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A Lei do Ventre Livre e a administração do tempo histórico no Império do Brasil1 1 Este artigo foi desenvolvido a partir de alguns pontos de minha dissertação de Mestrado. Tive a feliz oportunidade de discutir a primeira versão do texto em uma das reuniões do Laboratório de Estudos sobre o Brasil e o Sistema Mundial/Universidade de São Paulo (LabMundi/USP), do qual faço parte. Agradeço a todos pelas notáveis sugestões que fizeram naquela ocasião, tentei, na medida do possível, incorporá-las.

The Free Womb Law and the administration of historical time in Imperial Brazil

RESUMO

O objetivo deste artigo é compreender a Lei do Ventre Livre por meio de uma análise do tempo histórico. O argumento é de que a lei de 28 de setembro de 1871 foi, em seu longo processo de gestação, concebida como um instrumento para controlar o tempo da emancipação brasileira, pautando o seu ritmo, intensidade e duração. A análise será fundamentada nos debates do Conselho de Estado de 1867 e 1868, nos debates parlamentares de 1870 e 1871, nas discussões na imprensa em 1871 e em uma gravura que comemorou a liberdade do ventre assim que ela foi aprovada.

PALAVRAS-CHAVE:
Tempo histórico; Lei do Ventre Livre; Crise da escravidão no Brasil

ABSTRACT

This article seeks to understand the Free Womb Law by analyzing the historical time. It argues that the Law of September 28, 1871, was, in its long gestation processes, conceived as an instrument to control the time of Brazilian emancipation, guiding its rhythm, intensity, and duration. The analysis will be based in the debates of the Council of State of 1867 and 1868, in the parliamentary debates of 1870 and 1871, in the press discussions of 1871 and in an engraving that commemorated the freedom of the womb as soon as it was approved.

KEYWORDS:
Historical time; Free Womb Law; Brazilian slavery crisis

INTRODUÇÃO

Tão logo a famosa Lei do Ventre Livre foi aprovada, em 1871, uma gravura em homenagem a esse novo ato legislativo saía das prensas do Imperial Instituto Artístico. A gravura (Figura 1) é de autoria de Henrique Fleiuss. Nome marcante da imprensa pictórica no Brasil, natural da cidade de Colônia, na Prússia Renana, Fleiuss estudou belas artes em sua cidade natal e em Düsseldorf, bem como ciências naturais em Munique. Por recomendação de von Martius, desembarcou no Brasil em 1858 e explorou a região norte do Império. No ano seguinte, instalou-se no Rio de Janeiro e, com seu irmão, Karl Fleiuss, e um amigo próximo, Karl Linde, fundou o Instituto Artístico, responsável pela elaboração e publicação da famosa Semana Illustrada (1860-1873). A grande circulação do periódico, que contava com ilustrações exclusivamente de Fleiuss nos anos iniciais, decerto contribuiu para que, em 1863, por ação de Pedro II, o Instituto Artístico se tornasse Imperial Instituto Artístico, órgão que vigorou até 1878. Vendida pelo valor de 10$000, a gravura composta em 1871 por Fleiuss, carioca de coração conforme se declarava, chegou a receber elogiosa crítica no Jornal do Commercio, pois tratava-se de um “serviço importante” que simbolizava “uma das mais belas fases de nossa história”, comemorava um “acontecimento humanitário cujos benéficos resultados o tempo e a experiência se incumbirão de demonstrar”.3 3 Sobre Henrique Fleiuss, o comércio da gravura e a crítica na imprensa, veja-se, respectivamente: Fleiuss. (1923), Semana Illustrada (Anno XI, p.4527), Jornal do Commercio (1871, 3 out. p.2).

Figura 1
Honra e Gloria ao Ministério 7 de Março, 1871FLEIUSS, Henrique. Honra e Gloria ao Ministério 7 de Março. 1871. 1 litografia, preto e branco, 53 x 65,3cm em 60,7 x 83,6 cm..

Em relação ao referente, essa imagem pode ser dividida em dois planos: 1) os responsáveis pela nova lei; 2) os efeitos que ela produziria. Por ora, cabe pontuar que o gabinete chefiado pelo Visconde do Rio Branco recebeu grande destaque como o responsável pela liberdade dos nascituros, com a gravação do rosto de cada um de seus membros, com destaque, evidentemente, ao visconde. Nada surpreendente, pois a luta parlamentar em torno da medida libertadora, conforme se lerá em breve, foi prolongada e intensa. Mas, a família real também recebeu os louros desse acontecimento. Os olhos do observador são dirigidos de imediato para o busto de Pedro II, o maior de todos, ainda que a majestade imperial sequer estivesse no Brasil quando da aprovação do ventre livre, tendo recebido as boas novas apenas em outubro, assim que chegou em Alexandria, no Egito.4 4 Cf. Barman (2012, p. 341-342). Quem, de fato, assinou o texto ratificando a abolição do ventre escravo foi Isabel, a princesa regente, a figura angelical, localizada no topo da gravura, que ilumina toda a cena. Seus braços estendidos apontam também para a inscrição em latim vincula servitii tandem sunt saeva remissa, algo como, os cruéis laços de dominação são finalmente rompidos. O segundo plano da imagem de Fleiuss é a liberdade do ventre representada por uma figura feminina, agraciando os escravizados, ainda que não todos, já que a lei tratava, sobretudo, dos que estavam por nascer. Há, portanto, um todo harmônico entre os responsáveis e os beneficiários da emancipação, mas que não deixa de transparecer uma hierarquia sugerida na própria disposição da gravura entre os sujeitos que comandam a ação política e os sujeitos que a acatam. Trata-se de um equilíbrio da sociedade que é ainda explicitado pela total simetria da gravura: os que comandam estão no topo, todavia a base da sociedade ainda era composta pelos escravizados que sustentavam o trabalho agrícola e, portanto, possibilitavam a realização do comércio. A cena se completa com a exaltação das riquezas nacionais: as duas palmeiras imperiais nas laterais e a imponente serra ao fundo.5 5 Agradeço a Nicole Bianchini pela paciência e disponibilidade de me auxiliar na compreensão do universo da produção visual. As referências na próxima nota também devo a ela.

Essas observações preliminares da imagem indicam duas coisas. A representação visual procura sugerir que a lei foi bem recebida e festejada pelos contemporâneos, em uma concepção da liberdade do ventre como uma concessão das forças políticas às massas escravizadas. A celebração do ventre livre deriva disso, pois a escravidão acabaria não pela insurreição dos cativos, mas pela dádiva política que manteria, assim, a ordem brasileira.6 6 Nesse sentido, a imagem deve ser compreendida como uma dimensão da vida social, um documento histórico que apresenta, representa ou reapresenta o mundo. Para uma discussão mais detalhada sobre o sentido de imagens enquanto documento histórico dotado de potencial à compreensão do passado, cf: Meneses (2003), Weller e Bassalo (2011). Todavia, um olhar mais atento à cena, particularmente aos detalhes complementares da gravura, permite-nos dar um passo além e enxergar na pena de Fleiuss uma projeção de tempo histórico a partir da aprovação da Lei do Ventre Livre, projeção essa que estava presente no cerne da elaboração da nova lei e nas preocupações de seus defensores.

É o que pretendo demonstrar ao longo deste artigo. Em termos gerais e com pesos variáveis, as linhas historiográficas de interpretação acerca do evento de 1871 giraram em torno das contradições entre a escravidão e o capitalismo, das ações do imperador e da elite política imperial, da mobilização dos abolicionistas, do quadro internacional desfavorável à escravidão e das ações dos sujeitos escravizados.7 7 A bibliografia é extensa e não se pretende esgotá-la nesta nota. Para um exemplo de cada uma das correntes mencionadas, ver, respectivamente: Costa (2012), Carvalho (2007), Alonso (2015), Conrad (1978), Chalhoub (2011). Não obstante, os inegáveis ganhos que cada uma dessas linhas trouxe à compreensão da lei de 28 de setembro, um aspecto não explorado por elas foi a investigação da legislação emancipacionista por meio de uma análise do tempo histórico. Creio que, a partir desse procedimento, será possível captar um significado histórico importante contido na Lei do Ventre Livre e compreender a gravura de Fleiuss na sua totalidade.

O argumento que será exposto é o de que a Lei do Ventre Livre foi concebida como um instrumento para controlar o tempo da emancipação brasileira, pautando o seu ritmo, intensidade e duração. Esse controle estava intimamente ligado ao descompasso concebido pelos coevos de que o Império do Brasil estava cada vez mais de fora da orientação mundial, ao passo que rumava na direção da abolição. Mas, o fim da escravidão não poderia ocorrer abruptamente, pois isso poderia implicar a desestruturação do próprio Império ao corroer sua base econômica de sustentação. Como então acompanhar os novos tempos sem desequilibrar o Estado nacional? A partir da abolição do ventre das mulheres escravizadas. Portanto, a libertação dos nascituros, como também as libertações sazonais por meio do fundo de emancipação, estabelecia-se como o limite formal das ações estatais para que a escravidão chegasse a termo. Ao mesmo tempo, contudo, havia a garantia de permanência de uma massa de escravizados não agraciados pela nova lei, que seguiriam trabalhando nos campos e gerando divisas aos cofres públicos até serem libertados pelo fundo estatal, pela alforria e, no limite, pela morte. Assim, seria possível aos estadistas segurar as rédeas e dirigir a emancipação no Brasil, adequando-o à nova ordem mundial, formada a partir da abolição nos Estados Unidos, sem abalos no ordenamento social e produtivo do Império. A liberdade do ventre teria, desse modo, o potencial de assegurar a sobrevida do cativeiro e permitir a possibilidade de reorganização do Império sob a égide do trabalho livre, mas com a manutenção do poder senhorial. Pretendo fundamentar tal argumento por meio do exame dos debates parlamentares de 1870 e 1871, bem como de algumas discussões no Conselho de Estado de 1867 e 1868 e na imprensa.

O tempo histórico aqui é um tempo característico da modernidade e que pode ser compreendido a partir da distinção entre experiência e expectativa. Essas duas categorias históricas são fundamentais porque permitem apreender as relações entre passado (experiência acumulada de eventos pretéritos) e futuro (expectativa para o porvir concebida a partir da experiência). Além disso, essas formas categóricas são adequadas para assimilar as ações concretas dos sujeitos históricos, pois fundamentados nelas é que homens e mulheres pautavam suas ações. O tempo também apresenta uma heterogeneidade causal, isto é, as consequências dos atos empreendidos pelos sujeitos não dependem exclusivamente dos atos em si, mas, sobretudo do universo e do momento no qual eles ocorrem.8 8 Cf. Koselleck (2006a), p. 16 e p. 307-313, Sewell Jr (2017), p. 23-24. Por isso, era indispensável aos contemporâneos uma leitura acurada daquilo que os precederam para que eles pudessem formar uma projeção cuidadosa daquilo que poderia vir a ser dentro de um determinado campo de possibilidades concretas. Algo tão difícil que constitui uma verdadeira arte, a “arte do prognóstico”, um momento de ação política “capaz de inscrever o passado no futuro” e de nortear, justificar e sustentar ações políticas no presente.9 9 Cf. Koselleck (2006a), p. 36 e p. 79-94, Koselleck (2014), p. 189-205.

