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Implantação do Método Mãe-Canguru na percepção de enfermeiras de um hospital universitário

Implantación del Método Madre canguro en la percepción de enfermeras de un hospital universitario

Resumos

OBJETIVO: Compreender a percepção de enfermeiras de uma Unidade Neonatal, acerca da implantação do Método Mãe-Canguru. MÉTODOS: Trata-se de um estudo exploratório-descritivo, de abordagem qualitativa, realizado na Unidade Neonatal do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, do qual participaram cinco enfermeiras. A coleta de dados foi realizada através de entrevistas, as quais foram transformadas em narrativas e categorizadas. RESULTADOS: Das narrativas foram extraídas três categorias interpretadas à luz da mudança planejada, a saber: o processo de tomada de decisão e de sensibilização da equipe de saúde, os fatores intervenientes e as crenças e sentimentos relacionados a implantação do Método Mãe-Canguru. CONCLUSÃO: O estudo permitiu verificar a importância do envolvimento dos colaboradores da instituição nos processos de mudança e a necessidade de adequação dos recursos humanos e físicos para a efetiva implantação do método. Dessa forma, forneceu subsídios para a reorganização das atividades assistenciais e gerenciais no referido serviço.

Avaliação de programa de enfermagem; Mudança organizacional; Enfermagem neonatal; Recém-nascido de baixo peso; Cuidadodo lactente


OBJETIVO: Comprender la percepción de enfermeras de una Unidad Neonatal, respecto a la implantación del Método Madre canguro. MÉTODOS: Se trata de un estudio exploratorio-descriptivo, de abordaje cualitativo, realizado en la Unidad Neonatal del Hospital de las Clínicas de la Universidad de Sao Paulo, en la que participaron cinco enfermeras. La recolección de los datos fue realizada a través de entrevistas, las mismas que fueron transformadas en narrativas y luego categorizadas. RESULTADOS: De las narrativas fueron extraídas tres categorías interpretadas a la luz del cambio planificado, a saber: el proceso de toma de decisión y sensibilización del equipo de salud, los factores intervinientes y las creencias y sentimientos relacionados a la implantación del Método Madre Canguro. CONCLUSIÓN: El estudio permitió verificar la importancia del involucramiento de los colaboradores de la institución, en los procesos de cambio y la necesidad de adecuación de los recursos humanos y físicos para la implantación efectiva del método. De esta forma, dio subsidios para la reorganización de las actividades asistenciales y gerenciales en el referido servicio.

Investigación en evaluación de enfermería; Innovación organizacional; Enfermería neonatal; Recién nacido de bajo peso; Cuidado del lactante


OBJECTIVE: To understand the perception of nurses in a Neonatal Unit about the implantation of the Kangaroo Mother Method. METHODS: This is an exploratory-descriptive, qualitative study, performed at the Neonatal Unit at Hospital das Clínicas, Universidade de São Paulo, with the participation of five nurses. Data collection occurred through interviews, which were transformed into narratives and then categorized. RESULTS: Three categories were extracted from the narratives and interpreted according to the planned changes: the decision-making and awareness processes of the healthcare team, the intervenient factors and the beliefs and feelings associated to the implantation of the Kangaroo Mother Method. CONCLUSION: This study showed the importance of the involvement of the collaborators at the institution during the processes of change and the need to adequate the human and physical resources for the effective implantation of the method. Therefore, it yielded subsidies for the reorganization of the healthcare and managerial activities of the service.

Nursing evaluation research; Organizational innovation; Neonatal nursing; Low birth weight; Infant care


ARTIGO ORIGINAL

Implantação do Método Mãe-Canguru na percepção de enfermeiras de um hospital universitário* * Monografia de conclusão do Curso de Especialização em Neonatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil

Implantación del Método Madre canguro en la percepción de enfermeras de un hospital universitario

Thaís Cristina de Hollanda ParisiI; Eliane Regina Berti CoelhoII; Marta Maria MelleiroIII

IEnfermeira Neonatologista do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil

IIEnfermeira Neonatologista da Unidade Neonatal do Instituto da Criança do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil

IIIDoutora, Professora do Departamento de Orientação Profissional da Escola de Enfermagem da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil

Autor Correspondente Autor Correspondente: Thaís Cristina de Hollanda Parisi Av. Parada Pinto, 3420 - Apto 102 - Alto do Mandaqui São Paulo - SP – CEP. 02611-001 E-mail: thaischp@icr.hcnet.usp.br

RESUMO

OBJETIVO: Compreender a percepção de enfermeiras de uma Unidade Neonatal, acerca da implantação do Método Mãe-Canguru.

