Acessibilidade / Reportar erro

Polipose nasal em fibrose cística: seguimento em crianças e adolescentes durante um período de 3 anos

Resumo

Introdução:

A polipose nasal é frequentemente encontrada em pacientes portadores de fibrose cística.

Objetivo:

Avaliar a incidência de polipose nasal, a resposta ao tratamento clínico, a recorrência e a necessidade de intervenção cirúrgica em crianças e adolescentes com fibrose cística durante um seguimento de 3 anos.

Método:

Os sintomas clínicos (pulmonar, insuficiência pancreática, desnutrição, obstrução nasal), duas pesquisas de cloro no suor positivas e genótipo de 23 pacientes com fibrose cística foram descritos. Todos os pacientes foram submetidos à endoscopia nasal a cada 12 meses de janeiro de 2005 a dezembro de 2007, para avaliação de presença e grau de polipose nasal. A polipose nasal, quando presente, foi tratada com corticosteroide tópico de 6 a 12 meses e avaliada a evolução nos 3 anos de seguimento.

Resultados:

Na primeira avaliação, a polipose nasal foi diagnosticada em 30,43% dos pacientes (três bilaterais e quatro unilaterais), pneumonia recorrente em 82,6%, insuficiência pancreática em 87% e a desnutrição em 74%. A presença de polipose nasal não se associou aos valores de cloro no suor, genótipo, sinais clínicos de gravidade da fibrose cística ou sintomas nasais. Nos três anos de seguimento, 13 pacientes (56,52%) apresentaram pelo menos um evento de polipose, o mais jovem foi diagnosticado aos 32 meses. Apenas um paciente foi submetido à cirurgia (polipectomia) e houve um diagnóstico de carcinoma da nasofaringe.

Conclusão:

O estudo mostrou alta incidência de polipose nasal. O acompanhamento por meio de exames endoscópicos de rotina em pacientes fibrocisticos, mesmo na ausência de sintomas nasais, é altamente recomendado. A terapia com corticoide tópico mostrou bons resultados. Assim, faz-se necessária a interação entre pediatras e otorrinolaringologistas.

Palavras-chave:
Polipose; Fibrose cística; Diagnóstico; Endoscopia; Terapia

Abstract

Introduction:

Nasal polyposis is often found in patients with cystic fibrosis.

Objective:

To assess the incidence of nasal polyposis, the response to medical treatment, recurrence and the need for surgical intervention in children and adolescents with cystic fibrosis during a three-year follow-up.

Methods:

Clinical symptoms (pulmonary, pancreatic insufficiency, malnutrition, nasal obstruction), two positive sweat chloride tests, and genotype findings in 23 patients with cystic fibrosis were analyzed. All patients underwent nasal endoscopy every 12 months from January 2005 to December 2007, to assess the presence and grade of Nasal Polyps. Nasal polyposis, when present, were treated with topical corticosteroids for 6-12 months, with progress being evaluated within the 3 years of follow-up.

Results:

In the first evaluation, nasal polyposis was diagnosed in 30.43% of patients (3 bilateral and 4 unilateral), recurrent pneumonia in 82.6%, pancreatic insufficiency in 87%, and malnutrition in 74%. The presence of nasal polyposis was not associated with chloride values in the sweat, genotype, clinical signs of severity of cystic fibrosis, or nasal symptoms. In the three-year period of follow up, 13 patients (56.52%) had at least one event of polyposis, with the youngest being diagnosed at 32 months of age. Only one patient underwent surgery (polypectomy), and there was one diagnosis of nasopharyngeal carcinoma.

Conclusion:

The study showed a high incidence of nasal polyposis. Monitoring through routine endoscopy in patients with cystic fibrosis, even in the absence of nasal symptoms, is highly recommended. The therapy with topical corticosteroids achieved good results. Thus, an interaction between pediatricians and otolaryngologists is necessary.

