Acessibilidade / Reportar erro

Limitação do suporte de vida na terapia intensiva: percepção médica

Resumo

Analisou-se o processo de tomada de decisão médica para limitar o suporte de vida de pacientes críticos. Trata-se de pesquisa exploratório-descritiva e qualitativa, realizada por entrevista semiestruturada com 14 médicos em hospital público no sudoeste baiano. Utilizou-se a técnica do discurso do sujeito coletivo, identificando seis ideias centrais: limitar não é prescrever terapia inútil a paciente terminal; o paciente tem direito à morte digna e a cuidados paliativos; é preciso perceber a família e o papel do profissional em incluí-la na limitação do suporte de vida; decidir pela limitação é questão racional e médica; a família é apenas comunicada; não sou Deus, tenho incertezas e medo de diagnosticar a terminalidade; a medicina tem muitos vieses, como vou protocolar a limitação? E uma ancoragem: se tem câncer, não temos dificuldade para limitar o suporte diante da terminalidade. Concluiu-se que há necessidade de aprimorar a formação médica em relação à morte e seus desafios.

Doente terminal; Morte; Unidades de terapia intensiva; Tomada de decisões

Abstract

The present study sought to analyze the process of medical decision-making when limiting the life support of critical patients. A descriptive-exploratory, qualitative study was performed with 14 doctors from a public hospital in the southwest of the state of Bahia, Brazil, using semi-structured interviews. The Discourse of the Collective Subject technique was used to identify six central ideas: limitation means not employing useless treatment on terminal patients; the patient has the right to a dignified death and palliative care; it is important to be aware of the family and the professional role in including them when limiting life support; deciding on limitation is a rational and medical question; the family is only informed about the decision; I am not God, I have uncertainties and fear when diagnosing terminality; medicine has many biases, how will I create a protocol for the limitation of care? There was also one anchoring factor: we have no difficulty in limiting support when faced with terminality in cancer cases. It was concluded that there is a need to improve medical training when dealing with death and its challenges.

Terminally ill; Death; Intensive care units; Decision making

Resumen

Se analizó el proceso de toma de decisiones médicas para limitar el soporte de vida de pacientes críticos. Se trata de estudio descriptivo-exploratorio y cualitativo, realizado por medio de entrevistas semi-estructuradas con 14 médicos de un hospital público en el suroeste de Bahía, Brasil. Se utilizó la técnica del discurso del sujeto colectivo, identificando seis ideas centrales: limitar es no prescribir una terapia fútil a un paciente terminal; el paciente tiene derecho a una muerte digna y a cuidados paliativos; es necesario contemplar a la familia y atender al papel profesional de incluirla en el proceso de limitación del soporte de vida; decidirse por la limitación es una cuestión racional y médica, la familia sólo es informada; no soy Dios, tengo incertidumbre y miedo de diagnosticar la terminalidad; la Medicina tiene muchos sesgos, ¿cómo voy a protocolar la limitación? Y un anclaje: si tiene cáncer, no tenemos dificultad para limitar el soporte frente a la terminalidad. Se concluye que existe una necesidad de mejorar la formación médica en relación a la muerte y sus desafíos.

Enfermo terminal; Muerte; Unidades de cuidados intensivos; Toma de decisiones

A limitação do suporte de vida (LSV), também chamada de limitação do esforço terapêutico, é definida como a decisão de não instituir terapêutica médica ou interromper suporte avançado de vida já instituído em pacientes terminais sem possibilidade de recuperação 11. França GV. Tanatologia médico-legal. In: França GV. Medicina legal. 8ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 380-8..

A LSV é prática legal no Brasil, garantida pela publicação da Resolução 1.805/2006 do Conselho Federal de Medicina (CFM), e dá respaldo ao médico para limitar ou suspender procedimentos que prolonguem a vida do doente em fase terminal, respeitada a vontade da pessoa ou de seu representante legal. O médico deve esclarecer as modalidades terapêuticas adequadas para cada situação, registrar a decisão em prontuário, assegurar ao doente e sua família o direito a uma segunda opinião médica e continuar prestando assistência integral ao doente para alívio do sofrimento 22. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.805, de 28 de novembro de 2006. Diário Oficial da União. [Internet]. 9 nov 2006 [acesso 14 dez 2015]. Seção 1:169. Disponível: http://bit.ly/2f2ID0a
http://bit.ly/2f2ID0a...
.

Entretanto, apesar de a LSV ser prática crescente no mundo 33. Khandelwal N, Curtis JR. Clinical and economic implications of timing of limitations in life support. Crit Care Med. [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];42(2):455-6. Disponível: http://bit.ly/2w7hpvH
http://bit.ly/2w7hpvH...
,44. Turnbull AE, Ruhl AP, Lau BM, Mendez-Tellez PA, Shanholtz CB, Needham DM. Timing of limitations in life support in acute lung injury patients: a multi-site study. Crit Care Med. [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];42(2):296-302. Disponível: http://bit.ly/2ye9op6
http://bit.ly/2ye9op6...
, ainda é cercada de conflitos, pois mesmo com amparo legal persistem inseguranças e dificuldades no que tange a tomada de decisão por sua adoção 55. Linhares DG, Siqueira JE, Previdelli ITS. Limitação do suporte de vida em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2013 [acesso 20 jul 2016];21(2):291-7. Disponível: http://bit.ly/2w8HgmE
http://bit.ly/2w8HgmE...

6. Paranhos GK, Rego S. Limitação do suporte de vida pediátrico: argumentações éticas. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(3):519-28. Disponível: http://bit.ly/2fcu6OM
http://bit.ly/2fcu6OM...
-77. Gomes HA, Almeida MA, Matoso TVF, Viana MAA, Rezende MBC, Bento MAF et al. Limitação de esforço terapêutico na pessoa com lesão encefálica grave. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(2):282-90. Disponível: http://bit.ly/2jLi306
http://bit.ly/2jLi306...
.

O cenário das unidades de terapia intensiva (UTI) é onde há mais probabilidade de surgir a necessidade de LSV. Pacientes críticos, frequentemente com capacidade de decisão comprometida, têm sua terapêutica a cargo da equipe médica e da família. Nesse contexto, é muito importante considerar a participação familiar e sua opinião quanto à LSV, sendo evidenciada em estudos a vontade dos familiares em participar desse processo 88. Santos MFG, Bassitt DP. Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2011 [acesso 24 fev 2016];23(4):448-54. Disponível: http://bit.ly/2hjx58R
http://bit.ly/2hjx58R...
. Assim, destaca-se não apenas a obrigatoriedade legal da participação da família nessas decisões, mas a importância de inseri-la como coparticipante desse processo 99. Franco MHP. Famílias vivem seus lutos. In: Bomfim LA, organizadora. Família contemporânea e saúde: significados, práticas e políticas públicas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2010. p. 371-9..

