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O que Livros Didáticos de Matemática Propõem para a Aprendizagem de Amostragem?

What do Mathematics Textbooks Propose for Sampling learning?

Resumo

O ensino e a aprendizagem de Estatística na Educação Básica vêm recebendo mais atenção nos últimos anos. Nessa perspectiva, o novo documento curricular brasileiro – Base Nacional Comum Curricular (BNCC) ressalta a importância dos estudantes desenvolverem habilidades concernentes à realização de pesquisa estatística em contextos de relevância social a fim de permitir julgamentos bem fundamentados para a tomada de decisões. Um dos conceitos que propiciam a realização de uma pesquisa é a amostragem. Considerando que o livro didático é o recurso mais utilizado pelos professores para o ensino, este estudo tem como objetivo analisar como livros didáticos de Matemática dos Anos Finais do Ensino Fundamental propõem atividades para a aprendizagem de amostragem. Analisamos todas as onze coleções aprovadas pelo Programa Nacional do Livro Didático (PNLD) edição 2020. Apontamos uma distribuição desigual das atividades entre os volumes, excesso na utilização de dados fictícios e da identificação da população/amostra em situações atreladas a pessoas. Destacamos também que a ausência da discussão sobre variabilidade está vinculada a representatividade e tamanho da amostra. Portanto, esperamos que os resultados evidenciados neste estudo, possam contribuir para a reflexão e possíveis melhorias dos livros didáticos e da necessária complementação por parte dos professores no que tange a aprendizagem sobre amostragem.

Palavras-chave
Educação Estatística; Pesquisa; Amostragem; Livros Didáticos; Anos Finais do Ensino Fundamental

Abstract

The teaching and learning of Statistics in middle school has been receiving more attention in recent years. In this perspective, the new Brazilian curricular document – National Common Curricular Base (BNCC) emphasizes the importance of students developing skills concerning the conduct of statistical research in contexts of social relevance to allow well-founded judgments for decision making. One of the concepts that make research possible is sampling. Considering that the textbook is the resource most used by teachers, this study aims to analyze how Middle-School Mathematics textbooks propose activities for sampling learning. We analyzed all eleven collections approved by the 2020 issue of the National Textbook Program (PNLD). We pointed out an uneven distribution of activities between the volumes (6th and 9th grade), excessive use of fictitious data, and the identification of the population/sample in situations linked to people. We also highlight the absence of a discussion on variability, specifically the one related to representativeness and sample size. Therefore, we hope that the results evidenced in this study can contribute to the reflection and possible improvements of textbooks and for the necessary complementation of teachers with regard to learning about sampling.

Keywords
Statistical Education; Research; Sampling; Textbooks; Middle School

1 Introdução

A Estatística, segundo Triola (2008TRIOLA, M. Introdução à estatística. 10. ed. Rio de Janeiro: LTC, 2008., p. 4), “é um conjunto de métodos para o planejamento de estudos e experimentos, obtenção de e elaboração de dados e consequente organização, resumo, apresentação, análise, interpretação e elaboração de conclusões baseadas nos dados”.

Neste artigo, tomamos como referência o trabalho de Gal (2002)GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002., que destaca o papel da Estatística para a tomada de decisões em situações de incerteza e risco e denomina essa perspectiva de Letramento Estatístico. Tal perspectiva se refere à capacidade de interpretar, avaliar criticamente e expressar opiniões acerca de mensagens estatísticas sustentadas em argumentos concernentes a dados. O autor afirma que o Letramento Estatístico envolve dois conjuntos de elementos: elementos de conhecimento, que dizem respeito a aspectos cognitivos; e os elementos de disposição que fazem alusão a fatores afetivos.

De acordo com o Quadro 1, Gal (2002)GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002. define que as habilidades de letramento se referem à necessidade de ativação de várias habilidades de processamento de texto (orais, escritas, virtuais, gráficas etc.) para obtenção de significado da informação estatística. O conhecimento estatístico refere-se a conceitos e procedimentos estatísticos e probabilísticos e sua inter-relação. O conhecimento matemático envolve a compreensão de número e operações matemáticas. O conhecimento de contexto é o conhecimento de mundo, que consiste em fonte de significado e base para a interpretação dos resultados obtidos, pois a familiaridade com o contexto é fundamental no julgamento da mensagem estatística. O questionamento crítico constitui-se em avaliação crítica sobre a razoabilidade de informações estatísticas: De onde vieram os dados?; Uma amostra foi usada?; Quantas pessoas participaram?; A amostra é grande o suficiente?; É representativa?; É tendenciosa?

Quadro 1
Modelo de Letramento Estatístico

Pontua-se que os elementos de conhecimento se sobrepõem e não operam independentemente um do outro. Assim, na interpretação de uma pesquisa estatística, por exemplo, requer não apenas domínio de cálculos de porcentagem (conhecimento matemático) e entendimento da seleção de uma amostra representativa (conhecimento estatístico), mas também comunicação de opiniões claras, oralmente ou por escrito (habilidades de letramento), e conhecimento do contexto no qual a pesquisa está inserida.

Os elementos de disposição envolvem crenças e atitudes, sendo estes conceitos imbricados. As crenças tangem às ações individuais expressas em ideias ou opiniões, por exemplo: “As estatísticas governamentais sempre são precisas”. Crenças levam tempo para serem desenvolvidas e os fatores culturais a influenciam, enquanto as atitudes são as materializações das crenças e dizem respeito à tomada de decisões. A postura crítica é a capacidade de adotar, sem pistas externas, uma atitude questionadora em relação às mensagens estatísticas que podem ser enganosas, tendenciosas ou incompletas, intencionalmente ou não. A postura crítica é ativada ao se realizar os questionamentos críticos.

Gal (2002)GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002. argumenta que é difícil conceber uma pessoa letrada estatisticamente caso não possua os elementos de disposição (crenças, atitudes e postura crítica) para acionar os cinco elementos de conhecimento e vice-versa. Deste modo, não se trata de elementos dissociados (conhecimento e disposição), mas que se inter-relacionam e juntos compõem o Letramento Estatístico.

O autor chama atenção para o fato de que a maioria dos indivíduos é consumidor de dados, os quais estão inseridos em contexto de leitura, e, portanto, necessitam dispor de uma postura crítica frente à fidedignidade ou não de informações que lhes são apresentadas. Por outro lado, há os produtores de dados (GAL, 2002GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002.; 2019GAL, I. Understanding statistical literacy: About knowledge of contexts and models. In: J. M. CONTRERAS, J. M.; GEA, M. M.; LÓPEZ-MARTÍN, M. M.; MOLINA-PORTILLO, E. (Eds.). Actas del Tercer Congreso Internacional Virtual de Educación Estadística. Granada: Universidad de Granada, 2019. p. 1-15.), os quais são indivíduos envolvidos na produção de dados, inseridos no chamado contexto de investigação. Estes necessitam desenvolver uma postura investigativa e compreender as fases do ciclo investigativo (GUIMARÃES; GITIRANA, 2013GUIMARÃES, G. L.; GITIRANA, V. Estatística no Ensino Fundamental: a pesquisa como eixo estruturador. In: BORBA, R. E.; MONTEIRO, C. E. (Orgs.). Processos de ensino e aprendizagem em Educação Matemática. Recife: UFPE, 2013, p. 93-132.).