Keywords:
Polyposis; Cystic fibrosis; Diagnosis; Endoscopy; Therapy

Introdução

A fibrose cística (FC) é uma doença de herança autossômica recessiva que atinge as glândulas exócrinas, envolve múltiplos órgãos e evolui de forma crônica e progressiva. É a doença genética letal mais comum na etnia branca, com média de frequência de 1:2.000 nascidos vivos11 Cystic Fibrosis Foundation. Clinical practice guidelines for cystic fibrosis. Atlanta: Cystic Fibrosis Foundation; 1997.,22 Ratjen F, Döring G. Cystic fibrosis. Lancet. 2003;361:681-9.. No Brasil, estudos revelaram uma incidência de 1:9.500 nascidos vivos no Paraná,33 Santos GPC, Domingos MT, Wittog EO, Riedi CA, Rosório NA. Programa de triagem neonatal para fibrose cística no estado do Paraná: avaliação após 30 meses de sua implantação. J Pediatr. 2005;81:240-4. 1:8.700 em Santa Catarina44 Honório LFO, Ludwig Neto N, Barbosa E, Perin N, Gastaldi LA, Ferreira JE, et al. Avaliação da triagem neonatal para fibrose cística no Estado de Santa Catarina. J Bras Pneumol. 2006;32:S1. e 1:10.000 em Minas Gerais.55 Reis F, Melo SO, Vergara AA. Programa de triagem neonatal para fibrose cística de Minas Gerais (PETN-FC): aspectos clínicos e laboratoriais. J Bras Pneumol. 2006;32:S1.

As infecções respiratórias com falência respiratória final são a principal causa de óbito em pacientes com FC. Todavia, a mortalidade tem sido reduzida nos últimos anos, devido ao diagnóstico mais precoce, à maior atenção na profilaxia das infecções recorrentes de vias aéreas e ao melhor controle de pacientes em serviços especializados.11 Cystic Fibrosis Foundation. Clinical practice guidelines for cystic fibrosis. Atlanta: Cystic Fibrosis Foundation; 1997.,22 Ratjen F, Döring G. Cystic fibrosis. Lancet. 2003;361:681-9.

O diagnóstico de FC é baseado em critérios clínicos e laboratoriais: história familiar positiva para FC, insuficiência pancreática/suficiente pancreático, doença pulmonar obstrutiva supurativa crônica e dois exames de cloro no suor elevados (> 60 mEq/L) e/ou detecção de mutações genéticas descritas na FC. Outros dados clínicos que sugerem a doença são: íleo meconial e/ou atresia intestinal, desidratação hiponatrêmica, edema e hipoalbuminemia, panrrinossinusite crônica, polipose nasal (PN), volvo, intussepção, bronquiectasias de etiologia desconhecida e azospermia.66 Rosenstein BJ, Cutting GR. The diagnosis of cystic fibrosis: a consensus statement. J Pediatr. 1998;132:589-95.,77 Gibson LEG, Cooke RE. Test for concentration of eletrolytes in sweat in cystic fibrosis of the pancreas utilizing pilocarpin iontophoresis. Pediatrics. 1959;23:545-9.

O comprometimento de vias aéreas superiores (VAS), como rinossinusite recorrente, rinite e/ou PN, ocorre em mais de 90% dos pacientes.88 Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.

9 Piltcher OB, Zucatto AE, Rosa DD, Preissler LC, Hentschel EL, Paixão LQ. Rinossinusite na fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 1997;63:469-78.

10 Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.

11 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.

12 Graf PM. Rhinitis medicamentosa. Clin Allergy Immunol. 2007;19:295-304.

13 Hadfield PJ, Rowe-Jones JM, Mackay IS. A prospective treatment trial of nasal polyps in adults with cystic fibrosis. Rhinology. 2000;38:63-5.

14 Cepero R, Smith RJ, Catlin FI, Bressler KL, Furuta GT, Shandera KC. Cystic fibrosis an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.

15 Morris P, Leach A. Antibiotics for persistent nasal discharge (rhinosinusitis) in children. Cochrane Database Syst Rev. 2002. CD001094.
-1616 Videler WJ, van Drunen CM, Reitsma JB, Fokkens WJ. Nebulized bacitracin/colimycin: a treatment option in recalcitrant chronic rhi-nosinusitis with Staphylococcus aureus? A double-blind, randomized, placebo-controlled, cross-over pilot study. Rhinology. 2008;46:92-8. A incidência de PN, em particular, tem sido relatada em 6 a 48% dos pacientes,1717 Schwachman H, Kulczyckii LL, Mueller HL, Flake CJ. Nasal polyposis in patients with cystic fibrosis. Pediatrics. 1962;30:389-401.,1818 Henriksson G, Hestrin KM, Karpati F, Wikstroem AC, Stierna P, Hjelte L. Nasal polyps in cystic fibrosis. Chest. 2002;121:40-7. é sintomática em 4% dos pacientes por ocasião do diagnóstico de FC.88 Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.,1010 Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.,1111 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.,1919 Kingdom TT, Lee KC, Firsimmons SC, Cropp GJ. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis requiring surgery. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1996;122:1209-13. A literatura estima que 14% dos pacientes necessitarão de tratamento cirúrgico da PN.88 Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.,1010 Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.,1111 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.,1919 Kingdom TT, Lee KC, Firsimmons SC, Cropp GJ. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis requiring surgery. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1996;122:1209-13.