Considerando a complexidade da temática, buscou-se conhecer seu estado da arte, onde se verificou a escassez de trabalhos que abordem o tema no país, sobretudo em UTI adulto 55. Linhares DG, Siqueira JE, Previdelli ITS. Limitação do suporte de vida em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2013 [acesso 20 jul 2016];21(2):291-7. Disponível: http://bit.ly/2w8HgmE
http://bit.ly/2w8HgmE...

6. Paranhos GK, Rego S. Limitação do suporte de vida pediátrico: argumentações éticas. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(3):519-28. Disponível: http://bit.ly/2fcu6OM
http://bit.ly/2fcu6OM...
-77. Gomes HA, Almeida MA, Matoso TVF, Viana MAA, Rezende MBC, Bento MAF et al. Limitação de esforço terapêutico na pessoa com lesão encefálica grave. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(2):282-90. Disponível: http://bit.ly/2jLi306
http://bit.ly/2jLi306...
. Tal revisão evidenciou a importância de aprofundar a discussão, justificando a relevância deste estudo envolvendo os profissionais que lidam com esta situação em seu cotidiano laboral.

Desse modo, constituiu-se como problema central: “como se estabelece o processo de tomada de decisão médica para LSV de pacientes críticos?”. Questão que apontou para o objetivo geral: analisar o processo de tomada de decisão médica para a limitação do suporte de vida de pacientes terminais internados em Unidades de Terapia Intensiva.

Método

Trata-se de estudo descritivo-exploratório de abordagem qualitativa, cujo cenário de pesquisa envolveu duas UTI adulto do Hospital Geral de Vitória da Conquista (HGVC), instituição estadual localizada na região sudoeste da Bahia. Participaram do estudo 14 médicos plantonistas das referidas unidades, selecionados por método não probabilístico e com no mínimo um ano de atuação em UTI. O critério de inclusão foi estabelecido para garantir maior experiência médica com situações que envolvem a tomada de decisão quanto à LSV.

Os profissionais responderam a entrevista semiestruturada com as seguintes questões: “O que você entende por limitar o suporte de vida de um paciente terminal?”; “Qual o tipo de medida mais usada para limitar o suporte de vida de um paciente terminal?”; “Quais os principais critérios que norteiam uma decisão médica, no caso a sua, em decidir por não investir mais num paciente?”; “Existe algum protocolo aqui no serviço que norteie isso?”; “Para você qual a principal dificuldade presente neste processo?”; “E você, como médico, qual sua visão da família neste processo? Qual o papel dela?”.

Após anuência mediante assinatura do termo de consentimento livre e esclarecido (TCLE), as entrevistas foram gravadas e posteriormente transcritas. Foram realizadas em local privativo da UTI, ao longo de dois meses, tendo duração média de trinta minutos. O trabalho de campo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal da Bahia, campus Anísio Teixeira, em respeito à Resolução CNS 466/12 1010. Brasil. Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde, Comitê Nacional de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprovar as seguintes diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. [Internet]. 13 jun 2013 [acesso fev 2017]. Disponível: http://bit.ly/20ZpTyq
http://bit.ly/20ZpTyq...
.

A técnica utilizada para analisar os dados foi o discurso do sujeito coletivo (DSC), que se fundamenta na teoria das representações sociais e que, neste estudo, serviu como referencial metodológico de análise. A técnica do DSC consiste em organizar e tabular dados qualitativos de natureza verbal, obtidos por meio de entrevistas.

O sujeito coletivo é expresso por meio de discurso estruturado sintaticamente em primeira pessoa do singular, que remete a um único “eu” que sintetiza as falas coletivas. Esta fala identificada como sujeito individual expressa, todavia, referência coletiva, uma vez que fala “em nome de um grupo entrevistados”.

Analisou-se o material verbal obtido extraindo de cada depoimento as ideias centrais (IC), ancoragens (AC) e suas expressões-chave (ECH). Essas últimas são trechos e transcrições literais que revelam a essência do conteúdo discursivo, sendo a matéria-prima para definir os DSC. As IC são expressões linguísticas que descrevem de forma fidedigna o significado de cada discurso analisado e de cada conjunto de expressões-chave homogêneas. Não se trata de interpretação do discurso, mas de descrição do seu sentido. A AC é manifestação linguística de ideologia ou crença revelada pelo autor do discurso e só é considerada no método dos DSC quando está explicitamente presente, o que, ao contrário das IC, nem sempre acontece.

Após extrair as figuras metodológicas do discurso e a partir da junção de ECH semelhantes, foram elaborados os DSC na primeira pessoa do singular 1111. Lefevre F, Lefevre AMC. Discurso do sujeito coletivo: representações sociais e intervenções comunicativas. Texto Contexto Enferm. [Internet]. 2014 [acesso 6 fev 2017];23(2):502-7. Disponível: http://bit.ly/2wyLmsS
http://bit.ly/2wyLmsS...
.

Resultados

A análise apontou seis ideias centrais e uma ancoragem. As IC incluíram: 1) limitar é não instituir terapia inútil a paciente terminal; 2) o paciente tem direito à morte digna e a cuidados paliativos; 3) É preciso perceber a família e o meu papel em incluí-la na LSV; 4) decidir pela LSV é questão racional e médica; a família é apenas comunicada; 5) não sou Deus, tenho incertezas e medo de diagnosticar a terminalidade; e 6) a medicina tem muitos vieses, como vou protocolar a LSV? A AC incluiu: se tem câncer, não temos dificuldade para LSV diante da terminalidade.

IC 1: Limitar é não instituir terapia inútil a paciente terminal

“Limitar é deixar de oferecer algo que não irá trazer mais mudança no prognóstico do paciente, se trata de não aplicar uma terapia que é considerada fútil porque não atingirá seu objetivo, que é melhorar a qualidade e não apenas quantidade de vida, somente prolongando o sofrimento. Quando o paciente é terminal, o que mais acontece é a não instalação de hemodiálise, a não reanimação cardiopulmonar e o não aumento da vazão de drogas vasoativas. Nos casos de terminalidade a gente estabelece que, mesmo em instabilidade hemodinâmica, aumentar vazão de droga vasoativa para ter um incremento da pressão arterial não muda o prognóstico. Não aumentamos, mas também não retiramos. Agora, se o paciente parar, ninguém reanima – se parar, parou” (DSC 1).

