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FECUNDIDADE DE DERMANYSSUS GALLINAE (DE GEER, 1778) (ACARI, DERMANYSSIDAE) EM LABORATÓRIO

FECUNDITY AND THE FERTILITY OF DERMANYSSUS GALLINAEIN THE LABORATORY

RESUMO

O presente trabalho teve por objetivo estudar a fecundidade de Dermanyssus gallinae em condições de laboratório. As fêmeas foram isoladas em pipetas "Pasteur" e mantidas em estufa climatizada sob 27° C, 80%UR e 12:12 (C:E). As avaliações foram feitas no terceiro dia após a alimentação, ocasião em que foi oferecida às fêmeas uma nova alimentação. Esta etapa foi repetida a cada 3 dias até o final do experimento. As avaliações foram feitas anotando-se o número total de ovos colocados após cada alimentação. As fêmeas iniciaram a oviposição logo após o 1o repasto sanguíneo e continuaram ovipondo após 7 alimentações. A maior porcentagem das fêmeas (58,1%) ovipôs após a primeira alimentação. A partir do segundo repasto esta porcentagem foi diminuindo até a oitava alimentação, onde se recuperou apenas uma fêmea, que morreu antes de ovipor. No presente experimento as fêmeas de D. gallinae foram capazes de realizar um total de 7 oviposições com uma produção total de 25 ovos. O padrão de oviposição de D. gallinae é do tipo declinante, ocorrendo um aumento no número de ovos após cada repasto até atingir um número máximo (3a alimentação) e decrescendo nas alimentações subseqüentes.

PALAVRAS-CHAVE
Ácaros hematófagos; galinhas poedeiras; manutenção de colônias

ABSTRACT

The purpose of this work was to study the fecundity and the fertility of Dermanyssus gallinae under laboratory conditions. Females were maintained at 27° C, 80%UR and 12:12 (C:E). Observations were made on 3rd day after a blood meal when the total number of eggs was evaluated and a new blood meal was offered. The results showed that the females began to lay eggs just after the first blood meal and continued to lay eggs up to the 7th day after the meal. The highest percentage of females (58%) laid eggs after the first meal. After thesecond meal this percentage began to decrease until the8th meal, when only one female was present, but it died before it was able to lay eggs. Dermanyssus gallinae females had a total of 7 oviposition cycles totaling 25 eggs.

KEY WORDS
Haematophagous mites; poultry hens; laboratory rearing

INTRODUÇÃO

Indiscutivelmente, o conhecimento da biologia de uma espécie é a principal arma na elaboração de programas de controle.

A escassez de trabalhos sobre a biologia de Dermanyssus gallinae deixa um grande número de informações a serem desvendadas. Um dos parâmetros biológicos mais importantes a se conhecer é o potencial reprodutivo de um parasita, estabelecendo-se quantos ovos e quantas oviposições uma fêmea é capaz de por em toda sua vida.

O ciclo de desenvolvimento de D. gallinae, assim como grande parte dos mesostigmata, é bastante curto, com um ciclo biológico desde fêmea ingurgitada até nova geração de adultos se completando em 7 a 8 dias WOOLEY (1988)WOOLEY, T.A. Acarology. Mites and human welfare. New York: John Wiley, 1988. 484p..

Em granjas de postura comercial é muito comum ocorrer um grande aumento da população do parasito, onde em poucos dias a infestação aumenta e se espalha por todo o galpão, atingindo toda a propriedade em poucas semanas.

O número de proles produzido é crucial para o potencial de crescimento de uma população e muitos fatores estão relacionados com a fecundidade. OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966. verificou que entre 4 ácaros mesostigmata estudados (Dermanyssus gallinae, Ornithonyssus sylviarum, O. bacoti e Ophionyssus natricis) somente D. gallinae requer a cópula para que ocorra a oviposição, constatando a reprodução por partenogênese somente nas 3 espécies restantes.

A alimentação também é outro fator importante. Fêmeas virgens alimentam-se menos que as acasaladas e raramente ingurgitam após várias alimentações (OLIVER, 1966OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966.).