Até hoje, a fisiopatologia da PN ainda é pouco conhecida.2020 Konstan MW, Schluchter MD, Xue W, Davis PB. Clinical use of ibuprofen is associated with slower FEV1 decline in children with cystic fibrosis. Am J Respir Crit Care Med. 2007;176:1084-9.,2121 Lindstrom DR, Conley SF, Splaingard ML, Gershan WM. Ibuprofen therapy and nasal polyposis in cystic fibrosis patients. J Otolaryngol. 2007;36:309-14. Processos alérgicos têm sido referidos como possível causa da PN, mas a prevalência de atopia em pacientes com FC não é maior do que na população geral.2222 Ramsey B, Richardson M. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.

A partir de dados de literatura e do estudo feito previamente em nosso serviço,2323 Weber SAT, Ferrari GF. Incidência e evolução da polipose nasal em crianças e adolescentes com fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74:16-20. observou-se a necessidade de uma melhor caracterização da evolução do comprometimento de VAS nesses pacientes.

Dessa forma, o objetivo do presente estudo foi avaliar, em médio prazo, a incidência de PN, a resposta ao tratamento clínico, a recorrência e a necessidade de intervenção cirúrgica em crianças e adolescentes com FC durante um seguimento de três anos.

Casuística e método

O estudo de coorte prospectivo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da instituição envolvida na presente pesquisa. Os pais/cuidadores e as crianças maiores de 10 anos assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido.

A amostra inicial foi composta por 23 pacientes (20 do sexo masculino), entre um ano e nove meses e 22 anos e oito meses, em acompanhamento no Centro de Referência de Fibrose Cística da Pneumopediatria da instituição envolvida. Dados epidemiológicos (idade, gênero) e sintomas clínicos de FC foram obtidos, tais como íleo meconial, desnutrição, insuficiência pancreática, pneumonia recorrente e/ou outros sintomas respiratórios, além da confirmação de FC pela análise cloro no suor77 Gibson LEG, Cooke RE. Test for concentration of eletrolytes in sweat in cystic fibrosis of the pancreas utilizing pilocarpin iontophoresis. Pediatrics. 1959;23:545-9. e estudos genéticos. Todos os pacientes foram investigados em relação às queixas de obstrução nasal, respiração oral, asma e rinossinusite e submetidos a endoscopia nasal a cada 12 meses, durante três anos. As nasofibroscopias foram feitas sob anestesia tópica com lidocaína spray sem vasoconstritor. Em crianças menores de três anos foi usado o nasofibroscópio pediátrico flexível (Karl Storz, diâmetro de 2,4 mm) e nas demais o endoscópio nasal rígido (Karl Storz, 30°, diâmetro de 2,4 ou 4 mm).

A presença ou ausência de pólipos foi descrita, de acordo com a classificação sugerida por Lund e Kennedy,2424 Johansson L, Akerlund A, Holmberg K, Melen I, Stierne P, Bende M. Evaluation of methods for endoscopic staging of nasal polyposis. Acta Otolaryngol. 2000;120:72-6. em Grau 0 - ausência de pólipo; Grau I - pólipo no meato médio; Grau II - pólipo que passa a concha média; e Grau III - pólipo que preenche toda a cavidade nasal. Durante a endoscopia, foram avaliadas presença e cor de secreção e o aspecto da mucosa nasal (coloração, edema e degeneração).

Os pacientes com diagnóstico de PN foram submetidos a tratamento com corticosteroide tópico nasal por seis meses e reavaliados por meio de endoscopia após esse período. Em caso de persistência da polipose, os pacientes eram avaliados para possível programação cirúrgica, com tomografia computadorizada de seios paranasais.

Na análise estatística, os dados demográficos e de sintomas foram descritos como média e desvio padrão. A associação entre a presença de pólipos e idade, sexo, sintomas clínicos e mutações genéticas foi avaliada por meio do teste exato de Fisher e foi considerado como significante p < 0,05.

