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Estudo vídeo-polissonográfico em recém-nascidos de termo pequenos para a idade gestacional

Video-polygraphic-EEG study in the full-term newborn with low birthweight for their gestational age

Resumos

Analisamos o exame video-polissonográfico de 26 recém-nascidos de termo (RNT) com 24 horas de vida. Os RN tinham exame neurológico e ultrassonográfico cerebral normais e apresentaram período perinatal isento de complicações. Foram subdivididos em dois grupos, um controle constituído de 11 RNT com peso adequado para a idade gestacional; e um grupo de 15 RN com peso abaixo do esperado para o termo (RNT-PIG). Do segundo grupo, 13 RN apresentaram algum tipo de alteração ao exame video-polissonográfico. As alterações mais frequentes foram na arquitetura do sono, 11 casos, e no comportamento, em que oito RN apresentaram número excessivo de sobressaltos ("startle") em relação ao grupo controle e dois RN uma atividade motora reduzida. Os resultados deste estudo demonstram a utilidade da video-polissonografia quando aplicada a RNT-PIG. O exame mostrou-se sensível em detectar diferenças no comportamento, arquitetura do sono e padrão eletrencefalográfico dos RNT-PIG quando comparados ao grupo controle.

polissonografia neonatal; RNT-PIG; EEG neonatal


Video-polygraphic-EEG studies were performed in the first 24 life-hours of 26 healthy full-term newborns without perinatal injuries. The neurological examination and cranial ultrasonography were normal. The newborns were divided into two groups: one, with full-term appropriate - birth weight 11 newborns (control group ) and the other with full-term low-birth weight 15 newborns. Thirteen newborns of the second group had video-polygraphic-EEG study abnormalities. The most frequent abnormalities were found in 11 cases, as far as sleep architecture is concerned. Also, when compared with the control group, 8 cases of an excessive amount of startles and 2 cases of low behavior activities were found. The results demonstrate the usefulness of video-polygraphic-EEG study in the full-term newborns with intra-uterine growth retard. This examination was sensitive to detect behavior, sleep architecture and EEG standard differences in the low birth-weight newborns as to the control group.

neonatal polygraphy; newborn; intra-uterine growth retard; neonatal EEG


ESTUDO VÍDEO-POLISSONOGRÁFICO EM RECÉM-NASCIDOS DE TERMO PEQUENOS PARA A IDADE GESTACIONAL

NIURA A.M R. PADULA* * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , LÍGIA M. SUPPO DE S. RUGULO** * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , CARLOS ROBERTO PADOVANI*** * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , ALTAMIR TEIXEIRA**** * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , RONALDO GUIMARÃES FONSECA***** * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , M. VALERIANA L. MOURA-RIBEIRO****** * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999. , ÁUREA NOGUEIRA DE MELO******* * Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP): Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ** Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP; *** Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP; **** Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP; ***** Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP; ****** Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP; ******* Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999.

RESUMO - Analisamos o exame video-polissonográfico de 26 recém-nascidos de termo (RNT) com 24 horas de vida. Os RN tinham exame neurológico e ultrassonográfico cerebral normais e apresentaram período perinatal isento de complicações. Foram subdivididos em dois grupos, um controle constituído de 11 RNT com peso adequado para a idade gestacional; e um grupo de 15 RN com peso abaixo do esperado para o termo (RNT-PIG). Do segundo grupo, 13 RN apresentaram algum tipo de alteração ao exame video-polissonográfico. As alterações mais frequentes foram na arquitetura do sono, 11 casos, e no comportamento, em que oito RN apresentaram número excessivo de sobressaltos ("startle") em relação ao grupo controle e dois RN uma atividade motora reduzida. Os resultados deste estudo demonstram a utilidade da video-polissonografia quando aplicada a RNT-PIG. O exame mostrou-se sensível em detectar diferenças no comportamento, arquitetura do sono e padrão eletrencefalográfico dos RNT-PIG quando comparados ao grupo controle.

PALAVRAS-CHAVE: polissonografia neonatal, RNT-PIG, EEG neonatal.