Em 1871, ano de elaboração e promulgação da Lei do Ventre Livre, claro estava aos contemporâneos do Brasil que a antiga ordem escravista ruiria e que algo novo se assomava no horizonte. Tratava-se, portanto, de um cenário de crise que, como tal, abria aos contemporâneos múltiplas possibilidades de futuro ao lhes impor a necessidade de tomada de decisões.10 10 Cf. Koselleck (2006b). Pautando-se na iminência de um futuro inédito e desafiador, os atores brasileiros se puseram em movimento. O tempo examinado aqui se estende de 1864 a 1871. Trata-se, em outras palavras, do início da crise da escravidão brasileira e de como os estadistas imperiais, administrando o tempo da abolição, tentaram segurar as rédeas do processo que colocaria fim no cativeiro.

ENTRANDO NO DEBATE

Entre maio e setembro de 1871, o Parlamento brasileiro foi palco de um dos mais intensos e importantes debates travados no Império. Discutiu-se, ao longo daqueles meses, o projeto de libertação do ventre das mulheres escravas; para a maioria dos que ali estavam era a questão mais importante da história brasileira desde a independência. De um modo geral, dois grupos antagônicos se formaram no legislativo. De um lado, um grupo maioritário, alinhado ao gabinete Rio Branco, que propôs a emancipação, compreendia que o momento presente exigia uma solução para a escravidão. De outro lado, uma minoria, intimamente ligada aos proprietários de escravos do Vale do Paraíba, resistia a qualquer tentativa de modificação nas relações existentes entre senhores e escravos. A despeito do embate, interessa aqui apreender o significado de fundo contido no projeto de lei defendido pela maioria parlamentar em 1871.

É na longa discussão em torno do projeto apresentado em 12 de maio de 1871 à Câmara dos Deputados que se pode apreender o ponto de chegada da intenção mais ampla dos propugnadores da liberdade do ventre, a então chamada reforma do elemento servil. Um dos maiores entusiastas da nova legislação, que trabalhou incessantemente entre discursos e arguições aos opositores em 1871, foi João José de Oliveira Junqueira. Nascido na Bahia e formado em direito pela faculdade do Recife, Junqueira alcançou o cargo de juiz de direito na magistratura, foi eleito deputado sequencialmente desde 1857 e chegou a presidir as províncias do Piauí, do Rio Grande do Norte e de Pernambuco. Em 1872, sem dúvidas em virtude do apoio prestado ao Visconde do Rio Branco nas pelejas do processo de emancipação, o deputado foi nomeado ministro da guerra.11 11 Cf. Blake (1883, p. 464), Javari (1962, p. 162). A nomeação de Junqueira em 1872 pode ser enquadrada na prática de patronagem utilizada por Rio Branco para garantir apoio ao projeto. Sobre o tema, cf: Needell (2006, p. 278-283; p. 300-301; p. 307-314).

De acordo com Junqueira, a liberdade do ventre era o melhor plano a ser adotado naquela quadra no Brasil. A história mostrava o sucesso aquilatado a partir dessa resolução. Foi por meio dessa medida que a escravidão chegou a termo em Portugal e na Nova-Granada. Na ilha de Cuba, o processo de emancipação pelo ventre já estava em curso desde o ano anterior ao debate parlamentar brasileiro. Não obstante, o grande exemplo poderia ser colhido na maior república americana:

Mas quer a câmara saber se este plano tem por si a sanção mais brilhante que se poderia desejar? Vou dizê-lo, é o plano adotado por diversos Estados da América do Norte. (Apoiados).

Há vários Estados da União-Americana, portanto, que chegaram a emancipação completa sem passarem por nenhum abalo, quer social, quer político, empregando os meios que a proposta do governo aconselha a câmara dos senhores deputados. (Apoiados.).12 12 Cf. Annaes do Parlamento Brazileiro. Camara dos Srs. Deputados. Doravante ACD. Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve & C., 1871, Sessão de 11 de julho de 1871, p. 102.

O exemplo dos Estados Unidos não era mobilizado à toa. Quiçá tivesse sido adotada a senda moderada pela emancipação dos nascituros também nos estados do Sul, o país não precisaria ter passado por uma prolongada guerra civil para pôr fim ao cativeiro. Era possível, pois, evitar um desastre em território nacional. Por essa mesma razão, caso aprovado no Brasil, o projeto seria “como a última palavra que devemos dar sobre a matéria, a autoridade senhoril fica consolidada, porque então o escravo compreenderá que para obter a sua liberdade precisa do consentimento do seu senhor, e de se lhe tornar agradável”. O deputado pontuou ainda que essa reforma “tem por si o futuro, porém o futuro sem alteração notável para o presente”. 13 13 ACD. Sessão de 11 de julho de 1871, p. 101-106. Grifos meus. Em outros termos, o que se colocava era que dali em diante mais nenhuma medida legislativa tendente à emancipação deveria ser tomada. Assim, a liberdade do ventre e tão somente ela seria capaz de levar a escravidão, lentamente, ao seu fim, colocando ponto final no cativeiro por meio de uma modificação no futuro. O controle do ventre das escravizadas era a porta para prolongar os anos vindouros do cativeiro no Brasil. O que se defendia, portanto, era uma emancipação controlada, que, contudo, concedia sobrevida à escravidão.14 14 ACD. Sessão de 22 de agosto de 1871, p. 228-230.

Os opositores do projeto argumentavam que isso era impossível. Perdigão Malheiro manifestou claramente isso em três ocasiões. Conforme o deputado pela província de Minas Gerais, na sequência da aprovação da libertação dos nascituros

seremos forçados a decretar a emancipação imediata e simultânea em muito breve tempo, em 2 ou 3 anos (muitos apoiados da minoria) ou se o governo, em vista das circunstâncias gravíssimas em que se há de achar o país, não a fizer por ato de ditadura para salvar o Império, ela se fará por si e com todo o estrondo que uma reforma desta ordem é capaz de produzir nos fatos humanos. (Muitos apoiados; muito bem da minoria.).15 15 ACD. Sessão de 9 de agosto de 1871, p.97. Das falas de Malheiro, ver também: ACD. Sessão de 12 de julho de 1871, p. 124; ACD. Sessão de 26 de agosto de 1871, p. 298-299 e p. 102-103.

Desse modo, segundo Malheiro, o projeto ministerial seria um caminho sem volta e impossível de ser controlado, como pretendia o gabinete, pois estaria eivado de “circunstâncias gravíssimas”, que implicariam inevitavelmente na abolição próxima da escravidão. Cada uma a seu modo, as manifestações contrárias ao pensamento do ministério e de seus aliados seguiram essa mesma linha argumentativa.

Na casa vitalícia, o senador pela província de Minas Gerais, Antão, acompanhou de perto os deputados oposicionistas. Segundo ele, não apenas o caráter direto das medidas da proposta, como também o avanço da opinião abolicionista (que não seria barrada pelo projeto) anunciava que a emancipação total estava próxima; portanto, para que ninguém fosse pego de surpresa, todos deveriam se preparar de antemão. Assim, o projeto, caso aprovado, implicaria não o termo das discussões e deliberações sobre a abolição, como almejava o ministério, mas sim a porta de entrada para medidas mais extremas. Não seria a última, mas a primeira palavra. Isso era “profecia que se há de realizar”, era

tão claro, tão evidente que só querendo fechar os olhos ou rasgar todos os livros em que esta questão tem sido tratada; é não conhecer a marcha dos acontecimentos […]

Se trago esta infalibilidade não é porque eu seja vidente ou profeta ou tenha a presciência dos acontecimentos, mas é pela história; digo que são premissas de que nasce uma conclusão, como o atesta a história de todos os tempos.16 16 Annaes do Senado do Império do Brasil. Doravante AS. Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871. Sessão de 14 de setembro de 1871, p. 134.

Apesar de não acreditar que o fim do cativeiro seria assim tão próximo, Itaboraí acompanhou Antão. Segundo o visconde, Rio Branco iludia-se completamente, pois “depois de lançar a pedra do cume da montanha […] não a poderá fazer parar no meio da carreira.”17 17 Ibid., p. 139.

A predição dos opositores completava o diagnóstico realizado pelos próprios fazendeiros do Vale do Paraíba que inundaram o parlamento com petições demandando a não aceitação do projeto que, essencialmente, feria a liberdade de administração doméstica dos escravos. De acordo com esses fazendeiros, aprovado o ventre livre, a anarquia se instauraria no Brasil: os senhores perderiam seu poder moral, os escravos se insubordinariam, a produção agrícola ruiria e a emancipação se aceleraria de modo descontrolado.18 18 Cf. Miranda (2018). Como evitar tudo isso?

De acordo com a oposição, o projeto substitutivo apresentado por Perdigão Malheiro, ainda que tardiamente, daria conta do recado, pois tendia a resolver o problema em longo prazo, porém, sem qualquer intervenção na administração doméstica da escravidão. Com os senhores escolhendo quais escravos seriam manumitidos, o substitutivo não desmantelaria o poder moral dos proprietários e os cativos não teriam qualquer espaço para a insubordinação. Não haveria destruição das relações entre senhores e escravos, mas sim elementos para garantir a ordem e a disciplina. No juízo do próprio Malheiro, as medidas sugeridas findariam com a escravidão mais rapidamente do que o projeto do governo, no máximo 30 anos antes.19 19 Segundo o deputado mineiro: “é muito fácil e convincente o cálculo, é simplíssimo; a escrava que nascer na véspera da lei, e ficar no cativeiro, pode ter filhos até aos 45 anos; estes filhos são, pela proposta, obrigados a servir até os 21; aí temos que 45 e 21 são 60 anos! […] o projeto substitutivo tende a extinguir definitivamente a escravidão, sem classe de servos, em 20 ou 30 anos, o mais tardar; o sistema da proposta vai além do dobro”. Cf. ACD. Sessão de 26 de agosto de 1871, p. 300.

Não obstante a oposição, o pensamento do gabinete 7 de março estava completamente afinado com a fala de Junqueira, o deputado baiano. O ministro da agricultura deixou isso absolutamente claro ao anunciar sem meias palavras qual a política do gabinete no que tangia a emancipação: antecipar-se a qualquer radicalismo emancipacionista que pudesse imanar da sociedade civil e dirigir o processo de fim da escravidão, dando-lhe o tom ao assinalar “os limites a que se podia chegar sem perigo”. Resolver a questão era, segundo o próprio Rio Branco, de interesse dos próprios agricultores que estavam “sem saber o que pretende fazer o legislador, sem saber qual a lei em que viverá”. Naquele momento, era mais sensato tomar a dianteira do processo imprimindo-lhe uma direção, pois os anos vindouros poderiam ser palco de circunstâncias com capacidade de tornar “amanhã impossível o que hoje é tão fácil”.20 20 Ministro da agricultura. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871, p. 132-133; Rio Branco. ACD. Sessão de 14 de julho de 1871, p. 152. Essa preocupação em controlar o tempo, projetando um futuro a partir da leitura da história marcou as falas dos deputados.