Partindo dessa concepção, estamos interessados em compreender os processos de ensino e de aprendizagem da Estatística, denominado de Educação Estatística, o qual envolve aspectos cognitivos, afetivos e o desenvolvimento de métodos e materiais de ensino como afirmam Carzola, Magina, Gitirana e Guimarães (2017)CAZORLA, I. M.; MAGINA, S. M.; GITIRANA, V.; GUIMARÃES, G. L. Estatística para os anos iniciais do Ensino Fundamental. Brasília: Sociedade Brasileira de Educação Matemática – SBEM, 2017.. Mais especificamente, neste artigo, nosso foco está relacionado à amostragem. Selecionar amostras representativas e usá-las para realizar generalizações sobre populações desconhecidas são o núcleo da Estatística. A compreensão destes aspectos e de como amostras podem variar (variabilidade) são cruciais para fazer estimações e tomar decisões baseadas em dados (BEN-ZVI; BAKKER; MAKAR, 2015BEN-ZVI, D.; BAKKER, A.; MAKKAR, K. Learning to reason from samples. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 291-303, 2015.). Apesar da relevância deste conceito, pesquisadores afirmam que há poucas investigações sobre o tema (BEN-ZVI; BAKKER; MAKAR, 2015BEN-ZVI, D.; BAKKER, A.; MAKKAR, K. Learning to reason from samples. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 291-303, 2015.; PEDROSA; REYES; BATANERO; SERRANO; 2019PEDROSA, N. B.; REYES, K. A. R.; BATANERO, C.; SERRANO, M. M. G. Understanding Sampling: A Summary of the Research. Boletín de Estadística e Investigación Operativa, Rioja, v. 35, n. 1, p. 49-78, 2019.) e, portanto, carecem de maior atenção.

Para o ensino e a aprendizagem vários recursos podem e devem ser utilizados. Dentre esses, temos o livro didático, que muitas vezes é o principal recurso que o professor dispõe para desenvolver suas práticas em sala de aula (CARVALHO; LIMA, 2010CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30.; JANUÁRIO, 2017JANUÁRIO, G. Marco conceitual para estudar a relação entre materiais curriculares e professores de Matemática. 2017. Tese (Doutorado em Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2017.; TURÍBIO; SILVA, 2017TURÍBIO, S. R. T.; SILVA, A. C. A influência do livro didático na prática pedagógica do professor que ensina Matemática. Revista Prática Docente, Confresa, v. 2, n. 2, p. 158-178, jul./dez. 2017.).

Assim, neste artigo, temos como objetivo analisar o que tem sido proposto em atividades relacionadas ao conceito de amostragem nos livros didáticos de Matemática dos Anos Finais do Ensino Fundamental aprovados pelo PNLD 2020.

2 Afinal, o que é amostra? Como podemos selecioná-la?

É inegável a utilidade de pesquisas estatísticas. As informações obtidas através delas ajudam governos, empresas e cidadãos a planejarem suas ações. Para o poder público, por exemplo, permite conhecer a realidade socioeconômica dos habitantes das diversas regiões do país a fim de identificar áreas mais necessitadas de investimento. No âmbito empresarial, também auxilia na tomada de decisões em suas áreas de atuação e para os cidadãos, possibilita compreender o mundo, cobrar e sugerir políticas públicas.

Para a validade de uma pesquisa é fundamental, entre outros conceitos, explicitar a amostra e a população investigada. Em Estatística, população se refere ao conjunto de elementos (indivíduos, objetos) que possuem ao menos uma característica em comum. Deste modo, ao realizar uma pesquisa com toda população de interesse, dizemos que ela é censitária. Um exemplo é o Censo, realizado a cada 10 anos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Entretanto, devido a fatores de tempo, custo e inconveniência (configurar-se em processo destrutivo, dentre outros), nem sempre é possível fazê-lo e, então, elaboram-se pesquisas com uma parte da população de interesse, constituindo-se em pesquisa amostral (ou por amostragem). Qualquer subconjunto desta população é chamado de amostra (MOORE, 1995MOORE, D. S. A Estatística básica e sua prática. 3. ed. New York: W. H. Freeman and Company, 1995.). A propósito, o IBGE realiza regularmente a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios Contínua (PNAD).

Ao selecionar uma amostra, é imprescindível que esta seja representativa, para assim realizar generalizações para toda população e, portanto, evitar resultados imprecisos e enviesados. Em outras palavras, a representatividade está associada em que medida as características da população (gênero e classe social de pessoas, raça de cães, marcas e modelos de celulares etc.) estão refletidas exatamente na amostra. Um exemplo mal sucedido aconteceu em 1948, quando um jornal de Chicago previu erroneamente o próximo presidente dos Estados Unidos baseado em uma pesquisa por telefone, pois não consideraram que, naquela época, só a classe alta poderia ter telefone[1].

Além da representatividade, é preciso levar em conta outros aspectos como variabilidade, tamanho da amostra e amostragem. A variabilidade diz respeito à quantidade de fatores para caracterizar uma população. Se pensarmos em grãos de arroz, temos uma variabilidade tão pequena que nos permite experimentar um grão e falarmos sobre uma panela cheia deles, ou seja, a população. O tamanho da amostra está estritamente relacionado com a variabilidade (homogênea ou heterogênea) dessa população. Quanto mais homogênea for a população, ou seja, que tenha uma menor variabilidade (caso do grão de arroz), menor o tamanho da amostra para representá-la. Quanto maior a variabilidade da população, maior será a amostra, pois será necessário conter todas as características da população na amostra a ser selecionada para que a mesma seja, de fato, representativa da população. Assim, percebe-se que, representatividade, variabilidade e tamanho da amostra são conceitos interligados.

Stevenson (1981STEVENSON, W. J. Estatística aplicada à administração. São Paulo: Harper & Row do Brasil, 1981., p. 158) argumenta que “a finalidade da amostragem é fazer generalizações sobre todo um grupo, sem precisar examinar cada um de seus elementos”. A utilização da amostragem é primordial quando desejamos realizar inferência estatística, pois formulamos julgamentos sobre um todo analisando apenas uma parte dele, ou seja, uma amostra.

Mas como se seleciona uma amostra representativa? Este questionamento nos leva à discussão do conceito de amostragem que se refere aos métodos de seleção de uma amostra e são divididos em dois grupos: métodos não probabilísticos (não aleatórios) e não probabilísticos (aleatórios).

