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Modelos agro-meteorológicos na estimativa da produtividade da cultura da soja na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná

Agrometeorological models in the soybean crop productivity estimate, in Ponta Grossa region, State of Paraná, Brazil

Resumos

O presente estudo teve por objetivo avaliar o desempenho de modelos simplificados e agro-meteorológicos na estimativa da produtividade da cultura da soja, na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná, visando à previsão e ao planejamento de safras. A região estudada possui Latossolo Vermelho distrófico típico e clima Cfb. Os dados de produtividade da cultura da soja (11 safras) e climáticos foram disponibilizados pela Fundação ABC e Simepar, respectivamente. A evapotranspiração de referência foi estimada com o método de Penman-Monteith e os balanços hídricos diários foram determinados com um programa desenvolvido especialmente para esta finalidade. Dentre as inúmeras análises realizadas, os melhores resultados foram obtidos, considerando-se: (a) a disposição temporal das produtividades reais das safras da cultura da soja em dois grupos, denominados 'Ano 1' e 'Ano 2', em função da rotação de culturas na região; (b) o ajuste dos coeficientes e fatores dos modelos em análises de regressão múltipla. Os modelos de Stewart et al. (1976) e Jensen (1968) possibilitaram as melhores estimativas de produtividade (R² > 0,73).

planejamento de safras; Glycine max; balanço hídrico


The objective of this study was to evaluate the performance of simplified and agrometeorological models in the soybean crop productivity estimate, looking for crop season prediction and planning, in the Ponta Grossa region, Paraná State, Brazil. The soil of the studied region is classified as Typic Hapludox and the climate as Cfb. The soybean crop productivity (11 seasons) and climate data were provided by the ABC Foundation and SIMEPAR, respectively. The reference evapotranspiration was estimated by the Penman-Monteith method and the daily water balances were determined using a program especially developed for this purpose. After innumerable analyses, the best results were obtained when the following were considered: (a) the temporal distribution of real productivity of soybean crop seasons in two groups, which were called 'Year 1' and 'Year 2', according to the experimental crop rotation (b) the fit of model coefficient and factors to multiple regression analyses. The Stewart et al. (1976) and Jensen (1968) models provided the best productivity estimates (R² > 0.73).

crops planning; Glycine max; water balance


ENGENHARIA RURAL

Modelos agro-meteorológicos na estimativa da produtividade da cultura da soja na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná

Agrometeorological models in the soybean crop productivity estimate, in Ponta Grossa region, State of Paraná, Brazil

Marla Alessandra AraujoI; Jorge Luiz Moretti de SouzaII,* * Autor para correspondência. E-mail: jmoretti@ufpr.br ; Rodrigo Yoiti TsukaharaIII

IPrograma de Pós-graduação em Ciência do Solo, Departamento de Solos e Engenharia Agrícola, Setor de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Paraná, Curitiba, Paraná, Brasil

IIDepartamento de Solos e Engenharia Agrícola, Setor de Ciências Agrárias, Universidade Federal do Paraná, Rua dos Funcionários, 1540, 80035-050, Curitiba, Paraná, Brasil

IIIFundação ABC para Assistência e Divulgação Técnica Agropecuária, Castro, Paraná, Brasil

RESUMO

O presente estudo teve por objetivo avaliar o desempenho de modelos simplificados e agro-meteorológicos na estimativa da produtividade da cultura da soja, na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná, visando à previsão e ao planejamento de safras. A região estudada possui Latossolo Vermelho distrófico típico e clima Cfb. Os dados de produtividade da cultura da soja (11 safras) e climáticos foram disponibilizados pela Fundação ABC e Simepar, respectivamente. A evapotranspiração de referência foi estimada com o método de Penman-Monteith e os balanços hídricos diários foram determinados com um programa desenvolvido especialmente para esta finalidade. Dentre as inúmeras análises realizadas, os melhores resultados foram obtidos, considerando-se: (a) a disposição temporal das produtividades reais das safras da cultura da soja em dois grupos, denominados 'Ano 1' e 'Ano 2', em função da rotação de culturas na região; (b) o ajuste dos coeficientes e fatores dos modelos em análises de regressão múltipla. Os modelos de Stewart et al. (1976) e Jensen (1968) possibilitaram as melhores estimativas de produtividade (R2 > 0,73).

