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Descalonamento de antimicrobiano e custos do tratamento de pacientes com infecção

Resumos

OBJETIVO: Avaliar as repercussões do descalonamento nos custos com o tratamento antimicrobiano de pacientes com infecção da corrente sanguínea. MÉTODOS: Estudo de coorte histórica realizado em Unidade de Terapia Intensiva de hospital de Belo Horizonte (MG). A população incluiu 62 pacientes com infecção da corrente sanguínea causada por Staphylococcus aureus. Os dados foram coletados entre março/2007 e março/2011 nos prontuários dos pacientes, Comissão de Controle de Infecção Hospitalar e Setor de Custos com análise, descritiva e univariada. RESULTADOS: A colonização esteve associada à ocorrência de infecção por micro-organismo resistente (p<0.05). O descalonamento antimicrobiano reduziu o espectro de ação do antibiótico prescrito e os custos com o tratamento (de R$2.673,12 para R$727,03, p=0,001). CONCLUSÃO: O descalonamento de antimicrobianos favoreceu o redirecionamento da terapia do paciente, reduzindo, quando necessário, o espectro de ação do antimicrobiano prescrito e, consequentemente, os custos com o tratamento.

Resistência a medicamentos; Custos de medicamentos; Infecções bacterianas


OBJECTIVE: To evaluate the repercussions of discontinuation the cost with the antimicrobial treatment of patients with bloodstream infection. METHODS: A historical cohort study conducted in the intensive care unit of a hospital in Belo Horizonte (MG). The population included 62 patients with bloodstream infection caused by Staphylococcus aureus. Data were collected between March/2007 and March/2011 from patients' medical records, Commission of Hospital Infection Control and Sector of Costs, with descriptive and univariate analysis. RESULTS: Colonization was associated with the occurrence of infection with resistant microorganisms (p <0.05). The antimicrobial discontinuation reduced the spectrum of action of the antibiotic prescribed, and the treatment costs (R$ 2,673.12 to R$ 727.03, p = 0.001). CONCLUSION: The discontinuation of antimicrobials favored the redirection of patient therapy, reducing, where necessary, the spectrum of action of the prescribed antimicrobial and, consequently, the costs of treatment.

Drug resistance; Drug costs; Bacterial infections


OBJETIVO: Evaluar las repercusiones del desescalamiento en los costos con el tratamiento antimicrobiano de pacientes con infección de la corriente sanguínea. MÉTODOS: Estudio de cohorte histórica realizado en una Unidad de Terapia Intensiva de un hospital de Belo Horizonte (MG). La población incluyó a 62 pacientes con infección de la corriente sanguínea causada por Staphylococcus aureus. Los datos fueron recolectados entre marzo/2007 y marzo/2011 en las historias clínicas de los pacientes, Comisión de Control de Infección Hospitalaria y Sector de Costos con análisis, descriptivo y univariado. RESULTADOS: La colonización estuvo asociada a la ocurrencia de infección por microorganismo resistente (p<0.05). El desescalamiento antimicrobiano redujo el espectro de acción del antibiótico prescrito y los costos con el tratamiento (de R$2.673,12 para R$727,03, p=0,001). CONCLUSIÓN: El desescalamiento de antimicrobianos favoreció el redireccionamiento de la terapia del paciente, reduciendo, cuando necesario, el espectro de acción del antimicrobiano prescrito y, consecuentemente, los costos con el tratamiento.

Resistencia a medicamentos; Costos en drogas; Infecciones bacterianas


ARTIGOS ORIGINAIS

Descalonamento de antimicrobiano e custos do tratamento de pacientes com infecção

IProfessora Associada do Departamento de Enfermagem Básica da Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Belo Horizonte(MG), Brasil

IIPós-graduanda (Doutorado) em Enfermagem pelo Programa de Pós-Graduação da Escola de Enfermagem, Universidade Federal de Minas Gerais – UFMG – Belo Horizonte(MG), Brasil. Bolsista Capes

Endereço para correspondência

RESUMO

OBJETIVO: Avaliar as repercussões do descalonamento nos custos com o tratamento antimicrobiano de pacientes com infecção da corrente sanguínea.

MÉTODOS: Estudo de coorte histórica realizado em Unidade de Terapia Intensiva de hospital de Belo Horizonte (MG). A população incluiu 62 pacientes com infecção da corrente sanguínea causada por Staphylococcus aureus. Os dados foram coletados entre março/2007 e março/2011 nos prontuários dos pacientes, Comissão de Controle de Infecção Hospitalar e Setor de Custos com análise, descritiva e univariada.

