Acessibilidade / Reportar erro

Questões enfrentadas pela dermatologia nos Estados Unidos

ARTIGO ESPECIAL

Questões enfrentadas pela dermatologia nos Estados Unidos

Bruce H. Thiers

MD, Professor and Chairman Department of Dermatology

Endereço para correspondência Endereço para correspondência: Bruce H. Thiers, Medical University of SC 135 Rutledge Avenue; 11th floor PO Box 250578 Charleston, SC 29425 Phone: 1-843-792-5858 Fax: 1-843-792-9804 E-mail: thiersb@musc.edu

Durante meus quatro anos no Conselho Diretor da Academia Americana de Dermatologia (AAD) e dois anos como vice-presidente eleito e vicepresidente dessa instituição, tive a oportunidade de trabalhar com muitos líderes da Academia na identificação e tentativa de resolução de muitas questões importantes enfrentadas pela especialidade nos Estados Unidos. Neste texto, tento identificar 13 questões críticas da dermatologia e o progresso, ou não-avanço, verificado nos últimos anos. É bastante provável que muitos desses problemas não sejam peculiares aos Estados Unidos e sim vivenciados por dermatologistas do mundo todo.

O CONTINGENTE DE DERMATOLOGISTAS

A maioria concorda que há falta de dermatologistas nos Estados Unidos, e os pacientes com freqüência têm que esperar meses por uma consulta. A gravidade desse problema varia de região para região, sendo mais grave em áreas pobres, rurais, e menos sério nas cidades ricas e populosas. A falta de dermatologistas pode ser atribuída a vários fatores relacionados abaixo.

1. Número insuficiente de vagas para residência em dermatologia.

de 300 vagas por ano disponíveis para o treinamento de novos dermatologistas. Esse número permaneceu relativamente estável na última década apesar do aumento constante na demanda para serviços de dermatologia. Por que o número de vagas em residência em dermatologia não aumenta? Primeiro, essas vagas requerem verbas para pagamento do salário dos residentes, e, em última instância, os recursos vêm do governo americano, que reverte o dinheiro coletado do programa Medicare para pagamento de residentes em centros médicos acadêmicos. O governo americano e o Medicare estão com grandes déficits, o que impede o patrocínio de novas vagas de residências. Mais ainda, há tendência em favorecer verbas para vagas de residência em clínica geral, e não em especialidades, como dermatologia. A AAD tentou criar um mecanismo para fornecer verbas para vagas em residência de dermatologia que seriam parcialmente financiadas pela Academia e pela indústria. Essa iniciativa retrocedeu quando foi contestada por membros da Academia que, ainda que em minoria, tinham voz ativa.

2. Número crescente de mulheres trabalhando em dermatologia.

As mulheres formam percentagem cada vez maior entre os estudantes de medicina e residentes de dermatologia. Em função de obrigações familiares importantes, inclusive criação dos filhos, muitas delas são forçadas a trabalhar meio turno ou faltar por períodos prolongados, com freqüência durante os anos mais produtivos de suas carreiras. Assim, uma médica trabalhando em tempo parcial pode ocupar o lugar de um médico que trabalhe em uma equipe em tempo integral. O grande número de dermatologistas trabalhando parcialmente piora ainda mais a falta de médicos treinados para tratar doenças de pele.

3. Aposentadoria precoce de dermatologistas.

Muitos dermatologistas em franca atividade, desencantados pelo peso colocado sobre eles pelo managed care (discutido mais adiante), optam por se aposentar precocemente, o que tira muitos indivíduos capazes, altamente treinados, da força de trabalho em dermatologia. Conforme mencionado, esses médicos são substituídos por outros, incapazes de se envolver em tempo integral com o atendimento dos pacientes, pelo menos durante um período substancial de suas carreiras.