Palavras-chave: planejamento de safras, Glycine max, balanço hídrico.

ABSTRACT

The objective of this study was to evaluate the performance of simplified and agrometeorological models in the soybean crop productivity estimate, looking for crop season prediction and planning, in the Ponta Grossa region, Paraná State, Brazil. The soil of the studied region is classified as Typic Hapludox and the climate as Cfb. The soybean crop productivity (11 seasons) and climate data were provided by the ABC Foundation and SIMEPAR, respectively. The reference evapotranspiration was estimated by the Penman-Monteith method and the daily water balances were determined using a program especially developed for this purpose. After innumerable analyses, the best results were obtained when the following were considered: (a) the temporal distribution of real productivity of soybean crop seasons in two groups, which were called 'Year 1' and 'Year 2', according to the experimental crop rotation (b) the fit of model coefficient and factors to multiple regression analyses. The Stewart et al. (1976) and Jensen (1968) models provided the best productivity estimates (R2 > 0.73).

Keywords: crops planning, Glycine max, water balance.

Introdução

Vários fatores referentes ao solo, à planta e à atmosfera interagem entre si determinando a produtividade das culturas agrícolas. Certamente existe uma relação funcional entre estes fatores e a produção das culturas, característica de cada condição ambiental (FRIZZONE et al., 2005). Os métodos utilizados para estabelecer a relação plantaclima variam desde a simples correlação, até modelos complexos, ou seja, funções de produção que podem considerar diferentes parâmetros envolvidos no sistema produtivo (PICINI et al., 1999). No entanto, considerando-se o grande número de variáveis que influenciam a produtividade das culturas agrícolas e a complexidade das relações que afetam a quantidade e qualidade do produto, a produtividade pode ser expressa exclusivamente em função da água utilizada pelo cultivo, estando todas as outras variáveis inerentes à produtividade fixas em nível ótimo (FRIZZONE et al., 2005).

Os modelos agro-meteorológicos consideram somente a influência de fatores climáticos sobre a produtividade da cultura, funcionando como medidores de eficiência. Em determinadas condições de clima, cultivo e operação, estes modelos possibilitam a previsão de produtividades físicas da água a serem

utilizadas nas análises econômicas e são particularmente importantes em análises de produção agrícola quando a água é escassa.

As principais críticas aos modelos agrometeorológicos referem-se às suas aplicações, consideradas, muitas vezes, específicas para uma localidade, ou incompletas, no sentido de omitir efeitos de outros fatores e suas interações com a água (FRIZZONE et al., 2005). No entanto, diversos autores (DOORENBOS; KASSAM, 1979; FRIZZONE et al., 2005; HOWELL et al., 1992; JENSEN, 1968; VAUX; PRUITT, 1983) ressaltam que os modelos agro-meteorológicos e funções de produção são necessários para se prever, em determinadas condições de clima, cultivo e operação, as produtividades físicas da água a serem utilizadas nas análises econômicas, e são particularmente importantes em análises de produção agrícola quando a água é escassa. Para o processo de planejamento estratégico da cultura da soja, cujo complexo agroindustrial tem contribuído com um superávit considerável na balança comercial brasileira (FARIAS et al., 2001), os modelos agrometeorológicos constituem ferramenta simples e básica à decisão dos planos de desenvolvimento. Relativamente à operação de projetos de irrigação, eles permitem tomar decisões sobre planos ótimos de cultivo e ocupação de área para produção econômica com base na água disponível. Possibilitam, também, a escolha correta da época de plantio, para que a cultura não fique exposta a déficits hídricos em momentos cruciais à obtenção de uma boa produção.

Além disso, Santos e Camargo (2006) destacam que o conhecimento prévio das safras agrícolas torna-se cada vez mais uma questão estratégica para o país, seja para o planejamento do abastecimento interno, seja para a orientação das ações referentes ao mercado externo.