IC 2: O paciente tem direito à morte digna e a cuidados paliativos

“Quando percebemos que os esforços que estão sendo feitos não estão obtendo êxito, que já foi feito todo o possível e o paciente não respondeu a nada, entramos nos cuidados paliativos. Por isso nunca suspendemos analgesia, e caso não tenha efeitos colaterais e contraindicação, mantemos a dieta, o aporte calórico. E mesmo que o objetivo da terapêutica não seja paliativo, se já está instituída é mantida, se o paciente está com um quadro infeccioso grave, ele vai continuar recebendo antibióticos que cobrirão aquele tipo de infecção” (DSC 2).

IC 3: É preciso perceber a família e meu papel em incluí-la na LSV

“O que nos liga aos nossos familiares não são apenas os laços de sangue, mas principalmente o amor e carinho que se tem uns pelos outros, e é justamente esse afeto a maior dificuldade quando se fala em limitação de esforços. Se não houver um relacionamento de confiança com a família, ela se tornará o maior empecilho neste processo. Já vi negativas da família, mas no momento que você tem uma relação aberta com a família, de chegar, conversar e explicar, aquela família se vincula a você e com muita frequência concorda conosco quando expomos que não há mais um horizonte de tratamento para aquele paciente. A família tem que entender o que está acontecendo; quando eles percebem que tudo já foi feito, são os primeiros na nossa prática, aqui, a concordar” (DSC 3).

IC 4: Decidir pela LSV é questão racional e médica; a família é apenas comunicada

“A decisão pela limitação terapêutica é meramente técnica e restrita ao médico, não podendo a opinião da família prevalecer, porque esta tem um envolvimento emocional com a situação, perdendo um pouco da racionalidade. O que vemos é um apego familiar absurdo e muita contestação. Na realidade querem que fique vivo para eles e não para a pessoa em si. Mas nós da área da saúde temos certa racionalidade, não podemos permitir absurdos, porque esta é uma decisão baseada na ciência! Então quando a gente começa a limitar coisas para o paciente, a gente decide isso entre a gente, e a família é apenas comunicada” (DSC 4).

IC 5: Não sou Deus, tenho incertezas e medo de diagnosticar a terminalidade

“Eu não sou Deus! Tenho dificuldade em determinar quem está terminal. Suspender alguma terapêutica é algo muito complicado. Eu acho que todos os médicos têm essa dúvida, e se isso, e se aquilo, sabe? Então, se não tenho certeza, torno o paciente um réu do meu julgamento, como se você estivesse brincando um pouquinho de Deus! Estatisticamente a medicina não tem uma certeza absoluta porque o ser humano é cheio de variáveis, o risco de óbito pode ser muito alto, mas a gente está falando de risco, e como vou saber? Ter certeza absoluta de que está sendo fútil o investimento para aquele indivíduo? Nós não somos donos da verdade, a gente pode estar enganado” (DSC 5).

IC 6: A medicina tem muitos vieses, como vou protocolar a LSV?

“Aqui no hospital não existe nenhum protocolo escrito que trate sobre isso, até porque a construção e aplicação de um protocolo para essas situações são muito complicadas, pois cada paciente tem suas particularidades e responde clinicamente de um jeito. Estudamos cada caso como único; como vamos enquadrar todo mundo em um protocolo? A medicina tem muitos vieses, muitas considerações a serem feitas, o que deve haver é bom senso” (DSC 6).

AC 1: Se tem câncer, não temos dificuldade para LSV diante da terminalidade

“O paciente terminal é aquele com alguma doença irreversível, por exemplo, um câncer com metástase, que o paciente já fez n tratamentos e tem recidivas. Eles nem deveriam entrar na UTI. Não tem prognóstico, então temos uma maior facilidade em instituir um limite de suporte de vida nestes casos” (DSC 7).

Discussão

IC 1: Limitar é não instituir terapia inútil a paciente terminal

Quanto ao significado de limitar, exposto no DSC 1, os entrevistados apenas exemplificaram terapêuticas que não deviam ser estabelecidas e que, se já iniciadas, deveriam ser mantidas, fato que contradiz a literatura. A maior parte dos estudos sobre o assunto afirma que o suporte de vida não se resume apenas à não instituição de terapêutica, mas se refere também à remoção de suporte avançado de vida já utilizado no caso de pacientes em cuidados de fim de vida 11. França GV. Tanatologia médico-legal. In: França GV. Medicina legal. 8ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 380-8..

O artigo primeiro da Resolução CFM 1.805/2006 permite ao médico não apenas limitar, mas também suspender procedimentos e tratamentos que prolonguem a vida do doente em situação terminal 22. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.805, de 28 de novembro de 2006. Diário Oficial da União. [Internet]. 9 nov 2006 [acesso 14 dez 2015]. Seção 1:169. Disponível: http://bit.ly/2f2ID0a
http://bit.ly/2f2ID0a...
. Apesar de a norma autorizar a suspensão, no segundo discurso são citadas apenas terapêuticas não instituídas: não instituição de hemodiálise, não aumento da vazão de drogas vasoativas e não reanimação cardiopulmonar. Outro estudo já observou as mesmas terapêuticas citadas pelos entrevistados como as menos utilizadas 88. Santos MFG, Bassitt DP. Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2011 [acesso 24 fev 2016];23(4):448-54. Disponível: http://bit.ly/2hjx58R
http://bit.ly/2hjx58R...
.

Não iniciar ou suspender a utilização de determinadas técnicas são questões moral e legalmente equivalentes. Entretanto, os sujeitos deste estudo se mostraram resistentes em suspender algo já instituído, mesmo que saibam quando o tratamento é inútil. Essa interpretação tem a ver com certo conflito ético também discutido em estudo sobre cuidados paliativos integrados em final de vida de paciente internado em UTI. Tal estudo confirma a ênfase no não emprego de tratamentos de suporte avançado de vida, como a intubação orotraqueal, a hemodiálise, o uso de drogas vasoativas e a ordem para não ressuscitar 1212. Mazutti SRG, Nascimento AF, Fumis RRL. Limitação de suporte avançado de vida em pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva com cuidados paliativos integrados. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];28(3):294-300. Disponível: http://bit.ly/2xwYBt5
http://bit.ly/2xwYBt5...
.

A não utilização, portanto, é mais frequentemente percebida nas UTI e reforçada pelo respeito à prática da ortotanásia, ou seja, o não prolongamento da vida por meios artificiais quando diagnosticada a terminalidade. Reforça-se, nesse sentido, a contribuição dos cuidados paliativos integrados, para que as decisões de LSV sejam tomadas o quanto antes no direcionamento da ortotanásia dos pacientes 1212. Mazutti SRG, Nascimento AF, Fumis RRL. Limitação de suporte avançado de vida em pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva com cuidados paliativos integrados. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];28(3):294-300. Disponível: http://bit.ly/2xwYBt5
http://bit.ly/2xwYBt5...
.

