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Conhecimento Matemático e Didático de Professores da Escola Básica acerca de Padrões e Regularidades em um Processo Formativo Ancorado na Prática

Mathematical and Didactical Knowledge of Basic School Teachers about Patterns and Regularities in a Practice-Based Teacher Education Process

Resumo

O presente artigo discute resultados de uma pesquisa realizada a partir de um processo formativo ancorado na prática envolvendo professores da Escola Básica e tematizando o ensino de álgebra por meio de padrões e regularidades. Utilizando tarefas de aprendizagem profissional especialmente elaboradas para a formação, objetiva-se investigar o conhecimento matemático e didático mobilizado e aprofundado por professores de Matemática ao preparar, desenvolver e analisar coletivamente uma aula sobre padrões e regularidades em uma turma do Ensino Médio. Trata-se de uma pesquisa qualitativa-interpretativa, cujos dados foram recolhidos por meio de protocolos e gravações em áudio e vídeo. Os resultados mostram que os professores participantes mobilizaram e ampliaram seus conhecimentos sobre a interpretação de diferentes formas de generalizar um padrão matemático, assim como ampliaram seus próprios conhecimentos matemáticos acerca de um importante tema a ser discutido na Escola Básica.

Palavras-chave
Ensino de Álgebra; Formação de Professores; Tarefas de Aprendizagem Profissional; Conhecimento Matemático; Conhecimento Didático

Abstract

This article discusses the results of a research based on a formative process involving basic school teachers and addressing the teaching of algebra through patterns and regularities. Using professional learning tasks specially designed for a formative process, the aim is to investigate the mathematical and didactical knowledge mobilized and deepened by mathematics teachers when preparing, developing, and collectively analyzing a lesson on patterns and regularities with high school pupils. This is a qualitative-interpretative research, in which data were collected through protocols and audio and video recordings. The results show that the participating teachers mobilized and expanded their knowledge with regard to the interpretation of different ways of generalizing a mathematical pattern, as well as expanded their mathematical knowledge about an important topic to discuss at basic school.

Keywords
Algebra Teaching; Teacher Education; Professional Learning Task; Mathematical Knowledge; Didactical Knowledge

1 Introdução

Desvelar e compreender o conhecimento matemático e didático dos professores (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.) constitui um importante campo de pesquisa na formação de professores, em especial, quando se considera a prática como ponto de partida (LAMPERT, 2010LAMPERT, M. Learning teaching in, from, and for practice: What do we mean? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 61, n. 1-2, p. 21-34, 2010.) para a construção do conhecimento profissional docente. Pesquisas apontam a relevância do papel que tarefas de aprendizagem profissional (TAP) (BALL; COHEN, 1999BALL, D. L.; COHEN, D. K. Developing practice, developing practitioners: Toward a practice-based theory of professional education. In: SYKES, G.; DARLING-HAMMOND, L. (Eds.). Teaching as the learning profession: Handbook of policy and practice. San Francisco: Jossey Bass, 1999. p. 3-32.; SMITH, 2001SMITH, M. S. Practice-based professional development for teachers of mathematics. Reston: NCTM, 2001.; RIBEIRO; PONTE, 2019RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities in a practice-based teacher education programme about the concept of function. Acta Scientiae, Canoas, v. 21, n. 2, p. 49-74, mar./abr. 2019.) podem assumir como mediadoras na construção de conhecimentos dos professores a partir de suas experiências em sala de aula.

Situamos nossa investigação no campo do ensino de Álgebra, o qual carece de pesquisas que expliquem e busquem apresentar caminhos para superar dificuldades encontradas pelos professores neste campo (RIBEIRO, 2012RIBEIRO, A. J. Equação e conhecimento matemático para o ensino: relações e potencialidades para a Educação Matemática. Bolema, Rio Claro, v. 26, n. 42, p. 535-557, 2012.). Em especial, nesta pesquisa, tematizamos o trabalho com padrões e regularidades por entender ser este um caminho promissor para o desenvolvimento do pensamento algébrico (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.; CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.; PIMENTA; SARAIVA, 2019PIMENTA, C. M. C.; SARAIVA, J. M. As ações epistémicas na construção do novo conhecimento matemático e no desenvolvimento do pensamento algébrico. Quadrante, Lisboa, v. 28, n. 1, p. 27-53, 2019.; PIMENTEL; VALE, 2012PIMENTEL, T.; VALE, I. Os padrões e o raciocínio indutivo em matemática. Quadrante, Lisboa, v. 21, n. 2, p. 29-50, 2012.).

Assim, assumimos como objetivo no presente estudo, investigar o conhecimento matemático e didático mobilizado e ampliado por professores de matemática ao prepararem, desenvolverem e analisarem coletivamente uma aula sobre padrões e regularidades em uma turma do Ensino Médio. Para tal, realizamos uma pesquisa a partir da organização e desenvolvimento de um processo de formação continuada para professores de Matemática, constituído por TAP que visavam propiciar discussões coletivas acerca dos conhecimentos matemáticos e didáticos dos professores a respeito de padrões e regularidades no ensino da Álgebra.

2 Enquadramento teórico

2.1 O uso de tarefas na e para a aprendizagem do professor

A atividade profissional do professor exige dele diversos conhecimentos para a sua prática (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.). A construção desse conhecimento começa na formação inicial, mas precisa prosseguir na formação continuada, até porque muitos destes conhecimentos emergem na prática (LAMPERT, 2010LAMPERT, M. Learning teaching in, from, and for practice: What do we mean? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 61, n. 1-2, p. 21-34, 2010.). Como refere Ponte (1999)PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., “os conhecimentos profissionais se constroem na ação e na interação e só são realmente úteis se forem mobilizáveis na ação” (p. 16). Por isso, a aprendizagem do professor deve ser contínua e fundamentada na prática.

Na busca por oportunidades para apoiar os profissionais nessa aprendizagem contínua, pesquisas apontam a necessidade de propiciar uma aprendizagem profissional do professor que esteja baseada na prática, ou seja, experiências de aprendizagem que estejam relacionadas com a realidade da prática do professor, com o seu local de trabalho e com as suas responsabilidades profissionais (LAMPERT, 2010LAMPERT, M. Learning teaching in, from, and for practice: What do we mean? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 61, n. 1-2, p. 21-34, 2010.; SMITH, 2001SMITH, M. S. Practice-based professional development for teachers of mathematics. Reston: NCTM, 2001.; WEBSTER-WRIGHT, 2009WEBSTER-WRIGHT, A. Reframing professional development through understanding authentic professional learning. Review of Educational Research, Washington, v. 79, p. 702-739, 2009.).

As abordagens de aprendizagem profissional do professor devem relacionar os diferentes conhecimentos necessários ao professor para a realização da sua atividade profissional e, além disso, envolver os contextos em que esses conhecimentos são mobilizados. Como indicam White et al. (2013)WHITE, A. L.; JAWORSKI, B.; AGUDELO-VALDERRAMA, C.; GOOYA, Z. Teachers learning from teachers. In: CLEMENTS, M. A.; BISHOP, A. J.; KEITEL, C.; KILPATRICK, J.; LEUNG, F. K. S. (Eds.). Third international handbook of mathematics education. New York: Springer, 2013. p. 393-430. e Ball, Ben-Peretz e Cohen (2014)BALL, D. L.; BEN-PERETZ, M.; COHEN, R. B. Records of practice and the development of collective professional knowledge. British Journal of Educational Studies, London, v. 62, n. 3, p. 317–335, 2014., os processos formativos proporcionam oportunidades de aprendizagem na medida em que retiram o professor do seu isolamento e o levam a discutir e refletir com os seus pares.