Video-polygraphic-EEG study in the full-term newborn with low birthweight for their gestational age

ABSTRACT - Video-polygraphic-EEG studies were performed in the first 24 life-hours of 26 healthy full-term newborns without perinatal injuries. The neurological examination and cranial ultrasonography were normal. The newborns were divided into two groups: one, with full-term appropriate - birth weight 11 newborns (control group ) and the other with full-term low-birth weight 15 newborns. Thirteen newborns of the second group had video-polygraphic-EEG study abnormalities. The most frequent abnormalities were found in 11 cases, as far as sleep architecture is concerned. Also, when compared with the control group, 8 cases of an excessive amount of startles and 2 cases of low behavior activities were found. The results demonstrate the usefulness of video-polygraphic-EEG study in the full-term newborns with intra-uterine growth retard. This examination was sensitive to detect behavior, sleep architecture and EEG standard differences in the low birth-weight newborns as to the control group.

KEY WORDS: neonatal polygraphy, newborn, intra-uterine growth retard, neonatal EEG.

A video-polissonografia registrando eventos da atividade elétrica cerebral, em distúrbios do sono e epilepsia, tem sido de indiscutível importância para a avaliação neurológica do recém-nascido. O eletrencefalograma (EEG) tem sido utilizado em várias situações, como no diagnóstico de crises neonatais1, na avaliação da idade gestacional e maturidade2, no prognóstico de sobrevida de prematuros3, em condições nosológicas específicas como na encefalopatia hipóxico-isquêmica4-6, e ainda em recém-nascidos (RN) com distúrbios metabólicos 7,8. Apesar de toda essa aplicabilidade, a sensação que nos dá é de sub-utilização de um exame que pode vir a oferecer um contingente expressivo de informações, às quais os pesquisadores da área deveriam estar mais atentos.

Um dos grupos que poderiam ser beneficiados com este exame é o dos RN com peso abaixo do esperado para o termo (RNT- PIG). A literatura referente a esta população, em geral, está mais voltada para eventos epileptiformes do que para a atividade elétrica cerebral de base, ou mesmo para o aspecto comportamental do exame9,10. Notamos ainda que esses autores não se preocuparam em analisar separadamente o grupo de RNT-PIG, do grupo de RN prematuros. Sabemos que o EEG neonatal obedece a padrões específicos de maturidade cerebral, que variam conforme a idade concepcional4,11.

Embora existam padronizações consagradas para a realização e interpretação da video-polissonografia neonatal4,12,13, o pesquisador que se aventure por este campo encontrará dificuldades na execução, tanto na técnica, quanto na análise posterior dos dados. Este estudo propõe uma sistematização da realização e interpretação do exame, facilitando assim a sua utilização prática na avaliação clínica e da atividade elétrica cerebral do RN.

MÉTODO

Foram avaliados com 24 horas de vida, 26 RNT (38 a 41 semanas e 6 dias), nascidos no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina de Botucatu-UNESP. Os RN tinham índice de Apgar maior ou igual a nove aos cinco minutos de vida, exame clínico neurológico e ultrassonográfico normais.

As crianças foram classificadas quanto ao peso, de acordo com a curva de peso para RN de Lubchenco e Koops14 e subdivididas em grupo controle, 11 casos; e grupo de RNT-PIG, 15 casos. A idade gestacional foi dada pela data da última menstruação e/ou pelo exame de Dubowitz15. Foram considerados critérios de inclusão para o grupo controle, ter o peso adequado para a idade gestacional e não terem sofrido intercorrências perinatais. Para o grupo de RNT-PIG, consideramos critérios de inclusão o peso, que deveria ser abaixo do esperado para o termo e estarem isentos de intercorrências perinatais.

Para a video-polissonografia utilizamos aparelho Neurofax, da marca NIHON KOHDEN- modelo EEG 4221 K, de 21 canais, acoplado a câmara JVC-HZ N 8100 E. Os RN foram amamentados 30 minutos antes do exame, que foi realizado com os RN despidos, não contidos, em decúbito dorsal, em berço aquecido, mantendo-se a temperatura entre 29 e 31o C. A duração do exame foi de 60 minutos.