Vale ressaltar que cuidados paliativos vão além do conceito de ortotanásia, haja vista seu princípio maior de alívio do sofrimento – intervir sempre, desde que na perspectiva de aliviar o sofrimento e de promover a qualidade de vida da pessoa em situação terminal e de sua família.

O DSC 1 evidencia ainda que todos os médicos entrevistados se posicionaram a favor da LSV, com as mesmas justificativas apontadas por outros estudos, entre elas evitar procedimentos que não resultem em melhor qualidade de vida e abreviar o sofrimento, buscando-se a conduta mais sensata possível – já que alguns tratamentos não apresentam benefícios justificáveis, causando baixa qualidade de vida, sem perspectiva de cura da doença de base 55. Linhares DG, Siqueira JE, Previdelli ITS. Limitação do suporte de vida em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2013 [acesso 20 jul 2016];21(2):291-7. Disponível: http://bit.ly/2w8HgmE
http://bit.ly/2w8HgmE...
.

Um último aspecto importante que esse discurso revelou foi a expressão “se parar, parou”, que remete a certa ancoragem dentro da IC 1. A expressão se reflete em palavras frequentemente utilizadas nas UTI ou outros setores de internação em relação à orientação médica de não reanimar. O uso crescente dessa orientação desperta a reflexão sobre a adequabilidade do jargão e as possíveis consequências ou generalizações que podem surgir no contexto hospitalar contemporâneo.

A maioria dos médicos participantes de outro estudo conhecia a ordem de não reanimar e concordava em prescrevê-la. No entanto, apontou-se a necessidade de regulamentar a decisão. Mesmo no caso de doença em fase terminal progressiva, ressalta-se a importância de não reanimar apenas mediante solicitação ou consentimento familiar, apesar de concordarem que o médico deve tomar parte na decisão 1313. Putzel EL, Hilleshein KD, Bonamigo EL. Ordem de não reanimar pacientes em fase terminal sob a perspectiva de médicos. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):596-602. Disponível: http://bit.ly/2fboVi6
http://bit.ly/2fboVi6...
.

IC 2: O paciente tem direito à morte digna e a cuidados paliativos

O DSC 2 indicou terapias caracterizadas pelos participantes como cuidados paliativos, geralmente aquelas não suspensas pelos médicos, para garantir conforto, bem-estar e morte digna ao paciente, além de cuidados com a família. De fato, é importante considerar que ações visando conforto e bem-estar do paciente nunca serão consideradas inúteis; pelo contrário, controlar a dor, alimentação e hidratação, por exemplo, são cuidados que não podem ser questionados quando houver indicação de alívio de sofrimento, tanto do paciente quando da família.

Entretanto, cabe discutir melhor o significado de cuidados paliativos, referidos no DSC 2 como aqueles prestados quando o paciente está morrendo. Essa compreensão se reflete em certa ancoragem social ainda impregnada no discurso de alguns médicos, a associação de cuidados paliativos com terminalidade.

De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), cuidados paliativos podem melhorar a qualidade de vida de pacientes e suas famílias, quando enfrentam problemas ligados a doenças que ameaçam a vida, pelo alívio de sofrimento identificado precocemente, avaliação impecável e tratamento de dor e outros problemas físicos, psicossociais e espirituais 1414. Worldwide Palliative Care Alliance. Global atlas of palliative care at the end of life. [Internet]. London: WHO; 2014 [acesso 21 jul 2016]. Disponível: http://bit.ly/VpiThu
http://bit.ly/VpiThu...
.

Assim sendo, a concepção de cuidados paliativos é atualmente direcionada a qualquer indivíduo com doença incurável, ou seja, crônica e progressiva, mesmo que não ameace a vida em curto prazo ou que seja passível de controle mas não de cura. Em vez de associados exclusivamente a pacientes com falecimento próximo, esses cuidados hoje devem ser prestados desde a primeira fase de qualquer doença incurável, progressiva e que ameace a vida. Nesse sentido, seu propósito é alcançar não somente corpo, mas o estado psicológico de paciente e familiares, levando em conta a sublimidade e circunstância do ser 1515. Bifulco VA, Caponero R. Cuidados paliativos: conversas sobre a vida e a morte na saúde. Barueri: Manole; 2016..

No contexto da terminalidade, os cuidados paliativos que deveriam ter sido implementados previamente devem ser contínuos e não se resumir ao controle de dor e à alimentação, mas ao atendimento das diversas necessidades do paciente e sua família, como afirma a própria Resolução CFM 1.805/2006 ao especificar que o enfermo deve receber todos os cuidados necessários para aliviar os sintomas causadores de sofrimento, garantindo-lhes assistência integral e conforto físico, psíquico, social e espiritual 22. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.805, de 28 de novembro de 2006. Diário Oficial da União. [Internet]. 9 nov 2006 [acesso 14 dez 2015]. Seção 1:169. Disponível: http://bit.ly/2f2ID0a
http://bit.ly/2f2ID0a...
.

Nessa perspectiva, emergem os cuidados ao fim da vida, que são parte importante dos cuidados paliativos, mas diferem destes porque se referem à assistência específica que a pessoa deve receber durante a última etapa de vida. Esses cuidados são oportunos a partir do momento em que o indivíduo se encontra em declínio progressivo e inexorável, e se estendem ao acolhimento de familiares em luto 1616. National Hospice and Palliative Care Organization. A pathway for patients and families facing terminal illness. Alexandria: NHPCO; 1997..

IC 3: É preciso perceber a família e meu papel profissional em incluí-la na LSV

Observa-se no DSC 3 o entendimento e respeito aos sentimentos de familiares a partir da possibilidade de constante, honesta e efetiva comunicação, referida pelos participantes como fundamental para criar vínculos que favoreçam a confiança no médico e em suas decisões, inclusive na LSV.

Acerca das inferências dos participantes deste estudo sobre os familiares do paciente, ressalta-se a inclusão de ideias contraditórias que podem ser mais bem observadas em análise concomitante desta e da próxima IC. Nesse sentido, cabe informar que a dualidade foi gerada pelas seguintes perguntas: “Em sua opinião, qual a principal dificuldade presente neste processo (LSV)?” e “Qual o papel da família do paciente no processo de LSV?”.

Esclarece-se que a maioria dos médicos entrevistados apontou como maior dificuldade do processo de LSV lidar com a família do paciente, relatando nas entrevistas quais as estratégias desenvolvidas por eles para melhor trabalhar nesse contexto de vínculos e sentimentos familiares. Tais inferências resultaram nesta IC.