As TAP (BALL; COHEN, 1999BALL, D. L.; COHEN, D. K. Developing practice, developing practitioners: Toward a practice-based theory of professional education. In: SYKES, G.; DARLING-HAMMOND, L. (Eds.). Teaching as the learning profession: Handbook of policy and practice. San Francisco: Jossey Bass, 1999. p. 3-32.) podem constituir elementos importantes em um processo formativo. Estas tarefas “envolvem professores no trabalho do ensino, podem ser desenvolvidas a fim de encontrar um objetivo específico para a aprendizagem do professor e levam em consideração o conhecimento prévio e a experiência que os professores trazem de sua atividade” (BALL; COHEN, 1999BALL, D. L.; COHEN, D. K. Developing practice, developing practitioners: Toward a practice-based theory of professional education. In: SYKES, G.; DARLING-HAMMOND, L. (Eds.). Teaching as the learning profession: Handbook of policy and practice. San Francisco: Jossey Bass, 1999. p. 3-32., p. 27). As TAP são elaboradas a partir de materiais advindos da prática tais como, vídeos ou narrativas de episódios de aulas, produções dos alunos, análise de materiais didáticos etc., chamados de registros de prática (BALL; BEN-PERETZ; COHEN, 2014BALL, D. L.; BEN-PERETZ, M.; COHEN, R. B. Records of practice and the development of collective professional knowledge. British Journal of Educational Studies, London, v. 62, n. 3, p. 317–335, 2014.). O trabalho com estes materiais pode propiciar aos professores processos de reflexão e construção de conhecimentos pedagógicos a partir de experiências reais de sala de aula (GROSSMAN et al., 2009GROSSMAN, P.; COMPTON, C.; IGRA, D.; RONFELDT, M.; SHAHAN, E.; WILLIAMSON, P. Teaching practice: A cross-professional perspective. Teachers College Record, New York, v. 111, n. 9, p. 2055-2100, 2009.).

As reflexões a partir dos registros de prática podem proporcionar momentos de discussão coletiva que debatam sobre questões matemáticas e didáticas, propondo e explorando novas propostas pedagógicas e, com isso, desenvolver ou (re)construir conhecimentos necessários para a prática do professor (PONTE, 2017PONTE, J. P. Discussões coletivas no ensino-aprendizagem em Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 33-56.; PONTE; QUARESMA, 2016PONTE, J. P.; QUARESMA, M. Teachers’ professional practice conducting mathematical discussions. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 93, n. 1, p. 51-66, 2016.). Um processo de formação de professores elaborado por meio de TAP construídas a partir dos registros de prática e tendo em vista promover discussões coletivas acerca dos conhecimentos matemáticos e didáticos do professor pode gerar oportunidades de aprendizagem profissional, como as que são discutidas em Ribeiro e Ponte (2019)RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities in a practice-based teacher education programme about the concept of function. Acta Scientiae, Canoas, v. 21, n. 2, p. 49-74, mar./abr. 2019..

2.2 Conhecimento profissional docente

Na perspectiva do conhecimento profissional docente, diferentes modelos teóricos têm sido propostos no campo da Educação Matemática tendo por base o conceito de Pedagogical Content Knowledge (PCK) (SHULMAN, 1986SHULMAN, L. S. Those who understand: Knowledge growth in teaching. Educational Researcher, Washington, v. 15, n. 2, p. 4-14, 1986.). Esta noção tem constituído uma importante referência para muitos pesquisadores de diferentes áreas do conhecimento, que a aprofundaram e/ou adaptaram em suas investigações.

Uma perspectiva muito utilizada no âmbito da Formação de Professores de Matemática é o Mathematical Knowledge for Teaching (MKT) (BALL; THAMES; PHELPS, 2008BALL, D. L.; THAMES, M. H.; PHELPS, G. Content Knowledge for teaching: what makes it special? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 59, n. 5, p. 389-407, 2008.). Em seu modelo, Ball, Thames e Phelps (2008)BALL, D. L.; THAMES, M. H.; PHELPS, G. Content Knowledge for teaching: what makes it special? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 59, n. 5, p. 389-407, 2008. apresentam seis domínios diferentes do MKT, entre os quais, o Common Content Knowledge (CCK), o Specialized Content Knowledge (SCK), o Knowledge of Content and Students (KCS) e o Knowledge of Content and Teaching (KCT). Outro modelo baseado nas ideias de Shulman (1986)SHULMAN, L. S. Those who understand: Knowledge growth in teaching. Educational Researcher, Washington, v. 15, n. 2, p. 4-14, 1986. é o Knowledge Quartet (ROWLAND, 2013ROWLAND, T. The knowledge quartet: The genesis and application of a framework for analysing mathematics teaching and deepening teachers’ mathematics knowledge. Sisyphus, Lisbon, v. 1, n. 3, p. 15-43, 2013.), o qual tem por objetivo identificar o conhecimento do conteúdo e o conhecimento pedagógico que emergem do professor em uma sala de aula como potencializadores para o processo de ensino e aprendizagem. Rowland (2013)ROWLAND, T. The knowledge quartet: The genesis and application of a framework for analysing mathematics teaching and deepening teachers’ mathematics knowledge. Sisyphus, Lisbon, v. 1, n. 3, p. 15-43, 2013. propõe quatro dimensões do conhecimento que emergem na prática da sala de aula: Fundamento, Transformação, Conexão e Contingência.

Em específico nesta pesquisa, fundamentamo-nos em Ponte (1999)PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., pois discute uma perspectiva de conhecimento profissional docente fortemente ancorado na prática letiva, argumentando que o conhecimento dos professores é orientado para a ação. Para o autor, este conhecimento

relaciona-se de um modo muito estreito com diversos aspectos do conhecimento pessoal e informal do professor da vida quotidiana como o conhecimento do contexto (da escola, da comunidade, da sociedade) e o conhecimento que ele tem de si mesmo (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., p. 3).

Em sua perspectiva, o conhecimento profissional docente desdobra-se em diferentes domínios, dentre os quais: (1) o conhecimento da Matemática, “incluindo as suas inter-relações internas e com outras disciplinas e as suas formas de raciocínio, de argumentação e de validação” (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., p. 61); (2) o conhecimento do aluno, incluindo os processos de aprendizagem bem como as suas estratégias de resolução e dificuldades diante de tarefas matemáticas propostas; e (3) o conhecimento dos processos de ensino, incluindo preparação, condução e avaliação da prática letiva.

Esses domínios do conhecimento profissional, segundo Ponte (1999)PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., se inter-relacionam na prática do professor. Para efeitos de análise, vamos organizar esses domínios em dois conhecimentos: matemático e didático, para que possamos compreender como e em quais momentos esses conhecimentos são mobilizados na ação. Dessa maneira, vamos definir que o conhecimento matemático do professor discutido nesse artigo está centrado no primeiro domínio apresentado por Ponte (1999)PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72. e engloba tudo que compreende esta área de conhecimento específico. Por outro lado, o conhecimento didático se constitui pelos outros dois domínios, a saber, conhecimento do aluno e conhecimento dos processos de ensino, incluindo assim, os “objectivos, métodos e conteúdos enquanto saber escolar, bem como sobre a dinâmica do processo de ensino-aprendizagem e a sua avaliação” (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72., p. 63).