A falta de dermatologistas tem tido outros efeitos além de apenas os pacientes terem que esperar mais tempo para ver um médico: tem causado a invasão da dermatologia por médicos sem treinamento na especialidade, tais como clínicos gerais e outros especialistas. Qualquer profissional formado em Medicina pode exercer exclusivamente dermatologia, embora não se possa denominar especialista em dermatologia sem ter sido aprovado no exame do título de especialista do American Board of Dermatology (ABD). Dessa forma, agora temos muitos médicos de especialidades tão diversas como nefrologia e ginecologia/ obstetrícia fazendo escleroterapia, e clínicos gerais abrindo "centros de tratamento de doenças de pele" para atrair pacientes que não conseguem consulta com dermatologistas treinados. Muitos pacientes que procuram essas pessoas ignoram que elas não têm treinamento em dermatologia, e quaisquer erros ou tratamento inadequado que vivenciem geram uma mancha negra na especialidade como um todo. Mais ainda, muitos profissionais que seriam considerados "a extensão do médico";, tais como enfermeiros e auxiliares de médicos, hoje restringem seu exercício profissional à dermatologia. Ter pessoas tratadas por não-médicos menos treinados não é bom para a especialidade, tampouco para os pacientes.

A PERCEPÇÃO DA DERMATOLOGIA

Quem são os dermatologistas? A dermatologia tornou-se especialidade muito mais diversificada ao longo dos anos. Enquanto muitas pessoas, talvez corretamente, tenham considerado os dermatologistas médicos de verrugas e acne nas décadas de 1960 e 1970, a dermatologia hoje trata uma ampla gama de queixas clínicas, cirúrgicas e cosméticas. Alguns colegas incluem tudo isso em sua prática médica, enquanto outros se restringem simplesmente à dermatologia clínica, cirúrgica ou cosmética. Será que aqueles que fazem dermatologia clínica se sentem tão médicos quanto os colegas que tratam patologias internas mais graves? Aqueles de que fazem basicamente cirurgia dermatológica sentem que são iguais em habilidade e talento aos colegas de outras especialidades, tais como cirurgia plástica e otorrinolaringologia? E aqueles que exercem apenas dermatologia cosmética? são verdadeiramente médicos ou cosmiatras caros? Todos os anos de treinamento médico rigoroso foram desperdiçados neles? Deveriam ser treinadas pessoas que se especializam em dermatologia cosmética quando há enorme falta de dermatologistas clínicos e cirúrgicos? Quantos escolheram dermatologia porque realmente amam a especialidade e não porque a perceberam como caminho para uma "vida mole", sem plantões de 24 horas ou pacientes muitos doentes? Como os outros vêem os dermatologistas é importante. Como os dermatologistas se vêem é ainda mais importante.

RELAÇÕES INTERPROFISSIONAIS

É muito claro que a evolução da dermatologia para uma especialidade diferente gerou tensão nos relacionamentos com especialidades "concorrentes", como cirurgia plástica e otorrinolaringologia. Outras especialidades afirmam que o treinamento dermatológico não é tão rigoroso quanto o delas. Os dermatologistas afirmam que ninguém sabe mais sobre a pele do que eles. "Lutas campais"; se desencadearam entre as várias especialidades, que sentem que só elas são adequadamente treinadas para fazer um procedimento específico, por exemplo, lipoaspiração. Táticas políticas e administrativas têm sido usadas na tentativa de negar aos dermatologistas a possibilidade de fazer determinados procedimentos, seja em hospitais ou ambulatórios. Na sua maioria, com a ajuda da AAD, esses esforços têm fracassado, mas os profissionais devem continuar vigilantes. As mesmas questões geraram tensão entre a AAD e sociedades de subespecialidades, tais como a Sociedade Americana de Cirurgia Dermatológica (ASDS). Quem representa melhor os cirurgiões dermatológicos, a AAD ou a ASDS? Quem representa melhor a pesquisa em dermatologia, a AAD, a Sociedade de Dermatologia Investigativa (SID) ou a Fundação de Dermatologia? Quando se luta entre pares não há vencedores.

PESQUISA EM DERMATOLOGIA

A principal fonte de verbas para pesquisa em dermatologia nos Estados Unidos é formada pelos National Institutes of Health (NIH) [Institutos Nacionais de Saúde]. Em função de déficits governamentais maciços, é cada vez mais difícil conseguir verba dos NIH, e muitos projetos de pesquisa que mereceriam financiamento acabam não o obtendo. Com freqüência, a indústria, ou seja, as empresas farmacêuticas, tem preenchido esse espaço. Trata-se de benesse ou praga? Será que as melhores pesquisas estão recebendo verbas, ou só aquelas que irão resultar em um produto de mercado? A pesquisa financiada pela indústria não é tendenciosa? Os resultados das pesquisas têm sido apresentados de forma justa para os médicos e o público? Resultados negativos estão sendo publicados de forma apropriada, e os efeitos adversos devidamente documentados? Todas essas perguntas devem ser respondidas sempre que possam existir conflitos de interesse (também abordados adiante).