Assim, a comunicação empática se mostrou central no acolhimento da família, na compreensão de que cada uma tem sua maneira particular de reagir diante da terminalidade. Esse aspecto está relacionado à história de vida, cultura, ideologia, mitos, entre outros. É extremamente importante conhecer esses fatores, que devem ajudar a compreender o que pensam as famílias sobre a LSV 88. Santos MFG, Bassitt DP. Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2011 [acesso 24 fev 2016];23(4):448-54. Disponível: http://bit.ly/2hjx58R
http://bit.ly/2hjx58R...
.

Nesse contexto, é pertinente que o profissional de saúde tenha empatia pelos envolvidos na situação, isto é, compreenda as experiências únicas que paciente e família vivenciam, sem julgamentos ou preconceitos, com o intuito verdadeiro de cuidar 1717. Savieto RM, Leão ER. Assistência em enfermagem e Jean Watson: uma reflexão sobre a empatia. Esc Anna Nery. [Internet]. 2016 [acesso 11 jul 2017];20(1):198-202. Disponível: http://bit.ly/2jMV0Sr
http://bit.ly/2jMV0Sr...
.

Ressalta-se que a decisão pela limitação terapêutica não deve ser tomada isoladamente pelo médico, que deve prezar pelo diálogo com os familiares do doente terminal. Essa conduta é um dos pilares éticos nesse processo de tomada de decisão, uma vez que o uso indiscriminado de tecnologia avançada já não é mais aceitável para todos os pacientes. É necessário refinar a atuação médica para uma adequada limitação terapêutica de pacientes terminais, incluindo ainda no processo a equipe e a instituição 1818. Palhares D, Santos ÍA, Cunha ACR. Limitação terapêutica para crianças portadoras de malformações cerebrais graves. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):567-78. Disponível: http://bit.ly/2xiaPnr
http://bit.ly/2xiaPnr...
.

IC 4: Decidir pela LSV é questão racional e médica; a família é apenas comunicada

No DSC 4 evidencia-se a supremacia da decisão médica, apesar de os entrevistados reconhecerem a importância da família no cuidado e nas decisões de fim de vida. Segundo cerca de 78% dos participantes do estudo, a opinião da família não deve ser considerada quando se trata de LSV, um achado que contradiz a IC anterior.

A importância da família nessa discussão se deve ao fato de a maioria dos pacientes internados nas UTI pesquisadas estar incapaz de tomar decisões, sendo que nesses casos a tarefa deveria ficar a cargo de médico e familiares. Mas como fica evidente nesse discurso e em outros estudos sobre o assunto, o médico tem assumido o papel de único responsável pela decisão de limitar esforços 55. Linhares DG, Siqueira JE, Previdelli ITS. Limitação do suporte de vida em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2013 [acesso 20 jul 2016];21(2):291-7. Disponível: http://bit.ly/2w8HgmE
http://bit.ly/2w8HgmE...

6. Paranhos GK, Rego S. Limitação do suporte de vida pediátrico: argumentações éticas. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(3):519-28. Disponível: http://bit.ly/2fcu6OM
http://bit.ly/2fcu6OM...
-77. Gomes HA, Almeida MA, Matoso TVF, Viana MAA, Rezende MBC, Bento MAF et al. Limitação de esforço terapêutico na pessoa com lesão encefálica grave. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(2):282-90. Disponível: http://bit.ly/2jLi306
http://bit.ly/2jLi306...
.

O profissional até reconhece a importância da família e seus valores, mas em caso de opiniões discordantes sua decisão prevalece. Para o médico, a família dificilmente concorda com o diagnóstico de terminalidade do doente por causa do envolvimento emocional. Na verdade, a família tende a decidir pelo que seria melhor para si e não para seu ente querido.

Esse processo de negação é compreensível pelo fato de a instituição familiar ficar extremamente abalada quando percebe a proximidade da morte de um de seus integrantes, instalando-se um desequilíbrio entre seus membros 99. Franco MHP. Famílias vivem seus lutos. In: Bomfim LA, organizadora. Família contemporânea e saúde: significados, práticas e políticas públicas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2010. p. 371-9.. Para que haja boa relação com os familiares, os profissionais precisam compreender e respeitar o momento pelo qual estão passando.

Estudos comprovam que muitas vezes familiares negam a situação de terminalidade de seu ente querido para não desestimular qualquer investimento de cuidado 1919. Oliveira SG, Quintana AM, Denardin-Budó ML, Moraes NA, Lüdtke MF, Cassel PA. Internação domiciliar do paciente terminal: o olhar do cuidador familiar. Rev Gaúch Enferm. [Internet]. 2012 [acesso 20 jul 2016];33(3):104-10. Disponível: http://bit.ly/2wzbseY
http://bit.ly/2wzbseY...
dispensado, na esperança de cura ou milagre, apesar de o diagnóstico revelar que não há possibilidade. A fase de confiança na cura talvez seja a de maior dificuldade para os médicos, devido ao apego da família e da expectativa de que o doente irá se curar. Porém, deve-se entender que essa é uma reação natural e cultural que demanda habilidade dos profissionais.

Independentemente do comportamento da família, é seu direito ter voz nas decisões relativas a seu parente, sendo reconhecida como seu responsável. Apesar disso, a família do paciente terminal é frequentemente desatendida. Portanto, refletir sobre sua inserção em assuntos referentes à terminalidade é imprescindível para garantir a dignidade e o cumprimento das vontades manifestadas pelo paciente, além de proporcionar conforto aos familiares nessa situação estressante. Os profissionais da saúde devem atentar para o cuidado com a família, evitando condutas inflexíveis e, tanto quanto possível, estimulando conversas sinceras no contexto de fim de vida 2020. Cogo SB, Lunardi VL, Quintana AM, Girardon-Perlini NMO, Silveira RS. Desafios da implementação das diretivas antecipadas de vontade à prática hospitalar. Rev Bras Enferm. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];69(6):1031-8. Disponível: http://bit.ly/2xRYGc7
http://bit.ly/2xRYGc7...
.

Nesse sentido, as diretivas antecipadas de vontade são regulamentadas como instrumento que permite à pessoa registrar sua vontade sobre tratamentos futuros e a assistência que deseja receber caso a doença se agrave e não possa mais responder por si. Esse dispositivo é reconhecido pelo Conselho Federal de Medicina (Resolução CFM 1.995/2012) 2121. Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.995, de 9 de agosto de 2012. Dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes [Internet]. Diário Oficial da União. Brasília; p. 269-70, 31 ago 2012 [acesso 9 nov 2017]. Disponível: http://bit.ly/207VBbw
http://bit.ly/207VBbw...
e representa suporte ético e legal para garantir que profissionais de saúde respeitem a vontade da pessoa que designa um representante para tomar decisões, geralmente um familiar.