MÉTODOS: Trata-se de um estudo exploratório-descritivo, de abordagem qualitativa, realizado na Unidade Neonatal do Hospital das Clínicas da Universidade de São Paulo, do qual participaram cinco enfermeiras. A coleta de dados foi realizada através de entrevistas, as quais foram transformadas em narrativas e categorizadas.

RESULTADOS: Das narrativas foram extraídas três categorias interpretadas à luz da mudança planejada, a saber: o processo de tomada de decisão e de sensibilização da equipe de saúde, os fatores intervenientes e as crenças e sentimentos relacionados a implantação do Método Mãe-Canguru.

CONCLUSÃO: O estudo permitiu verificar a importância do envolvimento dos colaboradores da instituição nos processos de mudança e a necessidade de adequação dos recursos humanos e físicos para a efetiva implantação do método. Dessa forma, forneceu subsídios para a reorganização das atividades assistenciais e gerenciais no referido serviço.

Descritores: Avaliação de programa de enfermagem; Mudança organizacional; Enfermagem neonatal; Recém-nascido de baixo peso; Cuidadodo lactente/métodos

RESUMEN

OBJETIVO: Comprender la percepción de enfermeras de una Unidad Neonatal, respecto a la implantación del Método Madre canguro.

MÉTODOS: Se trata de un estudio exploratorio-descriptivo, de abordaje cualitativo, realizado en la Unidad Neonatal del Hospital de las Clínicas de la Universidad de Sao Paulo, en la que participaron cinco enfermeras. La recolección de los datos fue realizada a través de entrevistas, las mismas que fueron transformadas en narrativas y luego categorizadas.

RESULTADOS: De las narrativas fueron extraídas tres categorías interpretadas a la luz del cambio planificado, a saber: el proceso de toma de decisión y sensibilización del equipo de salud, los factores intervinientes y las creencias y sentimientos relacionados a la implantación del Método Madre Canguro.

CONCLUSIÓN: El estudio permitió verificar la importancia del involucramiento de los colaboradores de la institución, en los procesos de cambio y la necesidad de adecuación de los recursos humanos y físicos para la implantación efectiva del método. De esta forma, dio subsidios para la reorganización de las actividades asistenciales y gerenciales en el referido servicio.

Descriptores: Investigación en evaluación de enfermería; Innovación organizacional; Enfermería neonatal, Recién nacido de bajo peso; Cuidado del lactante/métodos

INTRODUÇÃO

O baixo peso ao nascer constitui um dos principais problemas observados na área materno-infantil, uma vez que, por acarretar graves conseqüências à saúde do neonato, traz ônus tanto para a rede social, na qual esse recém-nascido (RN) irá inserir-se, como para as instituições hospitalares.

O elevado número de crianças prematuras e com baixo peso (inferior a 2500g) que nascem anualmente atinge a cifra de 20 milhões, dos quais cerca de um terço morre antes de completar um ano de vida, geralmente por problemas respiratórios, asfixia ao nascer e infecções(1).

Nesse sentido, as ações e os programas governamentais voltados para a assistência materno-infantil vêm estabelecendo um novo paradigma, visando a promoção da humanização da assistência, por meio da implementação de iniciativas e projetos de humanização de atendimento à saúde e da melhoria da qualidade do vínculo estabelecido entre profissionais de saúde e usuários dos serviços de saúde.

Entre as normatizações encontra-se a Portaria nº 693/00, que estabelece a Norma de Atenção Humanizada do Recém-nascido de Baixo Peso, conhecida como Método Mãe-Canguru (MMC), lançada pelo Ministério da Saúde(1). Trata-se de uma proposta assistencial que, entre outras medidas humanizadoras da assistência ao neonato, preconiza que o mesmo seja colocado em contato pele a pele, na posição vertical e em decúbito prono contra o peito de um adulto, a fim de promover vínculo, estimular o aleitamento materno e auxiliar na recuperação do RN.