Resultados

O diagnóstico de FC foi confirmado em todos os pacientes com o teste de suor. Mutações genéticas, com o uso de painel que continha 12 mutações, foram investigadas em todos os pacientes, em oito deles foram detectadas as mutações: ▴ F 508/outro; três ▴ F508/▴ F508; um ▴ F508/G 542X; um G542X/outro; e um R1162X/R1162X e em nove pacientes a mutação não pôde ser determinada. Proporção significativa de pacientes apresentou manifestações clínicas, inclusive pneumonias recorrentes (82,6%), insuficiência pancreática (87%), desnutrição (74%) e íleo meconial (13%).

As queixas respiratórias relatadas no início da pesquisa foram asma em 35% dos pacientes, rinossinusites em 22% e predominância de respiração oral em 22%.

Na primeira avaliação por endoscopia nasal, pólipos nasais foram encontrados em sete pacientes (30,43%). Desses, três apresentaram PN bilateral e quatro unilateral, Grau I em três pacientes, Grau II em um e Grau III em três. Nenhuma associação foi encontrada entre PN, gênero, idade, gravidade clínica ou mutação genética. A figura 1 exemplifica a avaliação endoscópica (tabela 1).

Figura 1
Imagem da endoscopia de um pólipo Grau I na cavidade nasal direita do paciente n° 12 (P, pólipo; CM, concha média nasal).

Tabela 1
Resultados da endoscopia dos pacientes com fibrose cística e polipose nasal na avaliação inicial e primeiro, segundo e terceiro anos de acompanhamento

Durante os três anos de seguimento, 13 pacientes (56,52%) experimentaram pelo menos um evento de PN, o mais jovem foi diagnosticado aos 32 meses. A presença de polipose nasal manteve-se sem associação com sintomas nasais como obstrução nasal, rinorreia ou respiração oral. Na última avaliação endoscópica, seis pacientes apresentaram polipose. Em todos os pacientes o estadiamento da polipose foi de Grau I, evidenciou melhoria da gravidade (p < 0,05).

A conduta para a PN foi corticosteroide tópico nasal na dose habitual, 57,14% dos pacientes responderam ao tratamento clínico já na avaliação subsequente, apenas um paciente com PN bilateral Grau III não apresentou melhoria satisfatória, indicou-se assim a cirurgia endoscópica nasal. Nesses três anos, dois pacientes foram a óbito e um desenvolveu carcinoma de nasofaringe, foi submetido a quimioterapia e radioterapia com boa resposta. Os achados referentes aos três anos de acompanhamento estão dispostos na tabela 2.

Tabela 2
Comparação entre menor idade com polipose nasal, número de pacientes com polipose nasal, grau da polipose, unilateralidade, presença de indicações cirúrgicas e complicações na avaliação inicial e primeiro, segundo e terceiro anos de acompanhamento

Discussão

O seguimento de pacientes portadores de FC em um centro de referência é fundamental, em virtude da detecção de intercorrências e complicações e possibilidade de tomada de decisões por equipe multidisciplinar presente no serviço.

Os pacientes avaliados no presente estudo apresentaram manifestações clínicas clássicas de FC, como íleo-mecônio, insuficiência pancreática, desnutrição e pneumonia recorrente. Todos tiveram sua confirmação diagnóstica sustentada por duas dosagens de cloro anormais no suor, conforme método padrão que a literatura respalda.77 Gibson LEG, Cooke RE. Test for concentration of eletrolytes in sweat in cystic fibrosis of the pancreas utilizing pilocarpin iontophoresis. Pediatrics. 1959;23:545-9.

Quanto ao resultado da detecção das mutações genéticas, em 52,17% se evidenciou a mutação▴ F508, também presente em elevada porcentagem de pacientes com FC no Brasil, apesar da miscigenação de nossa população, o que corrobora a literatura, que identifica a associação dessa mutação com a FC.1919 Kingdom TT, Lee KC, Firsimmons SC, Cropp GJ. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis requiring surgery. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1996;122:1209-13. Ressalte-se que não foi observada correlação entre a presença ou gravidade de PN e o genótipo.