Assumimos que esses conhecimentos, matemático e didático, se inter-relacionam o tempo todo na ação do professor, mas, para efeito de análise, iremos considerá-los em separado. No que se refere ao conhecimento matemático no campo dos padrões e regularidades assinalamos, por exemplo, o uso de diferentes representações matemáticas (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.), a elaboração de conjecturas, argumentos e generalizações (PIMENTEL; VALE, 2012PIMENTEL, T.; VALE, I. Os padrões e o raciocínio indutivo em matemática. Quadrante, Lisboa, v. 21, n. 2, p. 29-50, 2012.; PIMENTA; SARAIVA, 2019PIMENTA, C. M. C.; SARAIVA, J. M. As ações epistémicas na construção do novo conhecimento matemático e no desenvolvimento do pensamento algébrico. Quadrante, Lisboa, v. 28, n. 1, p. 27-53, 2019.), e o uso do pensamento recursivo para compreender padrões (BLANTON; KAPUT, 2005BLANTON, M. L.; KAPUT, J. J. Helping elementary teachers build mathematical generality into curriculum and instruction. ZDM, Berlin, v. 37, n. 1, p. 34–42, 2005.). Por outro lado, o conhecimento didático neste tema inclui compreender o pensamento algébrico dos alunos e saber apoiar a superação das suas dificuldades habituais no que tange à generalização de padrões numéricos e geométricos.

De modo a mobilizarem e ampliarem conhecimentos matemáticos e didáticos acerca da temática em questão, sugere-se considerar em processos formativos, o uso de TAP que contemplem situações matemáticas envolvendo diferentes tipos de padrões e regularidades, nos quais sejam demandadas diferentes representações para se expressar generalizações, inclusive a forma algébrica (CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.; ZAZKIS; LILJEDAHL, 2002ZAZKIS, R.; LILJEDAHL, P. Generalization of patterns: The tension between algebraic thinking and algebraic notation. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 49, p. 379-402, 2002.). Branco e Ponte (2014)BRANCO, N.; PONTE, J. P. Articulação entre pedagogia e conteúdo na formação inicial de professores dos primeiros anos: Uma experiência em Álgebra. In: PONTE, J. P. (Ed.). Práticas Profissionais dos Professores de Matemática. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2014. p. 379-408. discutem tarefas que podem ser realizadas com professores, as quais favoreçam a articulação entre o conteúdo e a pedagogia, utilizando sequências pictóricas como um território fértil para se construir generalizações e, consequentemente, promover o pensamento algébrico.

Em complemento, Bruce, Esmonde, Ross, Dookie e Beatty (2010)BRUCE, C. D.; ESMONDE, I.; ROSS, J.; DOOKIE, L.; BEATTY, R. The effects of sustained classroom-embedded teacher professional learning on teacher efficacy and related student achievement. Teaching and Teacher Education, Cardiff, v. 26, p. 1598-1608, 2010. ressaltam a importância de se contemplar em processos formativos o “uso de ciclos interativos de planejamento, realização e reflexão [de aulas]” (BRUCE et al., 2010BRUCE, C. D.; ESMONDE, I.; ROSS, J.; DOOKIE, L.; BEATTY, R. The effects of sustained classroom-embedded teacher professional learning on teacher efficacy and related student achievement. Teaching and Teacher Education, Cardiff, v. 26, p. 1598-1608, 2010., p. 1599), os quais favorecem a mobilização e o aprofundamento de conhecimentos matemáticos e didáticos dos professores em relação ao tema em questão. Estes ciclos interativos estruturam-se de modo semelhante ao que acontece num estudo de aula (PONTE; QUARESMA; MATA-PEREIRA; BAPTISTA, 2016PONTE, J. P.; QUARESMA, M. Teachers’ professional practice conducting mathematical discussions. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 93, n. 1, p. 51-66, 2016.).

Em relação aos conhecimentos matemáticos que podem ser trabalhados dentro da proposta do ciclo interativo, destacamos a importância da escolha da tarefa matemática (SWAN, 2017SWAN, M. Conceber tarefas e aulas que desenvolvam a compreensão concetual, a competência estratégica e a consciência crítica. Educação e Matemática, Lisboa, n. 145, p. 67-72, 2017.), a partir da qual é possível identificar a percepção de padrões e generalizações (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.; CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.; PIMENTEL; VALE, 2012PIMENTEL, T.; VALE, I. Os padrões e o raciocínio indutivo em matemática. Quadrante, Lisboa, v. 21, n. 2, p. 29-50, 2012.).

Da mesma maneira, Mata-Pereira e Ponte (2012)MATA-PEREIRA, J.; PONTE, J. P. Raciocínio matemático em conjuntos numéricos: Uma investigação no 3.° ciclo. Quadrante, Lisboa, v. 21, n. 2, p. 82-110, 2012. ressaltam que é importante perceber os processos de raciocínio utilizados pelos alunos para encontrar a generalização do padrão. Conjuntamente a estes conhecimentos matemáticos, tem-se os conhecimentos didáticos que abrangem o planejamento da aula, no qual se inclui a antecipação das diferentes estratégias de resolução e as dificuldades dos alunos (FUJII, 2016FUJII, T. Designing and adapting tasks in lesson planning: A critical process of lesson study. ZDM, Dordrecht, v. 48, p. 411-423, 2016.; SERRAZINA, 2017SERRAZINA, L. Planificação do ensino-aprendizagem da Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: Planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 9-32.) e a relação do professor com os conhecimentos didáticos acerca de padrões e regularidades (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.; ZAZKIS; LILJEDAHL, 2002ZAZKIS, R.; LILJEDAHL, P. Generalization of patterns: The tension between algebraic thinking and algebraic notation. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 49, p. 379-402, 2002.).

3 Metodologia da pesquisa

3.1 Contexto do estudo

O processo formativo no qual os dados foram recolhidos foi realizado ao longo de 15 encontros semanais de 4 horas, o qual tinha por objetivo geral desenvolver e ampliar conhecimentos matemáticos e didáticos de professores, acerca de padrões e regularidades na Matemática escolar. Os encontros foram dinamizados pelos primeiro e terceiro autores deste artigo e contaram com a parceria de um outro formador. Os encontros constituíam-se de momentos de trabalho (i) individual, (ii) em pequenos grupos e (iii) em discussões coletivas.

A maior parte das atividades foi realizada na universidade, com três encontros realizados em escolas de Educação Básica. As sessões de trabalho contemplavam momentos de estudo teórico (totalizando 8 horas) e momentos de trabalho hands on, mediados por TAP elaboradas pelos dinamizadores dos encontros. O processo formativo incluiu cinco TAP, das quais três são tratadas neste artigo. Estas três TAP foram escolhidas porque formaram um ciclo interativo de planejamento, desenvolvimento e reflexão de aulas elaboradas coletivamente pelo grupo de professores – Ciclo PDR (TREVISAN; RIBEIRO; PONTE, 2020TREVISAN, A. L.; RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities regarding the concept of function in a practice-based teacher education program. International Electronic Journal of Mathematics Education, Eastbourne, v. 15, n. 2, p. 1-14, 2020.). As três TAP pretendiam promover discussões matemáticas e didáticas a respeito do tema matemático escolhido e possuíam o seguinte formato: 3.ᵃ TAP: Preparação em pequenos grupos de planos de aula destinados a anos escolares específicos; 4.ᵃ TAP: Desenvolvimento das aulas selecionadas, por um dos professores participantes da elaboração da aula; e 5.ᵃ TAP: Reflexão coletiva, mediada por registros de prática produzidos na aula realizada, focando o papel e as ações do professor.

