Resumo
Os moluscos são um requisito essencial para a conclusão do ciclo de vida pelo nematoide metastrogilídeo Angiostrongylus cantonensis, o agente causador de infecções em animais domésticos e selvagens, principalmente roedores, e também de angiostrongilíase neural ou meningite eosinofílica em humanos. Há muitos relatos de moluscos que podem atuar como hospedeiro para este parasito, sendo o foco dado aos moluscos de água doce e no gigante africano Achatina fulica. O gastrópode terrestre Bulimulus tenuissimus é amplamente distribuído no território brasileiro e há outras espécies do mesmo gênero que ocorrem no Brasil e outros países, sobrepondo-se às regiões em que há relatos à ocorrência de A. cantonensis e angiostornigilíase. Apesar disso, não há registro na literatura, acerca desta espécie como hospedeiro intermediário para A. cantonensis. O presente estudo teve como objetivo verificar a possibilidade de infectar experimentalmente, utilizando larvas L1 de A. cantonensis, em condições laboratoriais, o molusco B. tenuissimus, utilizando técnicas de histologia e microscopia eletrônica. Três semanas após a exposição às larvas L1, foi possível recuperar larvas L3 dos moluscos infectados, em pequena quantidade. As larvas em desenvolvimento foram observadas na massa cefalopediosa (pé), ovotestis e nos tecidos do manto, sendo localizadas dentro de uma estrutura granulomatosa constituída por infiltração hemocitária, mas não houve deposição de cálcio ou colágeno nessas estruturas em quantidade significativa. Na terceira semana pós exposição, foi possível observar uma bainha ao redor das larvas em desenvolvimento. Os caracóis infectados apresentaram redução no tecido muscular fibroso na região do pé, perda da organização acinar na glândula digestiva, com aumento de material amorfo dentro dos ácinos e perda do padrão epitelial da organização nuclear nas células acinares. No entanto, o ovotestis, pareceu não ser afetado pela infecção, uma vez que houve um grande número de oócitos em desenvolvimento e espermatozóides em diferentes estágios de formação. A digestão dos moluscos infectados nos permitiu a recuperação de larvas de terceiro estágio (17,25%), aos 14 dias após a exposição à L1 de A. cantonensis . Estas L3 recuperadas de B. tenuissimus foram utilizados para infectar ratos experimentalmente, e 43 dias após a infecção, as larvas do primeiro estágio (L1) foram recuperadas de fezes frescas. Os resultados apresentados representam o primeiro registro do papel de B. tenuissimus como hospedeiro intermediário experimental de A. cantonensis e trazem alguma luz a um problema, até então silencioso, uma vez que a sobreposição da distribuição de B. tenuissimus e A. cantonensis no Brasil, e outros países, onde as diferentes espécies de Bulimulus ocorrem, torna possível o estabelecimento e manutenção do ciclo de vida deste parasito na natureza, com roedores selvagens como reservatório, agindo como fonte de infecção para humanos e causando a angiostrongilíase neural.
Palavras-chave:
Bulimulus tenuissimus; Bulimulidae; Metastrongylidae; potencial hospedeiro intermediário