As diretivas podem ser apenas verbalizadas e registradas pelo médico em prontuário ou registradas em cartório, com testemunhas, a fim de eleger como representante legal uma pessoa da confiança do paciente para tomar decisões 2222. Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Vamos falar de cuidados paliativos. [Internet]. São Paulo: SBGG; 2015 [acesso 28 ago 2017]. Disponível: http://bit.ly/1SCBz73
http://bit.ly/1SCBz73...
.

IC 5: Não sou Deus, tenho incertezas e medo de diagnosticar a terminalidade

Observa-se a partir do DSC 5 que os médicos entendem como responsabilidade muito grande diagnosticar o paciente terminal e afirmar que nada mais pode beneficiá-lo, ideia expressa pela dúvida, incerteza e o temor de ocuparem o “lugar de Deus” ao firmar o juízo de que determinado paciente não tem mais salvação, “sentenciando-o” à morte.

Esse posicionamento decorre provavelmente do desconhecimento dos profissionais de saúde sobre cuidados paliativos. Em relação à afirmação de que “nada mais irá beneficiar o paciente”, esquece-se de que muito pode ser feito para minimizar o sofrimento no decorrer do processo de morte e na sua proximidade, o que requer dos profissionais habilidades específicas para aliviar o sofrimento humano.

Nesse sentido, observa-se na literatura que os médicos reconhecem no diagnóstico da terminalidade receio, relatividade e subjetividade. O fato de a situação não depender apenas de saberes técnicos dificulta ainda mais o diagnóstico 2323. Monteiro DT, Reis CGC, Quintana AM, Mendes JMR. Morte: o difícil desfecho a ser comunicado pelos médicos. Estud Pesqui Psicol. [Internet]. 2015 [acesso 21 jul 2016];15(2):547-67. Disponível: http://bit.ly/2jLGkDj
http://bit.ly/2jLGkDj...
. Compreende-se, assim, que mesmo centrada na racionalidade a medicina não pode responder a todas as questões objetivamente.

Como aponta o primeiro discurso do eixo, o médico se sente muito mais seguro em desligar aparelhos de um paciente cujo protocolo de morte encefálica (ME) já está caracterizado pela realização de exames clínicos e complementares durante intervalos variáveis, próprios a determinadas faixas etárias 2424. Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº 1.480, de 8 de agosto de 1997. A morte encefálica será caracterizada através da realização de exames clínicos e complementares durante intervalos de tempo variáveis, próprios para determinadas faixas etárias. Revoga-se a Resolução CFM nº 1.346/91. Diário Oficial da União. [Internet]. 21 ago. 1997 [acesso 20 set 2017];(160):Seção 1, p.18227-8. Disponível: https://goo.gl/EZFZMR
https://goo.gl/EZFZMR...
, a ter de limitar alguma terapêutica para o doente com prognóstico reservado, justamente pela subjetividade e percepção de cada um no processo decisório.

Essa maior facilidade em desligar aparelhos de pacientes com ME também foi observada pela insistência dos participantes em associar LSV a pacientes com ME. Para desfazer essa confusão, todos os entrevistados foram esclarecidos de que a pessoa precisaria estar viva para que o suporte de vida fosse limitado, e não morta. Pois, como o próprio termo revela, a LSV é alternativa a ser considerada para pacientes que estão vivos, porém em estágio terminal, e não para os que já estão com o diagnóstico de morte estabelecido 66. Paranhos GK, Rego S. Limitação do suporte de vida pediátrico: argumentações éticas. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(3):519-28. Disponível: http://bit.ly/2fcu6OM
http://bit.ly/2fcu6OM...
.

Esta situação resulta, frequentemente, do fato de profissionais de saúde não se sentirem preparados para comunicar más notícias, experimentando certo sofrimento ao fazê-lo. Pode-se considerar que esse impasse inicie na formação médica, que, mesmo em evolução, ainda se encontra ancorada em ditames da ciência positivista, deixando a subjetividade em segundo plano.

Portanto, prevalece a formação que cria barreiras a sentimentos e emoções na prática clínica. A relação entre médicos, pacientes e familiares deve desenvolver-se a partir de um comportamento médico compatível com a situação de incerteza. Nesse contexto, o maior problema surge quando a fragilidade do outro revela ao médico sua própria fragilidade e finitude, o que pode desencadear nos médicos mecanismos de defesa, muitas vezes não permitindo que lidem adequadamente com questões emocionais 2525. Monteiro DT, Quintana AM. A comunicação de más notícias na UTI: perspectiva dos médicos. Psicol Teor Pesqui. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];32(4):1-9. Disponível: http://bit.ly/2yeoRWi
http://bit.ly/2yeoRWi...
.

IC 6: A medicina tem muitos vieses, como vou protocolar a LSV?

O DSC 6 evidencia que nem todas as questões na medicina, apesar de seu estatuto de ciência, têm respostas exatas e irrefutáveis. Essa falta de objetividade e linearidade de quadro clínico de cada paciente dificulta o diagnóstico da terminalidade, bem como o estabelecimento de protocolos sobre o assunto.

Diante do exposto, é possível ver o processo que envolve as decisões de fim de vida permeado não apenas pela objetividade, mas também pela subjetividade, exigindo que o processo decisório sobre a limitação terapêutica passe por ampla discussão.

Deve-se levar em conta não apenas critérios objetivos da doença, mas também os que influenciam na homeostase do paciente de acordo com o momento, a doença e o contexto familiar e social. Nesse sentido, outros membros da equipe multiprofissional podem contribuir com seu conhecimento para conduzir a situação de forma mais equilibrada e segura.

Resultados de outra pesquisa corroboram a necessidade de mais subsídios e regulamentações para orientar de forma mais ampla os médicos diante dessa difícil tomada de decisão. Além disso, conclui que o momento é oportuno para elaborar orientação ética sobre a ordem de não reanimar no Brasil, o que preenche a atual lacuna normativa 1313. Putzel EL, Hilleshein KD, Bonamigo EL. Ordem de não reanimar pacientes em fase terminal sob a perspectiva de médicos. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):596-602. Disponível: http://bit.ly/2fboVi6
http://bit.ly/2fboVi6...
.

Outro estudo confirma essa compreensão com relatos concernentes à necessidade de melhorar a comunicação entre profissionais da equipe da UTI, uniformizando condutas na assistência ao paciente. Aponta também a urgência de capacitação para que, em conjunto, a equipe multiprofissional possa dar o suporte necessário aos familiares e ao paciente em fase final de vida 2626. Gulini JEHMB, Nascimento ERP, Moritz RD, Rosa LM, Silveira NR, Vargas MAO. A equipe da unidade de terapia intensiva frente ao cuidado paliativo: discurso do sujeito coletivo. Rev Esc Enferm USP. [Internet]. 2017 [acesso 11 jul 2017];51:e03221. Disponível: http://bit.ly/2fj5O9B
http://bit.ly/2fj5O9B...
.

