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Infecção iatrogênica em cisto dermoide no assoalho da boca

RELATO DO CASO

IEspecialista em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pelo Colégio Brasileiro de Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial, Mestrando em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial da Faculdade de Odontologia de Pernambuco, FOP/UPE

IIDoutora em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela Faculdade de Odontologia de Pernambuco, FOP/UPE. Professora Adjunta da Faculdade de Odontologia de Pernambuco, FOP/UPE

IIIDoutor em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial pela Faculdade de Odontologia de Pernambuco, FOP/UPE. Staff da Residência em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, HUOC/UPE

IVEspecialista em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial, Chefe da Residência e Especialização em Cirurgia e Traumatologia Buco-Maxilo-Facial do Hospital Universitário Oswaldo Cruz, HUOC/UPE

VMestre em Ciências da Saúde pelo Núcleo de Pós-Graduação em Medicina da Universidade Federal de Sergipe, UFS. Professor Substituto de Patologia Oral da Universidade Federal de Sergipe, UFS

VIDoutor em Patologia Oral pela Universidade Federal do Rio Grande do Norte, UFRN. Professor Adjunto de Patologia Bucal da Faculdade de Odontologia de Pernambuco, FOP/UPE

Endereço para correspondência

Palavras-chave: cirurgia bucal, cisto dermoide, doença iatrogênica, soalho bucal.

INTRODUÇÃO

Cistos dermoides são lesões císticas infrequentes, limitadas por epitélio epidérmico, contendo em seu interior estruturas anexas, tais como folículos pilosos, glândulas sudoríparas e sebáceas. Considerados verdadeiros teratomas, os cistos dermoides podem ser de origem congênita ou adquirida, havendo maior incidência em indivíduos entre 15 e 35 anos, sem predileção por sexo1.

RELATO DO CASO

Paciente feminina, 34 anos, relatou aumento de volume progressivo, com 6 anos de evolução, em região submentual e submandibular, bilateralmente. Referiu ter agravamento da alteração há 7 dias, após a realização, em outro serviço, de punção aspirativa na região de assoalho bucal (Figura 1A). O exame físico revelou um quadro de febre, disfonia, disfagia e dispneia. Procedeu-se, então, à internação hospitalar para drenagem cirúrgica por via intrabucal, sendo coletado conteúdo purulento e cístico contendo pelos e material amarelo-pastoso semelhante à ceratina. A radiografia panorâmica dos maxilares revelou a presença de lesão de cárie extensa com comprometimento pulpar na unidade 48, sugerindo uma infecção de origem odontogênica (Figura 1B). A ultrassonografia revelou formação ecogênica, bem delimitada, com contornos regulares na região submentual, sugerindo imagem cística com conteúdo líquido espesso (Figura 1C). A hipótese diagnóstica formulada foi de cisto dermoide. A paciente então foi submetida, sob anestesia geral, à enucleação da lesão cística por via intrabucal (Figura 1D). O exame histopatológico confirmou a hipótese de diagnóstico (Figura 1E). Após 1 ano e 6 meses da cirurgia, a paciente não apresentou recidiva da lesão (Figura 1F).





DISCUSSÃO

Os cistos dermoides apresentam-se geralmente como lesões de crescimento lento e assintomáticas, podendo apresentar diversos tamanhos. A localização anatômica é crítica na sua apresentação clínica. As lesões localizadas acima do músculo geniohioideo podem ocasionar aumento de volume sublingual, enquanto as localizadas abaixo deste músculo produzem um aumento de volume na região submentual, gerando a impressão de queixo duplo2-4. No caso aqui relatado, apesar de a lesão estar localizada acima do músculo geniohioideo, a infecção inicial e o quadro de obesidade da paciente denotavam um aspecto concomitante de queixo duplo, descaracterizando a apresentação clínica original das lesões localizadas na região sublingual.

O diagnóstico diferencial dos cistos dermoides localizados no assoalho bucal inclui uma gama de lesões, como rânula, obstrução do ducto submandibular/sublingual, cisto do ducto tireoglosso, infecções de origem odontogênica, tumores benignos e malignos e até mesmo a presença excessiva de gordura na região submentual. Além da avaliação clínica, deve-se lançar mão de métodos complementares, como tomografias computadorizadas, ultrassonografias e técnicas de biópsia para elucidação diagnóstica1. A correta realização da manobra semiotécnica da palpação, pela qual os cistos dermoides apresentam-se com consistência flutuante ou semelhante à massa de pão, aliada a métodos de imagem como a ultrassonografia, teriam sido suficientes para elucidação diagnóstica, evitando-se, desta forma, o procedimento da punção aspirativa, não recomendado pela literatura médica como meio de diagnóstico do cisto dermoide e considerada, portanto, uma manobra iatrogênica. Além disso, as alterações no estado geral e a presença de elementos dentários mal-conservados induziram à hipótese inicial de infecção de origem odontogênica com envolvimento dos espaços fasciais primários.

O tratamento proposto consiste na remoção cirúrgica das lesões, com abordagem extra ou intraoral, a depender da localização e tamanho das lesões2,5. No presente caso, foi realizada a remoção por via intraoral, uma vez que a lesão encontrava-se acima do músculo geniohioideo.

COMENTÁRIOS FINAIS

Um exame clínico com a correta realização de manobras semiotécnicas evita a ocorrência de iatrogenia no levantamento da hipótese diagnóstica do cisto dermoide, uma vez que este se apresenta, na maioria das vezes, com características bem definidas quando localizado no assoalho bucal.

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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  • 5. Shaari C, Ho BT, Shah K, Biller HF. Lingual dermoid cyst. Otolaryngol Head Neck Surg.1995;112(3):476-8.
  • Infecção iatrogênica em cisto dermoide no assoalho da boca

    Thiago de Santana SantosI; Ana Cláudia Amorim GomesII; Riedel FrotaIII; Emanuel Dias de Oliveira e SilvaIV; Paulo Ricardo Saquete Martins FilhoV; Emanuel Sávio de Souza AndradeVI
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      25 Out 2011
    • Data do Fascículo
      Out 2011
    Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Sede da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial, Av. Indianópolia, 1287, 04063-002 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (0xx11) 5053-7500, Fax: (0xx11) 5053-7512 - São Paulo - SP - Brazil
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