Resumo
O monumento às Bandeiras, « cartão postal » da cidade de São Paulo, é uma das poucas representações da nação brasileira numa praça pública. Embora tenha sido uma fonte de orgulho como obra de arte do escultor modernista Victor Brecheret, e também devido ao seu significado, o grupo esculpido, tal como as bandeiras e os bandeirantes a quem presta homenagem, tem sido recentemente o alvo de protestos virulentos. Os protestos denunciam a glorificação de suas exações e crimes perpetrados principalmente contra os indígenas, através da heroização dos paulistas do período colonial.
Este artigo examina a mensagem política do monumento e a ideologia do bandeirismo, que permeia a obra de Brecheret e foi formulada no século XX pela ala conservador e ultranacionalista do modernismo paulista. De acordo com esta interpretação do Brasil, desenvolvida em particular por Cassiano Ricardo, a «bandeira» é erguida tanto como o cadinho da sociedade brasileira como a essência do génio nacional. Substitui mesmo a Independência de 1822 como momento fundador do Brasil e oferece um programa para o futuro: a conclusão da colonização do território. No entanto, o bandeirismo não se estabeleceu como a narrativa dominante da história brasileira e permaneceu identificado com o regionalismo paulista. Paradoxalmente, o facto de o monumento às expedições se ter tornado o alvo da raiva anti-racista e decolonial deu-lhe um alcance muito mais geral. A desconstrução do bandeirismo e a sua rejeição no espaço de duas décadas atesta o carácter perecível e embaraçoso de certas propostas de identidade.
Palavras-chave
Bicentenário da Independência; monumento; cultura material