Sob essa ótica, o Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo (HCFMUSP), em 2005, deu início às mudanças necessárias para a implantação, a princípio, das duas primeiras etapas do MMC, a saber: a presença dos pais na Unidade Neonatal, a fim de compartilhar os cuidados ao neonato e a operacionalização da posição canguru propriamente dita.

Toda mudança em uma organização representa alguma modificação nas relações de trabalho, nas responsabilidades, nas atitudes cotidianas, nos hábitos e comportamentos das pessoas que são os membros da organização(2). Nesse contexto, a implementação da mudança deve ser cuidadosamente idealizada, para garantir que a inovação seja compatível com as necessidades dos trabalhadores e da organização, de modo que proporcione uma vantagem percebida e ofereça benefícios demonstráveis(3).

Nessa perspectiva, torna-se fundamental que a situação seja analisada por todas as pessoas envolvidas na futura mudança, de forma que após a compreensão de um diagnóstico situacional, as soluções e estratégias viáveis para a implantação da mudança venham a surgir, como resultado de um trabalho em equipe, adaptadas às condições da organização(4).

Acreditando nesses pressupostos e atuando na Unidade Neonatal do HCFMUSP, como estagiária do Curso de Especialização em Neonatologia, dispus-me a realizar este estudo, como monografia de conclusão do referido curso, com o objetivo de compreender a percepção de enfermeiras de uma Unidade Neonatal, acerca da implantação do MMC. Para tanto, escolhi como sujeitos do estudo um grupo de enfermeiras da citada unidade, por perceber que se tratava das profissionais com maior envolvimento nesse processo.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo exploratório-descritivo de abordagem qualitativa.

O cenário deste estudo foi a Unidade Neonatal do Instituto da Criança do HCFMUSP, que presta assistência terciária aos RN e possui, atualmente, 63 leitos distribuídos em quatro setores: baixo risco (23 leitos), médio risco (15 leitos), alto risco (9 leitos) e terapia intensiva (16 leitos). Assim, todos os neonatos, imediatamente após o nascimento, são encaminhados à Unidade Neonatal e distribuídos pelos setores de acordo com o nível de complexidade da condição clínica dos mesmos.

Para atender a essa complexidade assistencial, o quadro de pessoal dessa unidade é constituído por 79 profissionais, sendo: 19 enfermeiras (sendo duas encarregadas), 50 auxiliares de enfermagem e 10 atendentes de enfermagem, responsáveis apenas pelo cuidado indireto aos neonatos.

Para a realização deste estudo, o projeto de pesquisa foi encaminhado à Comissão Interna de Análise de Projetos de Pesquisa da referida instituição, tendo a coleta de dados se iniciado após a anuência desse órgão.

As colaboradoras da pesquisa foram cinco enfermeiras, atuantes na citada Unidade Neonatal e que participaram efetivamente do processo de implantação do MMC, uma vez que, para a seleção dos colaboradores de um estudo qualitativo, é importante que os mesmos estejam vivenciando o fenômeno sob investigação.

O número de colaboradoras não foi predeterminado, uma vez que o critério numérico não se aplica na amostragem da pesquisa qualitativa. Nesse tipo de investigação a preocupação está no aprofundamento e na abrangência da compreensão do grupo social retratado no estudo. Entretanto, foram propostos critérios básicos para a delimitação da amostra, tais como: definir claramente o grupo social mais relevante para as entrevistas, não suspendê-las enquanto não delinear o quadro empírico da pesquisa, prever um processo de inclusão progressiva encaminhada pelas descobertas do campo e seu confronto com a teoria(5).

Dessa forma, as colaboradoras do estudo foram esclarecidas do objetivo da pesquisa, assinaram e receberam o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, elaborado conforme as normas da Resolução n.º 196/96(6), que versa sobre os aspectos éticos em pesquisas envolvendo seres humanos.