3.2 Participantes do estudo

Os participantes do estudo eram professores de Matemática da Escola Básica, na região metropolitana de São Paulo. Durante a realização das três TAP, contamos com a participação de 33 professores, sendo 7 em formação inicial e 26 formados (5 destes sem experiência em sala de aula). A professora que ministrou a aula era formada há 8 anos e, na época, atuava no Ensino Médio, em uma escola da rede pública. Para a realização das TAP, os professores foram divididos em 6 grupos (com 4 a 6 participantes), organização feita pelos formadores de modo que, em todos os grupos, houvesse (i) professores com e sem experiência em sala de aula e (ii) professores formados e em formação inicial. Com a formação desses grupos pretendia-se propiciar a troca de experiências entre professores com vivências distintas em sala de aula.

3.3 Método de pesquisa e recolha de dados

O presente estudo segue uma abordagem de pesquisa qualitativa (BOGDAN; BIKLEN, 1994BOGDAN, R.; BIKLEN, S. Investigação qualitativa em educação. Porto: Porto Editora, 1994.), sob o paradigma interpretativo (CROTTY, 1998CROTTY, M. The foundations of social research: Meaning and perspective in the research process. London: Sage, 1998.). Os dados foram recolhidos por meio de (i) registros escritos das discussões dos pequenos grupos de professores (designados por “protocolos”); (ii) áudios das discussões nos pequenos grupos; e (iii) vídeo da discussão coletiva. As gravações em áudio e vídeo foram analisadas pelos pesquisadores em sua íntegra, articulando-se com os protocolos produzidos pelos professores. Tal abordagem permitiu preparar a terceira etapa do Ciclo PDR – a Reflexão – e favoreceu a organização e a análise dos dados de modo a identificar os conhecimentos matemáticos e didáticos dos professores, acerca de padrões e regularidades contempladas nas TAP.

Na análise dos dados, apresentamos discussões que ocorreram nas 3.ᵃ e 5.ᵃ TAP em relação aos conhecimentos matemáticos e didáticos dos professores acerca de padrões e regularidades. Vale ressaltar que a 5.ᵃ TAP foi elaborada a partir dos registros de prática produzidos na 4.ᵃ TAP. Nas transcrições apresentadas usamos os códigos: PA para a professora que participou do processo formativo e ministrou a aula que foi videogravada; sendo os outros professores participantes representados pela letra P, seguida de um número de identificação (P1, P2, etc.); os alunos participantes da aula são numerados em relação a toda a sala e também recebem uma indicação do grupo a que pertencem (por exemplo, A13F é o aluno 1 do grupo 3F); F1, F2 e F3 são os formadores que dinamizaram o processo formativo.

4 Realização das TAP

A estrutura e a realização de cada TAP que compõe o Ciclo PDR propiciaram discussões coletivas que mobilizaram e permitiram ampliar os conhecimentos matemáticos e didáticos analisados neste artigo. Fazemos uma breve descrição da realização de cada TAP relacionada com a aula que decorreu em uma sala do Ensino Médio.

4.1 Planejamento da aula – 3.ᵃ TAP

O planejamento da aula ocorreu em três encontros de 4 horas cada, os dois primeiros destinados à elaboração, e o terceiro à apresentação, discussão e negociação dos planos das aulas a realizar. Essa dinâmica contempla a etapa P do Ciclo PDR. Durante a elaboração do plano de aula, cada grupo escolheu um dos seus membros para desenvolver o plano em uma de suas salas de aula. No terceiro momento, todos os professores do processo formativo analisaram e discutiram cada plano de aula, a partir de um roteiro elaborado pelos formadores. O roteiro pretendia verificar: a escolha da tarefa matemática; a organização da gestão da aula; as ações do professor; e as antecipações do pensamento dos alunos, incluindo aí, as possíveis dificuldades. Após essa discussão, os planos de aula que seriam aplicados foram escolhidos.

4.2 Desenvolvimento da aula – 4.ᵃ TAP

Posteriormente, prossegue-se com a etapa D do Ciclo PDR, realizada com base no plano de aula elaborado e escolhido pelos professores na etapa anterior. No caso deste artigo, exploramos a aula Investigando padrões por meio do jogo Torre de Hanói que foi ministrada por uma professora que fez parte do grupo que elaborou esse plano de aula. Ela realizou a aula em uma de suas turmas do 3.° ano do Ensino Médio. Para esse momento, estavam presentes na sala: um professor que também pertencia ao grupo de elaboração, o qual tinha a função de observar a aula a partir de um roteiro elaborado pelos formadores; um formador filmando a sala e o outro formador filmando e observando a aula. Após filmar e observar a aula, os formadores selecionaram registros de prática produzidos nessa aula, em forma de protocolos dos grupos de alunos, que sintetizavam as discussões dos pequenos grupos, e as transcrições das discussões nos pequenos grupos. Conjuntamente, os formadores selecionaram e organizaram episódios de vídeos que retratavam os momentos da abertura da aula pela professora e das discussões coletivas do final da aula. Esses registros serviram para subsidiar a elaboração da 5.ᵃ TAP.

A aula foi constituída por três momentos: primeiro, a professora apresentou a tarefa matemática com seus objetivos e como seria a organização da aula; segundo, os alunos foram divididos em grupos para discutir e resolver a tarefa matemática; e, por fim, houve uma discussão coletiva com toda a sala. A sala naquele dia tinha 33 alunos, divididos em 6 grupos de 5 a 6 alunos. A aula teve duração de 150 minutos, tempo maior que o previsto no planejamento. A professora, no momento do trabalho nos pequenos grupos, circulou pela sala tirando dúvidas e acompanhando os questionamentos dos alunos. Dessa maneira, ela monitorou as discussões que aconteciam em cada grupo. No momento da discussão coletiva, a professora retomou as questões da tarefa matemática (Figura 1), fazendo com que os alunos explicassem as suas estratégias de resolução. Finalizou a aula fazendo uma síntese do que aconteceu.

Figura 1
Plano de aula elaborado por um grupo no processo formativo

4.3 Reflexão da aula – 5.ᵃ TAP

A reflexão da aula, momento que completa a etapa R do Ciclo PDR, foi realizada em um encontro de 4 horas, tendo sido norteada por um roteiro elaborado com os registros de prática produzidos na etapa anterior, e foi realizada em dois momentos: trabalho em pequenos grupos e discussão coletiva. No início do encontro, os formadores apresentaram o roteiro para todo o grupo e, em seguida, cada pequeno grupo recebeu o roteiro (5.ᵃ TAP), a tarefa matemática (Figura 1) acompanhada de seu planejamento e, também, um computador que continha os episódios selecionados.

5 Conhecimento matemático dos professores

Apresentamos aqui discussões a respeito do conhecimento matemático dos professores que emergiram na 5.ᵃ TAP, a partir dos registros de prática, quer sejam, os episódios 5 e 6 (Figuras 2 e 3). Estes registros mostravam dúvidas dos alunos que surgiram durante a aula (relacionados com a questão 6 – Figura 1) e que se baseavam em: (i) qual era a curva do gráfico formada pelos pontos da tabela: reta, parábola ou exponencial?; e (ii) a função da tarefa matemática tinha um domínio discreto ou contínuo? Apresentamos os registros de prática que mostram os alunos discutindo essas questões e, em seguida, a reflexão dos professores subsidiada pela 5.ᵃ TAP. Iniciamos com a discussão: (i) qual era a curva do gráfico formada pelos pontos da tabela: reta, parábola ou exponencial?