Na literatura, PN tem sido relatada com uma incidência de 6 a 48% em pacientes com FC.1010 Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.,1111 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.,2525 Cimmino M, Cavaliere M, Nordone M, Plantulli A, Orefice A, Esposito V, et al. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis. Clin Otolaryngol. 2003;28:125-32. Neste estudo, a incidência foi de 30,43%, maior do que a apresentada em um estudo nacional, que traz a incidência de 15,2% nas crianças com média de 9,5 anos.2626 Thomé DC, Tomikowa SO, Romano F, Padera F, Adde FV, Voegels RL, et al. Manifestações nasossinusais em pacientes com fibrose cística (FC). J Bras Pneumol. 2006;32:5. Além disso, ao acompanhar os pacientes de FC em um seguimento de três anos, houve o diagnóstico de PN em uma criança de dois anos e oito meses, fato não observado na literatura, que descreve a ocorrência de PN não antes dos cinco anos.2727 Stern R, Boat T, Wood R, LeRoy W, Doershuk C. Treatment and prognosis of nasal polyps in cystic fibrosis. Am J Dis Child. 1982;136:1067-70.

Mesmo com a população deste estudo predominantemente composta por crianças, houve uma incidência alta de PN, haja vista que dos 13 casos, 12 eram crianças (menores do que 12 anos) e apenas um era adolescente, de 16 anos. A literatura traz a incidência da PN em crianças de 5 e 15,2%.2626 Thomé DC, Tomikowa SO, Romano F, Padera F, Adde FV, Voegels RL, et al. Manifestações nasossinusais em pacientes com fibrose cística (FC). J Bras Pneumol. 2006;32:5.,2828 Schmitt EJ, Neaville W, Pougdee T. Prevalence of cystic fibrosis in children who present with nasal polyposis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115:516.

Houve incidência de rinossinusites e respiração oral em 22% dos pacientes, similar ao encontrado na literatura.99 Piltcher OB, Zucatto AE, Rosa DD, Preissler LC, Hentschel EL, Paixão LQ. Rinossinusite na fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 1997;63:469-78.,1010 Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.,1818 Henriksson G, Hestrin KM, Karpati F, Wikstroem AC, Stierna P, Hjelte L. Nasal polyps in cystic fibrosis. Chest. 2002;121:40-7.,2929 Shapiro ED, Milmoe GJ, Wald ER, Rodnan JB, Bowen A. Bacteriology of the maxillary sinuses in patients with cystic fibrosis. J Inter Dis. 1982;146:589-93. A presença de PN não se correlacionou com obstrução ou secreção nasal.1818 Henriksson G, Hestrin KM, Karpati F, Wikstroem AC, Stierna P, Hjelte L. Nasal polyps in cystic fibrosis. Chest. 2002;121:40-7.

Entre os pacientes com PN, três apresentaram a patologia na avaliação inicial (42,86%); cinco no primeiro ano de acompanhamento (83,33%), quatro no segundo (80%), e quatro no terceiro (66,67%) apresentaram pólipos pequenos, Grau I, destacou-se a importância do exame endoscópico rotineiro.1111 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52. Esses dados superam a porcentagem encontrada na literatura, de 68% de identificação de pólipos pequenos.1818 Henriksson G, Hestrin KM, Karpati F, Wikstroem AC, Stierna P, Hjelte L. Nasal polyps in cystic fibrosis. Chest. 2002;121:40-7.

Houve necessidade do procedimento cirúrgico em apenas um paciente (4,35%), sem recidiva nos dois anos subsequentes, a literatura estima em até 20% a necessidade de cirurgia em pacientes com PN88 Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.,99 Piltcher OB, Zucatto AE, Rosa DD, Preissler LC, Hentschel EL, Paixão LQ. Rinossinusite na fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 1997;63:469-78.,1111 Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52. ao longo da vida. Em virtude do relato de recidivas de pólipos com necessidade cirúrgica em 28,57 a 58%,3030 Yung MW, Gould J, Upton GJ. Nasal polyposis in children with cystic fibrosis: a long-term follow-up study. Ann Otol Rhinol Laryngol. 2002;111:1081-6.,3131 Rickert S, Banuchi VE, Germana JD, Stewart MG, April MM. Cystic fibrosis and endoscopic sinus surgery: relationship between nasal polyposis and likelihood of revision endoscopic sinus surgery in patients with cystic fibrosis. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2010;136:988-92. é imprescindível a continuidade de acompanhamento desses pacientes.