A partir da identificação dos modelos agrometeorológicos que melhor descrevem o comportamento da cultura da soja a campo em uma determinada região, é possível inserir tais modelos em programas de simulação de produtividade, prever o impacto de mudanças climáticas sobre esta e, caso os eventos meteorológicos se comportem igual à média dos anos, indicar a melhor época de plantio para cada região.

O presente estudo teve por objetivo avaliar o desempenho de modelos simplificados e agrometeorológicos na estimativa da produtividade da cultura da soja, na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná, visando à previsão e ao planejamento de safras.

Material e métodos

A avaliação da precisão da estimativa da produtividade da cultura da soja foi realizada com cinco modelos simplificados e sete modelos específicos (agro-meteorológicos), para a região de Ponta Grossa. As análises de regressão e correlação, visando verificar o ajustamento da produtividade real com dados climáticos (ETo, ETc, ER, ER/ETc e P), foram realizadas com as equações linear, potencial, exponencial, logarítmica e polinomial de segundo grau, com o auxílio de uma planilha eletrônica. Mediante as recomendações e sugestões apontadas por Moraes et al. (1998) e Frizzone et al. (2005), foram selecionados os seguintes modelos agrometeorológicos para a análise de regressão e correlação realizada entre os valores, medidos e estimados, de produtividade:

- Howell e Hiler (1975):

- Jensen (1968):

- Minhas et al. (1974):

- Doorenbos e Kassam (1979):

- Stewart et al. (1976) proposto por Doorenbos e Kassam (1979):

- Doorenbos e Kassam (1979) modificado por Camargo et al. (1986):

- Rao et al. (1988):

Sendo: Yr - produtividade estimada da cultura da soja (kg•ha-1); Yp - produtividade potencial da cultura da soja na região (kg•ha-1); ERi - evapotranspiração real da cultura no i-ésimo estádio fenológico (mm•ciclo-1); ETci - evapotranspiração da cultura no i-ésimo estádio fenológico (mm•ciclo-1); Ky ou Kyi - coeficientes de penalização da produtividade por déficit (adimensional); λi - fator hídrico de penalização da produtividade por déficit (adimensional); kei - coeficiente de penalização da produtividade por excedente hídrico (adimensional); fei - fator excedente que penaliza a produção por excedente hídrico (adimensional); i - estádios fenológicos da cultura; n - número de estádios fenológicos.

Os dados de produtividade média da cultura da soja foram registrados em um experimento de longa duração, conduzido na Estação Experimental da Fundação ABC, situada no município de Ponta Grossa, Estado do Paraná, Brasil, entre os anos de 1989 a 2007, totalizando 11 ciclos produtivos de soja pelo esquema de rotação de culturas (Tabela 1). O local possui relevo suave ondulado e Latossolo Vermelho distrófico típico, textura argilosa. Maiores detalhes sobre o experimento conduzido na Fundação ABC, os sistemas de manejo, as análises estatísticas para se avaliar a produtividade e capacidade de água disponível (CAD) no local, entre outros, podem ser obtidos em Araujo et al. (2009).

A estimativa da evapotranspiração real (ER) foi realizada com auxílio de um programa denominado 'MORETTI - Módulo: Balanço hídrico sequencial (Periodicidade: 1, 5, 7, 10, 15 e 30 dias), Versão 1.0', que foi extraído e melhorado a partir do modelo original realizado por Souza e Frizzone (2003), seguindo a metodologia de Thornthwaite e Mather (1955). As análises foram realizadas para uma periodicidade diária e, conforme recomendação de Souza e Gomes (2008), a opção 'equação cosenoidal' foi utilizada para o cálculo do armazenamento de água no solo e/ou 'negativo acumulado'. O programa necessitou também dos seguintes dados para realização das análises de balanço hídrico para cada safra: precipitação pluvial (P); evapotranspiração de referência (ETo); coeficiente de cultivo (kc); capacidade de água disponível (CAD) e fração de água disponível no solo para um determinado tipo de cultura (p).