Os métodos não probabilísticos são aqueles em que é desconhecida a probabilidade de um elemento da população ser escolhido para participar da amostra (MOORE, 1995MOORE, D. S. A Estatística básica e sua prática. 3. ed. New York: W. H. Freeman and Company, 1995.). Sua seleção depende de critérios e julgamento do pesquisador. Decorrente disso, não é possível obter representatividade para produzir resultados generalizáveis. No entanto, estes métodos tendem a ser mais baratos e convenientes, os quais são bastante úteis para pesquisas exploratórias e de geração de hipóteses. Os métodos não probabilísticos são: amostragem por conveniência, amostragem por quotas e amostragem por julgamento.

Em contrapartida, nos métodos probabilísticos, a chance de cada elemento da população pertencer à amostra é conhecida e diferente de zero (MOORE, 1995MOORE, D. S. A Estatística básica e sua prática. 3. ed. New York: W. H. Freeman and Company, 1995.), ou seja, há a necessidade de listagem de todos os elementos da população, pois os elementos da amostra são selecionados através de alguma forma de sorteio aleatório. Neste caso, é possível realizar generalizações, pois seu princípio é a representatividade, sendo que sua seleção pode ocorrer por sorteio, seja utilizando a tabela de números aleatórios, sites ou programas específicos de computador, e, até mesmo uma urna. Os métodos probabilísticos são: amostragem aleatória simples, amostragem estratificada, amostragem sistemática e amostragem por conglomerados.

Em síntese, o processo de seleção de amostras a partir de uma população é denominado métodos de amostragem. Já a inferência estatística refere-se a fazer afirmações a respeito de característica de uma população, baseando-se em uma amostra representativa.

3 A Base Nacional Comum Curricular e o estudo de amostragem

A Base Nacional Comum Curricular – BNCC – (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
) consiste em um documento de caráter normativo no qual se define um conjunto de competências e habilidades que todos os estudantes devem desenvolver ao longo das etapas e modalidades da Educação Básica, promovendo assim, equidade de direitos de aprendizagem.

Na área de conhecimento da Matemática, o documento sublinha cinco unidades temáticas, dentre elas, a Probabilidade e Estatística. Nelas enfatiza-se a necessidade de trabalhar com a pesquisa, abordando conceitos, fatos e procedimentos da vida cotidiana, das ciências e da tecnologia, ressaltando a importância de usar dados reais:

A consulta a páginas de institutos de pesquisa – como a do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) – pode oferecer contextos potencialmente ricos não apenas para aprender conceitos e procedimentos estatísticos, mas também para utilizá-los com o intuito de compreender a realidade (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
, p. 274).

Em relação aos Anos Finais do Ensino Fundamental, foco desse estudo, a expectativa é que os alunos saibam planejar e construir relatórios de pesquisas estatísticas, incluindo a definição da população a ser pesquisada, “a decisão sobre a necessidade ou não de usar amostra e, quando for o caso, a seleção de seus elementos por meio de uma adequada técnica de amostragem” (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
, p. 275).

Percebemos que o cerne nesta fase de escolarização está na realização de pesquisas estatísticas, isto é, os estudantes assumem papel de produtores de dados (GAL, 2002GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002.) e consequentemente, uma postura ativa em seu aprendizado. Neste processo, o espírito investigativo, a autonomia, colaboração, argumentação e criticidade entram em cena. Contudo, é imprescindível que os temas a serem investigados, além de apresentarem caráter de relevância social, sejam de interesse dos estudantes, pois, assim, possibilitam-lhes um maior engajamento.

Dentre as etapas do ciclo investigativo, a BNCC enfatiza a definição da amostra. No Quadro 2, encontramos habilidades específicas deste conceito por ano de escolaridade (Quadro 2).

Quadro 2
Habilidades da BNCC referentes ao estudo de amostra

De acordo com o Quadro 2, percebemos que o estudo de amostra é indicado explicitamente a partir do 7° ano, em que se propõem a percepção e justificativa da pesquisa ser censitária ou amostral e, no 8° ano, refere-se à seleção da amostra feita de diferentes maneiras (amostra casual simples, sistemática e estratificada). No entanto, conceitos importantes como representatividade, variabilidade e tamanho da amostra, não foram mencionados. Tampouco há alusão da noção de possíveis efeitos de vieses na seleção de amostras.

Especificamente a respeito dos métodos de amostragem, salientamos nossa inquietação de, nas habilidades, serem apontados apenas os probabilísticos. Todavia, os métodos não probabilísticos possuem sua importância e são corriqueiramente utilizados. Deste modo, julgamos necessário tê-los como ponto de discussão e uso.

Consoante à gradação de habilidades por ano escolar, a BNCC (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
, p. 275) argumenta que: “Se baseia na compreensão e utilização de novas ferramentas e também na complexidade das situações-problema propostas, cuja resolução exige a execução de mais etapas ou noções de unidades temáticas distintas”. No entanto, constatamos inconsistência na gradação proposta, uma vez que as habilidades do 8° e 9° ano referentes à pesquisa estatística não apresentam diferença de objetivo de aprendizagem.

Diante da análise da BNCC, pudemos perceber pontos favoráveis e outros que necessitam ser incorporados para um melhor entendimento do estudo de amostragem, pois as competências e habilidades preconizadas pelo documento servem de determinantes na elaboração de livros didáticos.

4 Livro didático

O livro didático consiste em um material de grande importância no processo de ensino e aprendizagem da Educação brasileira, e, por muitas vezes, é o principal recurso que o professor dispõe para desenvolver suas práticas em sala de aula (CARVALHO; LIMA, 2010CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30.; JANUÁRIO, 2017JANUÁRIO, G. Marco conceitual para estudar a relação entre materiais curriculares e professores de Matemática. 2017. Tese (Doutorado em Educação Matemática) - Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo, 2017.; TURÍBIO; SILVA, 2017TURÍBIO, S. R. T.; SILVA, A. C. A influência do livro didático na prática pedagógica do professor que ensina Matemática. Revista Prática Docente, Confresa, v. 2, n. 2, p. 158-178, jul./dez. 2017.). Carvalho e Lima (2010)CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30. apontam que o livro consolida, aprofunda e integra conhecimentos, favorecendo o desenvolvimento de habilidades, além de auxiliar na avaliação de aprendizagem dos estudantes.

No que diz respeito à Estatística na Educação Básica, Batanero (2000)BATANERO, C. Significado y comprensión de las medidas de posición central. Revista de didáctica de las matemáticas, Granada, v. 25, n. 1, p. 41-58, 2000. discorre que o livro didático serve como formação para os professores, levando em consideração que quem está ensinando tem ou deveria ter formação em Matemática, no entanto, pouco se trabalha a Educação Estatística nos cursos de formação inicial. Neste sentido, a qualidade deste recurso é de extrema relevância e, para garanti-la, conta-se com o auxílio do Programa Nacional do Livro Didático (PNLD).