RESULTADOS: A colonização esteve associada à ocorrência de infecção por micro-organismo resistente (p<0.05). O descalonamento antimicrobiano reduziu o espectro de ação do antibiótico prescrito e os custos com o tratamento (de R$2.673,12 para R$727,03, p=0,001).

CONCLUSÃO: O descalonamento de antimicrobianos favoreceu o redirecionamento da terapia do paciente, reduzindo, quando necessário, o espectro de ação do antimicrobiano prescrito e, consequentemente, os custos com o tratamento.

Descritores: Resistência a medicamentos; Custos de medicamentos; Infecções bacterianas

INTRODUÇÃO

O consumo indiscriminado de antimicrobianos vem sendo descrito como fator predisponente para a ocorrência de resistência bacteriana desde a década de 1950, quando após a descoberta e a disponibilização da penicilina para o tratamento de infecções, foram relatados os primeiros casos de Staphylococcus aureus resistentes nos Estados Unidos da América(1,2).

No cenário mundial, incluindo o Brasil, a emergência de cepas resistentes como a Klebsiella produtora de carbapenemase (KPC) ou Staphylococcus aureus com resistência intermediária a vancomicina (VISA), vêm trazendo preocupações adicionais dada a complexidade de um tratamento efetivo, em razão da redução do arsenal terapêutico e da necessidade de associações empíricas(3,4).

Diante dessa situação, iniciativas do governo brasileiro, como a Resolução nº 44 de 26 de outubro de 2010, preconizam a venda de agentes antimicrobianos somente com receita médica e retenção desta, a fim de exercer melhor controle no que diz respeito à comercialização e consumo desses medicamentos, e assim, contribuir para a redução da resistência bacteriana. O fato evidencia como a questão começa a ser tratada com mais seriedade no País, ressaltando a necessidade de utilizar os antibióticos (ATB) de forma racional para assegurar a prevenção da disseminação dos micro-organismos resistentes(5).

Entretanto, no ambiente hospitalar, mais especificamente nas Unidades de Terapia Intensiva (UTI), a ocorrência de Infecções Relacionadas à Assistência à Saúde (IRAS) por micro-organismos resistentes vem se tornado cada vez mais frequente(6,7).

Com base nesta realidade e na premissa de que receber um tratamento adequado nas primeiras 24 horas após o diagnóstico de IRAS é fundamental para um desfecho mais favorável ao paciente, observa-se cada vez mais o uso de antibióticos de amplo espectro de ação no tratamento empírico (aquele que ocorre antes da confirmação microbiológica do agente causal da infecção e do perfil de resistência)(8,9).

Esta prática tem sido respaldada pelas principais agências e sociedades internacionais e nacionais de saúde, com vistas à tentativa de se reduzir as complicações do paciente e consequentemente as taxas de mortalidade (8-12). Contudo, pela possibilidade de seleção de bactérias resistentes aos ATB de amplo espectro de ação usados no tratamento empírico, algumas estratégias vêm sendo empregadas com o intuito de atenuar as consequências do uso de antibióticos de amplo espectro de ação. Dentre elas, pode-se citar o descalonamento, ou seja, o ajuste para o antibiótico mais indicado assim que disponíveis os resultados de cultura, a auditoria de antimicrobianos, assim como a restrição de algumas drogas, com seu uso liberado apenas após autorização prévia dos médicos auditores da Comissão de Controle de Infecção Hospitalar (CCIH)(9).

O descalonamento merece destaque entre as medidas supracitadas, sobretudo, por permitir a adequação da prescrição médica, de acordo com o agente causal da infecção, favorecer o uso racional dos ATB e, com isso, minimizar a seleção de bactérias multirresistentes. Ainda, alguns estudos relatam que este pode reduzir os custos com o tratamento antimicrobiano. Entretanto, poucos são os trabalhos na literatura nacional e internacional que refletem sobre este assunto(13). Com esta fundamentação, torna-se relevante questionar se o descalonamento apresenta repercussões nos custos do tratamento antimicrobiano de pacientes com infecção.

Neste sentido, dada a relevância desse tema, este estudo teve como objetivo avaliar as repercussões do descalonamento nos custos do tratamento antimicrobiano de pacientes com infecção da corrente sanguínea causada por Staphylococcus aureus resistente ou sensível à oxacilina (MRSA ou MSSA, respectivamente).