Os dados diários de P e os demais dados climáticos necessários para a estimativa da ETo, foram disponibilizados pelo Instituto Meteorológico do Paraná (Simepar), sendo provenientes da: (a) Antiga Estação Climatológica Convencional de Ponta Grossa, que ficava no Parque Estadual de Vila Velha, sob latitude 25,2381º S, longitude 50,0213º W, altitude 801 m, e clima Cfb, segundo a classificação de Köppen; e, (b) Estação Climatológica Automática do Campo Demonstrativo e Experimental de Ponta Grossa - Fundação ABC, sob latitude 25,0137º S, longitude 50,1524º W, altitude 882 m e clima Cfb, segundo a classificação de Köppen, responsável pela coleta dos dados climáticos da região a partir de 30 de junho de 2002.

A ETo diária da região de Ponta Grossa, Estado do Paraná, foi estimada com o método de Penman-Monteith, empregando-se a parametrização recomendada pela FAO (ALLEN et al., 1998), cuja equação geral é dada por:

Sendo: ETo - evapotranspiração de referência (mm • dia-1); Δ - corresponde à declividade da curva de pressão de vapor da água à temperatura do ar (KPa •ºC-1); Rn - radiação líquida na superfície (MJ • m-2 d-1); G - balanço do fluxo de calor no solo (MJ • m-2 dia-1); γpsy - constante psicrométrica (kPa • ºC–1); T - temperatura média do ar (ºC); u2 - velocidade do vento a 2 m de altura (m • s-1) es - pressão de saturação de vapor (kPa); ea - pressão atual do vapor (kPa).

Os valores de kc utilizados para transformar a ETo em evapotranspiração da cultura (ETc) são os apresentados por Farias et al. (2001), cujos períodos foram adaptados aos estádios fenológicos propostos por Costa (1996) (Tabela 2). Como todas as cultivares utilizadas no presente estudo possuíam um ciclo médio de 140 dias, os valores de kc foram ajustados para este período (Tabela 2). Nas análises, a profundidade efetiva do sistema radicular (z) da cultura da soja variou ao longo de seu desenvolvimento, conforme apresentado por Fietz e Urchei (2002) (Tabela 2).

Os valores médios de CAD (Tabela 2) utilizados foram obtidos em um estudo prévio, realizado por Araujo et al. (2009) na área experimental, em que foram detalhados aspetos referentes ao processo de coleta das amostras, às análises do solo, à obtenção dos valores de capacidade de campo (CC) e ao ponto de murcha permanente (PMP), à análise estatística, entre outros. As equações utilizadas para o cálculo da cálculo da CAD e água disponível (AD) foram:

Sendo: CADi - capacidade de água disponível no solo no i-ésimo estádio fenológico (mm); θCC - umidade do solo na CC com base em volume (%); θPMP - umidade do solo no PMP com base em volume (%); zi - profundidade efetiva do sistema radicular no i-ésimo estádio fenológico (mm); ADi - água disponível no solo no i-ésimo estádio fenológico (mm); p - fração de água disponível no solo (adimensional) -considerada igual a 0,5 para a cultura da soja, conforme recomendação da FAO (ALLEN et al., 1998).

Na estimativa do armazenamento de água no solo (ARM), no momento do plantio da cultura da soja, os balanços hídricos realizados para as 11 safras analisadas foram iniciados no mês de junho. Com este procedimento, as simulações que envolveram as 11 safras não apresentaram variabilidade do ARM no momento do plantio até mesmo quando o ARM inicial foi considerado igual a zero no início do mês de junho de uma determinada safra.

As análises de estimativa de produtividade com os modelos agro-meteorológicos foram realizadas, empregando-se: (a) coeficientes ou fatores disponibilizados na literatura (Tabela 3); e (b) coeficientes ky, kyi e fatores λi obtidos em análises de regressão linear simples (ky) e múltipla (kyi e λi), estabelecida entre as transformadas dos termos que continham o rendimento relativo (Y/Ym) da soja e da evapotranspiração relativa (ETr/ETc), utilizando os dados climáticos e culturais das 11 safras estudadas. As análises de regressão linear foram resolvidas com o método dos mínimos quadrados e a sistemas de equações lineares solucionado com o método da eliminação de Gauss.

As cultivares BR 16, BRS 133 e CD 206, consideradas de ciclo semi-precoce, apresentaram comportamento de cultivar semi-tardio, com ciclo de 140 dias, na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná. Desta forma, os valores de λi utilizados nos modelos de Jensen (1968) e Minhas et al. (1974) foram os mesmos calibrados para cultivares de ciclo semi-tardio a tardio (Tabela 3).