Em relação ao uso de corticoide tópico, observou-se que 57,14% dos pacientes responderam satisfatoriamente ao tratamento clínico inicial, na avaliação subsequente houve completa involução da PN, o que se assemelha ao dado de que há melhoria em 56% dos pacientes com PN por meio da terapia com corticoide tópico.88 Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60. Para a população portadora de FC, não há dados de avaliação que relatem a evolução dos PN com tratamento clínico por longos períodos.

Acreditamos que o protocolo proposto por esse grupo de pesquisa de acompanhamento endoscópico anual de pacientes de FC, somado ao tratamento clínico, pode estar relacionado à baixa necessidade de indicação cirúrgica. A FC é uma doença genética comum, grave, mas quando há diagnóstico e tratamento precoces diminuem-se as comorbidades e melhora-se a qualidade de vida desses indivíduos. O número restrito de pacientes deste estudo levou a uma dificuldade na análise estatística, ressalta-se a importância de que outros centros de referência de fibrose cística também sigam esse protocolo e publiquem seus resultados no meio científico.

Conclusão

A incidência de polipose nasal em pacientes com fibrose cística é alta, mesmo entre crianças, e não está relacionada com a gravidade clínica da doença ou sintomatologia nasal. A endoscopia nasal anual rotineira permite o diagnóstico precoce do pólipo nasal em fase inicial (polipose Grau I), além da indicação do tratamento clínico com controle satisfatório do quadro. Portanto, a interação entre pneumopediatras e otorrinolaringologistas torna-se fundamental para diagnóstico, indicação de tratamento e seguimento desses pacientes.

  • A revisão por pares é da responsabilidade da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial.
  • Financiamento
    Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp, 2010/11064-1).
  • Como citar este artigo: Weber SA, Iyomasa RM, Corrêa CC, Florentino WN, Ferrari GF. Nasal polyposis in cystic fibrosis: follow-up of children and adolescents for a 3-year period. Braz J Otorhinolaryngol. 2017;83:677-82.