Mais recentemente, foi solicitado à AAD que patrocinasse projetos de pesquisa que param de receber ou não obtêm verbas governamentais. Isso é parte da missão da AAD? Se assim for, o conceito da AAD como instituição que patrocina pesquisa é novidade e irá demandar toda uma infra-estrutura nova dentro da organização para avaliar os méritos de vários pedidos de verbas.

RELAÇÕES COM A INDÚSTRIA/CONFLITOS DE INTERESSE

A questão de pesquisas com verbas vindas da indústria já foi discutida. Durante o processo de desenvolvimento do fármaco e após sua aprovação, muitas empresas farmacêuticas empregam dermatologistas como consultores e auxiliares de publicidade e comercialização de seus produtos. É fundamental que essas pessoas tragam a público esses conflitos de interesse quando apresentam os resultados em congressos ou os publicam em periódicos. Aqueles que os ouvem ou lêem devem estar cientes desses conflitos que, é claro, não significam que a apresentação ou trabalho sejam parciais. No entanto, existe o potencial para conclusões errôneas e deve ser comentado. De forma semelhante, dermatologistas em posições de liderança na AAD devem fornecer declaração detalhada de conflito de interesse quando exercerem qualquer posição influente na instituição.

A AAD recebe um valor substancial de verbas da indústria, grande parte sob forma de "doações irrestritas". A Academia deve garantir que esses financiadores não tenham influência na apresentação de informações científicas em seus encontros ou publicações. Com isso em mente, as políticas de conflito de interesses da Academia e as declarações de descobertas foram recentemente atualizadas.

QUESTÕES DE MANAGED CARE

Para alguns pacientes e médicos, a expressão managed care (atenção gerenciada), da forma como é usado nos Estados Unidos, mais adequadamente define negação de atendimento. Instituições de managed care, também chamadas organizações de manutenção da saúde, fornecem seguro saúde a baixo custo para seus associados. Com esse custo menor, vem a restrição ao credenciamento para os médicos e a redução de benefícios para os associados.

Em alguns contratos de managed care existe um quesito de "porteiro", exigindo que todo paciente que deseje ver um especialista primeiro obtenha encaminhamento do clínico geral. Essa é uma forma de acesso restrito, uma vez que o paciente não tem o direito de escolher o especialista com melhor treinamento para tratar seu problema. Quando o paciente chega efetivamente ao dermatologista, pode haver necessidade de autorização de procedimento. Por exemplo, o clínico geral pode encaminhar o paciente ao dermatologista, mas, se for necessária uma biópsia, pode ser preciso ter autorização adicional da seguradora. Então, num certo sentido, o managed care corta os custos e fornece obstáculos ao atendimento mais eficaz e, com freqüência, mais caro. Além disso, muitas empresas de managed care designam um número limitado de especialistas como seus "provedores preferenciais". Isso tem dois efeitos: pode fazer com que os pacientes esperem longamente por uma consulta com um especialista e dá às seguradoras poder de barganha, pelo qual elas designam como "provedores preferenciais" aqueles especialistas que oferecem seus serviços por menor preço. Infelizmente, o atendimento de menor preço nem sempre é o melhor, e esses médicos talvez não propiciem o cuidado mais eficaz.

Além disso, algumas empresas de managed care utilizam um processo chamado de capitação, em que pagam ao médico um valor anual para que dê atendimento a seus clientes. Se os clientes são na maioria pessoas jovens, saudáveis, que raramente vão a médicos, tais contratos são bastante lucrativos para o médico. Por outro lado, se os clientes são idosos e doentes, e precisam de muitas consultas demoradas, o custo para o médico prestar esse atendimento pode exceder substancialmente o pagamento vindo da seguradora. Assim, com capitação, o risco fica por conta do médico, não da empresa de managed care.