Muitos dados sobre a biologia de D. gallinae são desconhecidos ou incompletos, como o número de oviposições que cada fêmea é capaz de realizar.

O estímulo efetivo para a oviposição é desconhecido, podendo estar associado a um estímulo sensorial somente (distensão do intestino) ou a um estímulo nutricional (OLIVER, 1966OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966.).

Com relação à fecundidade de D. gallinae, a literatura registra o máximo de 8 oviposições e produção máxima de 29 ovos (WOOD, 1917WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917.) e 8 oviposições com 23 ovos (OLIVER, 1966OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966.). Assim, o presente trabalho teve por objetivo estudar a fecundidade e a fertilidade de D. gallinae em condições de laboratório.

MATERIAL E MÉTODOS

Os estudos foram desenvolvidos no Laboratório de Parasitologia do Centro de Pesquisa e Desenvolvimento em Sanidade Animal do Instituto Biológico de São Paulo, com a espécie Dermanyssus gallinae, sob temperatura de 27º C, umidade relativa do ar de 80% e fotoperíodo de 12:12 (C:E).

Os ácaros utilizados no presente trabalho foram provenientes da colônia do Laboratório de Parasitologia do Instituto Biológico, mantida com ácaros coletados em galpão de poedeiras, naturalmente infestadas por D. gallinae, em granja de postura comercial, localizada no Município de Ibiúna, São Paulo.

Após serem alimentadas, fêmeas ingurgitadas foram retiradas da colônia e isoladas individualmente nas pipetas de vidro para desenvolvimento do ciclo evolutivo, até a obtenção de nova geração de adultos.

Assim que as deutoninfas mudaram para o estágio adulto, machos e fêmeas foram mantidos por 3 dias em pipetas para que ocorresse a cópula.

As fêmeas foram então alimentadas e, na manhã do dia seguinte, 260 fêmeas ingurgitadas foram recolhidas, isoladas individualmente em pipetas de vidro e mantidas em estufa climatizada.

No terceiro dia após a alimentação, foram feitas as avaliações, e às fêmeas foi oferecida nova alimentação. Esta etapa foi repetida a cada três dias até o final do experimento.

As avaliações foram feitas em microscópio estereoscópico, em intervalos de 3 dias, anotando-se o número total de ovos colocados após oviposição.

RESULTADOS

Os resultados estão expressos nas Tabelas 1 e 2. As fêmeas iniciaram a oviposição logo após o primeiro repasto sanguíneo e continuaram ovipondo após sete alimentações. A maior porcentagem das fêmeas (58,1%) ovipôs após a primeira alimentação. A partir da segunda alimentação esta porcentagem foi diminuindo até a oitava alimentação, onde se recuperou apenas uma fêmea, que morreu antes de ovipor (Tabela 1).

A porcentagem de fêmeas mortas variou entre 9,6 e 25,5% do primeiro ao quinto repasto sanguíneo (Tabela 1), ocorrendo um pico após a sexta alimentação, com mortalidade de 35,7%. Após a sétima alimentação não houve mortalidade. Provavelmente as fêmeas mais sensíveis e/ou debilitadas morreram durante a sexta alimentação, permanecendo somente as mais resistentes.

Tabela 1
Fertilidade, fecundidade e mortalidade de Dermanyssus gallinae, após os diferentes períodos de oviposiçao.
Tabela 2
Número de ovos por fêmea de Dermanyssus gallinae após repastao sanguíneo.

Verificou-se que o numero total de ovos depositados, por fêmea, foi igual a 25, após 7 oviposições.

A maior produção de ovos foi observada a partir da segunda até a quinta alimentação (Tabela 2), com a maior produção após a terceira alimentação, com média de 5,1 ovos por fêmea.