Voltando à aula (4.ᵃ TAP), enquanto os alunos construíam o gráfico a partir dos pontos da tabela (questão 4 – Figura 1) nos pequenos grupos, algumas dúvidas surgiram: um grupo pensou que fosse uma reta; outro ficou em dúvida se o gráfico era uma parábola ou uma exponencial e, dois grupos, estranhando o gráfico, usaram o aplicativo Geogebra no celular e identificaram que a curva era uma função exponencial. A professora percebendo essas dúvidas nos pequenos grupos, perguntou aos alunos, no momento da discussão coletiva (Figura 2):

Figura 2
Episódio 5 – Registro de Prática

Esse registro de prática foi levado aos professores no momento da reflexão como parte do episódio 5 (Figura 2). Ele foi selecionado para que os professores percebessem: (i) que só colocar os pontos num plano cartesiano não auxilia os alunos a identificarem o tipo de gráfico e (ii) a ação da professora ao perceber a dúvida dos alunos. A intenção dos formadores com esse registro era levar os professores a perceberem que a curva desenhada gerou dúvidas aos alunos e, por isso, o professor deveria lançar mão do seu conhecimento matemático sobre funções e explicar por que esse gráfico não pode ser uma parábola. Uma possibilidade seria os alunos perceberem a diferença na taxa de variação desses tipos de funções. No processo formativo, durante a discussão coletiva, um professor identifica que a resposta da professora não resolve a questão:

P2: Você [professora] comenta [na aula] que não é uma parábola porque não tem o x negativo, realmente, não tem. Mas o fato de não ser uma parábola é porque não é uma função de 2° grau e, sim, uma função exponencial que é outro tipo de gráfico. É só isso que eu queria…

PA: É! Talvez isso eu deveria ter continuado…

P2: É! Mas é que na hora a gente não pensa, mas o fato do domínio ser só positivo não quer dizer que não seja uma parábola.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Na discussão, os professores conseguem argumentar que os gráficos são distintos porque são determinados por funções algébricas diferentes. Mas, como os professores não conseguem chegar à taxa de variação, os formadores continuam insistindo na discussão. O professor P1 ressalta a dificuldade de diferenciar as curvas exponencial e parábola apenas pelo desenho do gráfico:

P1: Quando a curva é um pouco fechada, ela pode se confundir com uma parábola, mas a parábola é uma função quadrática então isso também é instigado nos alunos. Porque é como você [outro professor] falou, eles conhecem pelo menos as quatro funções básicas [funções de 1.° grau, de 2° grau, exponencial e logarítmica].

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Nessa argumentação, P1 valida a ação da professora de instigar os alunos a pensarem na diferença das funções, pois eles, provavelmente, já as conhecem. Como os formadores continuam a fomentar a discussão, os professores vão mobilizando os seus conhecimentos matemáticos para resolver a situação:

P1: Se eles colocassem mais pontos no gráfico eles teriam visto a exponencial.

P2: O fato do domínio ser só positivo não quer dizer que não seja uma parábola.

P1: Porque a parábola ela admite x negativo. Nesse caso concreto, não.

F2: Pessoal! Mas a exponencial também admite x negativo.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Neste ponto, o formador F2 tenta retomar a conversa para a função exponencial e, assim, o professor P1 percebe que precisa buscar outro caminho para identificar a função exponencial e diferenciá-la da quadrática. Então ele ressaltou:

P1: Eles deveriam ter focado não no fato de não haver uma região negativa, mas no comportamento da curva.

F2: Eles deveriam olhar os valores da tabela para poderem entender o quanto [a função] cresce.

PA: Mas o [Formador 1] escreveu na lousa padrão de crescimento. É! Um aluno, não lembro quem, falou que é exponencial e crescente. Eu deveria ter explorado: é crescente por quê? Como? Foram várias coisas que eu deveria ter feito e não fiz.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Os formadores instigaram a discussão até que P1 mobilizou seu conhecimento matemático e ressaltou que deveríamos olhar o comportamento da curva. A partir disso, o formador F2 completou a ideia sugerindo olhar o comportamento da curva a partir da tabela (questão 4 – Figura 1). Com isso, a professora PA lembrou de um momento da aula, em que um aluno falou que a função era crescente, e ela não aproveitou esse pensamento do aluno.

Tomando esse conhecimento matemático sobre funções, o formador F1 finalizou a discussão falando da diferença de crescimento entre as funções quadrática e exponencial e que isso era o aspecto covariacional da função. Por outro lado, identificar que esse gráfico era de uma função exponencial auxiliava os alunos a pensarem na representação algébrica da generalização. Os formadores perceberam uma dificuldade de natureza matemática neste momento da discussão coletiva. Possivelmente os professores nunca tinham se deparado com esse tipo de pergunta, o que gerou uma dúvida. Esse poderá ter sido um momento de reflexão e ampliação sobre esses conceitos matemáticos que não surgem, usualmente, nos livros didáticos.

Passamos para a segunda discussão sobre o conhecimento matemático que emergiu nas discussões a partir de outro registro de prática (Figura 3): (ii) a função da tarefa matemática tinha um domínio discreto ou contínuo? No desenvolvimento da aula, durante a discussão coletiva, após a discussão sobre o domínio da função (questão 6 – Figura 1), a PA perguntou como os alunos haviam traçado o gráfico: só marcaram os pontinhos ou ligaram os pontinhos? (Figura 3) Como não havia um consenso na sala, a PA perguntou:

Figura 3
Episódio 6 – Registro de Prática

Os formadores, nesse registro, perceberam que a professora não identificou o domínio da função em sua representação gráfica e, com isso, não mostrou para os alunos a diferença entre uma função com domínio discreto e uma outra com domínio contínuo. Por isso, foi pensado em discutir esse conhecimento matemático no processo formativo. Diante dessa discussão, que fora apresentada no episódio 6 na 5.ᵃ TAP (Figura 3), um professor comentou:

P2: No final ela [a professora] fala: Se você ligou não está errado, só diferente. Na verdade, não. Se ele ligou está errado.

PA: Não está errado. Porque se ele ligou, ele fez outro exercício. Então não tá correto pro exercício que eu pedi pra ele.

P2: Sim!

PA: Mas pro raciocínio dele, ele pode ter usado outro raciocínio, então pra ele tá certo!

F1: Não pode. Ele não podia ligar, senão ele vai pensar que uma função cujo domínio é discreto, eu posso traçar um gráfico contínuo e, isso não é verdade.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Discute-se aqui a relação entre o domínio da função e o traço do gráfico, ou seja, que a representação gráfica da função está relacionada com o domínio da função. Discussões como essa dificilmente aparecem em tarefas comuns dos livros didáticos, isto porque, pouco se trabalha com funções com domínio discreto na escola básica. Identificamos aqui, um tipo de conhecimento matemático necessário aos professores para que estes proponham tarefas matemáticas sobre padrões e regularidades.

Esses episódios foram importantes no processo formativo, uma vez que possibilitaram a mobilização e o aprofundamento desses conceitos matemáticos. Por outro lado, é importante perceber como tarefas matemáticas podem gerar dúvidas e questionamentos nos alunos. A proposta era mostrar aos professores, as possibilidades de questões geradas por tarefas matemáticas sobre padrões e regularidades quando se trabalha com a respectiva generalização.