O PNLD é responsável por avaliar os livros didáticos antes dos mesmos chegarem às escolas públicas brasileiras. Esta avaliação é realizada por especialistas que seguem critérios técnicos, dentre eles “garantir que os materiais contribuam para o desenvolvimento das competências e habilidades envolvidas no processo de aprendizagem nos Anos Finais do Ensino Fundamental, conforme definidas na Base Nacional Comum Curricular” (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
p.37). Como forma de orientar a prática docente, no livro do professor é obrigatória conter o formato em U (Figura 1) que se refere a:

Figura 1
Livro do professor formato em U

Diagramação do manual do professor que, a cada duas páginas espelhadas, dispõe no centro superior a reprodução de duas páginas do livro do aluno, já com as respostas aos exercícios propostos, e nas laterais e embaixo (num formato que se assemelha à letra U) o conteúdo específico do professor referente ao conteúdo do aluno (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
p. 23).

Conforme podemos observar na Figura 1, o formato em U contêm orientações didáticas e metodológicas, como indicações de leituras, sugestões de recursos tecnológicos para a prática docente e respostas associadas a cada uma das atividades propostas aos estudantes. A inclusão destas orientações nas páginas das atividades representa um avanço para o PNLD 2020 em relação às edições anteriores, uma vez que as orientações ficavam concentradas no início ou fim do livro e de forma bem reduzida (CARVALHO; GIRITANA, 2010CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30.).

Diante da importância do livro didático, pesquisadores têm se dedicado a analisar abordagens dadas a diversos conceitos, pois, embora se passe por um crivo de avaliadores do PNLD, esta é de caráter técnico, enquanto os pesquisadores se debruçam em uma análise mais detalhada e sobre diferentes aspectos.

5 O que a literatura nos diz sobre o ensino e aprendizagem de amostragem na Educação Básica?

Diversos estudos (GOMES; GUIMARÃES, 2018GOMES, T. M.; GUIMARÃES, L. G. Compreensão dos estudantes do ensino fundamental sobre seleção de uma amostra representativa. Com a palavra, o professor, v. 3, n. 6, p.132-149, 2018.; JACOBS, 1997JACOBS, V. R. Children's understanding of sampling in surveys. In: Annual Meeting of the American Educational Research Association, V, 1997, Chicago. Actas […] Chicago: AERA, 1997. p. 1-37.; MELITIOU-MAVROTHERIS; PAPARISTODEMOU, 2015MELETIOU-MAVRITHERIS, M.; PAPARISTODEMOU, E. Developing students’ reasoning about samples and sampling in the context of informal inferences. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 385-404, 2015.; PEDROSA; REYES; BATANERO; SERRANO; 2019PEDROSA, N. B.; REYES, K. A. R.; BATANERO, C.; SERRANO, M. M. G. Understanding Sampling: A Summary of the Research. Boletín de Estadística e Investigación Operativa, Rioja, v. 35, n. 1, p. 49-78, 2019.; WATSON; MORITZ, 2000WATSON, J. M.; MORITZ, J. B. Developing concepts of sampling. Journal for Research in Mathematics Education, Reston, v. 31, n. 1, p. 44-70, 2000.) têm nos apontado possibilidades e desafios para o ensino e aprendizagem dos conceitos relacionados à amostragem na Educação Básica. Esses pesquisadores argumentam que a noção de amostra é central em estatística e, deste modo, necessita de uma maior atenção. Entretanto, ainda são poucas as pesquisas e quando encontramos se referem à aprendizagem de estudantes (BEN-ZVI; BAKKER; MAKAR, 2015BEN-ZVI, D.; BAKKER, A.; MAKKAR, K. Learning to reason from samples. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 291-303, 2015.).

Rubin, Bruce e Tenney (1990)RUBIN, A. D.; BRUCE, B. C.; TENNEY, Y. Learning about Sampling: Trouble at the Core of Statistics. In: International Conference on Teachings Statistics, 3, 1990, Voorburg. Proceedings […] Voorburg, 1990. p. 314-319. alertam sobre o excesso de confiança na representatividade da amostra que levava os estudantes a pensarem que uma amostra nos diz tudo sobre uma população. Por outro lado, a dependência excessiva da variabilidade leva-os a conceberem que uma amostra não nos diz nada útil sobre uma população. Os autores chamam atenção para a necessidade de ter um equilíbrio entre essas duas ideias: representatividade e variabilidade.

Watson e Moritz (2000)WATSON, J. M.; MORITZ, J. B. Developing concepts of sampling. Journal for Research in Mathematics Education, Reston, v. 31, n. 1, p. 44-70, 2000. entrevistaram 62 estudantes australianos e perceberam que as crianças do 3° ano do Ensino Fundamental apresentaram noções muito elementares e geralmente derivadas da experiência de vida. Estas confiavam em obter conclusões para a população, apoiando-se em dados de amostras pequenas sem se preocuparem com possíveis vieses. Por sua vez, estudantes do 6° ano sublinharam uma diversidade de crenças a respeito do tamanho da amostra e métodos de amostragem, enquanto os estudantes do 9° ano se mostraram preocupados com a variabilidade, apontando a necessidade de contar com uma amostra grande o suficiente e representativa.

No entanto, também não identificaram os riscos de vieses associado à amostra. Essas conclusões mostram a importância de explicitar as diferenças entre coletar uma pequena amostra de um universo homogêneo (por exemplo, uma amostra de sangue) e coletar uma amostra de uma população heterogênea (por exemplo, uma amostra de uma população de estudantes) para estimar uma característica específica. As ideias inerentes a amostras homogêneas não ajudam no entendimento da variabilidade e da necessidade em selecionar amostras grandes ao fazer inferências a partir de dados. Assim, Watson e Moritz (2000)WATSON, J. M.; MORITZ, J. B. Developing concepts of sampling. Journal for Research in Mathematics Education, Reston, v. 31, n. 1, p. 44-70, 2000. enfatizam a importância das noções de variabilidade e representatividade quando estudantes estão envolvidos em uma tarefa relacionada à amostragem.

Watson (2004)WATSON, J. M. Developing reasoning about samples. In: BEN-ZVI, D.; GARFIELD, J. (Eds.). The challenge of developing statistical literacy, reasoning and thinking. Dordrecht: Kluwer, 2004, p. 277–294. destaca que os estudantes costumam prestar atenção à justiça e desconfiam dos métodos de amostragem aleatória como um processo que produz amostras imparciais, optando assim, pelo método de amostragem por resposta voluntária.

Estas dificuldades são persistentes, pois também foram encontradas no estudo de Meletiou-Mavrotheris e Paparistodemou (2015)MELETIOU-MAVRITHERIS, M.; PAPARISTODEMOU, E. Developing students’ reasoning about samples and sampling in the context of informal inferences. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 385-404, 2015., em que estudantes do 6° ano de Chipre mostravam-se preocupados com a possibilidade de levar a resultados extremos: “É aleatório, para que tudo aconteça”. Logo, a preferência por amostragem estratificada não era para aumentar a representatividade da amostra, mas sim para aumentar a “justiça” do processo, garantindo que meninos e meninas sejam igualmente representados, por exemplo.