QUESTÕES DE REEMBOLSO

Esse tema foi discutido parcialmente acima. Existe um cabo-de-guerra constante entre médicos e seguradoras quanto ao reembolso apropriado. Os pacientes querem o melhor atendimento. As seguradoras estão interessadas em obter lucro. E os médicos estão interessados em manter sua renda. Esses objetivos são totalmente incompatíveis, a menos que haja uma discussão honesta das partes interessadas. A idéia de que os pacientes podem receber atendimento ilimitado e de alta qualidade e a baixo custo é uma fantasia. Ainda assim, muitos pacientes não querem arcar com parte do custo de tecnologias modernas de saúde, que, como sabemos, são muito caras. As seguradoras estão no negócio para obter lucro e, assim, querem racionar o atendimento para manter suas despesas em um patamar mínimo. Essa é uma batalha constante, cujo final não parece estar próximo.

O CUSTO DE MEDICAMENTOS PRESCRITOS

Em geral, o custo de medicamentos prescritos aumenta muito mais rápido do que a inflação. As margens de lucro das empresas farmacêuticas são invejadas pela indústria americana. O custo das drogas com freqüência é maior do que o da consulta. Uma vez que muitos pacientes não têm cobertura para medicamentos, doenças tratáveis permanecem sem terapêutica.

Tradicionalmente o preço dos fármacos é estabelecido com base no custo mais razoável margem de lucro. Os custos aumentaram muito nos últimos anos, em parte graças a investimentos incrivelmente altos em marketing por parte da maioria das empresas farmacêuticas. Essas empresas gastam milhões com a propaganda de seus produtos para os médicos. E a propaganda direta ao consumidor de medicamentos que necessitam receita (os americanos são bombardeados com propagandas dessas drogas na televisão) só piorou a situação. Mais recentemente, as empresas farmacêuticas abandonaram o estabelecimento de preço estilo "custo mais" em favor de uma abordagem mais abstrata que considera o "valor para a sociedade". Assim, uma empresa de biotecnologia com uma nova droga para estimular a medula óssea prega que a droga tornará a necessidade de transfusão algo do passado. O preço é 75 mil dólares por ano, basicamente o mesmo preço das transfusões. Outra empresa de biotecnologia tem uma droga para tratar degeneração ocular. O que as pessoas valorizam mais do que a visão? Poucas coisas. Assim, o preço da droga é 100 vezes superior ao de droga semelhante que a mesma empresa comercializa com outra indicação.

Com os preços de fármacos fora de controle, é de pensar que o governo protegeria o interesse público. Afinal, como maior comprador de atendimento médico (por intermédio do Medicare), o governo usou seu poder de barganha para reduzir ao mínimo o reembolso hospitalar e médico. Quando um novo plano Medicare para cobertura de medicamentos com receita entrou em vigor no início de 2006, muitos otimistas pensaram que o governo assumiria a mesma linha dura com as empresas farmacêuticas. Infelizmente, não foi assim. Por quê? As mesmas empresas contribuem pesadamente para campanhas políticas de deputados e senadores, e, assim, a legislação final para cobertura de medicamentos pelo Medicare foi redigida mais para proteger os interesses das empresas do que os do público. O resultado final foi um conjunto de regras e normas perdidamente confuso e mal concebido, que dá cobertura incompleta de medicamentos a alto custo, com aqueles que pagam impostos arcando com até 80% a mais por medicamentos comprados por esse plano do que por outros planos governamentais.

Their health insurance, treatable diseases may remain untreated.

Drugs traditionally have been priced based on cost plus a reasonable profit margin. Costs have increased markedly in recent years, due in large part to incredibly high marketing budgets at most pharmaceutical companies. These companies spend millions to market their products to physicians. Direct to consumer advertising of prescription drugs (Americans are bombarded with prescription drug advertising on television) has only made things worse. More recently, drug companies have abandoned the "cost plus"; pricing formula in favor of a more abstract "value to society"; approach. Hence, a biotech company with a new drug to stimulate the bone marrow claims the drug will make the need for transfusions a thing of the past. The price: $75,000 per year, about the same as the cost of transfusions. Another biotech company has a drug do treat macular degeneration. What does any person value more than his sight? Not much, so the drug is priced 100 times higher than a similar drug the same company already markets for another indication.