Estabelecidos os fatores e coeficientes a serem utilizados e realizado o balanço hídrico para se determinar os valores de ETc e ER em cada i-ésimo estádio fenológico da cultura da soja e j-ésima safra, na região de Ponta Grossa, as análises de estimativa das produtividades para cada sistema de manejo e safra estudado, foram feitas a partir da inserção dos modelos agro-meteorológicos em uma planilha eletrônica.

A precisão da estimativa de cada modelo agrometeorológico foi determinada a partir de análise de regressão linear e correlação, realizada entre os valores anuais de produtividade real (levantados na região) e estimada com os referidos modelos na região de Ponta Grossa.

Para se avaliar o grau de exatidão entre valores de produtividade reais e estimados da cultura da soja, foi utilizado o índice 'd' de concordância de Willmott et al. (1985):

Sendo: d - índice de concordância de Willmott et al. (1985); Ŷj - produtividade estimada na j-ésima safra (kg•ha-1); Yrj - produtividade real observada na j-ésima safra (kg•ha-1); r - média das produtividades reais observadas (kg•ha-1); n - número de safras.

Resultados e discussão

A obtenção de modelos comumente utilizados a partir de análises de regressão simples e correlação, quando possível, é uma excelente forma de se realizar estimativas sobre um determinado fenômeno, baseando-se no conhecimento de apenas uma variável descritora. No entanto, a tentativa de se ajustar os dados de produtividade das 11 safras da cultura da soja com parâmetros climáticos (ETo, ETc, ER, ER/ETc e P) apresentou baixíssimos coeficientes de determinação (R2 < 0,14) para as equações do tipo linear, potencial, exponencial, logarítmica e polinomial de segundo grau.

Os modelos agro-meteorológicos que empregam coeficientes obtidos na literatura (Tabela 3) também não retornaram satisfatoriamente valores de produtividade equivalentes aos valores reais de produtividade registrados para as 11 safras, e o melhor R2 encontrado foi baixíssimo (R2 = 0,0321) (Tabela 4). Diante de resultados insatisfatórios, outro procedimento recomendado na literatura consiste na realização do ajuste estatístico dos coeficientes ou fatores dos modelos agro-meteorológicos. Fontana et al. (2001) relata que diferenças entre cultivares, manejo, tipo de solo, fertilidade, clima, entre outros, variam de região para região e até dentro da mesma região, salientando a importância da calibração de coeficientes ou fatores para cada localidade, o que possibilitaria a obtenção de estimativas mais precisas. No entanto, somente o ajuste dos valores de ky, kyi e λi não foram suficientes para se gerar bons resultados com as cinco equações que permitem este procedimento dentre as sete testadas (Tabela 4). Os melhores resultados encontrados foram para os modelos de Jensen (1968) e Minhas et al. (1974), apresentando R2 igual a 0,4412 e 0,3098, respectivamente.

Os resultados obtidos anteriormente evidenciaram a existência de um ou mais fatores que provavelmente interferiram e ocultaram a dependência que a produtividade real da cultura da soja tem quanto ao suprimento adequado de sua necessidade hídrica, em seus estádios fenológicos, na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná. Diante deste fato, inúmeras tentativas, visando encontrar possíveis variáveis que interferissem no processo produtivo foram realizadas. As análises apresentadas a seguir se referem aos resultados promissores obtidos a partir da constatação e consideração de uma tendência temporal da produtividade na região em estudo.

A Figura 1 apresenta a disposição temporal dos valores reais médios de produtividade da cultura da soja na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná, para as 11 safras analisadas.