Para o registro seguimos as recomendações específicas para o período neonatal sugeridas por Fenichel12, e Ellingson e colaboradores12,16,17. Utilizamos 12 canais na avaliação da atividade elétrica cerebral e 5 no registro de dados fisiológicos adicionais: 1 para a eletromiografia submentoniana, 2 para o eletrooculograma,1 para monitorizar movimentos ventilatórios da caixa torácica e 1 para o eletrocardiograma. No estudo da atividade elétrica cerebral utilizamos eletrodos de prata acoplados ao couro cabeludo com pasta ELEFIX, segundo o sistema internacional 10-20, adaptado ao RN. Utilizamos a seguinte montagem : Fp1-C3; C3-O1; Fp1-T3; T3-O1; Fp2-C4; C4-O2; Fp2-T4; T4-O2; T3-C3; C3-Cz; Cz-C4; C4-T4. Na eletromiografia submentoniana foram utilizados 2 eletrodos de prata fixos à pele com pasta ELEFIX e fita cirúrgica. No registro oculográfico 1 eletrodo foi colocado 0,5 cm acima do canto externo do olho direito e o outro 0,5 cm abaixo do canto externo do olho esquerdo. A distensão da caixa torácica foi medida a partir de sensor da marca NIHON KOHDEN (strain gauge), próprio para RN. A velocidade do papel foi de 30 mm/seg. Para o EEG utilizamos uma constante de tempo de 0.3s; sensibilidade de 7mV/ mm; e filtro de 70Hz.

As modificações comportamentais foram registradas a partir de dados obtidos a beira do berço por um dos autores e posteriormente somadas às informações do vídeo. Foram computados movimentos menores, como de pés, mãos ou membros, movimentos de cabeça; movimentos globais dos quais destacamos os semelhantes a um sobressalto ("startles"), pela frequência e estereotipia; movimentos de boca; sucção; caretas; sorriso; choro; tremores de queixo; e ereção peniana. Por falta de padronização pré-existente utilizamos como índice da atividade motora a somatória dos eventos em cada estado do sono.

Os exames foram realizados sempre pelo mesmo técnico. Sistematizamos a análise dividindo os estados em sono ativo (SA), sono quieto (SQ), sono indeterminado (SI ) e vigília. Para facilitar a interpretação dos dados obtidos elaboramos uma ficha na qual computamos a arquitetura do sono, os eventos comportamentais, as alterações de eletromiografia, eletrocardiograma e respiração. Nessa ficha dividimos temporalmente os eventos em períodos de 30 segundos.

Os traçados foram analisados separadamente por dois dos autores, ambos especialistas em eletrencefalografia. Posteriormente os dados foram confrontados a fim de dar maior fidedignidade ao estudo. A atividade elétrica cerebral foi analisada de acordo com os critérios de normalidade para o RN T4,17,18.

O estudo da associação das variáveis idade materna, sexo, tipo de parto, exame vídeo-polissonográfico alterado, alteração na arquitetura do sono, alteração no aspecto comportamental, pausas respiratórias excessivas; estado em que o sono se iniciou, desvios na porcentagem de sono esperada para cada estado, sincronia inter-hemisférica e instabilidade na manutenção dos estados, nos dois grupos considerados (controle e RNT-PIG), foi realizado através do teste de Goodman19,20 para contrastes entre e dentro de populações multinomiais. Todas as discussões estatísticas foram realizadas no nível de 5% de significância.

RESULTADOS

Grupo Controle

Sete RN eram do sexo masculino e quatro do sexo feminino. A idade gestacional variou de 38 a 40 semanas, o peso ao nascimento de 2950g a 3580g, o Apgar aos cinco minutos de vida foi nove em cinco casos e dez nos restantes. Os partos foram exclusivamente vaginais.

O início do exame deu-se em SA, tipo REM I em oito casos e em SI em três. A arquitetura do sono foi adequada em todos os RN, com a diferenciação de SA e SQ, sendo que cinco casos apresentaram SI. As porcentagens de ocupação dos diferentes estados durante os exames estão na Tabela 1. Os traçados mantiveram sincronia inter-hemisférica. O SQ deu-se na forma de "tracé alternant" em todos os RN e também com padrão de ondas lentas contínuas em apenas um caso.

As atividades comportamentais registradas foram principalmente de pequenos movimentos de pés e mãos e ocorreram predominantemente em SA. A Tabela 2 mostra os diferentes eventos comportamentais, relacionando-os com os respectivos estados do sono. Em apenas dois exames foram registrados eventos do tipo ereção peniana, ambos durante o SA. Ocorreram no máximo 10 eventos do tipo "startle" durante os traçados. O índice motor para o SA foi em média 63,46 e para o SQ 12,09. No registro da ventilação foram evidenciadas em todos os RN pequenas pausas respiratórias, variando de 10 a 20 episódios, com duração de um a 10 segundos, nos 60 minutos de exame. A ventilação foi regular nos períodos de SQ e irregular no SA e SI . A eletromiografia submentoniana mostrou um registro de maior amplitude durante o SQ.