Ao questionarem sobre o tamanho da amostra que uma empresa deveria selecionar para saber quais sabores de sorvete vender, os estudantes declararam que uma amostra pequena (10 pessoas) não seria representativa, devido à variabilidade. Nesta direção, sinalizaram que uma amostra constituída apenas de crianças ou idosos poderia apresentar vieses, “muito provavelmente todas as crianças gostam de sorvete”, “pode ser que a maioria não experimente para evitar o açúcar” (MELETIOU-MAVROTHERIS; PAPARISTODEMOU, 2015MELETIOU-MAVRITHERIS, M.; PAPARISTODEMOU, E. Developing students’ reasoning about samples and sampling in the context of informal inferences. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 385-404, 2015., p. 396). Deste modo, quando exposto a uma situação com contexto de interesse e entendimento deles, os estudantes se mostram capazes de entender a relação - variabilidade, tamanho e representatividade da amostra.

Além da compreensão na relação população-amostra, variabilidade-tamanho- representatividade, alguns estudos levantaram o que estudantes são capazes de entender sobre os métodos de amostragem. Os resultados de Jacobs (1997)JACOBS, V. R. Children's understanding of sampling in surveys. In: Annual Meeting of the American Educational Research Association, V, 1997, Chicago. Actas […] Chicago: AERA, 1997. p. 1-37. em uma pesquisa com estudantes estadunidenses do 4° e 5° ano (9 a 11 anos de idade) ressaltam que, embora esses reconheçam vantagens de procedimentos aleatórios, tendem a preferir a amostragem estratificada.

Gomes (2013)GOMES, T. M. O todo é a soma das partes, mas uma parte representa o todo? Compreensão de Estudantes do 5° e 9° ano sobre Amostragem. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática e Tecnológica) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013. se debruçaram em analisar compreensões iniciais a respeito dos diferentes conceitos atrelados à amostragem. Para tanto, realizaram uma entrevista com 40 estudantes brasileiros do 5° e 9° ano (vinte de cada ano escolar) contendo treze questões. Dentre essas, as pesquisadoras destacam que a variedade de situações incentiva os estudantes a entrarem em conflito e pensarem nas relações população-amostra, além de construírem conceitos baseados em critérios estatísticos, e não apenas em suas experiências pessoais. Entretanto, quando perguntaram sobre qual a população a ser analisada em uma pesquisa para obter o tempo de duração de computadores, notaram que 85% dos estudantes responderam incorretamente, apresentando respostas como: “A população quem vai ser, vai ser quem fez o computador” ou “O cara que mexe com informática pra saber quanto tempo, porque ele entende mais” (GOMES, 2013GOMES, T. M. O todo é a soma das partes, mas uma parte representa o todo? Compreensão de Estudantes do 5° e 9° ano sobre Amostragem. Dissertação (Mestrado em Educação Matemática e Tecnológica) – Universidade Federal de Pernambuco, Recife, 2013., p 62). Diante disso, ficou evidente a dificuldade de conceituarem população estatística para além de um conjunto de pessoas.

Encontramos também pesquisas documentais realizadas a partir de livros didáticos. Gomes e Guimarães (2017)GOMES, T.; GUIMARÃES, G. Amostragem nos livros didáticos do 5° e 9° ano do Ensino Fundamental do Brasil. In: Congreso Iberoamericano de Educacion Matematica, 8, 2017. Actas […] Madrid, 2017, p. 325-326. analisaram atividades concernentes a conceitos relacionados à amostragem nas obras brasileiras do 5° e 9° aprovadas pelo PNLD edições de 2016 e 2017 respectivamente. As autoras perceberam que no 5° ano atividades desta natureza são escassas e não há nenhuma indicação para estudantes e professores sobre o conceito de amostra. Já no 9° ano, encontraram algumas atividades referentes à definição de conceitos, identificação da população/amostra, finalidade, seleção e representação de amostra e realização de pesquisa estatística. Essas coleções tinham como currículo norteador os Parâmetros Curriculares Nacionais – PCN (BRASIL, 1997BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. 1° e 2° ciclos. Brasília: MEC/ Secretaria de Ensino Fundamental, 1997.; 1998BRASIL. Parâmetros Curriculares Nacionais: Matemática. 3° e 4° ciclos. Brasília: MEC/ Secretaria de Ensino Fundamental, 1998.), os quais davam pouca ênfase ao estudo de amostragem.

No âmbito internacional, Reyes (2019)REYES, K. A. R. Comprensión del muestreo por alumnos chilenos de educación secundaria. 2019. Tesis (Doctorado en Didáctica de la Matemática) – Universidad de Granada, Granada, 2019. analisou oito livros didáticos chilenos, um de cada ano escolar, dos Anos Finais ao Ensino Médio (11-18 anos de idade), os quais estiveram vigentes no período de 2016 a 2018. Foi constatado que o livro destinado a estudantes do 6° ano (11-12 anos) é o que contempla mais atividades, partindo de aspectos elementares como população e amostra, até chegar à ideia intuitiva de representatividade. E tão somente no 9° ano (14-15 anos), contêm situações relacionadas a tamanho e tipos de amostra. Reyes (2019)REYES, K. A. R. Comprensión del muestreo por alumnos chilenos de educación secundaria. 2019. Tesis (Doctorado en Didáctica de la Matemática) – Universidad de Granada, Granada, 2019. chama atenção que conceitos como variabilidade e vieses de amostras não foram discutidos e salienta que nas orientações curriculares chilenas também não estão presentes.

Todas estas evidências reforçam a complexidade do conceito de amostragem, apontando possibilidades de práticas de ensino, como também sinalizando desafios a serem superados. Um deles é a abordagem dada em livros didáticos. Na seção a seguir, iremos discorrer acerca dos aspectos metodológicos que adotamos para realizar nossa pesquisa.

6 Aspectos metodológicos

Dado o objetivo geral deste estudo que é analisar o que tem sido proposto em atividades de conceitos relacionados à amostragem nos livros didáticos de Matemática, desenvolvemos uma pesquisa de caráter qualitativo e cunho documental que consiste em “procedimento que se utiliza de métodos e técnicas para apreensão, compreensão e análise de documentos dos mais variados tipos” (SÁ-SILVA; ALMEIDA; GUINDANI, 2009SÁ-SILVA, J. R.; ALMEIDA, C. D.; GUINDANI, J. F. Pesquisa documental: pistas teóricas e metodológicas. Revista Brasileira de História & Ciências Sociais, Porto Alegre, v. 1, n. 1, p. 1-15, 2009., p. 5).

Assim, analisamos todas as coleções (11) dos Anos Finais do Ensino Fundamental (6° ao 9° ano) aprovadas pelo PNLD 2020, perfazendo um total de 44 livros didáticos. As coleções foram denotadas aleatoriamente de A, B, C, …, J, K, para facilitar sua citação ao longo do texto.