6 Conhecimento didático dos professores

Analisamos o conhecimento didático dos professores – a respeito do pensamento dos alunos – que foram mobilizados e aprofundados na preparação, desenvolvimento e reflexão da aula realizada no Ensino Médio. No segundo encontro, destinado ao planejamento (3.ᵃ TAP), o grupo que elaborava o plano de aula do Ensino Médio estava escrevendo perguntas que o professor poderia fazer durante a realização da aula, para auxiliar os alunos na resolução da tarefa. O grupo elaborou várias perguntas no planejamento da aula, uma das quais era:

Existe um padrão? Este padrão relaciona o número de discos ao número de movimentos?

(Planejamento da aula do grupo do ensino médio, 2018).

Durante a conversa desse grupo, o professor P6 explica para os outros membros do grupo qual o objetivo desta pergunta:

P6: Eu imaginei que fazendo essa pergunta para eles, eles iam conseguir ver uma multiplicação com o movimento anterior, mas não a equação exponencial [f(n) = 2n – 1].

PA: Você acha que eles não chegam na função exponencial? Eles chegam! A minha turma chegou! Eles já trabalharam com potência no 9.° ano, então eles chegam!

(Diálogo entre os professores nos pequenos grupos durante o planejamento, 2018).

O professor P6 acreditava que seria mais fácil os alunos encontrarem a fórmula recursiva do que a função exponencial. Por outro lado, a professora PA, que já havia trabalhado conceitos relacionados em anos anteriores, antecipou que os alunos conseguiriam fazer a generalização. Aqui dois professores mostraram as diferentes possibilidades de resolução que poderiam emergir nas ideias dos alunos. A dinâmica proposta, a partir da estrutura da 3.ᵃ TAP, permitiu que cada professor apresentasse o conhecimento que possuía sobre o pensamento dos alunos a partir de suas experiências. Em complemento, o desenvolvimento da aula (4.ᵃ TAP) e sua posterior análise (5.ᵃ TAP) possibilitaria a esses, e aos outros professores, perceberem as estratégias de resolução que os alunos seguiram. Apresentamos os registros de prática que foram utilizados para a discussão dos professores, os quais foram obtidos durante o desenvolvimento da aula.

Na 4.ᵃ TAP, no momento da discussão coletiva, a professora selecionou dois grupos com respostas diferentes a respeito da expressão algébrica encontrada, e que representava o padrão observado (Desafio II – Figura 1), e escolheu a ordem das apresentações. O primeiro grupo apresentou a expressão n= na x 2 + 1, sendo n o número de movimentos e na o número de movimentos anterior. Na discussão em pequenos grupos, encontramos o grupo 3F (Figura 4) discutindo sobre o pensamento recursivo que identificaram.

Figura 4
Transcrição do áudio do grupo 3F – Registro de Prática

Na discussão coletiva, o grupo apresentou a expressão n= na x 2 + 1, que representava o pensamento recursivo (Figura 4). A professora questionou a validade da expressão e propôs aos alunos fazerem uma tabela (Tabela 1) que relacionava o número de discos com o número mínimo de movimentos, para verificarem a validade da expressão algébrica. Na lousa, a professora foi construindo a tabela, a partir das falas dos alunos. Apresentamos a transcrição desse registro de prática com a discussão entre a professora e o grupo de alunos.

Tabela 1
A tabela que a professora construiu na lousa

A transcrição (Figura 5) refere-se ao momento em que a professora vai começar a escrever a segunda linha da tabela (Tabela 1) a partir das informações dadas na primeira linha.

Figura 5
Episódio 2 – Registro de Prática

Os formadores selecionaram esse episódio porque, mesmo que os professores que elaboraram o plano de aula (3.ᵃ TAP) tivessem previsto, como resolução dos alunos, o uso de uma fórmula recursiva, a PA não a identificou no momento da aula, o que a deixou em dúvida sobre a validade dessa expressão. Diante dessa situação inesperada, ela utilizou seu conhecimento matemático para mostrar para os alunos como se verifica a validade de uma expressão algébrica dentro desse contexto. Assim, essa discussão foi transformada em um episódio (Figura 5) que foi apresentado aos professores no momento da reflexão da aula, ou seja, na 5.ᵃ TAP. Na discussão coletiva, após os professores terem assistido ao episódio 2, instaurou-se o diálogo a seguir: se os alunos conseguiram explicar a expressão algébrica encontrada.

P2: Eu acho que ficou clara a explicação da estratégia que eles [os alunos] utilizaram porque ela [a professora] foi escrevendo na lousa. Se tivesse sido só uma explicação verbal acho que não teria conseguido entender o raciocínio deles.

P1: É que ela conduz! Eles explicam, mas ela conduz! Essa condução organiza o raciocínio.

P4: Eu achei até que na hora que ela deixou eles errarem foi importante também. Porque eles colocaram 3, e eles falaram que era número de discos, e eles mesmos perceberam e corrigiram. Eu achei aquela postura dela importante para eles perceberem o erro que eles estavam cometendo.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Nessa situação, os professores percebem e validam o conhecimento didático da PA, pois ela utilizou do seu conhecimento matemático de buscar a representação tabular para mostrar aos alunos como eles poderiam verificar se a expressão algébrica encontrada, a partir do pensamento recursivo, era válida ou não. Da mesma forma, os professores percebem o quanto foi significativo a PA não corrigir os alunos e deixá-los, eles próprios, pensarem e corrigirem o significado dos números na tabela. Essas ações da PA, que foram observadas e discutidas na 5.ᵃ TAP, mostram como o professor pode utilizar o seu conhecimento matemático, juntamente com a discussão em sala de aula, e tentar auxiliar o seu aluno a sanar as suas dificuldades.

Retomando os dados produzidos durante a aula (4.ᵃ TAP), temos o registro de prática de outro grupo, que apresentou como expressão algébrica a função exponencial (f(n)=2n – 1). A PA perguntou como eles haviam encontrado essa expressão. Primeiramente, o grupo tentou explicar que procurava uma forma de escrever o número 8 e, depois, continuou a explicação (Figura 6):

Figura 6
Episódios 3 e 4 – Registro de Prática

Diante dos episódios da Figura 6, os professores, no momento da reflexão (5.ᵃ TAP), começaram a discutir sobre o pensamento dos alunos:

P5: De onde surgiu a necessidade de transformar o 8? Escrever o 8 de um jeito diferente? Foi sugestão da professora ou foram os alunos que sentiam essa necessidade?

PA: Porque quando eles desenharam o gráfico, eles viram que parecia uma parábola, alguma exponencial. Eles viram que era uma curva! Eles falaram: – Então, tem que aparecer uma potência em algum lugar. E aí, eles foram testando, tanto que eles colocaram 82, depois 28, [a professora disse a frase que os alunos falaram com ela] ah, pô! Aqui dá 8! [imaginando 23] Então, vamos usar assim.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

A discussão ficou em torno de se compreender o pensamento dos alunos para encontrar a função exponencial. Foram apresentados aos professores os episódios (Figuras 5 e 6), na 5.ᵃ TAP, com o intuito de lhes mostrar as diferentes formas de pensar dos alunos e, com isso, levá-los a tentar compreendê-las, e propor outras formas de atuação na sala de aula. Após assistirem a todos os episódios, os professores validaram a ação da professora, como podemos perceber:

P7: E a importância também das intervenções da professora [PA]. Foi muito importante, foi fundamental porque ela foi norteando os alunos de forma que eu tenho esse pensamento, opa! Por outro lado, eu consigo também pensar assim. Eu acho que aí surgiu outro pensamento.