Nas palavras de Alencar Araripe, por exemplo, que argumentava que os defensores do projeto sustentavam os interesses da lavoura, cumpria

resolver o problema com brevidade; a demora exigirá maiores sacrifícios para o futuro. […] Os nobres opositores da proposta, retardando a providência, concorrem, embora involuntariamente, para que o mal cresça pela exigência de mais enérgico remédio.

[…] O que os proprietários de escravos [do sul dos Estados Unidos] não quiseram por meios pacíficos e suaves, o tiveram pela força e violência das circunstâncias. Fujamos de semelhante hipótese, e aprendamos na alheia calamidade a evitar a nossa ruína.21 21 ACD. Sessão de 18 de julho de 1871, p. 197.

Assim, o problema não estava na proposição da liberdade do ventre, mas na oposição feita a ela. A história recente, novamente dos Estados Unidos, fornecia o mais vivo caso disso, o exemplo a ser evitado. E, como o Brasil se encontrava, de acordo com Araújo Lima, “sobre uma pressão temerosa”, pois ninguém sabia como permaneceria a escravidão, urgia resolver a situação de modo a acalentar a “ansiedade do espírito público”22 22 ACD. Sessão de 21 de julho de 1871, p. 226-227. . “A permanência da escravidão, como existe hoje, é que nos ameaça de graves perigos”, disse Rio Branco, ao sustentar que a proposta do ventre livre era composta por medidas moderadas que não tinham a capacidade de insubordinar os escravizados, tampouco de prejudicar o país, como argumentavam os fazendeiros e parlamentares contrários ao projeto de libertação. “A grande vantagem deste projeto” era que não inovava nada, porque concedia “muito à escravidão e muito pouco à liberdade”. No limite, eram medidas que minavam o cativeiro, porém de modo tão lento, gradual e controlado que acabavam por garantir a sua manutenção ainda por muito tempo, sem prejuízo real dos fazendeiros e das rendas nacionais.23 23 Rio Branco. ACD. Sessão de 31 de julho de 1871, p. 304-306. Cf. Ministro da agricultura. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871, p. 133. Sobre a oposição de fazendeiros e parlamentares ao ventre livre, cf.: Miranda (2018). Algo que toma mais força quando se compreende que os propugnadores da reforma tinham em mente que ela seria a palavra final sobre o assunto do cativeiro. Nos termos do chefe do gabinete:

[…] nós não queremos este projeto senão como solução completa (apoiados); e colocamo-nos entre os extremos, adotando as medidas mais moderadas e prudentes. Pelo projeto, a emancipação caminhará progressiva mas lentamente, tanto quanto é possível, e tanto quanto devem querer os grandes proprietários de escravos. […]

A virtude do nosso projeto consiste em que não tiramos os braços atuais à lavoura, em que não desorganizamos o serviço agrícola. (Apoiados e não apoiados). As manumissões que ele tende a animar e favorecer far-se-hão sem abalo, com a ação lenta e benéfica do tempo.24 24 ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871, Apêndice, p. 347. Grifos meus.

No Senado, Rio Branco arrematou o argumento: o projeto da liberdade do ventre era “uma solução completa e final”, “a solução mais razoável e adequada às nossas circunstâncias”.25 25 AS. Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871. Sessão de 15 de setembro de 1871, p. 155. Assim, apesar de parecer paradoxal, a defesa da emancipação do ventre escravo garantia a manutenção da escravidão nos anos vindouros; os fazendeiros, muito relutantes em 1871, acabariam por perceber isso.26 26 Conrad, op. cit, p. 145-146. Secundando Araripe, o visconde completava que a resistência à proposta é que poderia “criar perigos que hoje não existem”.27 27 ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871, Apêndice, p. 348. Mas, afinal, que perigos eram esses que impeliam a maioria a combater em favor da proposta?

AS RAÍZES LOCAIS E GLOBAIS DO DEBATE

Os perigos e o impulso à ação podem ser observados bem antes dos debates de 1871, quando o projeto do ventre livre tomava forma no universo político institucional brasileiro. O primeiro passo nesse sentido, sem dúvida, se deu em 1864, quando Pedro II recomendou à Zacarias de Góis e Vasconcelos, então chefe de gabinete, a liberdade dos nascituros como a medida “mais profícua” para encaminhar a escravidão ao seu fim.28 28 As instruções de Pedro II à Zacarias de Góis aparecem citadas em: Barman (2012), p. 284. Foi a observação atenta sobre o desenrolar da Guerra Civil Americana que levou o monarca brasileiro a propor a sugestão. Com efeito, e como a historiografia vem demonstrando, o contencioso dos Estados Unidos, sobretudo, o seu desfecho, com a aprovação da 13° emenda, abolindo a escravidão na república, criou um senso de preocupação com a manutenção da escravidão no Brasil, que passaria a ser o único país independente, além de única monarquia na América, a preservar a nefanda instituição.29 29 Cf. Bandeira (1978, p. 98-103); Conrad, op. cit, p. 88-100; Toplin (1972, p. 40-43), Barman, op. cit, p. 281-284; Chalhoub (2003, p. 139-142); Salles (2008, p. 79-110); Marquese e Parron (2011); Marquese (2017); Azevedo (2003, p. 59-61); Youssef, op. cit. Mas, se a recomendação de Pedro II foi o passo inicial, como explicar o lapso temporal de oito anos para que a liberdade do ventre fosse promulgada?

Nem todas as condições nas quais os homens e as mulheres fazem a história são escolhidas por eles e, nesse caso em particular, outro evento bélico, a Guerra do Paraguai, pôs em espera o encaminhamento político da emancipação no Brasil. No entanto, no decorrer da guerra no Cone Sul, o tema foi sobejamente estudado no âmbito do Conselho de Estado, instituição de caráter consultivo, convocada pelo imperador em assuntos matreiros, que contava com alguns dos mais importantes estadistas do Império.30 30 Cf. Martins, op. cit., p. 144-154; p. 281-289; p. 301. Foi ali que, em 1867, discutiu-se os famosos projetos de emancipação elaborados em 1866 por Pimenta Bueno, futuro Marquês de São Vicente, e elaborou-se um projeto único, com redação de Nabuco de Araújo, em 1868ARAÚJO, José Thomaz Nabuco de; SÃO VICENTE, José Antonio Pimenta Bueno, Marquês de. Trabalho sobre a extincção da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1868., que forneceu a base tanto de um projeto de liberdade do ventre apresentado à Câmara em 1870, mas igualmente da proposição ministerial de 1871 que finalmente foi aprovada em 28 de setembro daquele mesmo ano.

Em 1867, o Conselho de Estado foi consultado sobre a conveniência de acabar com a escravidão e, em caso positivo, quais as providências poderiam ser tomadas nesse sentido. Os projetos de Pimenta Bueno foram entregues aos conselheiros de tal modo a auxiliá-los em suas considerações. O debate se realizou em 1867 e as atas do Conselho relativas à discussão já foram devidamente analisadas.31 31 Cf. Salles, op. cit., p. 82-86; p. 95-110. O autor analisa não apenas as atas, mas também a composição do Conselho de Estado. Cf. Chalhoub, op. cit, p. 139-154. Cabe, contudo, recuperar uma das enunciações mais marcantes realizadas na ocasião, a de Nabuco de Araújo. Segundo o conselheiro, o Brasil estava isolado no cenário internacional ao manter a escravidão e não poderia resistir à pressão “do mundo inteiro”; logo, para ele, não fazer nada seria, portanto, um erro incomensurável.

No Brasil o perigo é mais sério e mais grave; está conosco; o perigo está dentro do País, pode surpreender-nos, afetar a ordem pública e a sociedade civil. Daí a urgência de conjurá-lo pela previsão, e pela providência; daí a necessidade de tomar a iniciativa desta grande questão; de evitar que se ela, torne uma questão política e presa dos demagogos. Impedir a torrente é impossível, dirigi-la para que não se torne fatal é de alta política. Não é conclusão do que digo, a abolição simultânea e imediata. Está isto bem longe do meu pensamento. É preciso fazer o que é possível. Assim damos satisfação ao mundo civilizado.32 32 Cf. Rodrigues (1973a, p. 110) (Versão digital disponibilizada pela Biblioteca do Senado Federal).

A opinião de Nabuco de Araújo era a de que com o país isolado a escravidão estava fadada a desaparecer no Brasil. Adiantar-se e encaminhar a solução dirigindo-a de modo sábio e previdente era imperativo para que o governo pudesse manter a ordem social no país, uma vez que a escravidão estava intrinsecamente enraizada aqui. Assim, conforme bem notou Ricardo Salles, se não havia dúvidas de que a escravidão era um problema a ser resolvido, o que realmente estava em jogo no Conselho de Estado naquele momento era a defesa da ordem senhorial e imperial.33 33 Cf. Salles, op. cit., p. 94-95. Sobre a ordem senhorial brasileira, cf: Mattos, 1987.

O modo como encarou o debate, mas igualmente a sugestão de que um único projeto emancipacionista deveria ser preparado, a fim de facilitar a discussão e uma eventual aprovação por parte do poder legislativo, contribuíram para que Nabuco de Araújo fosse nomeado, com Francisco Salles Torres Homem, Bernardo de Souza Franco e São Vicente, para redigir “um projeto sobre a extinção da escravatura no Império, de acordo com as ideias que obtiveram maioria de votos nas sessões do Conselho de Estado pleno”. Em momento oportuno, essa peça legislativa seria apresentada ao Parlamento34 34 Cf. Nabuco de Araújo e Pimenta Bueno, Marquês de São Vicente (1868, p. 110). algo que, inclusive, foi anunciado ao país na famosa Fala do Trono de 1867.