References

  • 1
    Cystic Fibrosis Foundation. Clinical practice guidelines for cystic fibrosis. Atlanta: Cystic Fibrosis Foundation; 1997.
  • 2
    Ratjen F, Döring G. Cystic fibrosis. Lancet. 2003;361:681-9.
  • 3
    Santos GPC, Domingos MT, Wittog EO, Riedi CA, Rosório NA. Programa de triagem neonatal para fibrose cística no estado do Paraná: avaliação após 30 meses de sua implantação. J Pediatr. 2005;81:240-4.
  • 4
    Honório LFO, Ludwig Neto N, Barbosa E, Perin N, Gastaldi LA, Ferreira JE, et al. Avaliação da triagem neonatal para fibrose cística no Estado de Santa Catarina. J Bras Pneumol. 2006;32:S1.
  • 5
    Reis F, Melo SO, Vergara AA. Programa de triagem neonatal para fibrose cística de Minas Gerais (PETN-FC): aspectos clínicos e laboratoriais. J Bras Pneumol. 2006;32:S1.
  • 6
    Rosenstein BJ, Cutting GR. The diagnosis of cystic fibrosis: a consensus statement. J Pediatr. 1998;132:589-95.
  • 7
    Gibson LEG, Cooke RE. Test for concentration of eletrolytes in sweat in cystic fibrosis of the pancreas utilizing pilocarpin iontophoresis. Pediatrics. 1959;23:545-9.
  • 8
    Cepero R, Smith RJH, Cathin FI, Bressler KL, Furuta GT, Sandesa KC. Cystic Fibrosis - an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.
  • 9
    Piltcher OB, Zucatto AE, Rosa DD, Preissler LC, Hentschel EL, Paixão LQ. Rinossinusite na fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 1997;63:469-78.
  • 10
    Bastasakis JG, El-Naggar AK. Cystic fibrosis and the sinonasal tract. Ann Otol Rhinol Laryngol. 1996;105:329-30.
  • 11
    Ramsey B, Richardson MA. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.
  • 12
    Graf PM. Rhinitis medicamentosa. Clin Allergy Immunol. 2007;19:295-304.
  • 13
    Hadfield PJ, Rowe-Jones JM, Mackay IS. A prospective treatment trial of nasal polyps in adults with cystic fibrosis. Rhinology. 2000;38:63-5.
  • 14
    Cepero R, Smith RJ, Catlin FI, Bressler KL, Furuta GT, Shandera KC. Cystic fibrosis an otolaryngologic perspective. Otolaryngol Head Neck Surg. 1987;97:356-60.
  • 15
    Morris P, Leach A. Antibiotics for persistent nasal discharge (rhinosinusitis) in children. Cochrane Database Syst Rev. 2002. CD001094.
  • 16
    Videler WJ, van Drunen CM, Reitsma JB, Fokkens WJ. Nebulized bacitracin/colimycin: a treatment option in recalcitrant chronic rhi-nosinusitis with Staphylococcus aureus? A double-blind, randomized, placebo-controlled, cross-over pilot study. Rhinology. 2008;46:92-8.
  • 17
    Schwachman H, Kulczyckii LL, Mueller HL, Flake CJ. Nasal polyposis in patients with cystic fibrosis. Pediatrics. 1962;30:389-401.
  • 18
    Henriksson G, Hestrin KM, Karpati F, Wikstroem AC, Stierna P, Hjelte L. Nasal polyps in cystic fibrosis. Chest. 2002;121:40-7.
  • 19
    Kingdom TT, Lee KC, Firsimmons SC, Cropp GJ. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis requiring surgery. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 1996;122:1209-13.
  • 20
    Konstan MW, Schluchter MD, Xue W, Davis PB. Clinical use of ibuprofen is associated with slower FEV1 decline in children with cystic fibrosis. Am J Respir Crit Care Med. 2007;176:1084-9.
  • 21
    Lindstrom DR, Conley SF, Splaingard ML, Gershan WM. Ibuprofen therapy and nasal polyposis in cystic fibrosis patients. J Otolaryngol. 2007;36:309-14.
  • 22
    Ramsey B, Richardson M. Impact of sinusitis in cystic fibrosis. J Allergy Clin Immunol. 1992;90:547-52.
  • 23
    Weber SAT, Ferrari GF. Incidência e evolução da polipose nasal em crianças e adolescentes com fibrose cística. Rev Bras Otorrinolaringol. 2008;74:16-20.
  • 24
    Johansson L, Akerlund A, Holmberg K, Melen I, Stierne P, Bende M. Evaluation of methods for endoscopic staging of nasal polyposis. Acta Otolaryngol. 2000;120:72-6.
  • 25
    Cimmino M, Cavaliere M, Nordone M, Plantulli A, Orefice A, Esposito V, et al. Clinical characteristics and genotype analysis of patients with cystic fibrosis and nasal polyposis. Clin Otolaryngol. 2003;28:125-32.
  • 26
    Thomé DC, Tomikowa SO, Romano F, Padera F, Adde FV, Voegels RL, et al. Manifestações nasossinusais em pacientes com fibrose cística (FC). J Bras Pneumol. 2006;32:5.
  • 27
    Stern R, Boat T, Wood R, LeRoy W, Doershuk C. Treatment and prognosis of nasal polyps in cystic fibrosis. Am J Dis Child. 1982;136:1067-70.
  • 28
    Schmitt EJ, Neaville W, Pougdee T. Prevalence of cystic fibrosis in children who present with nasal polyposis. J Allergy Clin Immunol. 2005;115:516.
  • 29
    Shapiro ED, Milmoe GJ, Wald ER, Rodnan JB, Bowen A. Bacteriology of the maxillary sinuses in patients with cystic fibrosis. J Inter Dis. 1982;146:589-93.
  • 30
    Yung MW, Gould J, Upton GJ. Nasal polyposis in children with cystic fibrosis: a long-term follow-up study. Ann Otol Rhinol Laryngol. 2002;111:1081-6.
  • 31
    Rickert S, Banuchi VE, Germana JD, Stewart MG, April MM. Cystic fibrosis and endoscopic sinus surgery: relationship between nasal polyposis and likelihood of revision endoscopic sinus surgery in patients with cystic fibrosis. Arch Otolaryngol Head Neck Surg. 2010;136:988-92.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Nov-Dec 2017

Histórico

  • Recebido
    21 Fev 2016
  • Aceito
    16 Set 2016
Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico-Facial. Sede da Associação Brasileira de Otorrinolaringologia e Cirurgia Cérvico Facial, Av. Indianópolia, 1287, 04063-002 São Paulo/SP Brasil, Tel.: (0xx11) 5053-7500, Fax: (0xx11) 5053-7512 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: revista@aborlccf.org.br