A coleta de dados ocorreu nos meses de agosto a novembro de 2006, por meio de entrevistas semi-estruturadas, sendo que as mesmas foram agendadas de acordo com a disponibilidade das colaboradoras do estudo.

As questões norteadoras da entrevista foram:

- Como está sendo, na sua atividade profissional, a implantação do Método Mãe-Canguru?

- Descreva como esse método vem sendo operacionalizado na Unidade Neonatal.

Na seqüência partiu-se para a etapa de transcrição, a qual é a passagem da gravação oral para o escrito e que envolve a textualização e a transcrição. A textualização foi realizada a partir da definição de palavras-chave que servem para mostrar a incidência das ênfases dadas em algumas situações e a transcrição se compromete a ser um texto recriado em sua plenitude, correspondendo à finalização do mesmo(7).

Ao término dessa etapa, foram agendadas datas com as colaboradoras do estudo para que fossem realizadas as conferências das entrevistas. Assim, algumas alterações foram feitas, de forma que as narrativas foram avalizadas para que fossem utilizadas na pesquisa. Nessa ocasião, foram sugeridos nomes fictícios para cada colaboradora da pesquisa, a saber: Rubi, Esmeralda, Safira, Ametista e Opala.

Os dados deste estudo foram coletados e analisados simultaneamente, buscando-se os eventos significativos extraídos das narrativas das colaboradoras.

A análise dos dados obedeceu às seguintes etapas(8): localizou-se na experiência pessoal relatada, frases ou afirmativas relacionadas diretamente ao fenômeno do estudo; interpretou-se os significados dessas frases ou temas centrais como um leitor informado; obteve-se a interpretação das colaboradoras, sempre que possível; investigou-se os significados com o objetivo de verificar o que eles revelavam a respeito das características essenciais e recorrentes do fenômeno do estudo e concluiu-se a análise elaborando prováveis definições ou afirmativas a respeito do objeto pesquisado.

RESULTADOS

A análise interpretativa das narrativas permitiu a construção de três categorias, as quais estão descritas a seguir.

O processo de tomada de decisão e de sensibilização da equipe de saúde

A administração participativa propicia às pessoas possibilidades reais de participar na administração com liberdade de questionar, discutir, sugerir e modificar uma decisão. Isso porque, quando há um clima de confiança mútua entre as partes, as pessoas são envolvidas, sensibilizadas e estimuladas a se tornarem desejosas de contribuir. Quando isso não ocorre constata-se que há dificuldade, por parte da equipe, em aceitar o novo e a mesma pode passar a perceber a proposta como uma imposição da chefia, conforme demonstra a fala de Rubi. Assim, é importante a manutenção de um processo participativo em que sejam propiciados espaços para discussões com a equipe envolvida no processo de mudança(9).

"Quando nos foi apresentada à proposta de implantar o MMC, esta não foi muito explícita, não disseram olha, vamos implantar por causa disso, ficou um pouco nebuloso, algumas pessoas foram, inclusive, resistentes para aceitá-la e fizeram o curso [referindo-se ao treinamento para a implantação] obrigadas, apenas para não ficar com uma imagem ruim perante a instituição". [Rubi]

O sucesso do processo de mudança pressupõe a sensibilização e a educação permanente das pessoas envolvidas no mesmo(10-12). Contudo, observou-se nas falas das entrevistadas que essa capacitação esteve atrelada, principalmente, à dimensão técnico-científica, ficando em segundo plano as dimensões ético-política e sócio-educativa, na qual haveria a sensibilização da equipe, em segundo plano.

Os fatores intervenientes na implantação do MMC

A análise das narrativas permitiu observar a descrição de fatores considerados intervenientes na implantação do MMC. Esses fatores referem-se aos aspectos de infra-estrutura, ao tipo de instituição, à supervisão inadequada, à sobrecarga de trabalho e da falta de trabalho em equipe.

A administração em geral acaba focalizando suas atenções na gerência dos recursos organizacionais, os quais permitem à instituição, desde que bem geridos, alcançar os pressupostos e objetivos com os quais se comprometeu(13).

No MMC é imperativa a necessidade de oferecer aos cuidadores um espaço que permita o contato físico, e que propicie, aos mesmos, adquirir gradualmente a confiança em sua capacidade de cuidar e proteger o neonato(14).