MÉTODOS

Trata-se de um estudo epidemiológico retrospectivo, do tipo coorte histórica, realizado em uma Unidade de Terapia Intensiva de um hospital privado e de grande porte, localizado no Município de Belo Horizonte (MG).

A população do estudo foi composta por todos os pacientes que receberam o diagnóstico de infecção da corrente sanguínea (ICS) por Staphylococcus aureus, durante o período entre março de 2007 e março de 2011, de acordo com os critérios estabelecidos pelo National Healthcare Safety Network (Sinais e sintomas + Exame laboratorial). Considerou-se ainda a confirmação do micro-organismo causador da ICS e perfil de resistência destes para os pacientes que completaram o tratamento com antimicrobianos durante a internação hospitalar. Foram excluídos os pacientes que apresentaram infecções da corrente sanguínea causada concomitantemente por micro-organismos sensíveis e resistentes. Para preservar a suposição de independência das observações, apenas a primeira infecção da corrente sanguínea devidamente tratada de cada paciente foi incluída no estudo. O grupo de pacientes infectado por Staphylococcus aureus resistente à oxacilina foi comparado ao grupo de pacientes com infecção por Staphylococcus aureus sensível à oxacilina.

A coleta dos dados foi realizada pela pesquisadora, com o uso de um instrumento estruturado, que continha informações sobre a ocorrência da ICS e o número de doses antimicrobianos utilizadas no tratamento. Estas informações foram obtidas por meio dos registros nos prontuários dos pacientes e da CCIH, respectivamente. Aquelas referentes aos custos dos antimicrobianos foram levantadas, mediante o valor anual de cada dose de antimicrobiano, em reais e, posteriormente, convertidas para dólares, com intuito de permitir comparações futuras pela padronização da moeda como referência. A conversão para o dólar foi realizada, de acordo com a Reserva de Lançamento Estatístico Federal dos Estados Unidos da América, baseados nas taxas de câmbio anual, com lançamento nos anos entre 2007 e 2011(14).

Foram identificados 78 pacientes com diagnóstico de infecção da corrente sanguínea associada a Staphylococcus aureus entre março de 2007 e março de 2011. Destes, oito foram excluídos por apresentarem infecções relacionadas a microrganismos resistentes e sensíveis concomitantemente e outros oito por terem evoluído a óbito antes de finalizar o tratamento. Dos 62 pacientes restantes, 31 foram incluídos no grupo de pacientes com microrganismos resistentes e 31 no grupo de pacientes com microrganismos sensíveis.

Os dados foram analisados no programa estatístico SPSS (19.0). Realizou-se a análise descritiva, com apresentação dos valores das medianas e intervalo interquartílico (valor percentil 25% – valor percentil 75%) das variáveis contínuas e do valor absoluto e percentual das variáveis categóricas. Posteriormente, para identificar as diferenças entre as variáveis, relacionadas à ocorrência de infecção por micro-organismos resistentes (MR) ou microrganismos sensíveis (MS), foram realizados os testes Qui-quadrado ou exato de Fisher em caso de variáveis categóricas, e o teste Mann-Whitney em caso de variáveis contínuas.

O projeto de pesquisa foi aprovado pelo Comitê de Ética da Instituição e foram respeitados os preceitos da Resolução nº 196/96, no que diz respeito à pesquisa com seres humanos (ETIC n°: 658/2011).

RESULTADOS

Os dados da Tabela 1 apresentam as características clínico-epidemiológicas dos pacientes, de acordo com o perfil de resistência do agente causal da infecção da corrente sanguínea (Staphylococcus aureus sensível ou resistente à oxacilina).

Dentre os fatores associados à ocorrência de ICS por MRSA, a colonização por micro-organismos resistentes mereceu destaque (p<0.05).

Em relação ao tratamento antimicrobiano para ICS, destaca-se que, na instituição do estudo, há uma padronização de condutas. Pelo longo período de permanência dos pacientes na UTI e as altas taxas de resistência bacteriana, optou-se por iniciar o tratamento empírico com antimicrobianos de amplo espectro de ação (vancomicina, polimixina B e meropenem ou ertapenem), sendo estes ajustados após os resultados da cultura (tratamento direcionado).