DISCUSSÃO

A maior porcentagem das fêmeas (58,1%) ovipôs após a primeira alimentação e a partir da segunda, a porcentagem diminuiu para 16,1% mantendo-se baixa até a sétima, exceto na sexta que subiu para 27,8%. Um grande número de fêmeas (41,9%) deixou de ovipor após a primeira alimentação, assim como nas alimentações subseqüentes a porcentagem bastante alta, superior a 72%. Estes resultados concordam com os obtidos por OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966. que, apesar de não quantificar, observou que um grande número de fêmeas não ovipôs após a primeira alimentação.

OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966. não faz menção à porcentagem de fêmeas que ovipôs, referindo-se apenas ao número total de fêmeas utilizadas e à média de ovos por fêmea. WOOD (1917)WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917. também não faz referência à porcentagem de fêmeas que ovipôs, no entanto, dá a entender, na forma dissertativa de expor os resultados, que obteve uma alta porcentagem durante todas as alimentações. No presente trabalho obteve-se uma baixa porcentagem de fêmeas ovipondo logo na primeira alimentação (58%) com esta porcentagem diminuindo nas alimentações subseqüentes. Alguns fatores poderiam explicar esta baixa porcentagem de oviposição das fêmeas.

Uma primeira hipótese para este fato pode estar relacionada ao fato das fêmeas não terem sido fecundadas pelos machos durante os 3 dias que permaneceram agrupados. No entanto, a probabilidade de não ter ocorrido a cópula, no que se refere ao tempo que machos e fêmeas permaneceram em contato, é muito baixa. Segundo HUTCHESON & OLIVER (1988)HUTCHESON, H.J. & OLIVER JUNIOR, J.H. Spermiogenesis and reproductive biology of Dermanyssus gallinae (De Geer) (Parasitiformes: Dermanyssidae). J. Med Entomol., v.25, n.5, p.321-330, 1988, 100% das fêmeas de D. gallinae mantidas com machos por 1, 2 ou 3 dias apresentaram espermatozóides em seu interior, confirmando que a cópula ocorreu com sucesso nesse período.

A baixa porcentagem de fêmeas que não ovipos pode estar relacionada ao número de machos utilizados e não quanto ao tempo que permaneceram agrupados. Os machos do presente trabalho foram obtidos juntamente com as fêmeas a partir de criação inicial de ovos de D. gallinae. Segundo HUTCHESON & OLIVER (1988)HUTCHESON, H.J. & OLIVER JUNIOR, J.H. Spermiogenesis and reproductive biology of Dermanyssus gallinae (De Geer) (Parasitiformes: Dermanyssidae). J. Med Entomol., v.25, n.5, p.321-330, 1988 cada macho de D. gallinae é capaz de inseminar com sucesso 3 ou 4 fêmeas. O número total de machos obtidos na colônia final de adultos do presente trabalho não foi estimado e pode ter sido insuficiente para fecundar todas as fêmeas. Os resultados aqui obtidos demonstram que pelo menos 58,1% das fêmeas foram fecundadas pelos machos, conforme constatado após a primeira alimentação.

O fato das fêmeas terem sido isoladas em tubos, desde antes da primeira oviposição, pode explicar a baixa porcentagem de oviposição obtida no presente trabalho. D. gallinae é um ácaro que vive agregado em colônias. Em condições naturais, e também nas criações de laboratório, as fêmeas ingurgitadas rapidamente procuram abrigos onde se agregam e depositam os ovos. A agregação ocorre pela ação de feromônios voláteis e as colônias de ácaros são formadas pelos vários estágios de desenvolvimento do parasita (ENTREKIN & OLIVER JUNIOR. 1982ENTREKIN, D.L., & OLIVER., J.H. Aggregation of the chicken mite, Dermanyssus gallinae (Acari: Dermanyssidae). J. Med. Entomol., v.19, p.671-678, 1982.). O fato de estarem isoladas em tubos pode ter influenciado negativamente na produção de ovos durante a realização do experimento.

O estresse sofrido pelas fêmeas durante a manipulação em laboratório, desde o estádio de protoninfa até adulto, e seguido de 8 alimentações, também pode ter contribuído para a baixa freqüência de oviposição.