Primeiramente identificamos em cada livro, no mapeamento página a página, atividades que fazem referência implícita ou explícita aos conceitos alusivos à amostragem. Em seguida, as classificamos se estavam associadas a um contexto fictício ou real e se a população/amostra estudada referia-se a pessoas ou objetos. Posteriormente, analisamos as habilidades que o livro didático desejava desenvolver em cada uma das atividades. Além disso, todas as orientações ao professor contidas no formato em U foram analisadas.

7 Resultados

Dentre os resultados obtidos, encontramos um total de 275 atividades e observamos uma variação desse quantitativo entre as diferentes coleções, por exemplo, a coleção J contêm 13 atividades, enquanto a coleção B possui 40, o que demonstra uma não uniformização do trabalho com este conceito. Além disso, julgamos que esse número é insuficiente dado que o quantitativo por coleção é distribuído, na maioria dos casos, entre todos os quatro volumes (6° ao 9° ano). Assim, acreditamos que a pequena quantidade de atividades pode limitar a exploração deste conceito entre os anos escolares, dado o importante papel exercido pelo livro didático ao influenciar o que é desenvolvido em sala de aula (CARVALHO; LIMA, 2010CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30.; TURÍBIO; SILVA, 2017TURÍBIO, S. R. T.; SILVA, A. C. A influência do livro didático na prática pedagógica do professor que ensina Matemática. Revista Prática Docente, Confresa, v. 2, n. 2, p. 158-178, jul./dez. 2017.).

Quando observamos o quantitativo total de atividades (275) distribuídas por ano escolar, observamos poucas propostas no 6° ano (23) que aumentam no 7° ano (94) e 8° ano (119) e, no último ano, voltam a diminuir (39). Deste modo, existe uma tendência das coleções apresentarem um número maior de atividades nos volumes do 7° e 8° ano. Tal fato é decorrente dos critérios de avaliação do PNLD 2020, que coloca ênfase nos descritores sobre amostra nesses anos escolares.

Para uma análise específica destas atividades, criamos quatro categorias de análise: Amostra com conceito implícito ou explícito; Contexto real ou fictício; População/amostra estudada refere-se a pessoas ou objetos; Habilidades exploradas.

A primeira categoria diz respeito à forma de apresentação do conceito. Classificamos como amostra explícita (Figura 2) quando a atividade tinha como finalidade discutir conceitos relacionados à amostra. Entretanto, existem atividades que não têm a intenção de levar os estudantes a refletirem sobre amostra, mas permitem que o professor faça esta discussão, assim, a categorizamos como amostra implícita (Figura 3). Julgamos necessário incluí-las em nossa análise por se configurarem como oportunidade do professor explorar este conceito em sala de aula com perguntas do tipo: qual o objetivo da pesquisa, quantos elementos (pessoas, objetos etc.) compõem a amostra? Afinal, essas questões são imprescindíveis diante das informações apresentadas.

Figura 2
Exemplo de atividade de amostra explícita
Figura 3
Exemplo de atividade de amostra implícita

Na Figura 2, a atividade solicita identificar o universo estatístico e a amostra, assim, observamos claramente que o objetivo de aprendizagem refere-se ao estudo de amostra. Desta maneira, classificamos por atividade de amostra explícita. Em contrapartida, na Figura 3, temos um exemplo de atividade de amostra implícita, pois, embora possua a indicação do tamanho da amostra (30 alunos), não há intuito de discutir sobre. As orientações ao professor contida no formato em U reforçam nosso entendimento (ver Figura 3), que o objetivo central da atividade é a realização de pesquisa estatística com ênfase na reflexão da adequação de gráficos para representar os dados obtidos.

Ainda a respeito das atividades de amostra implícita, encontramos situações de interpretação e construção de tabelas, quadros e gráficos e cálculos de medidas de tendência central e de dispersão. É importante destacarmos que lemos todas as orientações ao professor presentes no formato em U e percebemos que as atividades de amostra implícita possuem potencial de refletirem explicitamente sobre amostra, contudo, é necessário, por exemplo, a intervenção do professor.

A partir dos dados da Tabela 2 percebemos que, no 6° ano, há uma distribuição simétrica em relação à forma de apresentação do conceito de amostra (implícito e explícito), já no 7°, 8° e 9° anos a grande maioria aborda de forma explícita, como está proposto na BNCC.

Tabela 1
Percentual de atividades que apresentam o conceito de amostra implícito ou explícito
Tabela 2
Percentual de atividades por tipo de contexto e ano escolar

A segunda categoria de análise refere-se ao contexto da atividade envolver dados fictícios ou reais. Para compreendermos nossa realidade é de extrema importância o uso de dados reais que possibilitam práticas de ação social, transformando reflexões em ações. Atividades que sinalizavam fontes de institutos de pesquisa, por exemplo, foram classificadas como sendo de contexto real, já as que apresentavam situações imaginárias, contexto fictício (Figura 4).

Figura 4
Atividades com dados fictícios

Na tabela 2 temos a distribuição do contexto (fictício e real) distribuído por ano escolar.

É importante frisar que o total de atividades apresentado na Tabela 2 (252) é diferente do apresentado na Tabela 1 (275), pois situações em que se pedia definição de conceito: “O que é população? E amostra? Qual a diferença entre pesquisa censitária e pesquisa amostral?” não foram contabilizadas na categoria contexto.

Os dados da Tabela 2 apontam forte concentração do contexto fictício (62,3%). Tal indício nos preocupa porque limita a entrada dos estudantes em uma cultura do Letramento Estatístico (GAL, 2002GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002.), a qual valoriza a leitura e o entendimento do mundo a partir de dados reais, assim como o despertar e o desenvolver do espírito científico.

Na terceira categoria de análise, estávamos interessados em saber se a população/amostra estudada em cada uma das atividades era de pessoas ou objetos. Pesquisas com estudantes de diferentes níveis da Educação Básica e países (RUBIN; BRUCE; TENNY, 1990RUBIN, A. D.; BRUCE, B. C.; TENNEY, Y. Learning about Sampling: Trouble at the Core of Statistics. In: International Conference on Teachings Statistics, 3, 1990, Voorburg. Proceedings […] Voorburg, 1990. p. 314-319.; BEN-ZVI; BAKKER; MAKAR, 2010; GOMES; GUIMARÃES, 2017GOMES, T.; GUIMARÃES, G. Amostragem nos livros didáticos do 5° e 9° ano do Ensino Fundamental do Brasil. In: Congreso Iberoamericano de Educacion Matematica, 8, 2017. Actas […] Madrid, 2017, p. 325-326.) têm evidenciado a importância da variedade de situações de ensino para a efetiva compreensão do conceito de população, amostra e suas relações (Tabela 3).