A maior parte dos pacientes analisados recebeu antibiótico empírico (77,4%), e do grupo de pacientes infectados por micro-organismos resistentes 67,7% receberam tratamento empírico e do grupo de pacientes com micro-organismo sensível 87,1% (p=0,068). A falta de recebimento do tratamento empírico deu-se por ausência do diagnóstico de infecção antes dos resultados de cultura.

Nesta etapa, os antibióticos prescritos com maior frequência foram vancomicina (69,4%), polimixina (46,8%), ertapenem (29,0%), meropenem (24,2%), cefepima (3,2%), cefotaxime, tazocin, oxacilina e ampicilina (1,6% cada). Destaca-se que não houve diferença significativa entre os grupos analisados para nenhuma classe de antimicrobianos prescrita empiricamente (p>0,05).

Após os resultados de cultura, ressalta-se que 90,3% do total de pacientes receberam tratamento direcionado, sendo 93,5% para os pacientes infectados por MRSA e 87,1% para aqueles com MSSA (p=0,671). O não ajuste do tratamento antimicrobiano, provavelmente, tenha ocorrido pela demora do resultado da cultura, e o tratamento empírico em alguns momentos já estava finalizando ou o paciente não apresentava mais os sintomas da infecção, optando-se por não realizar o direcionamento.

Os antibióticos prescritos com maior frequência durante o tratamento direcionado, para ambos os grupos foram vancomicina (45,2%) e oxacilina (40,3%) seguidos de ampicilina (3,2%), linezolida, teicoplanina, cefotaxima e ciprofloxacina (1,6% cada).

Os dados da Tabela 2 mostram a distribuição percentual dos pacientes de acordo com o uso de antibióticos após o resultado da cultura, agrupados segundo a classificação química dos mesmos e o perfil de sensibilidade do agente causal da ICS (MRSA ou MSSA).

Observa-se de acordo com os dados da Tabela 2 que, conforme previsto, o grupo de pacientes com infecção por Staphylococcus aureus resistente a oxacilina utilizou significativamente mais vancomicina, quando comparado ao grupo de pacientes com infecção por Staphylococcus aureus sensível à oxacilina. Em contrapartida, este grupo (MSSA) recebeu mais oxacilina após o resultado da cultura do que o primeiro grupo (MRSA).

No que diz respeito aos custos para o tratamento dos pacientes, a Figura 1 traz os custos com o tratamento antimicrobiano empírico, direcionado e total.


Conforme observado na Figura 1, o direcionamento do antibiótico utilizado no tratamento influenciou fortemente na queda dos gastos com antimicrobianos (p=0,000). Destaca-se que, para esta análise, avaliaram-se apenas os pacientes que foram efetivamente tratados em cada momento.

A Figura 2 apresenta as diferenças das medianas dos custos com tratamento antimicrobiano empírico, direcionado e total para cada grupo de pacientes.


Conforme observado na Figura 2, constatou-se uma diferença entre os gastos com tratamento antimicrobiano para pacientes portadores de micro-organismo resistentes e sensíveis, sendo o resultado da análise univariada apresentado nos dados da Tabela 3.

De acordo com a Tabela 3, observa-se que a diferença entre os custos associados ao tratamento antimicrobiano dos pacientes com micro-organismo resistente e sensível foi estatisticamente significativa apenas para o tratamento empírico (p=0,005).

DISCUSSÃO

No que diz respeito ao tratamento antimicrobiano, ressalta-se que o uso de ATB de amplo espectro de ação na terapia empírica está relacionado a menores taxas de mortalidade entre pacientes criticamente enfermos(8-9). Por este motivo, os guidelines para tratamento de IRAS recomendam que pacientes que possuam fatores de risco para infecções por micro-organismos resistentes recebam terapia empírica com, pelo menos, dois antimicrobianos de amplo espectro de ação(8,10-12).

Na UTI do hospital selecionado, os antibióticos mais utilizados para o tratamento empírico foram os de amplo espectro de ação (ertapenem, meropenem, polimixina e vencomicina), independente do grupo de pacientes avaliados (MRSA ou MSSA), uma vez que o perfil de risco dos pacientes era semelhante (Tabela 1). Contudo, ressalta-se que outras estratégias foram empregadas para garantir um uso racional dos antimicrobianos. Dentre elas, pode-se citar o descalonamento, ou seja, o ajuste para o antibiótico mais indicado, assim que disponíveis os resultados de cultura, a auditoria de antimicrobianos, assim como a restrição de algumas drogas, com seu uso liberado, apenas após autorização prévia dos médicos auditores da CCIH. Tais medidas são reportadas na literatura como essenciais para a contenção da resistência bacteriana no que diz respeito ao adequado manejo de antimicrobianos(9, 13).