P3: Eu acho interessante que ela sempre explicou colocando coisas que os alunos trouxeram. Dificilmente ela colocou coisa dela. Eu achei que isso foi bem legal na aula. Ela colocou o pensamento do aluno.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

Os professores reconheceram a ação da professora de valorizar o pensamento dos alunos e os erros como forma de aprendizagem. Por outro lado, os professores refletiram sobre as expressões algébricas encontradas pelos alunos e um professor finalizou a discussão:

P1: […] a primeira argumentação [n = na x 2 + 1, sendo n o número de movimentos e na o número de movimentos anterior] é sobre movimento, a segunda [f(n)=2n – 1] é sobre discos. A primeira dá a entender que é uma função de primeiro grau, a segunda já tem uma exponencial pronta. Então se você olha friamente um resultado e outro, eles são condizentes, mas não são iguais.

(Diálogo entre os professores na discussão coletiva, 2018).

O conhecimento didático exposto aqui parece ter favorecido aos professores compreender o pensamento dos alunos. O importante foi eles perceberem a diferença entre as duas formas de pensamento, pois a partir dessa compreensão os professores poderão auxiliar os alunos no desenvolvimento das suas estratégias de resolução, sanando as possíveis dificuldades e, ao mesmo tempo, fazer as conexões entre as ideias que surgem na sala de aula, indo além de verificar a validade ou não das expressões algébricas apresentadas. Com isso, os professores compreenderam e validaram a ação da professora durante a aula, a qual se baseava em identificar o significado utilizado pelos alunos para cada elemento da expressão algébrica, assim como transformar cada erro dos alunos em possibilidade de aprendizagem.

7 Discussão dos resultados

A realização do ciclo PDR nesse processo formativo pretendia mobilizar e ampliar os conhecimentos matemáticos e didáticos dos professores acerca de padrões e regularidades (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.). No momento do planejamento, o grupo de professores cuja aula foi selecionada elaborou coletivamente uma tarefa matemática na qual era possível perceber a mobilização do seu conhecimento matemático, como as possíveis representações para os conceitos envolvidos e os tipos de raciocínios matemáticos subjacentes à tarefa escolhida (SWAN, 2017SWAN, M. Conceber tarefas e aulas que desenvolvam a compreensão concetual, a competência estratégica e a consciência crítica. Educação e Matemática, Lisboa, n. 145, p. 67-72, 2017.). Da mesma maneira, de forma articulada, percebe-se a mobilização de conhecimento didático quando os professores escolhem uma tarefa matemática que permite diferentes representações para o mesmo padrão, até se chegar à expressão algébrica da sua generalização (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.; CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.). Notou-se ainda, ao longo das discussões nos pequenos grupos, durante o planejamento da aula, que os professores percebiam diferenças na antecipação das estratégias de resolução dos alunos acerca da generalização (BLANTON; KAPUT, 2005BLANTON, M. L.; KAPUT, J. J. Helping elementary teachers build mathematical generality into curriculum and instruction. ZDM, Berlin, v. 37, n. 1, p. 34–42, 2005.; FUJII, 2016FUJII, T. Designing and adapting tasks in lesson planning: A critical process of lesson study. ZDM, Dordrecht, v. 48, p. 411-423, 2016.; ZAZKIS; LILJEDAHL, 2002ZAZKIS, R.; LILJEDAHL, P. Generalization of patterns: The tension between algebraic thinking and algebraic notation. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 49, p. 379-402, 2002.), articulando-se aí, elementos dos conhecimentos didático e matemático. As discussões e a elaboração do planejamento (SERRAZINA, 2017SERRAZINA, L. Planificação do ensino-aprendizagem da Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: Planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 9-32.), caracterizaram-se como um momento importante do Ciclo PDR, fornecendo subsídios para o desenvolvimento da aula (4.ᵃ TAP).

O momento da reflexão da aula foi norteado pelo roteiro de análise (5.ᵃ TAP) que continha os registros de prática e as questões elaboradas pelos formadores acerca de elementos dos conhecimentos matemático e didático que emergiram na aula (4.ᵃ TAP). A proposta da 5.ᵃ TAP era promover discussões coletivas entre os professores da formação, no intuito de mobilizar e ampliar seu conhecimento matemático e didático acerca de padrões e regularidades (GROSSMAN et al., 2009GROSSMAN, P.; COMPTON, C.; IGRA, D.; RONFELDT, M.; SHAHAN, E.; WILLIAMSON, P. Teaching practice: A cross-professional perspective. Teachers College Record, New York, v. 111, n. 9, p. 2055-2100, 2009.; BALL; BEN-PERETZ; COHEN, 2014BALL, D. L.; BEN-PERETZ, M.; COHEN, R. B. Records of practice and the development of collective professional knowledge. British Journal of Educational Studies, London, v. 62, n. 3, p. 317–335, 2014.; PONTE, 2017PONTE, J. P. Discussões coletivas no ensino-aprendizagem em Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 33-56.).

Em relação ao conhecimento matemático dos professores, evidenciamos que, a partir dos registros de prática apresentados nas Figuras 2 e 3, os professores identificaram as ações da professora PA para tentar sanar as dificuldades dos alunos diante da tarefa. Nota-se aí, momentos em que os professores perceberam a importância de se identificar diferenças entre as funções quadrática e exponencial a partir de seus gráficos e, ainda, discutiram sobre o domínio da função dentro do contexto da tarefa. Isso se reflete na importância de compreender as diferentes representações utilizadas, no caso, o estudo do gráfico de funções, para ajudar os alunos a representarem a generalização pela expressão algébrica (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.; CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.).

O conhecimento didático, tanto no que diz respeito ao conhecimento do aluno como ao conhecimento dos processos de ensino (condução e reflexão sobre a prática letiva), emergiu nas discussões propiciadas pelos episódios 2, 3 e 4 (Figuras 5 e 6). Esses conhecimentos foram mobilizados na sala de aula (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.) e foram identificados pelos professores, durante o processo formativo, nas discussões coletivas geradas a partir de registros de prática (PONTE, 2017PONTE, J. P. Discussões coletivas no ensino-aprendizagem em Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 33-56.; PONTE; QUARESMA, 2016PONTE, J. P.; QUARESMA, M. Teachers’ professional practice conducting mathematical discussions. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 93, n. 1, p. 51-66, 2016.). Para alguns participantes, a atuação da professora, ao utilizar o seu conhecimento matemático para validar a expressão algébrica dos alunos e, ao mesmo tempo, transformar o erro dos alunos em oportunidade de aprendizagem, surgiu como um conhecimento didático emergente, reforçando a importância de o professor discutir com os seus pares a ação na sala de aula (WHITE et al., 2013WHITE, A. L.; JAWORSKI, B.; AGUDELO-VALDERRAMA, C.; GOOYA, Z. Teachers learning from teachers. In: CLEMENTS, M. A.; BISHOP, A. J.; KEITEL, C.; KILPATRICK, J.; LEUNG, F. K. S. (Eds.). Third international handbook of mathematics education. New York: Springer, 2013. p. 393-430.) e como essas vivências podem gerar oportunidades de aprendizagem profissional (RIBEIRO; PONTE, 2019RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities in a practice-based teacher education programme about the concept of function. Acta Scientiae, Canoas, v. 21, n. 2, p. 49-74, mar./abr. 2019.).