A maior produção de ovos foi obtida após a 3ª alimentação, com média de 5,1 ovos por fêmea, diminuindo nas alimentações subseqüentes indicando que a oviposição de D. gallinae é do tipo declinante. Resultados semelhantes foram obtidos por WOOD (1917)WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917. e OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966. que observaram a maior produção de ovos após a terceira alimentação, com médias de 4,98 e 3,95 ovos por fêmea, respectivamente.

Com relação ao número de oviposições, os resultados obtidos no presente estudo também foram próximos aos obtidos por WOOD (1917)WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917. e OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966.. O segundo autor acompanhou 8 alimentações com 8 oviposições e média total de ovos produzidos igual a 23. Na 9a alimentação restou apenas 1 fêmea que escapou. No presente estudo o número de ovos foi um pouco superior, 25 em 8 alimentações e 7 oviposições. WOOD (1917)WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917. conseguiu acompanhar 9 alimentações e 8 oviposições, com total de 29 ovos por fêmea.

WOOD (1917)WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull., n.553, p.1-15, 1917. iniciou seu estudo com 70 fêmeas e OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966. não cita a quantidade inicial, mas revela que o total de fêmeas que ovipuseram foi igual a 40. No presente estudo o número inicial de fêmeas foi de 260 e mesmo assim as dificuldades enfrentadas, referentes à diminuição do número de ácaros após cada alimentação, não permitiram acompanhar um maior número de oviposições.

O número de oviposições que uma fêmea de D. gallinae realiza pode ser superior às informações atualmente disponíveis na literatura. Segundo OLIVER (1966)OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol., v3, p.29-35, 1966., uma vez que a fêmea de D. gallinae começa a ovipor, ela continua ovipondo depois de cada alimentação por tanto tempo quanto ela sobreviver. Os estudos de HUTCHESON & OLIVER (1988)HUTCHESON, H.J. & OLIVER JUNIOR, J.H. Spermiogenesis and reproductive biology of Dermanyssus gallinae (De Geer) (Parasitiformes: Dermanyssidae). J. Med Entomol., v.25, n.5, p.321-330, 1988, sobre a espermiogênese e biologia reprodutiva desta espécie, demonstraram que cada espermatóforo de D. gallinae pode abrigar de 250 a 300 espermatozóides. Conforme verificado no presente estudo, se a média de ovos postos por uma fêmea foi de 25, ela utilizou apenas 10% dos espermatozóides armazenados e, portanto, sua capacidade de reprodução poderá ser bem maior do que a obtida no presente trabalho.

CONCLUSÕES

Os resultados obtidos permitem concluir que fêmeas de Dermanyssus gallinae podem realizar pelo menos 7 oviposições com produção total de 25 ovos.

O padrão de oviposição de Dermanyssus gallinae é do tipo declinante, ocorrendo um aumento no número de ovos após cada repasto até atingir um número máximo, na terceira alimentação, decrescendo nas alimentações subseqüentes.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

  • ENTREKIN, D.L., & OLIVER., J.H. Aggregation of the chicken mite, Dermanyssus gallinae (Acari: Dermanyssidae). J. Med. Entomol, v.19, p.671-678, 1982.
  • HUTCHESON, H.J. & OLIVER JUNIOR, J.H. Spermiogenesis and reproductive biology of Dermanyssus gallinae (De Geer) (Parasitiformes: Dermanyssidae). J. Med Entomol, v.25, n.5, p.321-330, 1988
  • OLIVER JUNUIOR, J.H. Notes on reproductive behavior on Dermanyssidae. J. Med. Entomol, v3, p.29-35, 1966.
  • WOOD, H.P. The chicken mite, its life history and habits. U.S.Dep. Agric. Agric. Inf. Bull, n.553, p.1-15, 1917.
  • WOOLEY, T.A. Acarology. Mites and human welfare New York: John Wiley, 1988. 484p.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    01 Abr 2021
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2005

Histórico

  • Recebido
    28 Fev 2005
  • Aceito
    31 Mar 2005
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