Grupo de RNT-PIG

Oito RN eram do sexo masculino e sete do sexo feminino. A idade gestacional variou de 38 a 40 semanas, e o peso ao nascimento de 1630g a 2400g. O Apgar aos cinco minutos de vida foi nove em dois RN e dez nos restantes. Os fatores de risco possivelmente relacionados ao baixo peso foram: em um caso, o irmão também baixo peso; um caso em que a mãe apresentava distúrbios psiquiátricos; dois, filhos de mães com hipertensão arterial gravídica; seis casos relacionados ao uso materno de nicotina, com mais de cinco cigarros por dia; três devido à gestação múltipla (trigêmeos). O parto foi via vaginal em nove RN e cesariana em seis.

O início do registro eletrencefalográfico deu-se em SA em nove casos, em SQ em quatro, e em S I em dois. Em oito RN houve alteração da arquitetura do sono, sendo um devido ao excesso de SI; um RN não apresentou SQ; um não apresentou SA; e dois demonstraram instabilidade na manutenção dos estados. Na Figura 1, comparamos as alterações da arquitetura do sono de um dos casos do grupo de estudo, em contrapartida com um RN controle. As porcentagens de ocupação dos diferentes estados ocupados nos exames dos RN deste grupo, encontram-se na Tabela 3. Quatro registros apresentaram trechos de assincronia inter-hemisférica, enquanto o Caso 5 apresentou surtos durante o SQ semelhantes a "tracé discontinue". Em todos os RN que apresentaram SA foram notados os padrões de REM I e REM II. Naqueles que discriminaram SQ notamos o padrão de "tracé alternant" em todos e de ondas lentas contínuas em apenas dois exames (Casos 13 e 15).


A Tabela 4 mostra os achados comportamentais do grupo de RNT-PIG. Podemos notar: atividade motora excessiva em dois casos; um número acima do encontrado no grupo controle de "startle", em oito casos. Os Casos 6 e 7 demonstraram baixo índice de eventos comportamentais em relação ao grupo controle.

Foram observadas pequenas pausas respiratórias em todos os RN, mas de forma excessiva em quatro (o Caso 1 apresentou 47 eventos; o Caso 4 apresentou 38; e nos Casos 7 e 8 foram registrados 26).

Os resultados das alterações encontradas no estudo video-polissonográfico estão computadas na Tabela 5.

O resultado do teste estatístico da associação entre os grupos mostrou diferenças estatisticamente significantes (p<0,05),com respostas positivas preferencialmente no grupo de RNT-PIG, nas variáveis: alteração no exame vídeo-polissonográfico; alteração na arquitetura do sono; alteração no aspecto comportamental; presença de pausas respiratórias excessivas; início do sono em SQ; instabilidade na manutenção dos estados; e sincronia inter-hemisférica. Todas essas variáveis foram estatisticamente significantes também dentro dos grupos, sendo exclusivamente sem alterações entre os indivíduos do grupo controle, e predominantemente alteradas ou positivas entre os indivíduos do grupo de RNT-PIG. Foram ainda estatisticamente significantes (p<0,05) dentro dos grupos, as variáveis: tipo de parto, sendo exclusivamente normal no grupo controle; e porcentagem esperada de cada estado durante o exame, em que SA maior ou igual ao SQ foi a única resposta obtida no grupo controle, e a predominante no grupo RNT-PIG.

DISCUSSÃO

Este estudo vem demonstrar a utilidade da vídeo-polissonografia, na complementação da avaliação neurológica do RNT, quando aplicado àqueles considerados pequenos para a idade gestacional.

Consideramos, com base nos dados do grupo controle e na literatura4,18, com a qual foi totalmente congruente, que apenas dois casos do grupo de RNT-PIG não apresentaram anormalidades detectáveis à video-polissonografia . As alterações foram principalmente desvios da arquitetura do sono, e do comportamento como "startles" excessivos e atividade motora reduzida. Ocorreu ainda frequência aumentada de pausas respiratórias, embora todos apresentassem exames neurológico e ultrassonográfico normais.

Na arquitetura do sono chama a atenção, em dois casos, a dificuldade em manterem-se nas diferentes fases do sono, com mudanças constantes de estado; alterações nas porcentagens esperadas dos vários tipos de sono, em quatro casos; o início do sono em padrão de SQ, em cinco casos. Alterações semelhantes na arquitetura do sono foram descritas em RN de mães dependentes de heroína21, em neonatos com hipotireoidismo22, em RN com malformação cerebral23, e em filhos de mães diabéticas24.