Os depoimentos a seguir salientam a necessidade da adequação de recursos humanos, materiais e físicos da Unidade Neonatal cenário deste estudo, para a viabilização da proposta nessa instituição.

"Acredito que para a implantação da proposta de atenção humanizada ao RN de baixo peso, vamos necessitar de recursos físicos, recursos materiais, recursos financeiros e, principalmente, recursos humanos, caso contrário não é possível a sua efetivação". [Esmeralda]

"Quando se tem uma infra-estrutura adequada e recursos humanos suficientes para a adesão da proposta você consegue observar as vantagens que o método oferece, com: o fortalecimento do vínculo entre mãe e filho, ganho ponderal mais rápido, menor custo para o hospital e menor tempo de internação, uma vez em que é possível dar alta a uma criança com 1800g". [Ametista]

O HCFMUSP é um órgão que tem como uma de suas atribuições, além da prestação de serviços de assistência hospitalar de alta complexidade, o ensino e a pesquisa. Isso posto, cabe a essa instituição receber estagiários de todas as áreas da saúde. Assim, foi ressaltado que a rotatividade desses estudantes interfere na implantação do MMC, conforme a narrativa abaixo:

"Outro fator interveniente na implantação dessa proposta assistencial é o fato dessa instituição ser um hospital de ensino. É diferente de um hospital privado em que a equipe multidisciplinar é sempre a mesma, são as mesmas pessoas sempre que vão estar inseridas no projeto como um todo. Aqui, nessa instituição, a mudança de residentes é freqüente e cada grupo que vem pensa de maneira diferente, então você tem que constantemente orientar os novos grupos". [Rubi]

A alta demanda assistencial na Unidade Neonatal foi, também, claramente identificada nas narrativas das colaboradoras, como sendo outro fator agravante na implantação da proposta assistencial. Segundo as mesmas, tal fato é decorrente do número reduzido de recursos humanos, em especial de enfermeiras, que acarreta prejuízo na qualidade das atividades assistenciais prestadas nessa unidade e a supervisão inadequada das mesmas.

O fato de o MMC ser uma estratégia de humanização e integralidade da assistência sinaliza que essa deva ser dirigida não só ao RN, mas também à sua família(15). Isso corrobora com as falas das colaboradoras, conforme observado no depoimento de Opala.

"Além dos recursos materiais, ainda temos o fato recursos humanos como limitador da execução da proposta assistencial, nós temos poucos profissionais para realizar a adequada supervisão das ações prestadas ao binômio mãe-filho, em especial nos finais de semana, quando trabalhamos com uma escala reduzida e ainda por cima temos as atividades gerenciais que tomam grande parte do nosso tempo". [Opala]

Outro aspecto considerado dificultador, que freqüentemente emergiu dos discursos das colaboradoras, envolve as questões da sobrecarga de trabalho devido a escassez de recursos humanos e da demanda educativa decorrente do fato da instituição ser um hospital de ensino, assim demonstrado na fala de Ametista.

"Nós, enfermeiras, somos escaladas para ficar apenas no setor de maior complexidade, onde estão as crianças mais graves, ficando os demais setores sob a supervisão da enfermeira chefe que tem muitas outras coisas para fazer. No entanto, aos finais de semana, em que não temos a enfermeira chefe, essa supervisão fica sob responsabilidade das demais enfermeiras, o que sobrecarrega ainda mais o nosso trabalho". [Ametista]

Com relação ao trabalho em equipe, percebeu-se que os profissionais encontravam-se parcialmente coesos quanto a implantação das medidas preconizadas pelo MMC, contrariando a premissa de que este deva ser uma modalidade de trabalho coletivo, em que uma determinada tarefa é compartilhada entre os vários integrantes dessa equipe, e estes têm, nessa tarefa, um objetivo comum a alcançar(16).