Dessa forma, a escolha do tratamento empírico deve ser baseada no tempo de início da infecção, uso prévio de antimicrobianos, uso prolongado de procedimentos invasivos, idade avançada do paciente (acima de 65 anos), internações anteriores, presença de colonizações e, sobretudo, conhecimento da prevalência dos agentes microbianos mais frequentes na instituição(11,12, 15,16).

Pesquisas apontam para uma baixa taxa de prescrição de terapia empírica apropriada, variando entre 26% e 51,8%, no que diz respeito à dose, duração e à própria indicação antimicrobiana(15,17). Assim, ressalta-se a importância do ajuste dos ATB, de acordo com os resultados a serem realizados o mais rápido possível, inclusive com o intuito de diminuir a emergência de resistência bacteriana e, consequentemente, os custos no tratamento antimicrobiano dos pacientes(15). Além disso, uma cultura institucional para redirecionar a terapêutica pode favorecer a revisão das prescrições dos pacientes, diminuindo os possíveis equívocos cometidos inicialmente.

A escolha do ATB a ser utilizado após a confirmação microbiológica deve ser realizada avaliando cinco princípios básicos, tais como: a eficácia, segurança, facilidade de administração, custo do ATB selecionado e, sobretudo, o espectro de ação, que deve ser o mais reduzido possível, ressaltando-se assim a importância do descalonamento antimicrobiano, como fundamental na contenção da resistência bacteriana(16).

Em relação aos ATB mais empregados no tratamento direcionado dos pacientes com infecção da corrente sanguínea, corroborando os resultados encontrados nesta pesquisa, é relatado na literatura que a vancomicina e a oxacilina são os agentes antimicrobianos habitualmente usados para bactérias gram-positivas, como o Staphylococcus aureus(17-20).

A oxacilina ou meticilina é um antimicrobiano de pequeno espectro de ação, pertencente ao grupo das penicilinas semissintéticas resistentes à betalactamase e penicilinase estafilicócica. Possui indicação para tratamento de infecções em diversas topografias, causadas por micro-organismos aeróbicos gram-positivos, dentre eles, o Staphylococcus aureus(19). No entanto, a resistência de tais micro-organismos a esta droga é reconhecida, sendo seu uso restrito para terapia empírica, devendo ser utilizado apenas após resultados de cultura, com reconhecimento de patógenos sensíveis a este agente(10).

Dessa forma, o uso da vancomicina para o tratamento empírico na instituição estudada é justificado pela alta prevalência de Staphylococcus aureus resistentes à oxacilina (21,22). A vancomicina é um glicopeptídeo que atua na inibição da síntese da parede celular, possuindo atividade, sobretudo sobre bactérias gram-positivas, o que sustenta seu amplo uso para o tratamento de tais micro-organismos(19). Contudo, apresenta importante nefrotoxicidade, especialmente em pacientes tratados com doses superiores a 4g/dia por mais de 10 dias. Assim, é recomendada a monitorização dos níveis plasmáticos de vancomicina e sua administração em um regime de perfusão contínua, em lugar de múltiplas doses(10-11).

Não obstante, ressalta-se a emergência de cepas de Staphylococcus aureus com resistência intermediária à vancomicina(20). Diante disso, o uso de tal ATB para tratamento de infecção por Staphylococcus aureus precisa ser ponderado e deve-se atentar para a necessidade de outras opções terapêuticas, o que justifica a realização de estudos recentes testando novos antibióticos, como terapia alternativa ao uso da vancomicina. Dentre essas drogas, destaca-se a linezolida, que é um agente antimicrobiano da classe das oxazolidinonas, recentemente desenvolvido (2001), que possui ação bacteriostática contra micro-organismos gram-positivos, dentre eles Staphylococcus aureus e Enterococcus spp(23,24).

Pesquisas comparando a efetividade da linezolida em relação à vancomicina observaram que, apesar da primeira ser mais cara, o custo adicional pode ser considerado neutro frente aos benefícios do tratamento com este ATB. As principais vantagens da linezolida são disponibilidade na forma oral, poucos casos de cepas resistentes relatadas até o momento, efeitos adversos reduzidos, sendo o mais comum a trombocitopenia, que é reversível pela suspensão do uso desse agente. Tais características resultam em maior segurança para o paciente(23-24).