Tabela 3
Tipo de população e amostra estudada nas atividades dos livros didáticos

Primeiramente, sinalizamos que o total de atividades apresentado na Tabela 3 (252) é diferente do apresentado na Tabela 1 (275), pois situações em que se pedia definição de conceito “O que é censo?” não foram contabilizadas na categoria população/amostra estudada, pois esta referia-se a pessoas ou objetos.

Observamos na Tabela 3 a prevalência de atividades (90,9%) em que a população e/ou amostra refere-se a pessoas. Embora poucas, as relacionadas a objetos são apresentadas em todos os volumes. Nesse panorama, é imprescindível que o professor chame atenção durante a condução da atividade para a definição de população na Estatística.

A quarta categoria de análise concerne às habilidades que atividades de amostra com conceito explícito exigiam (Tabela 4).

Tabela 4
Percentual de tipo de habilidade por ano escolar

A Tabela 4 apresenta um total de 237 atividades, isto porque esse quantitativo refere-se a situações que têm por objetivos de aprendizagem conceitos relacionados à amostragem (Ver Tabela 2). A partir desses dados, percebemos que as propostas de atividades envolvendo compreender o conceito de população, censo, amostra e perceber suas relações concentram o maior número de atividades (53%), principalmente no 7° e 8° anos (Figura 5).

Figura 5
Atividade sobre a compreensão dos conceitos de população, censo ou amostra e suas relações

Contudo, de acordo com os estudos de Watson e Moritz (2000)WATSON, J. M.; MORITZ, J. B. Developing concepts of sampling. Journal for Research in Mathematics Education, Reston, v. 31, n. 1, p. 44-70, 2000. e Gomes e Guimarães (2018)GOMES, T. M.; GUIMARÃES, L. G. Compreensão dos estudantes do ensino fundamental sobre seleção de uma amostra representativa. Com a palavra, o professor, v. 3, n. 6, p.132-149, 2018., estudantes desde os Anos Iniciais são capazes de entenderem aspectos do conceito de amostra. Dessa forma, acreditamos que poderiam ser propostas mais atividades para os estudantes do 6° ano, levando-os a compreenderem a função de uma amostra e quais elementos interferem em sua representatividade. Outro ponto que reforça nosso argumento é análise realizada por Reyes (2019)REYES, K. A. R. Comprensión del muestreo por alumnos chilenos de educación secundaria. 2019. Tesis (Doctorado en Didáctica de la Matemática) – Universidad de Granada, Granada, 2019. em livros do Chile, a qual observou que ideias elementares sobre amostra estavam mais concentradas no 6° ano (11-12 anos de idade).

A segunda habilidade foi pensar acerca da seleção e representatividade de uma amostra. Esta se configura em peça-chave na generalização de resultados para a população. Diz respeito à necessidade de coletar dados confiáveis, livre de vieses e considerando as características da população. Nas atividades analisadas, foram encontradas situações de indicar critérios e/ou caraterísticas para selecionar uma amostra representativa, identificar possíveis vieses (em uma ou várias situações) e justificar a adequação e inadequação de amostras. A Figura 6 exibe um exemplo dessa habilidade.

Figura 6
Atividade de seleção e representatividade de uma amostra

A atividade da Figura 6 configura uma boa possibilidade para os estudantes pensarem criticamente sobre vieses em amostras e, assim, evitarem resultados imprecisos ou tendenciosos. Essa habilidade foi pouco explorada em livros didáticos (11%), concentrados nos volumes do 7° e 8° anos.

Além da seleção e representatividade é fundamental compreender sobre métodos para selecionar uma amostra. Explicitamos esse tipo de situação pela habilidade de identificar e fazer uso adequado das técnicas de amostragem. A BNCC chama atenção para esses aspectos no 8° e 9° anos ao sugerir a realização de pesquisas estatísticas e é tão somente nesses anos escolares (Tabela 4) que atividades dessa habilidade aparecem nos livros didáticos. Encontramos situações para identificar a técnica empregada, indicar qual técnica utilizar em determinado contexto e conceituar, explicar, dar exemplos de métodos de amostragem, assim como realizar cálculos amostrais (Figura 7).

Figura 7
Atividade da habilidade: identificar e fazer uso adequado das técnicas de amostragem

As três atividades (itens a, b e c) exigem diferentes aspectos em relação a identificar e fazer uso adequado das técnicas de amostragem: identificar a técnica empregada, calcular o tamanho da amostra sistemática e explicar o porquê da utilização ou não da amostragem estratificada. O que nos chama atenção é o fato de que, mesmo a BNCC não evidenciando o trabalho com cálculos amostrais, livros didáticos propõem esse tipo de atividade. No entanto, sinalizamos que, tão primordial quanto à realização de cálculos, é a compreensão de conceitos, propiciando, desta forma, que o estudante atribua significado ao que está fazendo. Sobre essa questão, Campos, Wodewotzki, Jacobini (2013CAMPOS, C. R.; WODEWOTZKI, M. L. L.; JACOBINI, O. R. Educação Estatística: teoria e prática em ambientes de modelagem matemática. 2. ed. Belo Horizonte: Autêntica, 2013., p. 25) discorrem que “O entendimento dos conceitos básicos de Estatística deve preceder o cálculo. Antes de usar fórmulas, os estudantes devem perceber a utilidade, a necessidade de certa estatística”.

Ainda sobre técnicas de amostragem, percebemos que apenas três delas foram exploradas nas atividades: aleatória simples, sistemática e estratificada. Todas essas são amostras probabilísticas e são as únicas ressaltadas na BNCC. Embora não explorada em atividades, a ressalva que fazemos se refere à orientação didática (formato em U) da coleção A que propõe a ampliação dessa discussão, sugerindo ao professor explicitar duas das técnicas não probabilísticas: conveniência e quotas (Figura 8) e outra técnica probabilística: por conglomerado. Consideramos essa ação relevante, pois auxilia o trabalho do professor, permitindo que este possa ir além do que está posto na BNCC. Além disso, julgamos que é fundamental explorar outros tipos de amostras, não probabilísticas.

Figura 8
Orientação didática ao professor quanto à discussão de amostras não probabilística e probabilística

Embora todas as coleções tragam atividades de amostras probabilísticas, não identificamos discussão em torno da aleatoriedade e acaso, conceitos importantes para compreensão desse tipo de amostra.

Analisamos também se as atividades propunham a realização de uma pesquisa. Conforme argumentam Guimarães e Gitirana (2013), a pesquisa deve ser o eixo principal na formação estatística dos estudantes, a qual se constitui em modo de apropriação de saberes que permite reflexões e ações práticas de diferentes temas que cercam nosso cotidiano. A Tabela 4 evidencia que 21,6% das atividades sobre amostra estão num contexto de pesquisa, tendo maior concentração no 8° ano.

Notamos que as propostas de realização de pesquisas estatísticas são bem estruturadas, contendo orientações para a condução da atividade por parte do professor e todos os passos para o estudante realizá-la (Figura 9). Ainda há sugestões de temas relevantes (segurança, bullying, preconceito etc.) e uso de planilhas eletrônicas para organizar e representar dados (Figura 10).