Nos dias 16, 23 e 30 de abril, bem como no dia 7 de maio de 1868, o Conselho de Estado ocupou-se com a apreciação do projeto redigido pela comissão.35 35 Cf. CONSELHO DE ESTADO (1871). As discussões tiveram um tom diferente em relação àquelas do ano anterior. Em 1867, a grande questão era se a escravidão deveria acabar. Convictos da necessidade de seu fim, o que os conselheiros discutiam agora na Quinta da Boa Vista era o meio pelo qual o Estado interviria para controlar o processo de termo daquela milenar forma de trabalho forçado dentro do Império do Brasil. A solução encontrada foi a liberdade do ventre, entretanto, não sem graves discussões. Não era tão simples assim aprovar a libertação dos nascituros e isso não decorria exclusivamente de um apego à escravidão. Muito estava em jogo, a própria ordem senhorial brasileira, como também o regime jurídico no qual se fundamentava a escravidão e o próprio direito de propriedade no Brasil. Na tradição jurídica ibérica, legada ao Império em virtude da colonização portuguesa e da adoção das Ordenações Filipinas pelo Brasil independente, o princípio do partus sequitur ventrem (o parto segue o ventre) era longamente respeitado e havia certo consenso em relação a ele. O oposto ocorreu no mundo anglo-saxão cujo antigo postulado jurídico chegou a encontrar mesmo alguma resistência em ser aceito, o que ajuda explicar, ainda que não na completude, a razão pela qual as leis de ventre livre se disseminaram no norte dos Estados Unidos. Romper o partus, portanto, era ir contra todo o arcabouço que sustentava o estado de direito brasileiro no século XIX. Era uma inovação que tocava inclusive no direito de propriedade dos senhores.36 36 Sobre as tradições jurídicas em torno do princípio do partus sequitur ventrem, cf: Pereira (2022). Daí as rusgas no Conselho de Estado, notadamente entre Nabuco de Araújo e o Barão do Bom Retiro. Segundo este:

Não tem porventura o nosso direito reconhecido sempre, como inconcussa a aplicação às escravas do axioma de direito - partus sequitur ventrem - ? Não há sido sempre essa a jurisprudência constante e uniforme de nossos tribunais? Como pois iremos hoje pô-la em dúvida? E se a não pomos em dúvida, como daremos em todos os outros casos uma indenização aos senhores, e só neste nos achamos autorizados para decretar a liberdade do fato do ventre escravo, isto é, de uma propriedade igual a outra sem a menor compensação? Onde, o direito que justifique a distinção? Onde, a lógica que a legitime? Não haverá nisto violação flagrante do direito de propriedade que a Constituição indistintamente mandou respeitar em toda a plenitude? […] Se hoje violarmos destarte o direito de propriedade, qual a segurança que damos aos senhores de que daqui a algum tempo os poderes do estado não se julgarão também autorizados para decretarem emancipações parciais anualmente feitas sem indenização?37 37 Cf. Rodrigues (1973b, p. 234). O primeiro grifo está no original, o segundo grifo é meu.

Nabuco discordava. A indenização pela desapropriação apenas deveria ocorrer, segundo ele, quando o escravo desde seu nascimento fosse propriedade dos senhores e estes fizessem o uso daqueles. Pela nova legislação que se propunha, aqueles que nascessem das escravas estariam livres, ou seja, nunca se tornariam propriedade dos senhores. “Antes de nascerem não há fato consumado, e por consequência o direito adquirido. A propriedade do escravo não é senão o usufruto.”38 38 Idem, p. 237.

Percebendo que a maioria dos presentes concordava com a inovação jurídica, o imperador, em maio de 1868, uma vez mais recorreu a Nabuco de Araújo para que ele redigisse um projeto final a ser novamente discutido entre os conselheiros e, logo depois, encaminhado ao Parlamento. Novamente, esses debates transpareceram na abertura dos trabalhos legislativos quando Pedro II disse que “o elemento servil tem sido objeto de assíduo estudo, e oportunamente submeterá o governo à vossa sabedoria a conveniente proposta.”39 39 A fala encontra-se na íntegra em Brasil (1872, p. 637-640). Os rumos da Guerra do Paraguai, contudo, arrefeceram o andamento do processo.

O conflito no Paraguai obrigou, em 1868, a troca da chefia do gabinete de ministros. Saiu Zacarias de Góis, entusiasta da emancipação, e entrou Joaquim José Rodrigues Torres, Visconde de Itaboraí, último expoente vivo da trindade saquarema. O encerramento da Guerra do Paraguai, que se prolongava em demasia, foi o foro privilegiado do novo gabinete. Enquanto a guerra perdurou, nenhuma manifestação quanto à emancipação voltou a ocorrer na agenda política imperial. No entanto, tão logo o conflito capitaneado pela Tríplice Aliança foi resolvido, parecia haver certa expectativa no país acerca da questão da emancipação, algo que se justifica diante dos anúncios públicos realizados nas aberturas dos trabalhos legislativos em 1867 e 1868. Contudo, com o fim da Guerra do Paraguai em 1870, quando o Parlamento abriu as portas, nada foi dito. Itaboraí resistiu inclusive às tentativas do imperador de inserir a emancipação na fala do trono daquele ano.40 40 Cf. Barman, op. cit., p. 331-332, Needell, op. cit., p. 255, nota 88; p. 409. Foi essa ausência que deu motivos para que a voz de Jerônimo José Teixeira Júnior se erguesse e fosse ouvida na Câmara dos Deputados. Numa interpelação, o deputado pelo Partido Conservador questionava “qual o pensamento do governo imperial sobre a solução da grave questão do elemento servil do império?”41 41 ACD. Sessões de 9 e 11 de maio de 1870, p. 11-12.

Eleito pela província do Rio de Janeiro, Jerônimo José Teixeira Júnior, Visconde do Cruzeiro (título obtido no ano da abolição, em 1888), era filho de Jerônimo José Teixeira, comerciante português que se estabeleceu na Corte, e casado com Ana Maria Neto Leme, filha de João Neto Carneiro Leme (comerciante de alimentos e de escravos entre o Valongo e as províncias de Minas Gerais e do Rio de Janeiro). Teixeira Júnior era casado com a filha de seu tio, Honório Hermeto Carneiro Leão, Marquês de Paraná, algo consoante aos padrões da época. Do casamento com a prima, nasceram cinco filhos e todos eles se casaram com membros da elite agrária. Destaca-se, nesse sentido, o matrimônio da filha mais nova com Paulino José Soares de Souza, homônimo de seu pai, o Visconde de Uruguai. O apoio que recebeu de importantes fazendeiros vale-paraibanos, como os Barões do Rio Preto, da Paraíba e de Paty do Alferes, senhores de vastas propriedades em terras e escravos, grandes produtores de café e detentores de opulenta reputação na região do Vale do Paraíba, para sua eleição à Câmara apenas corrobora que o deputado pelo Partido Conservador era um verdadeiro representante da elite agrária fluminense. Além da atuação política (chegou inclusive ao Senado e ao Conselho de Estado), inspirada e estimulada pelo seu tio-sogro, Teixeira Júnior, tal qual seu pai, também trabalhou no mundo financeiro e chegou à vice-presidência da Estrada de Ferro D. Pedro II (1859) e à diretoria do Banco do Brasil (1865).42 42 As informações acerca de Teixeira Júnior foram retiradas de Martins op. cit., p. 205-221; p. 239.

No dia de discussão da interpelação, Teixeira Júnior, honrando suas raízes conservadoras, deixou claro já de início sua simpatia pelo gabinete chefiado por Itaboraí, e expôs que fez o questionamento ao governo por conta da incerteza na qual o país havia ficado em virtude dos anúncios anteriores em Falas do Trono. O problema de suscitar o tópico e não o finalizar residia no fato de criar expetativas incertas quanto ao futuro da escravidão, o que gerava entraves ao bom funcionamento dos estabelecimentos agrícolas. Falando em nome dos proprietários de escravos, o deputado argumentou com a autoridade de quem conhecia de perto tanto a realidade agrícola quanto o mundo financeiro:

O laborioso agricultor que procura desenvolver as suas forças não acha mais facilmente o crédito que até então se encontrava; e aqueles que, sob a pressão de cautelosos credores, buscam liquidar-se para salvar o resto de suas fortunas não podem achar senão ruinosos preços para os seus estabelecimentos. Os capitalistas e os compradores respondem-lhes com a fatídica ameaça do gabinete de 3 de Agosto: “Esperai a solução da questão da emancipação prometida pelo governo imperial em 1867; não sabemos o que valem vossos bens!43 43 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 21. Grifos no original.

Sem saber o valor exato dos escravos, a capacidade creditícia dos senhores era tolhida, pois os cativos eram frequentemente utilizados como garantia aos empréstimos.44 44 Sobre o tema, cf.: Schulz (2013, p. 87-100); Marcondes (2002). Desvalorização da propriedade e perda do poder de contratação de crédito eram fatores que desmoralizavam os senhores e enfraqueciam a ordem senhorial. Não era outra a preocupação do deputado ao apresentar sua interpelação, senão encontrar o remédio que restabelecesse essa mesma ordem no Brasil.

Ele esperava que o gabinete tomasse para si a missão de resolver a questão da emancipação evitando prejuízos e calamidades não apenas aos proprietários de escravos individualmente, mas à toda ordem senhorial. Uma demanda próxima daquilo que, em 1867, defendeu Nabuco de Araújo, quando da primeira vez que o tema visitou o Conselho de Estado. A noção, de fato, era a mesma e será encontrada, conforme será visto, em 1871. Se o futuro da escravidão estava comprometido no cenário internacional, havia a necessidade de dirigir e formatar o processo de fim do cativeiro garantindo ao máximo possível a manutenção da ordem social vigente. Assim, Teixeira Júnior definiu o papel do Partido Conservador:

E, portanto, o que deve querer o Partido Conservador é que essa grave questão possa resolver-se prudente e cautelosamente sem grande abalo social, respeitando-se o direito de propriedade, garantindo-se os legítimos interesses da nação e salvaguardando-se a tranquilidade, a segurança e a riqueza pública. O Partido Conservador não pode abandonar às discussões dos clubes e da praça pública uma questão tão incandescente, e cuja boa solução exige ser dirigida pelos poderes do Estado.45 45 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 23. Grifos meus.

Por que a solução da emancipação exigia “ser dirigida pelos poderes do Estado”? Completando a constatação de ruptura de equilíbrio de manutenção do cativeiro no cenário internacional causado pelo desfecho da Guerra Civil Americana, Teixeira Júnior adicionou à discussão um tópico novo: a tímida, porém crescente manifestação pró-emancipação que se fazia observar no Brasil, notadamente depois da reversão ministerial de 1868. Além da ala radical do Partido Liberal inserir em seu programa a abolição, despontou pelo Império, apenas entre 1868 e 1870, um total de dezenove associações abolicionistas, das quais 12 surgiram só em 1870. Nos tribunais de São Paulo, Luiz Gama, que anunciava na imprensa o oferecimento gratuito de seus serviços como advogado, audaciosamente conseguia a liberdade de escravizados por meio da interpretação radical da lei de 1831 e, finalmente, as províncias do Amazonas, do Pará, do Maranhão, do Piauí, do Ceará, do Rio Grande do Norte, da Paraíba do Norte, de Pernambuco, de Alagoas, de Sergipe, da Bahia, do Paraná, de Santa Catarina, de Minas Gerais e de Goiás, aprovavam fundos de emancipação em suas respectivas assembleias.46 46 Sobre as associações abolicionistas: Alonso, op. cit., p. 39; p. 93-98; p. 436; Castilho (2016, p. 22-52). Para a atuação de Luiz Gama veja-se: Azevedo (2010, p. 95-146), Alonso, op. cit., p. 103-109. Os fundos de emancipação aprovados nas províncias aparecem no discurso de 1871 de Teodoro Machado, então Ministro da agricultura. Cf. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871, p. 126-129. Para uma síntese que dá conta da amplitude dos acontecimentos, veja-se: Costa (1986).