AC 1: Se tem câncer, não temos dificuldade para LSV diante da terminalidade

No DSC 7, que representa a AC 1, fica claro o convencionalismo com que é visto o paciente oncológico. A ideia de que o diagnóstico de câncer, acompanhado de metástases resistentes ao tratamento, implica terminalidade explica a classificação deste eixo como ancoragem, ou seja, ideia central impregnada por estigma socialmente construído.

Essa discussão remete à transição das principais causas de morte no mundo atual. No passado, as epidemias dizimavam vidas, mas devido ao rápido progresso da medicina preventiva, com ações como vacinação e antibioticoterapia, entre outros aspectos sanitários, essas causas vêm cedendo lugar a doenças crônicas, como o câncer 2727. Kübler-Ross E. Sobre a morte e o morrer. 9ª ed. São Paulo: Martins Fontes; 2008..

As neoplasias crescem em todo o mundo e já representam a segunda causa de morte na maioria dos países, com previsão de se tornar a primeira nos próximos anos. Desse modo, o câncer é considerado uma das doenças crônicas de maior mortalidade, motivo que explica o preconceito de que a doença não tem um bom prognóstico 2828. World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: WHO; 2011..

Todavia, as ordens de não reanimar são expressão sensível da evolução ética em medicina, deixando de ser consideradas como má prática. Noutras palavras, “não reanimar”, no contexto da terminalidade, se configura hoje como padrão da boa prática médica e se estabelece como procedimento em casos de neoplasia metastática em fase terminal não somente no Brasil, mas também na Europa 2929. Nunes R. Testamento vital. Nascer Crescer. [Internet]. 2012 [acesso 21 jul 2016];21(4):250-5. Disponível: http://bit.ly/2yefTIN
http://bit.ly/2yefTIN...
.

Dessa forma, não reanimar indivíduos em fase terminal de doença progressiva é algo apontado em estudo como ato humano que vai ao encontro do princípio bioético da não maleficência, uma vez que visa minimizar o sofrimento e evitar a distanásia 1313. Putzel EL, Hilleshein KD, Bonamigo EL. Ordem de não reanimar pacientes em fase terminal sob a perspectiva de médicos. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):596-602. Disponível: http://bit.ly/2fboVi6
http://bit.ly/2fboVi6...
.

Considerações finais

O estudo evidenciou que o processo decisório médico para limitar terapêuticas a pacientes terminais é influenciado não só por critérios objetivos e concretos, mas também pelas nuances da subjetividade. Isso o torna mais complexo, revelando a insegurança do profissional médico em determinar a terminalidade perante as interpretações sociais que envolvem a vida e a morte dos seres humanos.

Para além desse conflito interior, também se mostrou relevante o desafio da relação com a família no contexto da LSV. Nesse sentido, a empatia por parte da equipe médica é imprescindível, uma vez que a sensibilidade para conduzir essa relação por meio de comunicação honesta e efetiva torna-se fator importantíssimo para potencializar e desenvolver a resiliência das famílias.

Diante disso, sugerem-se mais pesquisas na área, visando sensibilizar e mobilizar esses profissionais sobre a necessidade de transformarem sua práxis quanto ao acolhimento das necessidades subjetivas de pacientes e famílias, sobretudo no contexto intensivista. Também se propõe uma reforma curricular dos cursos de graduação médica para que discutam mais a morte e o morrer e suas demandas psicossociais.

As limitações deste estudo se devem ao fato de as percepções representarem os profissionais de UTI de um único hospital na região Nordeste do país. Outros cenários poderiam representar novas diversidades, demonstrando variação de conforto e experiência com a temática.

Por fim, propõe-se que sejam estabelecidas rodas de conversa entre familiares e equipe multiprofissional, viabilizando melhor compreensão por parte destes do processo da LSV e diluição das fronteiras disciplinares das profissões. Estruturar equipes que contemplem essas diferenças no cenário da terapia intensiva permitiria a paciente crítico e familiares desfrutar de assistência com mais vínculos e enriquecida pelos saberes/fazeres de todos os profissionais.