Em relação aos custos com o tratamento, observou-se como o descalonamento favoreceu a contenção de gastos, reduzindo-os estatisticamente, após o resultado das culturas (p=0,000). Cabe salientar que não foi encontrado nenhum estudo avaliando especificamente os gastos com antimicrobianos no tratamento de infecções da corrente sanguínea por MRSA, comparada a ICS por MSSA. Contudo, estudo realizado em 2006 avaliando várias espécies de micro-organismos, reportou que o descalonamento atuou ajustando o tratamento antimicrobiano dos pacientes em 88% dos casos, diminuindo o espectro de ação em 80%, o número de antibióticos prescritos em 22% e os custos com tratamento antimicrobianos em 23%(15).

Dessa forma, detaca-se a importância do descalonamento, não só na contenção da resistência bacteriana, mas favorecendo uma reavaliação das prescrições dos pacientes, diminuindo os possíveis equívocos como indicação, dose e tempo inadequados, a redução do espectro antimicrobiano utilizado e os custos com o tratamento.

Ao se analisar que o custo com antimicrobianos em uma instituição, especialmente, nas UTI, representa de 30% a 50% do total gasto com medicamentos, e no mínimo, 50% dos pacientes fazem uso de antibióticos em algum momento da internação, o presente estudo abre espaços para reflexões nas instituições, sobretudo da CCIH e dos auditores para revisão dos protocolos adotados. Estes, quando inadequados, podem levar a uma elevação dos gastos com antibióticos, sobretudo quando alguns princípios não são considerados, como perfil microbiológico da instituição, possibilidade de descalonamento e tempo necessário para terapêutica.

Assim, sugere-se que outras pesquisas sobre custos avaliem ainda a adequação da terapia antimicrobiana, uma vez que variáveis como antibióticos prescritos, posologia e tempo de tratamento empregado podem influenciar nos custos com o tratamento dos pacientes. Neste sentido, estudos prospectivos podem fornecer respostas mais próximas da realidade, já que o rigor da pesquisa nesta modalidade de seguimento pressupõe a melhor compatibilidade dos dados, análise em tempo real com diferentes formas de registros, como prescrição médica, registros de enfermagem e farmácia, análise de situações cotidianas, como indisponibilidade da droga, suspensão desta ou alteração do quadro clínico do paciente além de favorecer possíveis ajustes, tanto dos dados como dos registros em tempo real.

CONCLUSÃO

Os antibióticos mais usados para o tratamento empírico dos pacientes foram aqueles de amplo espectro de ação, como: vancomicina, polimixina, ertapenem e meropenem, justificados pelo perfil microbiológico da instituição e gravidade dos pacientes. No tratamento direcionado para os pacientes com MRSA, a vancomicina foi a droga de primeira escolha, e para os pacientes com MSSA a oxacilina foi a droga mais utilizada, em consonância com os principais guidelines internacionais e nacionais.

Constatou-se que o descalonamento de antimicrobianos, após o resultado de culturas, indispensável para a contenção da resistência bacteriana, favoreceu o redirecionamento da terapia do paciente, reduzindo, quando necessário, o espectro de ação do antimicrobiano prescrito e, consequentemente, os custos com antimicrobianos de forma significativa (p=001) para ambos os grupos de pacientes (MRSA e MSSA).

Assim, ressalta-se a importância de se incentivar a realização do descalonamento sempre que possível, pela preocupação com a emergência de micro-organismos resistentes, mas também por ser uma estratégia de redução de custos com tratamento antimicrobiano.

Neste aspecto, ressalta-se a importância desta abordagem no tocante às ações de enfermagem, visto que como membro da equipe multiprofissional e na abordagem da resistência bacteriana, cabe ao enfermeiro não a prescrição ou o descalonamento do antimicrobiano, mas conhecer sua implicação para a redução de custos na instituição, o impacto da redução das taxas de morbidade e mortalidade no contexto multifatorial deste evento.

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    Adriana Cristina de OliveiraI; Adriana Oliveira de PaulaII
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      04 Mar 2013
    • Data do Fascículo
      2012

    Histórico

    • Recebido
      09 Nov 2011
    • Aceito
      03 Jul 2012
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