As discussões ocorridas durante o processo formativo mostraram que tanto a professora PA, quanto os outros professores, conseguiram perceber alguns equívocos nas ações da professora, principalmente no que diz respeito ao conhecimento matemático, mas, ainda assim, eles mesmos tiveram dificuldades em propor outras possibilidades de atuação na aula, se estivessem no lugar da professora PA (ZAZKIS; LILJEDAHL, 2002ZAZKIS, R.; LILJEDAHL, P. Generalization of patterns: The tension between algebraic thinking and algebraic notation. Educational Studies in Mathematics, Dordrecht, v. 49, p. 379-402, 2002.). Com isso, inferimos que os professores não estão acostumados com esse tipo de aula, baseado em tarefas investigativas nas quais se realizam discussões matemáticas entre os alunos. Por isso, pudemos verificar que, por meio da formação realizada, os professores retomaram conceitos matemáticos que muitas vezes não são atendidos na prática da sala de aula (BRANCO; PONTE, 2014BRANCO, N.; PONTE, J. P. Articulação entre pedagogia e conteúdo na formação inicial de professores dos primeiros anos: Uma experiência em Álgebra. In: PONTE, J. P. (Ed.). Práticas Profissionais dos Professores de Matemática. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2014. p. 379-408.), fato que ocorre muitas vezes justamente pelo fato de o professor refletir sozinho sobre a sua prática e ficar isolado com seus conhecimentos (WHITE et al., 2013WHITE, A. L.; JAWORSKI, B.; AGUDELO-VALDERRAMA, C.; GOOYA, Z. Teachers learning from teachers. In: CLEMENTS, M. A.; BISHOP, A. J.; KEITEL, C.; KILPATRICK, J.; LEUNG, F. K. S. (Eds.). Third international handbook of mathematics education. New York: Springer, 2013. p. 393-430.). Dessa maneira, percebemos que as discussões coletivas, a partir da prática da sala de aula, auxiliaram todos os professores a refletirem sobre a sua prática (LAMPERT, 2010LAMPERT, M. Learning teaching in, from, and for practice: What do we mean? Journal of Teacher Education, Michigan, v. 61, n. 1-2, p. 21-34, 2010.; SMITH, 2001SMITH, M. S. Practice-based professional development for teachers of mathematics. Reston: NCTM, 2001.; WEBSTER-WRIGHT, 2009WEBSTER-WRIGHT, A. Reframing professional development through understanding authentic professional learning. Review of Educational Research, Washington, v. 79, p. 702-739, 2009.) e que esse processo de formação favoreceu a aprendizagem profissional dos professores participantes (RIBEIRO; PONTE, 2019RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities in a practice-based teacher education programme about the concept of function. Acta Scientiae, Canoas, v. 21, n. 2, p. 49-74, mar./abr. 2019.).

8 Conclusões e considerações finais

Percebemos que, com o auxílio das TAP (BALL; COHEN, 1999BALL, D. L.; COHEN, D. K. Developing practice, developing practitioners: Toward a practice-based theory of professional education. In: SYKES, G.; DARLING-HAMMOND, L. (Eds.). Teaching as the learning profession: Handbook of policy and practice. San Francisco: Jossey Bass, 1999. p. 3-32.) constituídas com os registros de prática (BALL; BEN-PERETZ; COHEN, 2014BALL, D. L.; BEN-PERETZ, M.; COHEN, R. B. Records of practice and the development of collective professional knowledge. British Journal of Educational Studies, London, v. 62, n. 3, p. 317–335, 2014.), em especial o uso de vídeos, aliado à promoção de discussões coletivas (PONTE, 2017PONTE, J. P. Discussões coletivas no ensino-aprendizagem em Matemática. In: GTI (Ed.). A prática dos professores: planificação e discussão coletiva na sala de aula. Lisboa: APM, 2017. p. 33-56.; PONTE; QUARESMA, 2106), foi possível revisitar alguns conhecimentos matemáticos que emergiram no e do desenvolvimento de uma aula envolvendo padrões e regularidades (BRITT; IRWIN, 2011BRITT, M. S.; IRWIN, K. C. Algebraic Thinking with and without Algebraic Representation: A Pathway for Learning. In: CAI, J.; KNUT, E. (Eds.). Early Algebraization: A Global Dialogue from Multiple Perspectives. Berlin Heidelberg: Springer-Verlag, 2011. p. 137-157.; CARRAHER; MARTINEZ; SCHLIEMANN, 2008CARRAHER, D. W.; MARTINEZ, M. V.; SCHLIEMANN, A. D. Early algebra and mathematical generalization. ZDM, Berlin, v. 40 n. 1, p. 3-22, 2008.). Além disso, foram explorados conhecimentos didáticos, tanto relacionados com o conhecimento do aluno quanto relacionados ao conhecimento do processo de ensino (PONTE, 1999PONTE, J. P. Didácticas específicas e construção do conhecimento profissional. In: TAVARES, J. (Ed.). Investigar e formar em educação: Actas do IV congresso da SPCE. Porto: SPCE, 1999. p. 59-72.), em especial durante o momento da reflexão sobre a aula realizada. Isso possibilitou a (re)construção de conhecimentos dos professores acerca de padrões e regularidades, e seus processos de ensino, durante a formação desenvolvida (BRANCO; PONTE, 2014BRANCO, N.; PONTE, J. P. Articulação entre pedagogia e conteúdo na formação inicial de professores dos primeiros anos: Uma experiência em Álgebra. In: PONTE, J. P. (Ed.). Práticas Profissionais dos Professores de Matemática. Lisboa: Universidade de Lisboa, 2014. p. 379-408.).

Estes resultados vão ao encontro dos resultados de Trevisan, Ribeiro e Ponte (2020)TREVISAN, A. L.; RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities regarding the concept of function in a practice-based teacher education program. International Electronic Journal of Mathematics Education, Eastbourne, v. 15, n. 2, p. 1-14, 2020., no que se refere ao trabalho coletivo criado ao longo do ciclo de planejamento, desenvolvimento e reflexão – Ciclo PDR – no qual cada participante se sente parte desse processo coletivo, favorecendo a (re)construção de conhecimentos. Os registros de prática, mais precisamente o uso de vídeos que constituíram a elaboração das TAP e que pretendiam promover discussões coletivas entre os professores, se mostraram ferramentas poderosas para que os professores saíssem do seu isolamento para pensar, construir e refletir coletivamente (WHITE et al., 2013WHITE, A. L.; JAWORSKI, B.; AGUDELO-VALDERRAMA, C.; GOOYA, Z. Teachers learning from teachers. In: CLEMENTS, M. A.; BISHOP, A. J.; KEITEL, C.; KILPATRICK, J.; LEUNG, F. K. S. (Eds.). Third international handbook of mathematics education. New York: Springer, 2013. p. 393-430.). Diante da elaboração e realização desse processo formativo ancorado na prática letiva, concluímos que os resultados alcançados mostram a constituição de um contexto favorável para gerar oportunidades de aprendizagem profissional para os professores (RIBEIRO; PONTE, 2019RIBEIRO, A. J.; PONTE, J. P. Professional learning opportunities in a practice-based teacher education programme about the concept of function. Acta Scientiae, Canoas, v. 21, n. 2, p. 49-74, mar./abr. 2019.).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    Ago 2021

Histórico

  • Recebido
    07 Jul 2020
  • Aceito
    03 Mar 2021
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