Modificações na duração dos estados do sono têm sido demonstradas em anormalidades metabólicas, como hipocalcemia25; e em exposição ao álcool e a maconha, levando a diminuição do tempo total do SQ26. O esperado seria a ocupação de 50% ou mais do registro em SA e no mínimo de 20% em S Q12-27.

O tempo de registro de 60 minutos foi eficaz para discriminar um ciclo completo de sono (SA - SQ - SA) no grupo controle, concordante com Parmelee e col.28, que indicaram tempo mínimo de 45 minutos para que o RNT fizesse um ciclo completo. Assim as alterações na arquitetura, uma característica anormal do sono, poderiam representar uma possível dismaturidade.

As pausas ventilatórias excessivas sugerem igualmente imaturidade de centros neurais geradores de ritmo ventilatório (células com periodicidade intrínseca), embora os RN fossem de termo.

Em relação ao aspecto comportamental, o achado mais marcante foi a constatação de frequência acima da encontrada no grupo controle, de "startle", que muito se assemelham a espasmo infantil ou a mioclonia maciça. Foram proeminentes em oito casos e ocorreram principalmente no SA. Gherpelli29 refere que esses eventos são mais proeminentes entre 34 e 37 semanas de idade concepcional, o que poderia corroborar a hipótese de imaturidade desses RN. Seriam esses eventos realmente os "startle" a que se refere Lombroso4, associados a breves irregularidades respiratórias? Poderiam ainda tratar-se dos despertares ("arousals") associados ou não a dessincronização, descritos por Scher e col.30. Fato é que eles diferem em número no grupo de RNT-PIG, em relação ao grupo controle, podendo ser um sinalizador de uma possível imaturidade, talvez transitória do sistema nervoso central (SNC) ou com um eventual comprometimento neurológico de outra ordem. Para que fosse possível concluir sobre esse aspecto, seria necessário um seguimento longitudinal dos RNT-PIG, o que não foi a proposta inicial deste estudo. Também consideramos uma alteração no exame, pela comparação com o grupo controle, os RN que se mantiveram pouco ativos, com baixo índice motor.

Os nossos achados demonstram que a video-polissonografia é um exame de grande valor na detecção de alterações eletrencefalográficas e/ou comportamentais, não só em situações de maior comprometimento do SNC, como também em circunstâncias de menor gravidade, mas que potencialmente poderiam comprometê-lo, como o baixo peso ao nascimento. É interessante salientar que neste estudo a video-polissonografia foi o melhor instrumento de avaliação, capaz de detectar possíveis repercussões neurológicas de forma superior às detectadas pelo exame neurológico clínico e ultrassonografia cerebral. Acreditamos que esses achados devam alertar os profisssionais da área para uma avaliação mais acurada e um acompanhamento mais intenso do desenvolvimento neuropsicomotor dos RNT-PIG, mesmo aqueles que aparentemente sejam isentos de intercorrências perinatais. O exame de vídeo-polissonografia poderia ser um sinalizador de quais desses RN seriam merecedores de um seguimento neurológico mais objetivo e talvez de estimulação precoce.

BIBLIOGRAFIA

Dra. Niura A. de Moura-Ribeiro Padula - Rua Cardoso de Almeida 1801 - 18602-130 Botucatu SP - Brasil. E-mail: Pad@laser.com.br

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    Pesquisa realizada no Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina (FM) de Botucatu da Universidade Estadual de São Paulo (UNESP):
    Responsável pela Disciplina de Neuropediatria do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP;
    **
    Chefe do Departamento de Pediatria da FM de Botucatu-UNESP;
    ***
    Professor Titular do Departamento de Bioestatística do Instituto de Biociências de Botucatu-UNESP;

    ****

    Docente do Departamento de Radiologia da FM de Botucatu-UNESP;

    *****

    Professor Doutor do Departamento de Neurologia e Psiquiatria da FM de Botucatu-UNESP;

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    Professora Associada do Departamento de Neurologia da Universidade Estadual de Campinas-UNICAMP;

    *******

    Professora Doutora do Departamento de Clínica Médica da Faculdade de Medicina da Universidade de Brasília. Aceite: 30-abril-1999.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      06 Dez 2000
    • Data do Fascículo
      Set 1999

    Histórico

    • Aceito
      30 Abr 1999
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