"A mãe é mais nossa parceira do que propriamente a equipe médica, é claro que não são todos os médicos. A impressão que tenho é que os médicos dão a ordem e nós temos que cumprir, quando na verdade todos deveriam estar inseridos na situação. É preciso decidir juntos a melhor forma e o melhor momento para realizar a técnica, para não fazê-la de qualquer jeito". [Rubi]

As crenças e sentimentos em relação a implantação do MMC

Mudar é um processo inerente ao ser humano e, portanto, inevitavelmente emocional, isso é sinal de que no processo de mudança, os principais alvos das manifestações emocionais são os seres humanos que participam dessa experiência(17). A fala a seguir evidencia a idiossincrasia de uma das colaboradoras e o conflito gerado com a implantação da mudança.

"Sinto a equipe desmotivada, no início todos estavam empolgados com a implantação do MMC, mas percebo que agora vem caindo no esquecimento". [Safira]

A mudança faz o conhecido ser trocado pela ambigüidade e pela incerteza, entretanto, tais sentimentos e comportamentos não constituem um aspecto negativo no processo de mudança, mas sugerem a necessidade de mais esclarecimentos dos objetivos e dos resultados pretendidos(18).

Nesse sentido, as colaboradoras demonstraram, ainda, expectativas dissonantes sobre a efetiva implementação do MMC após a mudança de área física da Unidade Neonatal para o novo prédio pertencente ao complexo HCFMUSP, denominado Instituto Doutor Arnaldo, como relataram Opala e Esmeralda.

"Em breve estaremos mudando nossas instalações para o novo prédio que fará parte do Complexo Hospital das Clínicas, o "Instituto Doutor Arnaldo", a nossa expectativa é que teremos um espaço físico maior que permita a implantação do Método Mãe-Canguru na integra". [Opala]

"Se hoje temos uma gestão que levanta a bandeira para a implantação do MMC e quer fazer da nossa unidade uma referência para esse método, talvez quando mudarmos para o outro prédio não seja a mesma gestão e pode ser então que a nova chefia não queira implantar essa proposta." [Esmeralda]

DISCUSSÃO

Na implantação das medidas preconizadas pelo MMC na Unidade Neonatal estudada observou-se que a mesma foi realizada sem a total adequação aos itens preconizados pela Portaria nº 693/00 estabelecida pelo Ministério da Saúde(1). Além disso, percebeu-se que o envolvimento da equipe no processo de implantação dessas medidas iniciou-se por ocasião da operacionalização das mesmas, e não no momento de tomada de decisão em aderir à citada proposta assistencial.

As mudanças bem sucedidas, antes de sua concretização e incorporação pela organização, devem percorrer três etapas distintas(19). A primeira etapa do processo de mudança planejada corresponde ao descongelamento. Essa etapa tem por objetivo gerar a motivação dos indivíduos, bem como prepará-los para a o reconhecimento da ineficácia do modelo atual. O agente de mudança, ou seja, aquele que a conduz, busca criar, nos indivíduos envolvidos, um sentimento de necessidade de mudança, assim, as pessoas ficam descontentes com a situação atual e tornam-se conscientes de sua necessidade. Notou-se, nos discursos das entrevistadas, que por falhas no processo de comunicação que antecedeu a implantação das medidas propriamente ditas do MMC, alguns integrantes da equipe foram resistentes em aderir o método.

A segunda etapa desse processo corresponde ao movimento. Nessa fase o agente de mudança identifica, planeja e implementa estratégias apropriadas, garantindo que as forças impulsoras superem as forças repressoras. Neste estudo, observou-se que a implantação das medidas preconizadas pelo MMC foram precedidas de uma capacitação técnico-científica, oferecida a todos os profissionais da instituição, porém percebeu-se que as dimensões sócio-educativa e ético-política ficaram comprometidas.

A última fase da mudança planejada é o recongelamento. Nessa etapa, o comportamento recém adquirido passa a ser integrado ao comportamento padronizado. Para que o recongelamento ocorra, é fundamental que o agente de mudança apóie e reforce, contínua ou intermitentemente, os esforços individuais de adaptação daquelas pessoas afetadas pela mudança, para evitar a extinção do comportamento adquirido.

Outro aspecto evidenciado no processo de implantação do MMC refere-se ao trabalho em equipe caracterizado como sendo a relação recíproca de duas dimensões complementares, trabalho e interação, pois é por meio da comunicação que se dá a articulação das intervenções técnicas(20). Todavia, percebeu-se que o processo de comunicação entre os integrantes da equipe de saúde apresentou ruídos, uma vez que a adesão, bem como o processo de implantação dessa proposta não foram amplamente discutidos e praticados por toda a equipe multidisciplinar de saúde.

