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Fator de impacto. Boletim do editor?

EDITORIAL

Fator de impacto. Boletim do editor?

Antonio C. Bianco

Associate Professor and Director of Research, Thyroid Section, Division of Endocrinology, Diabetes and Hypertension Brigham and Women's Hospital and Harvard Medical School

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Antonio C. Bianco, MD, PhD Associate Professor and Director of Research, Thyroid Section, Division of Endocrinology, Diabetes and Hypertension Brigham and Women's Hospital and Harvard Medical School 77 Av. Louis Pasteur, HIM Bldg. room 643 Boston MA 02115 - USA E-mail: abianco@partners.org

A INDEXAÇÃO DOS ABEM no PubMed é um marco na história da endocrinologia brasileira atingido graças aos esforços do Conselho Editorial dos ABEM assim como da diretoria da SBEM. Os ABEM passam a constituir o único periódico latino-americano de endocrinologia a figurar no PubMed. Esta indexação abre uma janela de oportunidade para que os milhões de profissionais da área biomédica do planeta que surfam o PubMed diariamente conheçam os progressos clínicos e básicos atingidos pelos endocrinologistas brasileiros e profissionais associados. Além disso, o PubMed facilita a localização de artigos publicados nos ABEM por parte de todos que têm o Português como a língua materna em países como Portugal, Angola, Moçambique e Timor Leste, que juntos somam uma população de aproximadamente 40 milhões de pessoas.

Qual o próximo passo? Uma possibilidade é continuar a excelente trajetória que os ABEM vem seguindo e, a partir de agora, utilizar o PubMed para localizar artigos nos ABEM. Outra possibilidade, bem mais ambiciosa, é considerar a indexação como a etapa inicial em direção ao posicionamento dos ABEM ao lado dos melhores periódicos de endocrinologia do planeta. Esse é um caminho difícil, trilhado por apenas alguns periódicos a nível mundial, que passa obrigatoriamente pela batalha do "fator de impacto". Esse é um índice padrão criado pelo Institute of Scientific Information (ISI) freqüentemente utilizado para medir como uma publicação recebe citações dos seus artigos ao longo do tempo. Estudos realizados por esse instituto mostram que, de uma forma geral, as citações de artigos publicados em um dado ano aumentam nos anos subseqüentes para atingir um pico entre 2 e 6 anos após a publicação e declinar exponencialmente a partir de então. Literalmente, o fator de impacto é a medida do tamanho relativo da curva de citações em 2-3 anos. Por exemplo, o fator de impacto de 1999 é o número de citações em 1999 a artigos publicados em 1997 e 1998, dividido pelo número de artigos publicados em 1997 e 1998. O número resultante é um indicador da média do número de citações que um artigo médio recebe por ano neste periódico.

A utilização do fator de impacto na medicina acadêmica não é nova, mas sua implementação no meio acadêmico nacional é bastante polêmica. Mais recentemente esse índice ganhou bastante popularidade e maior aceitação a partir da decisão da CAPES de utilizá-lo na avaliação dos cursos de pós-graduação. Nesse sentido, os conceitos mais altos são restritos aos cursos cujos docentes e alunos publicam regularmente em periódicos com maior fator de impacto. Não obstante, enquanto a utilização do fator de impacto para julgar o desempenho de um profissional na medicina acadêmica é discutível, sua aplicação para avaliar o sucesso, ou mesmo o prestígio, de um periódico científico é aceita quase que universalmente. Digo quase, porque ainda existem aqueles que consideram esse tipo de índice uma bobagem e argumentam que, se o estudo for bom, a divulgação nos anais de uma reunião científica tem a mesma repercussão que se publicado em uma revista de alto fator de impacto. Talvez em Paris do final do século XIX isso tenha sido verdade. Entretanto, ao longo do século XX, particularmente nos últimos 20 anos, houve uma transformação na forma com que a medicina acadêmica avança. Isso em função dos bilhões e bilhões de dólares que são investidos anualmente na descoberta de novos conhecimentos. Ninguém com um mínimo de seriedade investe sem que existam múltiplos mecanismos para medir rapidamente a significância e o retorno do investimento. O fator de impacto dos periódicos que divulgam essas descobertas é um deles. Basta dar uma olhada no Boletim FAPESP. E porque os bilhões de dólares são apenas bilhões e não trilhões, existe uma competição séria por recursos a nível global que acaba sendo vencida por quem publica em periódicos de muito prestígio.