Referências

  • 1
    França GV. Tanatologia médico-legal. In: França GV. Medicina legal. 8ª ed. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan; 2008. p. 380-8.
  • 2
    Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.805, de 28 de novembro de 2006. Diário Oficial da União. [Internet]. 9 nov 2006 [acesso 14 dez 2015]. Seção 1:169. Disponível: http://bit.ly/2f2ID0a
    » http://bit.ly/2f2ID0a
  • 3
    Khandelwal N, Curtis JR. Clinical and economic implications of timing of limitations in life support. Crit Care Med. [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];42(2):455-6. Disponível: http://bit.ly/2w7hpvH
    » http://bit.ly/2w7hpvH
  • 4
    Turnbull AE, Ruhl AP, Lau BM, Mendez-Tellez PA, Shanholtz CB, Needham DM. Timing of limitations in life support in acute lung injury patients: a multi-site study. Crit Care Med. [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];42(2):296-302. Disponível: http://bit.ly/2ye9op6
    » http://bit.ly/2ye9op6
  • 5
    Linhares DG, Siqueira JE, Previdelli ITS. Limitação do suporte de vida em unidade de terapia intensiva pediátrica. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2013 [acesso 20 jul 2016];21(2):291-7. Disponível: http://bit.ly/2w8HgmE
    » http://bit.ly/2w8HgmE
  • 6
    Paranhos GK, Rego S. Limitação do suporte de vida pediátrico: argumentações éticas. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(3):519-28. Disponível: http://bit.ly/2fcu6OM
    » http://bit.ly/2fcu6OM
  • 7
    Gomes HA, Almeida MA, Matoso TVF, Viana MAA, Rezende MBC, Bento MAF et al. Limitação de esforço terapêutico na pessoa com lesão encefálica grave. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2014 [acesso 20 jul 2016];22(2):282-90. Disponível: http://bit.ly/2jLi306
    » http://bit.ly/2jLi306
  • 8
    Santos MFG, Bassitt DP. Terminalidade da vida em terapia intensiva: posicionamento dos familiares sobre ortotanásia. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2011 [acesso 24 fev 2016];23(4):448-54. Disponível: http://bit.ly/2hjx58R
    » http://bit.ly/2hjx58R
  • 9
    Franco MHP. Famílias vivem seus lutos. In: Bomfim LA, organizadora. Família contemporânea e saúde: significados, práticas e políticas públicas. Rio de Janeiro: Fiocruz; 2010. p. 371-9.
  • 10
    Brasil. Ministério da Saúde, Conselho Nacional de Saúde, Comitê Nacional de Ética em Pesquisa envolvendo Seres Humanos. Resolução nº 466, de 12 de dezembro de 2012. Aprovar as seguintes diretrizes e normas regulamentadoras de pesquisas envolvendo seres humanos. [Internet]. 13 jun 2013 [acesso fev 2017]. Disponível: http://bit.ly/20ZpTyq
    » http://bit.ly/20ZpTyq
  • 11
    Lefevre F, Lefevre AMC. Discurso do sujeito coletivo: representações sociais e intervenções comunicativas. Texto Contexto Enferm. [Internet]. 2014 [acesso 6 fev 2017];23(2):502-7. Disponível: http://bit.ly/2wyLmsS
    » http://bit.ly/2wyLmsS
  • 12
    Mazutti SRG, Nascimento AF, Fumis RRL. Limitação de suporte avançado de vida em pacientes admitidos em unidade de terapia intensiva com cuidados paliativos integrados. Rev Bras Ter Intensiva. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];28(3):294-300. Disponível: http://bit.ly/2xwYBt5
    » http://bit.ly/2xwYBt5
  • 13
    Putzel EL, Hilleshein KD, Bonamigo EL. Ordem de não reanimar pacientes em fase terminal sob a perspectiva de médicos. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):596-602. Disponível: http://bit.ly/2fboVi6
    » http://bit.ly/2fboVi6
  • 14
    Worldwide Palliative Care Alliance. Global atlas of palliative care at the end of life. [Internet]. London: WHO; 2014 [acesso 21 jul 2016]. Disponível: http://bit.ly/VpiThu
    » http://bit.ly/VpiThu
  • 15
    Bifulco VA, Caponero R. Cuidados paliativos: conversas sobre a vida e a morte na saúde. Barueri: Manole; 2016.
  • 16
    National Hospice and Palliative Care Organization. A pathway for patients and families facing terminal illness. Alexandria: NHPCO; 1997.
  • 17
    Savieto RM, Leão ER. Assistência em enfermagem e Jean Watson: uma reflexão sobre a empatia. Esc Anna Nery. [Internet]. 2016 [acesso 11 jul 2017];20(1):198-202. Disponível: http://bit.ly/2jMV0Sr
    » http://bit.ly/2jMV0Sr
  • 18
    Palhares D, Santos ÍA, Cunha ACR. Limitação terapêutica para crianças portadoras de malformações cerebrais graves. Rev. bioét. (Impr.). [Internet]. 2016 [acesso 16 jul 2017];24(3):567-78. Disponível: http://bit.ly/2xiaPnr
    » http://bit.ly/2xiaPnr
  • 19
    Oliveira SG, Quintana AM, Denardin-Budó ML, Moraes NA, Lüdtke MF, Cassel PA. Internação domiciliar do paciente terminal: o olhar do cuidador familiar. Rev Gaúch Enferm. [Internet]. 2012 [acesso 20 jul 2016];33(3):104-10. Disponível: http://bit.ly/2wzbseY
    » http://bit.ly/2wzbseY
  • 20
    Cogo SB, Lunardi VL, Quintana AM, Girardon-Perlini NMO, Silveira RS. Desafios da implementação das diretivas antecipadas de vontade à prática hospitalar. Rev Bras Enferm. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];69(6):1031-8. Disponível: http://bit.ly/2xRYGc7
    » http://bit.ly/2xRYGc7
  • 21
    Conselho Federal de Medicina. Resolução nº 1.995, de 9 de agosto de 2012. Dispõe sobre as diretivas antecipadas de vontade dos pacientes [Internet]. Diário Oficial da União. Brasília; p. 269-70, 31 ago 2012 [acesso 9 nov 2017]. Disponível: http://bit.ly/207VBbw
    » http://bit.ly/207VBbw
  • 22
    Sociedade Brasileira de Geriatria e Gerontologia. Vamos falar de cuidados paliativos. [Internet]. São Paulo: SBGG; 2015 [acesso 28 ago 2017]. Disponível: http://bit.ly/1SCBz73
    » http://bit.ly/1SCBz73
  • 23
    Monteiro DT, Reis CGC, Quintana AM, Mendes JMR. Morte: o difícil desfecho a ser comunicado pelos médicos. Estud Pesqui Psicol. [Internet]. 2015 [acesso 21 jul 2016];15(2):547-67. Disponível: http://bit.ly/2jLGkDj
    » http://bit.ly/2jLGkDj
  • 24
    Conselho Federal de Medicina. Resolução CFM nº 1.480, de 8 de agosto de 1997. A morte encefálica será caracterizada através da realização de exames clínicos e complementares durante intervalos de tempo variáveis, próprios para determinadas faixas etárias. Revoga-se a Resolução CFM nº 1.346/91. Diário Oficial da União. [Internet]. 21 ago. 1997 [acesso 20 set 2017];(160):Seção 1, p.18227-8. Disponível: https://goo.gl/EZFZMR
    » https://goo.gl/EZFZMR
  • 25
    Monteiro DT, Quintana AM. A comunicação de más notícias na UTI: perspectiva dos médicos. Psicol Teor Pesqui. [Internet]. 2016 [acesso 5 jul 2017];32(4):1-9. Disponível: http://bit.ly/2yeoRWi
    » http://bit.ly/2yeoRWi
  • 26
    Gulini JEHMB, Nascimento ERP, Moritz RD, Rosa LM, Silveira NR, Vargas MAO. A equipe da unidade de terapia intensiva frente ao cuidado paliativo: discurso do sujeito coletivo. Rev Esc Enferm USP. [Internet]. 2017 [acesso 11 jul 2017];51:e03221. Disponível: http://bit.ly/2fj5O9B
    » http://bit.ly/2fj5O9B
  • 27
    Kübler-Ross E. Sobre a morte e o morrer. 9ª ed. São Paulo: Martins Fontes; 2008.
  • 28
    World Health Organization. Global status report on noncommunicable diseases 2010. Geneva: WHO; 2011.
  • 29
    Nunes R. Testamento vital. Nascer Crescer. [Internet]. 2012 [acesso 21 jul 2016];21(4):250-5. Disponível: http://bit.ly/2yefTIN
    » http://bit.ly/2yefTIN

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Sep-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    30 Ago 2016
  • Revisado
    25 Ago 2017
  • Aceito
    28 Ago 2017
Conselho Federal de Medicina SGAS 915, lote 72, CEP 70390-150, Tel.: (55 61) 3445-5932, Fax: (55 61) 3346-7384 - Brasília - DF - Brazil
E-mail: bioetica@portalmedico.org.br