Assim, diante desse quadro, a questão exigia ser dirigida, pois continha em si um caráter “tão incandescente” que, caso fosse abandonada pelos poderes do Estado, os “clubes” e a “praça pública”, isto é, a sociedade civil e a imprensa corriam o risco de se incendiarem em paixões emancipacionistas. A irracionalidade e a cegueira, própria das paixões, abalaria sensivelmente a sociedade, desrespeitaria o direito de propriedade e obstaria a salvaguarda da “tranquilidade, [d]a segurança e [d]a riqueza pública”. Sem dúvidas, todos esses elementos diziam respeito à manutenção dos interesses agrário-escravistas que, na fala de Teixeira Júnior, confundiam-se com a garantia dos interesses nacionais. Contudo, quem seria capaz de resistir à paixão e conduzir o processo de emancipação com prejuízos mínimos à agricultura? O Partido Conservador, dirigente por excelência do Estado brasileiro. Como a agricultura já sofria pela indefinição do tema, urgia a necessidade de se antecipar ao incêndio e dirigir a solução do problema da emancipação.

Ao final de sua fala, Teixeira Júnior perguntou se o governo pretendia ou não “iniciar as medidas que exigem a incerteza e ansiedade em que estão todos os interesses da sociedade”. Reconheceu que “a questão da emancipação no Brasil não se entende unicamente com a liberdade do escravo. Ela pode importar o abalo de todas as relações sociais, e até da tranquilidade e segurança pública.”47 47 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 24-25. Fundindo a atribuição concebida ao Partido Conservador com a história recente, alertava:

Aos poderes do Estado cumpre evitar os males horrorosos que a emancipação rápida e sem transição causou sempre em todos os países em que tal calamidade se tem dado.

Aí está a história contemporânea apresentando os exemplos do Haiti, das colônias francesas em 1846, e dos Estados Unidos durante a espantosa guerra civil que ainda há bem pouco tempo tanto impressionou o mundo civilizado.48 48 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 25.

Assim, manifestando clara preocupação em administrar o futuro, adiantando-se e dando o tom da reforma vindoura, Teixeira Júnior antecipou o que seria a estratégia de defesa da emancipação perpetrada pelo gabinete Rio Branco: a liberdade do ventre como a última palavra na legislação escravista do Império, aquela que readequaria o Brasil ao quadro internacional e conteria toda e qualquer radicalização do processo de emancipação. O cálculo de Teixeira Júnior era claro: aprovar o ventre livre era dirigir o tempo da emancipação de modo ordeiro. Valia o preço de se afastar de suas bases eleitorais para salvaguardar a ordem social brasileira. A resposta do Visconde de Itaboraí, contudo, foi a mais decepcionante que Teixeira Júnior poderia esperar. O autor da interpelação tinha como expectativa a ação de um político conservador dirigente, mas o que encontrou foi um conservador emperrado. Segundo o visconde, eram raros os brasileiros que não desejavam o fim da escravidão, isso porque o país estava inspirado pelos “dogmas da civilização moderna”. Apesar disso, ele lembrava que abolir a escravidão, regime de trabalho que estava arraigado há mais de três séculos no Brasil, importava “uma profunda transformação da vida social” e, se assim o era,

o governo não pode, não deve enunciar pensamento, nem indicar medida que não seja maduramente refletida, que não seja firmada em dados estatísticos (apoiados), que ainda nos falecem, sem estar convencido de que exprime a genuína vontade nacional. (Muito bem; muitos apoiados.)49 49 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 26.

Além disso, a Guerra do Paraguai, mesmo que já finalizada, continuava a exigir sacrifícios ao Império de tal modo que não se podia agitar o espírito público com um assunto tão delicado.

Apenas pontuando entraves à emancipação, o Visconde de Itaboraí esquivava-se de responder à interpelação. Assim, não dizia que ajudaria na resolução da questão, como também não afirmava que era contrário a seus pressupostos. Mesmo parecendo o contrário, o líder saquarema era coerente em seu discurso. Começou dizendo que quase ninguém queria a manutenção do cativeiro, pois os tempos da civilização moderna eram outros. Por um lado, de maneira hábil não se incluiu diretamente nessa exceção, mesmo que toda sua carreira política e sua ardente defesa da reabertura do tráfico de escravizados efetivamente demonstrassem o contrário. Por outro, não mostrou nenhuma simpatia à ideia de inserir nos tópicos do governo a emancipação escrava. Limitou-se, ao fim de sua fala, a dizer que se alguém submetesse à Câmara dos Deputados algo do tipo o assunto seria debatido. A resposta de Itaboraí circulou no Anti-Slavery Reporter, periódico da British and Foreign Anti-Slavery Society. O chefe de gabinete foi ali censurado e os redatores escreveram que

os políticos dos estados sulistas da União Americana falavam, dez anos atrás, como o presidente brasileiro fala. […] Eles não leram os sinais dos tempos, mas tornaram-se impotentes antes da força acumulativa dos eventos. Eles escreviam, discursavam e lutavam por direitos e propriedades em escravos; eles provocaram a guerra e as consequências foram terríveis.50 50 Cf. Anti-Slavery Reporter (1870, p. 25-27).

José de Alencar que, em 1867, sob o pseudônimo de Erasmo, havia publicamente censurado o imperador por conta da resposta do governo à Junta Francesa de Emancipação pela libertação de escravos para lutarem na Guerra do Paraguai e por conta da inserção da questão servil na Fala do Trono51 51 Ver, sobre isso, particularmente a segunda carta compilada em Alencar (2008, p. 55-76). , secundou Itaboraí, aprimorando seu argumento inicial:

[…] raros serão os brasileiros que aceitem a instituição da escravidão como uma instituição legítima. Todos nós brasileiros desejamos ardentemente ver desaparecer do país essa instituição, todos nós brasileiros fazemos votos para que deixemos de formar no mundo civilizado a exceção triste (digamos a verdade), que muito breve teremos infelizmente de constituir.52 52 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 27. Grifos meus.

E, depositando fé na iniciativa particular como promotora de reformas, acrescentava que o povo

legisla melhor pela educação e pelos costumes do que podem legislar os representantes da nação por meio de leis expressas, que serão letra morta se não germens de graves perturbações, quando não se conformarem com o espírito e a índole da sociedade.53 53 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 27. Grifos meus.

Muito possivelmente, ao enunciar a “exceção triste que muito breve” o Brasil se constituiria, José de Alencar tinha em mente o contínuo avanço abolicionista no Império espanhol que, poucos dias após a discussão da interpelação de Teixeira Júnior, foi capaz de encaminhar às cortes espanholas pelas mãos de Segismundo Moret um projeto de emancipação muito semelhante ao que se pretendia no Brasil, mas que lá foi aprovado naquele mesmo ano.54 54 Para a abolição da escravidão no Império espanhol, particularmente em Cuba, cf.: Scott (1991); Schmidt-Nowara (1999); Childs (2017).

Quanto à segunda assertiva do deputado-romancista, a mensagem que se passava era clara. De nada adiantava a promulgação de uma lei sem que ela tivesse respaldo na sociedade sobre a qual recairia. Se isso ocorresse, seria letra morta. Quando o assunto era a escravidão e, em particular, os meios a cerceá-la, fosse ao acesso ou ao direito de propriedade, a história do Brasil contribuía com um exemplo vivo demonstrando a capacidade da anulação prática dessa legislação pelo “espírito e a índole da sociedade”. Todos ali presentes lembravam muito bem que não fora outro o caso na década de 1830, e poderia muito bem o sê-lo agora, em 1870. Por esta razão, José de Alencar recomendava o exato oposto daquilo que Teixeira Júnior propunha: que ninguém se apressasse adiantando algo que poderia não corresponder às aspirações da sociedade brasileira, em geral, e dos fazendeiros e proprietários de escravos, em particular.

Teixeira Júnior, desapontado, conforme declarou, com Itaboraí e José de Alencar, notáveis expoentes do Partido Conservador que ele admirava há muito, disse ao final da sessão, em mais uma concordância com Nabuco de Araújo, que “o pior sistema, a meu ver, é a inércia a que o governo se condena”. Na inércia, o futuro da agricultura estaria incerto.55 55 ACD. Sessão de 14 de maio de 1870, p. 29-30. Mas, inerte Teixeira Júnior não ficou. O deputado conseguiu a eleição de uma comissão especial que não apenas deu parecer favorável sobre a matéria da emancipação como apresentou um projeto de libertação dos nascituros baseado nos trabalhos realizados pelo Conselho de Estado entre 1867-1868.56 56 ACD. Sessões de 23 e 24 de maio de 1871. ACD. Sessão de 16 de agosto de 1870, p. 163-209. Desgastado desde maio ao chocar-se com o monarca, a situação do ministério agravou-se ao final desse mês com a interpelação de Teixeira Júnior. O mesmo ocorria com o próprio Partido Conservador. A interpelação de Teixeira Júnior, as respostas de Itaboraí e de José de Alencar e o relatório final da comissão deixavam claro que havia uma divergência interna no seio do Partido Conservador quanto ao tema da emancipação escrava. Ainda em 1870, Itaboraí saiu do cargo e abriu-se espaço para a ascensão do Visconde de São Vicente, redator dos projetos emancipacionistas de 1866, à chefia do gabinete, cargo ocupado por brevíssimo período. Foi então que Rio Branco, recém agraciado com o título de visconde, subiu, em 1871, à posição de presidente do conselho dos ministros. Uma das primeiras tarefas era encarar a demanda de Teixeira Júnior, isto é, antecipar-se e dirigir o problema da emancipação controlando, assim, seus efeitos perversos sobre a agricultura e evitando todo e qualquer radicalismo.

DE VOLTA À 1871: AS EXPECTATIVAS PRETÉRITAS DO FUTURO

A emancipação dos nascituros era uma “questão gravíssima”, como a classificou o ministro da agricultura em pleno debate de 1871, cuja “força impulsora” não poderia ser contida mais tarde caso o poder público não tomasse a dianteira. “Devia dirigi-la”, continuou, “esta é a verdade, para que o país não tivesse de lamentar fatos como aqueles ocorridos nas colônias inglesas o que ao governo cumpre evitar por todos os modos em nosso país.”57 57 AS. Sessão de 11 de setembro de 1871, p. 107. O ministro fazia referência, notadamente, às revoltas de escravos ocorridas em Demerara (1823) e na Jamaica (1831-32). A brutal repressão britânica ao movimento dos cativos nas suas duas colônias fez crescer uma mobilização pública pró-emancipação na metrópole que não foi controlada até que a abolição nas colônias inglesas fosse decretada, o que ocorreu em 1833.58 58 Cf. Drescher (2011, p. 345-376); Costa (1998, p. 212-215). Para uma análise conjunta dessas revoltas e da revolta de Barbados em 1816: Matthews (2006). Assim, a história também mostrava que perder por qualquer razão o controle da esfera pública significava arruinar a direção do processo de fim da escravidão.