Hoje, o fator de impacto é utilizado amplamente por cientistas em todo o mundo no momento de escolha do periódico para submissão de um manuscrito. Além disso, é utilizado por diferentes sociedades científicas que possuem periódicos para avaliar e modificar sua política editorial. Alguns exemplos de fator de impacto do ano de 2002 ilustram esses pontos: New England Journal of Medicine = 32, Nature = 30, Science = 29, Cell = 27. Na área da endocrinologia, são esses os periódicos de destaque: Endocrine Reviews = 22, Diabetes = 8, Molecular Endocrinology = 7, Journal of Clinical Endocrinology and Metabolism = 5, Endocrinology = 5. Existem atualmente 5.860 periódicos catalogados pelo ISI, dos quais apenas 256 têm fator de impacto maior que 5. Quarenta por cento têm fator de impacto entre 1 e 5, enquanto que 55% têm fator de impacto menor que 1. Todos os 18 periódicos brasileiros catalogados pelo ISI têm fator de impacto menor ou igual a 1. Os ABEM ainda não estão catalogados pelo ISI mas, de acordo com a base de dados SciELO, em 2003 o fator de impacto foi 0,23.

O fator de impacto pode ser comparado ao preço de uma determinada ação negociada na Bolsa de Valores, o qual é utilizado para guiar investimentos e performance da Diretoria da Empresa. A subida do preço da ação espelha o sucesso da Diretoria e fortalece a aplicação das idéias e valores advogados por seus integrantes. Sob essa visão, o fator de impacto pode não ser exatamente o boletim do conselho editorial, mas a sua tendência ao longo do tempo, é. O conselho editorial deve conscientizar-se que as decisões envolvidas durante a análise de um manuscrito até a decisão final de aceitá-lo ou recusá-lo irão, a médio e longo prazo, influenciar o fator de impacto do periódico. Vejamos por exemplo a evolução do fator de impacto de três periódicos bem conhecidos, Journal of Clinical Investigation (JCI), Endocrinology e Cell. A estratégia seguida pelo JCI para fazer com que seu fator de impacto atingisse 14 em 2002 (era 9,3 em 1998) foi simples: tornou mais rigoroso o critério de escolha de manuscritos para publicação, diminuindo o número de artigos publicados de 645 em 1998 para 375 em 2002. Já o Endocrinololgy, que em 1998 publicou 653 artigos e teve um impacto de 4,6 optou por não endurecer seus critérios editoriais, publicando 548 artigos em 2002, e o resultado foi que seu fator de impacto permaneceu praticamente inalterado, 5,1. No caso da Cell, o fator de impacto despencou de 39 em 1998 para 27 em 2002, sem que o número de artigos publicados tenha mudado substancialmente (421 vs. 350), provavelmente devido ao aparecimento de excelentes periódicos que agora competem pelos melhores manuscritos.

Assim sendo, cabe ao conselho editorial a difícil tarefa de ponderar a importância relativa de todos esses fatores, particularmente do conteúdo científico e do "conteúdo" político de cada manuscrito, durante o processo de seleção dos manuscritos, sempre tendo em mente como isso afetará o fator de impacto. Deve-se destacar também que, além de medidas mais profundas envolvendo os critérios de seleção do que de fato é publicado, a maior parte dos periódicos tem passado por medidas cosméticas que incluem a apresentação de capas com design e fotos espetaculares (e.g. Cell), web sites modernos e versáteis (e.g. PNAS), disponibilização gratuita de grande parte ou mesmo toda a coleção no formato pdf via website (e.g. JBC).

Na eventualidade dos dirigentes dos ABEM decidirem que o fator de impacto é um índice útil para guiar o futuro editorial da revista, seria interessante a elaboração de um plano diretor para guiar eventuais modificações que deverão adaptar os ABEM a nova realidade. Alguns pontos, entretanto, nos parecem importantes: (i) Abstracts - mesmo artigos em Português devem conter abstracts escritos em inglês da melhor qualidade e contendo a maior quantidade possível de resultados; (ii) Citações - incentivar os autores a citar artigos publicados nos ABEM, tanto em artigos publicados em periódicos internacionais quanto nos próprios ABEM. Notem que o ISI processa todas as citações existentes, independente da língua em que o artigo é escrito; (iii) Publicação de revisões - o que já vem sendo feito pelos editores.

Parabéns ao Claudio, à Valéria e a todos os que participaram dessa vitória.

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    Antonio C. Bianco, MD, PhD
    Associate Professor and Director of Research,
    Thyroid Section, Division of Endocrinology, Diabetes and Hypertension
    Brigham and Women's Hospital and Harvard Medical School
    77 Av. Louis Pasteur, HIM Bldg. room 643
    Boston MA 02115 - USA
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  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      26 Ago 2004
    • Data do Fascículo
      Jun 2004
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