Os dados apresentados na Figura 1 permitiram verificar que, durante o ciclo de rotação de culturas, existiu alternância entre as produtividades da cultura da soja. Observou-se que a produtividade da cultura da soja foi sempre maior no primeiro ano em relação ao segundo. Em média, houve diferença positiva de 10,31% a favor do primeiro ano. Diante deste fato, optou-se por realizar a separação das produtividades da soja em dois grupos, denominados: (a) 'Ano 1': produtividades das primeiras safras de soja após a rotação de culturas (safras: 1991/1992, 1994/1995, 1997/1998, 2000/2001, 2003/2004 e 2006/2007); e, (b) 'Ano 2': produtividades das segundas safras de soja após a rotação de culturas (safras: 1992/1993, 1995/1996, 1998/1999, 2001/2002 e 2004/2005). As safras 1990/1991, 1993/1994, 1996/1997, 1999/2000, 2002/2003 e 2005/2006 foram cultivadas com outras culturas.

A Figura 2 apresenta a disposição temporal obtida a partir das produtividades da soja disposta em dois grupos ('Ano 1' e 'Ano 2').


A disposição das produtividades conforme a Figura 2 evidenciou melhoria na tendência dos dados. Este fato confirma as considerações dispostas anteriormente e evidencia que algum fator (fitossanitário, nutricional, operacional, entre outros) pode estar favorecendo as produtividades 'Ano 1' ou afetando as produtividades 'Ano 2'. Diante desta constatação, novas tentativas de ajuste com modelos simplificados e agrometeorológicos (coeficientes obtidos da bibliografia ou ajustados) foram realizadas.

O ajustamento dos dados de produtividade real 'Ano 1' e 'Ano 2' da cultura da soja com parâmetros climáticos (ETo, ETc, ER, ER/ETc e P), empregando modelos simplificados, melhorou consideravelmente os valores de R2. Os melhores resultados ocorreram para a: P com a equação linear, sendo R2 igual a 0,5623 e 0,348, respectivamente, nos agrupamentos 'Ano 1' e 'Ano 2'; e ETo para a equação polinomial de segundo grau, sendo R2 igual a 0,3847 e 0,7979, respectivamente, nos agrupamentos 'Ano 1' e 'Ano 2'. No entanto, as relações estudadas não foram estatisticamente satisfatórias, simultaneamente aos dois agrupamentos. Com exceção da ETo ('Ano 2'), as relações também apresentaram valores de R2 abaixo do recomendado por Dowdy et al. (2004), em que o R2 para a área de ciências agrárias deve ser igual ou superior a 0,7.

As análises de regressão linear entre os valores reais de produtividade da cultura da soja, conforme os agrupamentos 'Ano 1' e 'Ano 2' e os valores estimados com os sete modelos agrometeorológicos empregando coeficientes ou fatores obtidos na literatura (Tabela 3), quando comparados aos resultados, considerando-se as 11 safras, evidenciaram melhoras no R2 (Tabela 4), principalmente para as análises realizadas considerando as produtividades 'Ano 2'. Os modelos de Stewart et al. (1976), propostos por Doorenbos e Kassam (1979), Rao et al. (1988) e Doorenbos e Kassam (1979), modificados por Camargo et al. (1986), apresentaram R2 aproximadamente iguais (R2 0,6) para as produtividades 'Ano 2'. No entanto, os resultados, considerando as produtividades 'Ano 1', ainda não foram satisfatórios. Os melhores R2 foram obtidos para os modelos de Howell e Hiler (1975) e Doorenbos e Kassam (1979) (R2 = 0,3644) que, por sua vez, não foram os modelos que proporcionaram os melhores resultados com as produtividades 'Ano 2'.

Os resultados obtidos anteriormente diferem dos encontrados por Moraes et al. (1998), que também testaram modelos agro-meteorológicos para estimativa da produtividade da cultura da soja na região de Ribeirão Preto, Estado de São Paulo, utilizando os mesmos coeficientes recomendados na literatura. No entanto, a discrepância entre os resultados pode ter ocorrido pelas diferenças ambientais existentes entre as localidades; pela utilização de diferentes cultivares; pela constatação, no trabalho de Moraes et al. (1998), de que a profundidade efetiva do sistema radicular (z) da soja foi mantida fixa em valores altos, assim como os valores de CAD; pelas diferentes metodologias utilizadas para a obtenção da ETo; e pelo fato de a produtividade potencial do trabalho de Moraes et al. (1998) ter advindo de um modelo matemático e não de dados experimentais.