Ainda na perspectiva do trabalho em equipe, sabe-se que todos os profissionais de saúde executam suas ações dentro de uma certa esfera de autonomia e de responsabilidade, correspondente a sua área de atuação, porém, para que a equipe possa articular o seu trabalho, é preciso que seus componentes tomem em consideração a interdependência de suas ações e a autonomia profissional do outro(16).

Diante dessas considerações, e acreditando que a gestão participativa deva ser o alicerce para o progresso de uma organização, verificou-se que este estudo mostra a necessidade de maior participação das pessoas diretamente envolvidas nos processos de mudança, uma vez que se constatou que as colaboradoras acreditam nas mudanças e aderem às mesmas, a partir do momento em que as alterações nos processos de trabalho passam a ter significado para elas. Além disso, salientam a necessidade de algumas adequações para que o MMC seja totalmente implementado, de acordo com as normas preconizadas pelo Ministério da Saúde.

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O estudo permitiu a compreensão da percepção de um grupo de enfermeiras acerca da implantação do MMC. Constatou-se que as medidas preconizadas pela proposta assistencial de atenção humanizada ao RN de baixo peso não estão, ainda, sendo executadas na íntegra, algumas delas estão sendo instituídas e outras aguardam a mudança de área física da Unidade Neonatal para o Instituto Doutor Arnaldo.

Desse modo, a referida unidade está em processo de reorganização de suas atividades, com a finalidade de atingir todos as etapas necessárias para o alcance dessa proposta, uma vez que as duas primeiras etapas do método encontram-se em processo de implantação.

Verificou-se, ainda, que a sensibilização da equipe de saúde relativa à implantação do MMC foi parcial, pois na perspectiva das entrevistadas, faltou maior envolvimento das mesmas no processo de tomada de decisão.

Com relação ao processo de implantação das medidas que constituem o MMC, averiguou-se que alguns fatores vêm dificultando o pleno estabelecimento das recomendações dessa proposta, como a necessidade de adequação de recursos humanos, físicos e materiais. As colaboradoras destacaram, também, a importância do trabalho em equipe para a eficácia da implementação.

Cabe ressaltar que, para uma mudança ser bem sucedida, faz-se necessário o acompanhamento e a avaliação contínua de todo o processo, permitindo assim, analisar propostas novas ou modificada, formuladas com vistas a melhorias posteriores à mudança. Assim, acredita-se que o resultado deste estudo permite essa avaliação e contribuiu para a reorganização das ações desenvolvidas no referido serviço.

Outro aspecto a ser salientado é que as mudanças são necessárias e importantes nas instituições de saúde, e que a enfermeira, nesse sentido, deve assumir o papel de desencadeador do processo de mudança. Este estudo, levou a acreditar que é imprescindível que as enfermeiras envolvidas na implantação do MMC assumam a posição de desafiadoras, frente à mudança, entendendo-a como uma oportunidade de crescimento e desenvolvimento.

Acredita-se, também, que os resultados deste estudo possam contribuir para a compreensão do processo de mudança que vem ocorrendo nesse serviço, fornecendo subsídios para a reorganização das atividades assistenciais, gerenciais e de ensino e pesquisa. Além disso, que mediante essa compreensão, contribua para o êxito de uma assistência neonatal humanizada e de elevada qualidade.

Artigo recebido em 09/05/2007 e aprovado em 08/08/2007

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  • Autor Correspondente:
    Thaís Cristina de Hollanda Parisi
    Av. Parada Pinto, 3420 - Apto 102 - Alto do Mandaqui
    São Paulo - SP – CEP. 02611-001
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    Monografia de conclusão do Curso de Especialização em Neonatologia do Hospital das Clínicas da Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo – USP – São Paulo (SP), Brasil
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      13 Jan 2009
    • Data do Fascículo
      2008

    Histórico

    • Aceito
      08 Ago 2007
    • Recebido
      09 Maio 2007
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