Como o primeiro discurso de Rio Branco no debate de 1871 deixou claro, ao segurar as rédeas da emancipação pela proposição da liberdade do ventre escravo, o que se intentava era tanto uma readequação do Brasil aos quadros internacionais, assinalando ao mundo que a escravidão no país futuramente chegaria a termo, quanto à contenção das crescentes manifestações nacionais favoráveis à emancipação.59 59 Rio Branco, ACD. Sessão de 14 de julho de 1871, p. 145-146. Se os propugnadores da proposta justificavam seu apoio ao ventre livre, pois diziam estar respaldados na opinião pública, o que eles almejavam era justamente conter essa opinião a fim de frear qualquer intensificação drástica no processo de fim do cativeiro.

Depois da promulgação da liberdade do ventre das mulheres escravas, nada deveria ser feito para conduzir a abolição. O ponto final já estava estabelecido e a liberdade do ventre marcaria o tom da lenta e controlada transformação pela qual o país passaria: a transição ordeira ao trabalho livre. As expectativas eram grandes e podem ser apreendidas, à guisa de conclusão, na representação visual comemorativa do evento que abriu este artigo.

A gravura de Henrique Fleiuss homenageou o gabinete e a família real pela aprovação da Lei do Ventre Livre. Mas, ela é mais do que isso, deixando transparecer todo o ideal de última palavra da nova lei e as esperanças contidas no lento processo de emancipação escrava. Dito de outro modo, é possível visualizar as formas que o debate de 1871 e as potencialidades da lei de 28 de setembro reverberaram na sociedade civil e foram cristalizados pela pena do artista numa única composição. Uma das forças da imagem reside no fato de que Fleiuss foi capaz de realizar uma projeção temporal a partir das expectativas contidas na promulgação da liberdade do ventre.

Para que esse potencial heurístico da imagem seja mais bem apreendido, vale decompô-la em partes. No centro (Figura 2), uma sublime figura feminina representando a liberdade do ventre aparece entre mães escravizadas com seus filhos. Uma de suas mãos aponta para cima, ao céu, indicando um futuro de salvação, algo que se coaduna às diversas representações do futuro nas produções visuais oitocentistas.60 60 Essa perspectiva de um futuro salvacionista presente no universo oitocentista é discutida em pormenores em: Pimenta (2021). Agradeço a João Paulo Pimenta pela discussão que tivemos sobre o tema. Contudo, a mão levantada (Figura 3) vai também na direção exata das figuras do imperador, Pedro II, do chefe de Gabinete, Visconde do Rio Branco, e da princesa regente, Isabel. Ora, aí se assinala, de acordo com Fleiuss e, certamente, com boa parte da sociedade civil brasileira de então, os responsáveis diretos pela obra da emancipação, ou pela graça emanada dos céus, com inspiração salvacionista divina, tal qual a herética representação angelical de Isabel na imagem. A bela cena, contudo, não deixa de ter um certo tom melancólico, pois as crianças maiores não foram agraciadas com a manumissão e, por essa razão, a liberdade olha com ternura e estende uma de suas mãos como em consolo às aflições maternas. Atitude que de nada adiantava. Essas crianças comporiam a mão de obra escrava nos anos vindouros, isto é, garantiriam aos fazendeiros brasileiros a manutenção da ordem vigente do trabalho sem grandes abalos. Seus filhos, embora nascessem sob a égide da nova lei e fossem considerados ingênuos, poderiam ser conservados nos grilhões do cativeiro e sujeitos a extensivas jornadas laborais até completarem 21 anos.

Figura 2
Detalhe da figura feminina da gravura.61 61 Cf. Fleiuss (1923).

Figura 3
Detalhe dos responsáveis pela lei.

Se isso pode ser lido como a injustiça causal da nova lei, o restante da cena representa a maior mensagem de todas, de tal modo que a injustiça da arbitrariedade da liberdade pelo dia do nascimento é deixada de lado. Ao flanco esquerdo da figura feminina, uma mãe puérpera entrega decididamente seu filho à liberdade: trata-se da primeira criança nascida de mãe escravizada e agraciada com a liberdade pela nova lei. A beleza da cena, no entanto, encobre o que se tratava de uma liberdade até a segunda página. Nunca é demais repetir: as crianças nascidas de mulheres escravizadas poderiam, pelos dispositivos da lei de 1871, ser mantidas sob tutela, como ingênuas, até alcançarem 21 anos de idade. Para todos os efeitos, ainda que livres, os ventres dessas mulheres continuariam produzindo trabalhadores compulsórios para os campos brasileiros, até que a última criança do sexo feminino nascida no dia 27 de setembro de 1871, ou seja, um dia antes da promulgação da nova lei, conquistasse sua liberdade ou morresse. No limite, embora projetasse um futuro sem escravidão, a nova lei mantinha a reprodução social do trabalho forçado por meio da instrumentalização do ventre das mulheres cativas.62 62 Para os estudos que mostraram a reprodução dos escravos: Libby (1988); Libby e Paiva (1995), Bergad (2004), Salles, op. cit., p. 64-69; p. 155-159; p. 229-232. Toda essa ideia pode ser compreendida dentro da teoria da reprodução social, isto é, a ideia do controle dos corpos femininos na produção gestacional de novos trabalhadores. Para um estudo que analisou detidamente essa teoria na realidade oitocentista brasileira, veja-se: Figueira (2021). Ainda que visível, expressar isso pode não ter sido a intenção imediata de Fleiuss, mas efetivamente é o que está representado e em íntimo compasso com o planejamento do gabinete Rio Branco. Nas palavras do próprio visconde, citadas acima, era um projeto que concedia “muito à escravidão e muito pouco à liberdade”63 63 ACD. Sessão de 31 de julho de 1871, p. 304-306. .

Há uma mirada no futuro, uma aposta de realização da emancipação a partir da abolição do ventre. A despeito da resignação das mães que não tiveram seus filhos libertos, os escravos no Brasil seriam paulatinamente postos em liberdade pelos dispositivos da nova legislação. Não mais nasceriam escravos no Império e aqueles que continuariam em condição de cativeiro aos poucos seriam libertos pelo fundo de emancipação. Com a perspectiva da liberdade, os escravos acalmariam os ânimos e a opinião abolicionista arrefeceria, essa era a aposta. Tudo sob controle, ao longo do tempo a maior transformação social ocorreria na estrutura brasileira: a transição da escravidão para o trabalho livre. A lei de 1871 seria a última palavra na legislação e findaria o cativeiro de modo ordeiro, como o deputado Junqueira, o Visconde do Rio Branco e o ministro da agricultura asseveraram reiteradas vezes.

Na esteira da emancipação, a agricultura e o comércio seriam agraciados com a imigração e a colonização (Figuras 4 e 5). Novos trabalhadores espontaneamente desembarcariam no país, livre da pecha escravista, trazendo suas famílias inteiras. Eles cultivariam as vastas terras e auxiliariam na produção de riquezas agrícolas, que seriam comercializadas e gerariam cada vez mais divisas ao Império. O ouro agrícola, a julgar pelas sacas representadas na gravura, era o café que a essa altura já havia conquistado as vastas terras férteis do Oeste Paulista. O navio a vapor e a ferrovia simbolizam também o mundo moderno e civilizado entrando no Brasil na esteira da liberdade do ventre escravo. O ajuste com o cenário internacional estava feito. Por ação dos estadistas nacionais o Império ingressava no tempo da liberdade.

Figura 4
Detalhes do comércio e da colonização.

Figura 5
Detalhes da agricultura e imigração.

A análise dos fenótipos e vestimentas dos trabalhadores constantes nas Figuras 4 e 5 deixam claro também que a nova mão de obra brasileira deveria ser branca e europeia. A lei de 28 de setembro apagaria duplamente a escravidão no país: marcando o fim da instituição em longo prazo e abrindo espaço para o branqueamento do país, algo bastante influenciado pelas teorias científicas do século XIX que afirmavam sobre a inferioridade dos negros e asiáticos e, evidentemente, exaltavam a superioridade dos homens brancos, sobretudo, os europeus. Autores como Arthur de Gobineau e Louis Agassiz, que chegaram a visitar o Brasil e a circular nos circuitos mais distintos da sociedade imperial, também frequentavam e formavam a ideia nacional de que os negros eram degenerados, vadios e criminosos em potencial. Uma massa populacional tão abjeta, argumentavam, que só se sujeitaria ao trabalho mediante a coerção dos grilhões. Utilizando de abordagens históricas, etnológicas e mesmo biológicas, a partir da transposição da teoria da evolução de Darwin para a compreensão da ordem social, os diversos teóricos postulavam a marginalidade racial da população negra.64 64 Novamente, há uma longa bibliografia sobre o tema. Entre os trabalhos que analisaram desde as percepções senhoriais, as representações na imprensa, o panorama mais amplo das teses de inferioridade até a constituição do racismo no Brasil, veja-se, respectivamente: Azevedo (2004); Schwarcz (2017), Skidmore (1976), Bastide e Fernandes (2008).

Essa concepção, com foros de cientificidade, também seria replicada no Brasil, conforme atestam os trabalhos de Sílvio Romero, Nina Rodrigues e Graça Aranha. Contudo, numa região na qual a escravidão existia há nada menos do que três séculos, é natural que a população negra brasileira não fosse numericamente desprezível. O problema era claro: de que forma livrar o país não apenas do cancro escravista, mas da pecha da raça negra, então concebida como inferior? A solução brasileira foi o branqueamento, algo que pode ser apreendido, para ficar num único exemplo, no caso do diretor do Museu Nacional, João Batista de Lacerda. Segundo ele, como a população negra tinha baixa natalidade e a imigração de brancos era incentivada pelo governo, com o tempo, via miscigenação, o gene branco mais forte, determinante, se imporia no país. Essa tese foi apresentada com orgulho por Lacerda diante de ampla plateia no I Congresso Universal das Raças que ocorreu em Londres, em 1911. Três anos depois, até Theodore Roosevelt louvou aquilo que chamou de solução brasileira. Era, decisivamente, consoante afirmava o ex-presidente norte-americano, um trunfo quando comparado à solução segregacionista dos Estados Unidos.65 65 O episódio do diretor do Museu Nacional e os comentários de Roosevelt sobre o branqueamento no Brasil podem ser consultados em Skidmore, op. cit., p. 81-93. Skidmore também analisou os trabalhos de Romero, Rodrigues e Aranha, cf. op. cit., p. 71-79; p. 127-130.