Resultados satisfatórios foram obtidos somente quando as análises de regressão linear e correlação entre produtividade real e estimada ('Ano 1' e 'Ano 2') foram realizadas, empregando-se modelos agrometeorológicos e fatores ou coeficientes ajustados (Tabela 4 e Figura 3). Desta forma, verificou-se que prevaleceram as considerações de Fontana et al. (2001) e Krüger et al. (2007) em que a calibração de coeficientes ou fatores para cada localidade pode permitir a obtenção de estimativas mais precisas de produtividade por meio de modelos agrometeorológicos.


Os modelos de Stewart et al. (1976), propostos por Doorenbos e Kassam (1979) e Jensen (1968), apresentaram os melhores resultados (R2 > 0,7) para as análises, considerando-se tanto as safras 'Ano 1' como as 'Ano 2' (Tabela 4 e Figura 3). Assim, os resultados obtidos atenderam as recomendações de Dowdy et al. (2004), apresentando-se agronomicamente aplicáveis à realização de estimativas da produtividade na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná. Os dois modelos também apresentaram os melhores índices 'd' de concordância de Willmott et al. (1985). Os resultados obtidos após o ajuste do modelo de Jensen (1968) foram semelhantes aos obtidos por Fontana et al. (2001), os quais obtiveram coeficiente de determinação (R2) igual a 0,7225 para o modelo ajustado na forma completa.

O modelo de Rao et al. (1988) também apresentou desempenho satisfatório (R2 = 0,7658 e 'd' = 0,8710) para as análises com as safras 'Ano 2'. Contudo, o seu desempenho foi significativamente inferior para as safras 'Ano 1', apresentando valores de R2 e índice 'd' iguais a 0,1511 e 0,1522, respectivamente.

A Tabela 5 apresenta um resumo que contém os dois modelos de melhor desempenho para se estimar a produtividade da cultura da soja na região de Ponta Grossa, Estado do Paraná.

Os modelos de Stewart et al. (1976), propostos por Doorenbos e Kassam (1979) e Jensen (1968), apresentaram bom desempenho, especialmente pela sua simplicidade, pois consideram somente o consumo relativo de água como variável independente.

Confirmou-se também a afirmação inicial de Frizzone et al. (2005) de que a produtividade pode ser expressa exclusivamente em função da água utilizada pelo cultivo, estando todas as outras variáveis inerentes à produtividade fixa em nível ótimo.

Como Picini et al. (1999) e Frizzone et al. (2005) descrevem que os métodos utilizados para se estabelecer a relação planta-clima variam desde simples correlações, modelos agro-meteorológicos até modelos complexos (funções de produção), considera-se que houve êxito na obtenção dos resultados com os modelos destacados na Tabela 5. Caso houvesse a necessidade de ajustamento de uma função de produção para a região de Ponta Grossa, os procedimentos seriam muito mais onerosos e laboriosos.

Conclusão

A disposição temporal das produtividades em agrupamentos de safras 'Ano 1' e 'Ano 2' melhorou o estreitamento da relação linear entre produtividade real e estimada com modelos; os coeficientes ou fatores obtidos na bibliografia não possibilitaram a obtenção de estimativas de produtividade estatisticamente satisfatórias com os modelos agrometeorológicos; os modelos de Stewart et al. (1976) e Jensen (1968), utilizando coeficientes e fatores obtidos por regressão, proporcionaram as relações lineares mais estreitas entre as produtividades reais e estimadas, com R2 iguais a 0,7469 e 0,7387 para a safra 'Ano 1', respectivamente, e 0,8127 e 0,7802 para a safra 'Ano 2', respectivamente.

Agradecimentos

À Fundação ABC, pelo fornecimento dos dados de produtividade da cultura da soja; ao Simepar, pela disponibilização dos dados meteorológicos da região de Ponta Grossa.

Received on September 12, 2008.

Accepted on March 17, 2009.

License information: This is an open-access article distributed under the terms of the Creative Commons Attribution License, which permits unrestricted use, distribution, and reproduction in any medium, provided the original work is properly cited.

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    Autor para correspondência. E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      28 Abr 2011
    • Data do Fascículo
      Mar 2011

    Histórico

    • Aceito
      17 Mar 2009
    • Recebido
      12 Set 2008
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