Figura 9
Proposta de pesquisa estatística
Figura 10
Proposta de pesquisa estatística

Ainda sobre a habilidade de realizar pesquisa estatística, identificamos que o tamanho da amostra era dado em 18,4% e o estudante precisava determinar em 81,6% das atividades. Este é um aspecto positivo, pois permite associar o tamanho da amostra à variabilidade e representatividade. Assim, os estudantes podem refletir se a população de interesse apresenta características variadas (heterogênea), portanto, há variabilidade e o tamanho da amostra necessita ser grande o suficiente para representar toda a população de modo a permitir realizar generalizações. O estudo de Meletiou-Mavrotheris e Paparistodemou (2015)MELETIOU-MAVRITHERIS, M.; PAPARISTODEMOU, E. Developing students’ reasoning about samples and sampling in the context of informal inferences. Educational Studies in Mathematics, New York, v. 88, n. 3, p. 385-404, 2015. evidenciou que estudantes do 6° ano compreendiam a relação entre o tamanho da amostra e a variabilidade da população. Assim, acreditamos que atividades de realização de pesquisa estatística necessitam considerar essa compreensão.

Ao se realizar pesquisas estatísticas, em particular as que utilizam amostras probabilísticas, é possível determinar e analisar margens de erro. Encontramos apenas uma atividade entre todos os 44 livros analisados (Figura 11).

Figura 11
Atividade de análise de margem de erro

Ressaltamos que discutir sobre margens de erros é relevante, pois possibilita o entendimento de que os resultados obtidos em uma pesquisa podem ser generalizados para toda a população dentro de certos limites e, além disso, corrobora para o conhecimento estatístico discorrido por Gal (2002)GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002. no modelo do Letramento Estatístico.

8 Considerações finais

Com a recente publicação da BNCC (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
), a Estatística vem recebendo mais atenção na Educação Básica. O planejamento e coleta de dados - incluindo a definição da população/amostra a ser pesquisada - estão presentes em várias das habilidades descritas pelo documento. Por sua vez, critérios de avaliação do PNLD (BRASIL, 2017BRASIL. Base Nacional Curricular Comum. Brasília: MEC, 2017. Disponível em: http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abase/. Acesso em: 02 abr. 2020.
http://basenacionalcomum.mec.gov.br/abas...
) ressaltam que o livro didático deve estar em consonância com o que está posto pela Base. Deste modo, neste artigo tivemos por objetivo analisar como livros didáticos de Matemática dos Anos Finais do Ensino Fundamental aprovados pelo PNLD 2020 propõem atividades que envolvem os conceitos relacionados à amostragem.

Diante dos resultados obtidos em nosso estudo, conseguimos elencar aspectos positivos e outros que necessitam ser melhorados. Destacamos a boa qualidade das atividades de realização de pesquisa estatística as quais contêm sugestões de temas relevantes e indicação de planilhas eletrônicas para as representações gráficas e tabulares e, assim, propiciam o desenvolvimento das etapas do ciclo investigativo (GUIMARÃES; GITIRANA, 2013GUIMARÃES, G. L.; GITIRANA, V. Estatística no Ensino Fundamental: a pesquisa como eixo estruturador. In: BORBA, R. E.; MONTEIRO, C. E. (Orgs.). Processos de ensino e aprendizagem em Educação Matemática. Recife: UFPE, 2013, p. 93-132.) e uma cultura de Letramento Estatístico (GAL, 2002GAL, I. Adults’ statistical literacy: meanings, components, responsibilities. International Statistical Review, La Haya, v. 70, n. 1, p. 1-51, 2002.; 2019GAL, I. Understanding statistical literacy: About knowledge of contexts and models. In: J. M. CONTRERAS, J. M.; GEA, M. M.; LÓPEZ-MARTÍN, M. M.; MOLINA-PORTILLO, E. (Eds.). Actas del Tercer Congreso Internacional Virtual de Educación Estadística. Granada: Universidad de Granada, 2019. p. 1-15.).

As orientações contidas no formato em U é outro ponto que merece ser enfatizado, pois auxilia o professor na condução das atividades e oportuniza a formação continuada dos conceitos trabalhados. O formato em U é um avanço para a edição do PNLD 2020, tendo em vista que, nas edições anteriores, quando se tinha orientações para cada uma das atividades, essas ficavam em uma seção específica no início ou final do livro (CARVALHO; GITIRANA, 2010CARVALHO, J. B. P.; LIMA, P. F. Escolha e uso do livro didático. In: CARVALHO, J. B. P. F. (Coord.). Matemática: Ensino Fundamental. Ministério da Educação: Secretaria de Educação Básica, 2010. p. 15-30.) e que, muitas vezes, o professor não consultava. Diante disso, o modelo formato em U apresenta orientações pedagógicas ao lado de cada atividade, permitindo, deste modo, que inevitavelmente visualizem.

Acerca dos aspectos que carecem ser melhorados, referimo-nos à má distribuição das atividades entre os quatro volumes (6° ao 9° ano), excesso da utilização de contextos fictícios (62,3%) e da identificação da população/amostra em situações atreladas a pessoas (90,9%). Ao mesmo tempo em que percebemos a inexistência de diversificação entre as habilidades exploradas, notamos que se contempla com maior ênfase (52,7%) a habilidade de compreensão de conceitos iniciais como a população, censo, amostra e suas relações. Em contrapartida, a seleção, representatividade, métodos de amostragem e margens de erro foram pouco trabalhados. Além disso, chamamos atenção para que a variabilidade da amostra e sua relação com o tamanho e representatividade sejam urgentemente inseridas nas atividades.

Sugerimos também, que futuras propostas de atividades contemplem diferentes contextos (pessoas, objetos etc.), inclusive de dados reais (dados do IBGE e PNAD, por exemplo), e que propiciem a discussão de amostras homogêneas e heterogêneas e dos diferentes métodos de amostragem (probabilísticos e não probabilísticos), possibilitando assim, a compreensão de que, dependendo do objetivo da pesquisa estatística, um método de amostragem é mais adequado em relação aos outros.

Diante do papel do livro didático no processo de ensino e aprendizagem, salientamos a necessidade da sua qualidade ser garantida. Deste modo, esperamos que os resultados aqui evidenciados possam contribuir para os diversos atores envolvidos neste debate – professores, editores e autores de livros didáticos, responsáveis pela elaboração de propostas curriculares – incorporarem os aspectos supracitados neste artigo e, assim, propiciarem um melhor desenvolvimento da compreensão dos conceitos relacionados à amostragem aos estudantes.

Agradecimentos

À agência de fomento da CAPES pelo suporte financeiro que possibilitou a consolidação deste estudo.

Referências

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Ago 2021
  • Data do Fascículo
    Ago 2021

Histórico

  • Recebido
    14 Maio 2020
  • Aceito
    19 Nov 2020
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