With drug prices out of control, one would think the government would step in to protect the public interest. After all, as the largest purchaser of healthcare (through its Medicare program), the government has used its bargaining power to reduce physician and hospital reimbursement to the bare minimum. When a new Medicare plan for prescription drug coverage went into effect early in 2006, many optimists thought that the government would take a similar hard line with the pharmaceutical companies. Unfortunately, this was not to be. Why? These same companies contribute heavily to the political campaigns of our congressmen and senators, and thus the final legislation for Medicare drug coverage was written more to protect the companies’ interests than the public interest. The final result was a poorly conceived, hopelessly confusing set of rules and regulations that provides incomplete drug coverage at a high cost, with taxpayers paying up to 80% more for drugs purchased under this plan than under other government health plans.

O RISCO DE LITÍGIO

O valor de seguro para má prática nos Estados Unidos subiu astronomicamente, resultado de grandes compensações judiciais para aquilo que a profissão médica percebia como pequenos erros do exercício médico. Há alguns anos, o nascimento de uma criança anormal era considerado um ato de Deus. Agora, é considerado falha do obstetra. Como resultado, cada vez mais obstetras estão abandonando a profissão, criando grave falta dessa especialidade em muitos lugares. Os estados em que as questões judiciais são mais graves estão vivenciando perda de médicos para outros estados cujo ambiente de trabalho é mais favorável. As especialidades com os seguros mais caros para má prática, tais como ginecologia/obstetrícia e neurocirurgia, encontram dificuldades para recrutar novos médicos. Essa é uma crise real nos Estados Unidos, para a qual se procura, geralmente sem sucesso, o apoio do governo.

QUESTÕES COM O FDA - FOOD AND DRUG ADMINISTRATION

A declaração de missão do FDA (http://www.fda.gov) afirma que "o FDA é responsável por proteger a saúde pública garantindo a segurança e eficácia de fármacos humanos e veterinários, produtos biológicos, dispositivos médicos, suprimento de alimentos da nação, cosméticos e produtos que emitam radiação. O FDA também é responsável pelo avanço da saúde pública ao ajudar a agilizar inovações que tornem os medicamentos e alimentos mais eficientes, seguros e economicamente acessíveis, e auxiliar o público a obter informações precisas, baseadas em ciência, de que ele necessita no uso de medicamentos e alimentos para melhorar sua saúde". Infelizmente, esses nobres objetivos têm sido prejudicados por forças políticas com determinada programação a ser levada adiante, e a controvérsia recente envolvendo o Vioxx® colocou o FDA na defensiva. Assim, temos programas tais como o iPledge para rastrear pacientes que tomam isotretinoína, medicamento teratogênico mas altamente eficaz contra acne. O programa iPledge é tão malfeito e difícil de lidar, que muitos dermatologistas simplesmente desistiram de prescrever a droga. Quem perde? Os pacientes. Os alertas de "caixa preta" nos inibidores tópicos da calcineurina têm assustado pais a ponto de se recusarem a utilizá-los em seus filhos, os quais se beneficiariam muito do medicamento.

Há órgãos equivalentes ao FDA na maioria dos outros países, cujos dermatologistas deveriam monitorar as atividades dessas instituições para assegurar que atuem racionalmente e visem ao interesse do público.

ADESÃO AOS REGULAMENTOS

A regulamentação governamental certamente tem seu papel na prática médica. É necessário assegurar que os médicos ajam em prol do interesse público e não de seu próprio interesse. No entanto, em algum ponto as regulamentações se tornam desnecessárias e onerosas. Realmente aumenta o bem-estar público o fato de o meu laboratório ser inspecionado regularmente (ao custo de várias centenas de dólares) para ter certeza de que eu posso fazer um teste de KOH? Há regulamentação nos Estados Unidos para praticamente tudo que tenha impacto na prática médica, desde leis de privacidade a credenciamento de procedimentos (ver abaixo). Parte disso é necessária e benéfica; parte é um exemplo do enlouquecimento governamental. Muitas regras são impostas aos médicos por agências governamentais que simplesmente as criam para justificar sua existência. Acrescentam pouco ou nada à qualidade ou segurança do atendimento.

