratorial ou de imagem foi utilizado para estudá-la. Considerou-se fístula digestiva aquela cujo aspecto do líquido era de secreção gastrintestinal; fístula biliar, aquela cujo líquido apresentavam coloração amarelo-ouro e pancreática a de líquido com aspecto cristalino.
Fístula pancreática ocorre entre 10-15% dos pacientes submetidos à
duodenopancreatectomia, de acordo com Lermite et al.
1818. Lermite E, Pessaux P, Teyssedou C, Etienne S, Brehant O, Arnaud JP.
Effect of preoperative endoscopic biliary drainage on infectious morbidity after
pancreatoduodenectomy: a case- control study. Am J Surg.
2008;195(4):442-6.. Porém, como esta complicação depende de
vários fatores, há autores que apontam índices menores. Kamphues et
al.
1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
encontraram-na em 1,4% de 442 pacientes
operados e Amico et al.2
2. Amico EC, Alves JR, João SA, Guimarães PL, Barreto EJ, Barreto LS,
Costa PR, Medeiros JA. Complications after pancreatectomies: prospective study after
ISGFP and ISGPS new classifications. Arq Bras Cir Dig. 2013
Jul-Sep;26(3):213-8.encontraram em 50% de 54 pacientes operados. Dentre os fatores locais
relacionados à gênese da fistula pancreática, a consistência do pâncreas remanescente
e o calibre do ducto pancreático merecem destaque. A avaliação subjetiva da maior
consistência do pâncreas, associada à dilatação ductal, contribuiria para menor
ocorrência da fístula pancreática2323. Matheus AS, Montagnini AL, Jukemura J, Jurendini R, Penteado S, Abdo
EE, Cunha JEM. Risk factors for pancreatic fistula. Does it have a clinical
application for early identification of patients with high risk to develop pancreatic
fistula after pancreaticoduodenectomy? . Gastroenterol 2006;130(4)
supl2.. No estudo
em discussão, não se relacionou esta complicação nem com a consistência da glândula
(amolecida, normal ou endurecida) nem com o tipo de anastomose utilizada (ductomucosa
ou por telescopagem do coto pancreático).
Retardo do esvaziamento gástrico, por definição, é estase gástrica persistente que necessita de sondagem nasogástrica por mais de 10 dias ou a incapacidade de tolerar alimento sólido até o 14º dia de pós-operatório. Vários fatores estão relacionados ao aparecimento desta complicação, destacando-se as oprações abdominais prévias, o diabete, a desnutrição e as complicações intra-abdominais pós-operatória1212. Henegouwen MB, van Gulik TM, DeWit LT, Allema JH, Rauws EAJ, Obertop H, Gouma DJ. Delayed gastric emptying after standard pancreaticoduodenectomy versus pylorus-preserving pancreaticoduodenectomy: an analysis of 200 consecutive patients. J Am Coll Surg. 1997;185(4):388-95..
De acordo com Kamphues et al.
1414. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
, a complicação não-cirúrgica mais
prevalente foi a cardiopulmonar em 12,4% dos pacientes submetidos à
duodenopancreatectomia, e a reintervenção cirúrgica ocorreu em 10,3% dos casos. Já no
estudo de Rocha et al.
2626. Rocha LCG, Queiroz FL, Eudes Magalha~es EA, Santos FAV, Caldeira
DAM, Ribas MA. Duodenopancreatectomia: Avaliação dos resultados em 41 pacientes. Rev.
Col. Bras. Cir. 2006;33(6):387-92. , a complicação não-cirúrgica que mais
aconteceu foi a pneumonia (12,2%) junto com a infecção da ferida operatória (12,2%).
No atual estudo, o total de complicações pós-operatórias precoces foi de 64,3%. Esse
dado está em desacordo com Kamphues et al.
14 14. Kamphues C, Bova R, Schricke D, Hippler-Benscheidt M, Klauschen F,
Stenzinger A, Seehofer D, Glanemann M, Neuhaus P, Bahra M. Postoperative
Complications Deteriorate Long-Term Outcome in Pancreatic Cancer Patients. Ann Surg
Oncol [Internet] . 2011 Abril [acesso em 2011 Ago 30]; 2041-4. Disponível em:
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879265
http://www.ncbi.nlm.nih.gov/pubmed/21879...
e de acordo com Rocha et
al.
2626. Rocha LCG, Queiroz FL, Eudes Magalha~es EA, Santos FAV, Caldeira
DAM, Ribas MA. Duodenopancreatectomia: Avaliação dos resultados em 41 pacientes. Rev.
Col. Bras. Cir. 2006;33(6):387-92. , que obtiveram respectivamente 33,6% e 58%
de total de complicações. No estudo em discussão, 77,8% dos pacientes, que
submeteram-se à duodenopancreatectomia, apresentaram complicações precoces no
pós-operatório; entre os que realizaram derivação biliodigestiva apenas 16,7%; e o
restante que realizou pancreatectomia corpo-caudal, 5,6%. Teoricamente espera-se
encontrar complicações em frequência maior nos pacientes submetidos à
duodenopancreatectomia, quando comparados com os que realizaram pancreatectomia
corpo-caudal. No primeiro caso, o procedimento é tecnicamente mais complexo
resultando em tempo operatório maior e eventual necessidade de transfusão sanguínea.
No caso em tela, o número de pacientes com tumor de corpo e cauda foi excessivamente
menor, quando comparado aos com tumor de cabeça de pâncreas (pela própria frequência
da localização dos tumores malignos no pâncreas) e, por consequência, a
pancreatectomia corpo caudal foi realizada poucas vezes; talvez um número maior deste
procedimento pudesse diminuir tal diferença. Explicação semelhante pode ser atribuída
aos casos em que os pacientes foram submetidos à derivação biliodigestiva.
CONCLUSÃO
Há necessidade de se incentivar a detecção precoce dos tumores de pâncreas para que se consiga realizar mais operações com intenção curativa. Também, é necessário o aprimoramento das técnicas operatórias e das equipes cirúrgicas para que as complicações pós-operatórias e a morbimortalidade operatória diminuam ao longo do tempo.
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Fonte de financiamento: não há
Datas de Publicação
-
Publicação nesta coleção
Nov-Dec 2014
Histórico
-
Recebido
25 Mar 2014 -
Aceito
26 Jun 2014