Localizado no início do século XX, o exemplo mostra um ponto de chegada das ideias racistas brasileiras e de como a elite nacional afirmava ser possível acabar com o problema do negro: fazendo ele desaparecer. No longo debate em torno da Lei do Ventre Livre, nenhum parlamentar ousou levantar essa questão, mas ela estava presente no ideário de todos eles e a gravura de Henrique Fleiuss foi capaz de captá-la. No bico da pena de Fleiuss, enquanto uma criança era liberta pela lei de 28 de setembro, nada menos do que cinquenta imigrantes brancos chegavam ao Brasil, daí a celebração. A imagem completava os discursos parlamentares, a “solução completa”66 66 ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871, Apêndice, p. 347. que Rio Branco afirmava estar defendendo, sem dúvida, passava também pelo branqueamento nacional.

O ventre livre, com todas as potencialidades de controle do tempo da abolição brasileira e de ajuste com o mundo civilizado, vislumbradas por seus propugnadores, ficaria registrado com glória na história (Figuras 6 e 7). Tudo abençoado pela figura angelical da Princesa Isabel, responsável por assinar a lei de 28 de setembro de 1871, no topo da imagem (Figura 8). Com seu pai e o ministro Rio Branco, era uma das dirigentes que encaminhariam o fim da escravidão de um modo controlado e benéfico ao país. A história seria formatada por eles em um único ato legislativo. E o foi, todavia, não do modo previsto. A história tem o potencial de pegar homens e mulheres de surpresa. As novas condições da década de 1880, notadamente a contundente campanha abolicionista e o adensamento da ação dos escravizados contra o cativeiro, desorganizaram todo o processo idealizado em 1871, marcando o fracasso do projeto de controle ordeiro do tempo da abolição.

Figuras 6 e 7
Alegorias da História e da Glória.

Figura 8
Princesa Isabel.