CREDENCIAMENTO DE PROCEDIMENTOS

Durante a residência todos os dermatologistas aprendem a fazer pequenos procedimentos, como biópsias e excisões. Muitos dos que fizeram o treinamento mais recentemente são bastante habilidosos em tratamentos com laser e escleroterapia. É provável que um número menor tenha bastante experiência em tratamentos cosméticos mais complexos, tais como lipoaspiração. Como o público pode saber que médico é qualificado para fazer qual procedimento? Será simplesmente por ter uma residência completa em dermatologia ou outra especialidade? Que procedimentos demandam treinamento além da residência? Como alguém demonstra competência? Se uma pessoa é competente em um determinado procedimento quando termina a residência, ainda será competente 20 anos depois sem ser reavaliado? Muitas dessas questões são legítimas, outras simplesmente são excrescências das lutas campais, já mencionadas, entre a dermatologia e outras especialidades. Por exemplo, os cirurgiões plásticos podem argumentar que são treinados para fazer retalhos e enxertos durante a residência, enquanto os dermatologistas não o são (argumento improcedente no programa de treinamento dermatológico, em que essas habilidades são ensinadas – e bem ensinadas – por cirurgiões dermatologistas). Alguns especialistas lotados em hospitais, como os cirurgiões, argumentam que uma pessoa não deve ser considerada qualificada para fazer um procedimento (mesmo uma exérese simples) no consultório se não for qualificada para fazer o mesmo procedimento no hospital (sabendo muito bem que muitos dermatologistas não são credenciados em hospitalais, pois suas atividades são limitadas a pacientes ambulatoriais). Essas questões são continuamente abordadas pela AAD e pela ASDS. É provável que alguma forma de credenciamento de procedimentos seja solicitada pelas autoridades governamentais para que os médicos demonstrem competência. Se as regras que serão adotadas a partir daí atingirão esse objetivo ainda é uma incógnita.

RECERTIFICAÇÃO E MANUTENÇÃO DA CERTIFICAÇÃO

Há alguns anos, passar no exame para o título de especialista do American Board of Dermatology significava ser "certificado" como especialista em dermatologia por toda a vida. A partir de 1990, os certificados deixaram de ter validade indefinida, sendo restritos a 10 anos, após os quais o dermatologista tem que fazer um exame para comprovar que continua competente. Isso é chamado de "recertificação" ou "manutenção da certificação". A utilidade desse exame tem sido calorosamente discutida, com muitos dermatologistas acreditando que nenhum exame escrito pode medir de forma justa sua capacidade de cuidar de pacientes. Assim, o ABD esforçou-se bastante para tornar o exame mais prático e medir melhor a competência dos médicos. Ainda assim, muitos dermatologistas argumentam veementemente que tais exames não têm correlação com suas habilidades em dar atendimento profissional de alta qualidade a seus pacientes com doenças de pele, unhas e pêlos. Embora muitos dermatologistas, como este autor, certificados antes de 1990 tenham certificação vitalícia, as bancas de licenciamento médico de vários estados ainda solicitam recertificação para continuar o exercício dentro de suas divisas, e as seguradoras podem solicitar recertificação para manter o já mencionado "provedor preferencial" para tratar seus clientes. O debate sobre certificação é uma das questões mais controversas entre os dermatologistas americanos e não mostra sinais de solução próxima.

Finalmente, deve-se mencionar que muitas das questões discutidas aqui envolvem regulamentações da especialidade por instituições externas, sejam privadas, como seguradoras de saúde, ou federais, ou estaduais. Há evidente necessidade de que os dermatologistas assumam posições de influência nas agências reguladoras para apresentar o caso aos colegas médicos e ao público em geral, de forma favorável e imparcial.

Conflito de interese declarado: Nenhum.

  • Endereço para correspondência:
    Bruce H. Thiers,
    Medical University of SC
    135 Rutledge Avenue; 11th floor
    PO Box 250578 Charleston, SC 29425
    Phone: 1-843-792-5858
    Fax: 1-843-792-9804
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      21 Jun 2007
    • Data do Fascículo
      Dez 2006
    Sociedade Brasileira de Dermatologia Av. Rio Branco, 39 18. and., 20090-003 Rio de Janeiro RJ, Tel./Fax: +55 21 2253-6747 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
    E-mail: revista@sbd.org.br