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  • 1
    Este artigo foi desenvolvido a partir de alguns pontos de minha dissertação de Mestrado. Tive a feliz oportunidade de discutir a primeira versão do texto em uma das reuniões do Laboratório de Estudos sobre o Brasil e o Sistema Mundial/Universidade de São Paulo (LabMundi/USP), do qual faço parte. Agradeço a todos pelas notáveis sugestões que fizeram naquela ocasião, tentei, na medida do possível, incorporá-las.
  • 3
    Sobre Henrique Fleiuss, o comércio da gravura e a crítica na imprensa, veja-se, respectivamente: Fleiuss. (1923FLEIUSS, Max. Centenário de Henrique Fleiuss. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 148, p. 770-784, 1923. T. 94.), Semana Illustrada (Anno XI, p.4527AVISO. Semana Illustrada, Rio de Janeiro, p.4527, Anno XI., N. 566.), Jornal do Commercio (1871O QUADRO ALLEGORICO DO SR. H. FLEIUSS. Jornal do Commercio, Rio de Janeiro, p. 2, 3 out., 1871., 3 out. p.2).
  • 4
    Cf. Barman (2012BARMAN, Roderick. Imperador Cidadão: e a construção do Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2012., p. 341-342).
  • 5
    Agradeço a Nicole Bianchini pela paciência e disponibilidade de me auxiliar na compreensão do universo da produção visual. As referências na próxima nota também devo a ela.
  • 6
    Nesse sentido, a imagem deve ser compreendida como uma dimensão da vida social, um documento histórico que apresenta, representa ou reapresenta o mundo. Para uma discussão mais detalhada sobre o sentido de imagens enquanto documento histórico dotado de potencial à compreensão do passado, cf: Meneses (2003MENESES, Ulpiano Bezerra de. Fontes Visuais, Cultura Visual, História Visual: Balanço Provisório, Propostas Cautelares. Revista Brasileira de História, São Paulo, v. 23, n. 45, p. 11-36, 2003.), Weller e Bassalo (2011WELLER, Wivian; BASSALO, Lucélia de Moraes Braga. Imagens: Documentos de Visões de Mundo. Sociologias, Porto Alegre, v. 13, n. 28, p. 284-314, 2011.).
  • 7
    A bibliografia é extensa e não se pretende esgotá-la nesta nota. Para um exemplo de cada uma das correntes mencionadas, ver, respectivamente: Costa (2012COSTA, Emília Viotti da. Da Senzala à Colônia. 5. ed. São Paulo: Editora Unesp, 2012.), Carvalho (2007CARVALHO, José Murilo de. A Construção da Ordem e Teatro de Sombras. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2007.), Alonso (2015ALONSO, Angela. Flores, votos e balas: O movimento abolicionista brasileiro (1868-1888). São Paulo: Companhia das Letras, 2015.), Conrad (1978CONRAD, Robert Edgar. Os Últimos anos da escravatura no Brasil (1850-1888). 2. ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 1978.), Chalhoub (2011CHALHOUB, Sidney. Visões da liberdade: Uma história das últimas décadas da escravidão na Corte. São Paulo: Companhia das Letras , 2011.).
  • 8
    Cf. Koselleck (2006aKOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: Contribuições à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006a.), p. 16 e p. 307-313, Sewell Jr (2017SEWELL JR, William. Lógicas da história: teoria social e transformação social. Petrópolis: Vozes, 2017.), p. 23-24.
  • 9
    Cf. Koselleck (2006aKOSELLECK, Reinhart. Futuro Passado: Contribuições à semântica dos tempos históricos. Rio de Janeiro: Contraponto, 2006a.), p. 36 e p. 79-94, Koselleck (2014KOSELLECK, Reinhart. Estratos do tempo: estudos sobre história. Rio de Janeiro: Contraponto , 2014.), p. 189-205.
  • 10
    Cf. Koselleck (2006bKOSELLECK, Reinhart. Crisis. Journal of the History of Ideas, Philadelphia, v. 67, n. 2, p. 357-400, 2006.).
  • 11
    Cf. Blake (1883BLAKE, Augusto Victorino Alves Sacramento. Diccionario Bibliographico Brasileiro. Rio Janeiro: Typographia Nacional, 1883. v. 3., p. 464), Javari (1962JAVARI, Barão de. Organizações e Programas Ministeriais. Regime Parlamentar no Império. Rio de Janeiro: Arquivo Nacional, 1962., p. 162). A nomeação de Junqueira em 1872 pode ser enquadrada na prática de patronagem utilizada por Rio Branco para garantir apoio ao projeto. Sobre o tema, cf: Needell (2006NEEDELL, Jeffrey. The Party of Order: The Conservatives, the State, and Slavery in the Brazilian Monarchy, 1831-1871. Stanford: Stanford University Press, 2006., p. 278-283; p. 300-301; p. 307-314).
  • 12
    Cf. Annaes do Parlamento Brazileiro. Camara dos Srs. Deputados. Doravante ACD. Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. Villeneuve & C., 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., Sessão de 11 de julho de 1871, p. 102.
  • 13
    ACD. Sessão de 11 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 101-106. Grifos meus.
  • 14
    ACD. Sessão de 22 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 228-230.
  • 15
    ACD. Sessão de 9 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p.97. Das falas de Malheiro, ver também: ACD. Sessão de 12 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 124; ACD. Sessão de 26 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 298-299 e p. 102-103.
  • 16
    Annaes do Senado do Império do Brasil. Doravante AS. Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871. Sessão de 14 de setembro de 1871, p. 134BRASIL. Anais do Parlamento Brasileiro: Senado (AS). Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871..
  • 17
    Ibid., p. 139.
  • 18
    Cf. Miranda (2018MIRANDA, Bruno da Fonseca. O Vale do Paraíba contra a Lei do Ventre Livre, 1865-1871. 2018. Dissertação (Mestrado em História Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.).
  • 19
    Segundo o deputado mineiro: “é muito fácil e convincente o cálculo, é simplíssimo; a escrava que nascer na véspera da lei, e ficar no cativeiro, pode ter filhos até aos 45 anos; estes filhos são, pela proposta, obrigados a servir até os 21; aí temos que 45 e 21 são 60 anos! […] o projeto substitutivo tende a extinguir definitivamente a escravidão, sem classe de servos, em 20 ou 30 anos, o mais tardar; o sistema da proposta vai além do dobro”. Cf. ACD. Sessão de 26 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 300.
  • 20
    Ministro da agricultura. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 132-133; Rio Branco. ACD. Sessão de 14 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 152.
  • 21
    ACD. Sessão de 18 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 197.
  • 22
    ACD. Sessão de 21 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 226-227.
  • 23
    Rio Branco. ACD. Sessão de 31 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 304-306. Cf. Ministro da agricultura. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 133. Sobre a oposição de fazendeiros e parlamentares ao ventre livre, cf.: Miranda (2018MIRANDA, Bruno da Fonseca. O Vale do Paraíba contra a Lei do Ventre Livre, 1865-1871. 2018. Dissertação (Mestrado em História Social) - Universidade de São Paulo, São Paulo, 2018.).
  • 24
    ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., Apêndice, p. 347. Grifos meus.
  • 25
    AS. Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871. Sessão de 15 de setembro de 1871, p. 155BRASIL. Anais do Parlamento Brasileiro: Senado (AS). Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871..
  • 26
    Conrad, op. cit, p. 145-146.
  • 27
    ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., Apêndice, p. 348.
  • 28
    As instruções de Pedro II à Zacarias de Góis aparecem citadas em: Barman (2012BARMAN, Roderick. Imperador Cidadão: e a construção do Brasil. São Paulo: Editora Unesp, 2012.), p. 284.
  • 29
    Cf. Bandeira (1978BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil (Dois Séculos de História). Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978., p. 98-103); Conrad, op. cit, p. 88-100; Toplin (1972TOPLIN, Robert Brent. The Abolition of Slavery in Brazil. New York: Atheneum, 1972., p. 40-43), Barman, op. cit, p. 281-284; Chalhoub (2003CHALHOUB, Sidney. Machado de Assis historiador. São Paulo: Companhia das Letras, 2003., p. 139-142); Salles (2008SALLES, Ricardo. E o Vale era o Escravo: Vassouras, Século XIX. Senhores e escravos no coração do Império. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira , 2008., p. 79-110); Marquese e Parron (2011MARQUESE, Rafael; PARRON, Tâmis Peixoto. Internacional escravista: a política da Segunda Escravidão. Topoi, Rio de Janeiro, v. 12, n. 23, p. 97-117, 2011.); Marquese (2017MARQUESE, Rafael. The Civil War in the United States and the Crisis of Slavery in Brazil. In: DOYLE, Don (Org.). American Civil Wars: The United States, Latin America, Europe, and the Crisis of the 1860s. Chapel Hill: University of Carolina Press, 2017.); Azevedo (2003AZEVEDO, Celia Maria Marinho de. Abolicionismo: Estados Unidos e Brasil, uma história comparada (século XIX). São Paulo: Annablume, 2003., p. 59-61); Youssef, op. cit.
  • 30
    Cf. Martins, op. cit., p. 144-154; p. 281-289; p. 301.
  • 31
    Cf. Salles, op. cit., p. 82-86; p. 95-110. O autor analisa não apenas as atas, mas também a composição do Conselho de Estado. Cf. Chalhoub, op. cit, p. 139-154.
  • 32
    Cf. Rodrigues (1973aRODRIGUES, José Honório. (org.). Atas do Conselho de Estado. Brasília, DF: Senado Federal, 1973a. v. 6., p. 110) (Versão digital disponibilizada pela Biblioteca do Senado Federal).
  • 33
    Cf. Salles, op. cit., p. 94-95. Sobre a ordem senhorial brasileira, cf: Mattos, 1987MATTOS, Ilmar Rohloff. O Tempo Saquarema: Formação do Estado Imperial. São Paulo: Hucitec, 1987..
  • 34
    Cf. Nabuco de Araújo e Pimenta Bueno, Marquês de São Vicente (1868ARAÚJO, José Thomaz Nabuco de; SÃO VICENTE, José Antonio Pimenta Bueno, Marquês de. Trabalho sobre a extincção da escravatura no Brasil. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1868., p. 110).
  • 35
    Cf. CONSELHO DE ESTADO (1871CONSELHO DE ESTADO. Pareceres do Conselho de Estado no anno de 1868 relativos ao elemento servil. Rio de Janeiro: Typographia Nacional , 1871.).
  • 36
    Sobre as tradições jurídicas em torno do princípio do partus sequitur ventrem, cf: Pereira (2022PEREIRA, Paulo Henrique Rodrigues. Usos e Ambiguidades do regime jurídico da Lei do Ventre Livre brasileira (1773-1871). 2022. Tese (Doutorado em Direito), Universidade de São Paulo, São Paulo, 2022.).
  • 37
    Cf. Rodrigues (1973bRODRIGUES, José Honório. (org.). Atas do Conselho de Estado . Brasília, DF: Senado Federal , 1973b. v. 7., p. 234). O primeiro grifo está no original, o segundo grifo é meu.
  • 38
    Idem, p. 237.
  • 39
    A fala encontra-se na íntegra em Brasil (1872BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Falas do Throno desde o anno de 1823 até o anno de 1889 acompanhadas dos respectivos votos de graças da Camara Temporaria e de differentes informações e esclarecimentos/colligidas na Secretaria da Camara dos Srs. Deputados. Rio de Janeiro: Typographia Nacional, 1872., p. 637-640).
  • 40
    Cf. Barman, op. cit., p. 331-332, Needell, op. cit., p. 255, nota 88; p. 409.
  • 41
    ACD. Sessões de 9 e 11 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 11-12.
  • 42
    As informações acerca de Teixeira Júnior foram retiradas de Martins op. cit., p. 205-221; p. 239.
  • 43
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 21. Grifos no original.
  • 44
    Sobre o tema, cf.: Schulz (2013SCHULZ, John. A Crise Financeira da Abolição. São Paulo: Edusp, 2013., p. 87-100); Marcondes (2002MARCONDES, Renato Leite. O financiamento hipotecário da cafeicultura no Vale do Paraíba Paulista (1865-87). Revista Brasileira de Economia, Rio de Janeiro, v. 56, n. 1, p. 147-170, 2002.).
  • 45
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 23. Grifos meus.
  • 46
    Sobre as associações abolicionistas: Alonso, op. cit., p. 39; p. 93-98; p. 436; Castilho (2016CASTILHO, Celso Thomas. Slave Emancipation and Transformations in Brazilian Political Citizenship. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 2016., p. 22-52). Para a atuação de Luiz Gama veja-se: Azevedo (2010AZEVEDO, Elciene. O direito dos escravos: lutas jurídicas e abolicionismo na província de São Paulo. Campinas: Editora da Unicamp, 2010., p. 95-146), Alonso, op. cit., p. 103-109. Os fundos de emancipação aprovados nas províncias aparecem no discurso de 1871 de Teodoro Machado, então Ministro da agricultura. Cf. ACD. Sessão de 13 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 126-129. Para uma síntese que dá conta da amplitude dos acontecimentos, veja-se: Costa (1986COSTA, Emília Viotti da. Brazil: the age of reform, 1870-1889. In: BETHELL, Leslie (Org.). The Cambridge History of Latin America: c.1870 to 1930. Cambridge: Cambridge University Press, 1986.).
  • 47
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 24-25.
  • 48
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 25.
  • 49
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 26.
  • 50
    Cf. Anti-Slavery Reporter (1870ANTI-SLAVERY REPORTER. Under the sanction of the British and Foreign Anti-Slavery Society. v. 16-19 (1868-1875). Liechtenstein: Kraus Reprint, 1969., p. 25-27).
  • 51
    Ver, sobre isso, particularmente a segunda carta compilada em Alencar (2008ALENCAR, José de. Cartas a favor da escravidão. São Paulo: Hedra, 2008., p. 55-76).
  • 52
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 27. Grifos meus.
  • 53
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 27. Grifos meus.
  • 54
    Para a abolição da escravidão no Império espanhol, particularmente em Cuba, cf.: Scott (1991SCOTT, Rebecca. Emancipação escrava em Cuba: a transição para o trabalho livre, 1860-1899. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1991.); Schmidt-Nowara (1999SCHMIDT-NOWARA, Christopher. Empire and Antislavery: Spain, Cuba and Puerto Rico, 1833-1874. Pittsburgh: University of Pittsburgh Press, 1999.); Childs (2017CHILDS, Matt. Cuba and the Road to Abolition. In: DOYLE, Don (Org.). American Civil Wars: The United States, Latin America, Europe, and the Crisis of the 1860s. Chapel Hill: University of Carolina Press, 2017.).
  • 55
    ACD. Sessão de 14 de maio de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 29-30.
  • 56
    ACD. Sessões de 23 e 24 de maio de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871.. ACD. Sessão de 16 de agosto de 1870BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 163-209.
  • 57
    AS. Sessão de 11 de setembro de 1871BRASIL. Anais do Parlamento Brasileiro: Senado (AS). Rio de Janeiro: Typographia do Diário do Rio de Janeiro, 1871., p. 107.
  • 58
    Cf. Drescher (2011DRESCHER, Seymour. Abolição: uma história da escravidão e do antiescravismo. São Paulo: Editora Unesp , 2011., p. 345-376); Costa (1998COSTA, Emília Viotti da. Coroas de glória, lágrimas de sangue: a rebelião dos escravos de Demerara em 1823. São Paulo: Companhia das Letras , 1988., p. 212-215). Para uma análise conjunta dessas revoltas e da revolta de Barbados em 1816: Matthews (2006MATTHEWS, Gelien. Caribbean Slave Revolts and the British Abolitionist Movement: A Memoir. Louisiana: Louisiana State University Press, 2006.).
  • 59
    Rio Branco, ACD. Sessão de 14 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 145-146.
  • 60
    Essa perspectiva de um futuro salvacionista presente no universo oitocentista é discutida em pormenores em: Pimenta (2021PIMENTA, João Paulo. O livro do tempo: uma história social. Lisboa: Almedina, 2021.). Agradeço a João Paulo Pimenta pela discussão que tivemos sobre o tema.
  • 61
    Cf. Fleiuss (1923)FLEIUSS, Max. Centenário de Henrique Fleiuss. Revista do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro, Rio de Janeiro, v. 148, p. 770-784, 1923. T. 94..
  • 62
    Para os estudos que mostraram a reprodução dos escravos: Libby (1988LIBBY, Douglas Cole. Transformação e Trabalho em uma Economia Escravista: Minas Gerais no século XIX. São Paulo: Brasiliense, 1988.); Libby e Paiva (1995LIBBY, Douglas Cole; PAIVA, Clotilde. Caminhos alternativos: escravidão e reprodução em Minas Gerais no século XIX. Estudos Econômicos, São Paulo, v. 25, n. 2, p. 203-233, 1995.), Bergad (2004BERGAD, Laird. Escravidão e História Econômica: demografia de Minas Gerais: 1720-1888. São Paulo: EDUSC, 2004.), Salles, op. cit., p. 64-69; p. 155-159; p. 229-232. Toda essa ideia pode ser compreendida dentro da teoria da reprodução social, isto é, a ideia do controle dos corpos femininos na produção gestacional de novos trabalhadores. Para um estudo que analisou detidamente essa teoria na realidade oitocentista brasileira, veja-se: Figueira (2021FIGUEIRA, Gabriela Salcedo. O Ventre do Capital: Um estudo sobre a reprodução escravista no Brasil do século XIX. 2021. Dissertação (Mestrado em Políticas Sociais) - Universidade do Minho, Braga, 2021.).
  • 63
    ACD. Sessão de 31 de julho de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., p. 304-306.
  • 64
    Novamente, há uma longa bibliografia sobre o tema. Entre os trabalhos que analisaram desde as percepções senhoriais, as representações na imprensa, o panorama mais amplo das teses de inferioridade até a constituição do racismo no Brasil, veja-se, respectivamente: Azevedo (2004AZEVEDO, Celia Maria Marinho de. Onda negra, medo branco: o negro no imaginário das elites - século XIX. São Paulo: Annablume , 2004.); Schwarcz (2017SCHWARCZ, Lilia Moritz. Retrato em branco e negro: jornais, escravos e cidadãos em São Paulo no final do século XIX. São Paulo: Companhia das Letras , 2017.), Skidmore (1976SKIDMORE, Thomas. Preto no branco: raça e nacionalidade no pensamento brasileiro. Rio de Janeiro: Paz e Terra, 1976.), Bastide e Fernandes (2008BASTIDE, Roger; FERNANDES, Florestan. Brancos e negros em São Paulo: ensaio sociológico sobre aspectos da formação, manifestações atuais e efeitos do preconceito de cor na sociedade paulistana. 4. ed. São Paulo: Global, 2008.).
  • 65
    O episódio do diretor do Museu Nacional e os comentários de Roosevelt sobre o branqueamento no Brasil podem ser consultados em Skidmore, op. cit., p. 81-93. Skidmore também analisou os trabalhos de Romero, Rodrigues e Aranha, cf. op. cit., p. 71-79; p. 127-130.
  • 66
    ACD. Sessão de 7 de agosto de 1871BRASIL. Congresso Nacional. Câmara dos Deputados. Annaes do Parlamento Brazileiro: Câmara dos Senhores Deputados (ACD). Rio de Janeiro: Typographia Imperial e Constitucional de J. de Villeneuve & C., 1870-1871., Apêndice, p. 347.
  • Agradeço ao apoio da FAPESP (Processo n. 2020/05104-2).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    30 Ago 2022
  • Aceito
    21 Dez 2022
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