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Sarcopenia e dor crônica em idosas institucionalizadas

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A sarcopenia e a dor crônica são síndromes geriátricas que impactam negativamente a vida dos idosos acometidos, dos seus familiares e na rotina dos serviços de saúde, como é o caso das instituições de longa permanência para idosos. O objetivo deste estudo foi verificar a relação entre a sarcopenia e a dor crônica em idosas institucionalizadas.

MÉTODOS:

Estudo de corte transversal, de base populacional, realizado em 24 instituições de longa permanência para idosos, no município de Passo Fundo/RS (dezembro 2016 - junho 2017). A população foi composta por 161 residentes nesses locais, submetidos a um instrumento estruturado em 23 blocos. Neste estudo utilizou-se os blocos A (tipo de instituição), B (variáveis sociodemográficas), F (sarcopenia) e G (dor crônica). Os blocos A, B e G foram avaliados por meio do autorrelato do idoso e o bloco F por meio do Questionário SARC-F. A análise estatística utilizou a estatística descritiva e o teste Qui-Quadrado com relação de Pearson (p≤0,05).

RESULTADOS:

A amostra foi composta por 79 idosas (81,38±8,79 anos). A maioria com 80-89 anos, residentes em instituições privadas, brancas, viúvas e com escolaridade de 1 a 8 anos. Observou-se que 62% apresentaram sarcopenia e 41,8% apresentaram dor crônica, sendo que houve associação dessas variáveis (p=0,033). Não se observou associação entre a sarcopenia ou a dor crônica com a faixa etária (p>0,05).

CONCLUSÃO:

Houve associação entre a sarcopenia e a dor crônica em idosas institucionalizadas. A partir disso, ressalta-se a importância de ações interdisciplinares de prevenção e tratamento destinadas a esse público.

Descritores:
Dor; Dor crônica; Idoso; Instituição de longa permanência para idosos; Perfil de saúde; Sarcopenia

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Sarcopenia and chronic pain are geriatric syndromes that negatively impact the lives of the affected elderly, their families and the routine of health services, as is the case of long-term care institutions for the elderly. The objective of this study was to verify the relationship between sarcopenia and chronic pain in institutionalized elderly women.

METHODS:

A cross-sectional, population-based study was carried out in 24 long-term care institutions for the elderly, in Passo Fundo/RS (December 2016 - June 2017). The population was composed of 161 residents in these places, submitted to an instrument structured in 23 blocks. In this study, blocks A (type of institution), B (sociodemographic variables), F (sarcopenia) and G (chronic pain) were used. Blocks A, B and G were evaluated using the elderly self-report and the block F through the SARC-F Questionnaire. The statistical analysis used the descriptive statistics and the chi-square test with Pearson’s relation (p≤0.05).

RESULTS:

The sample consisted of 79 elderly women (81.38±8.79 years). The majority between 80 to 89 years, living in private institutions, white, widowed and with 1 to 8 years of education. It was observed that 62% had sarcopenia and 41.8% chronic pain, and these variables were associated (p=0.033). There was no association between sarcopenia or chronic pain with age (p>0.05).

CONCLUSION:

There was an association between sarcopenia and chronic pain in institutionalized elderly women. Based on this, it is emphasized the importance of interdisciplinary preventive and treatment actions to this audience.

Keywords:
Aged; Chronic pain; Health profile; Long-term care institutions for the elderly; Pain; Sarcopenia

INTRODUÇÃO

O crescente processo de envelhecimento da população não se restringe somente aos países desenvolvidos e estende-se à realidade dos países ainda em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. Isso desencadeia mudanças sociais, econômicas e de saúde, necessitando de cuidados de longa duração aos idosos que apresentam dificuldade nas atividades da vida diária e/ou aqueles cuja família não possua condições financeiras, físicas ou emocionais para prestar tais cuidados, especializados integralmente11 Reis LA, Torres GV. Influência da dor crônica na capacidade funcional de idosos institucionalizados. Rev Bras Enferm. 2011;64(2):274-80..

Cerca de 100 milhões de pessoas no mundo são acometidas por algum tipo de dor crônica de caráter osteomioarticular, sendo os idosos aqueles que sofrem maiores consequências. Planejar, implementar programas preventivos e controlar os sintomas são ações necessárias para manter e promover a funcionalidade e a qualidade de vida (QV) desses indivíduos22 Kayser B, Miotto C, Dal Molin V, Kummer J, Klein SR, Wibelinger LM. Influência da dor crônica na capacidade funcional do idoso. Rev Dor. 2014;15(1):48-50.. No Brasil, cerca de 85% dos idosos apresentam um algum tipo de doença crônica e 10% destes ainda possuem outras afecções concomitantes. A longevidade também acarreta o aumento do número de idosos com limitações funcionais e que necessitam de cuidados especiais constantemente33 Gonçalves LH, Alvarez AM, Sena EL, Santana LW, Vicente FR. Perfil da família cuidadora de idoso doente/fragilizado do contexto sociocultural de Florianópolis, SC. Texto Contexto - Enferm. 2006;15(4):570-7..

Após a terceira década de vida inicia-se o processo de perda das reservas, especialmente óssea e muscular44 Keller K, Engelhardt M. Strength and muscle mass loss with aging process. Age and strength loss. Muscles Ligaments Tendons J. 2014;3(4):346-50.. A perda de massa, força e função muscular denomina-se sarcopenia, condição estreitamente ligada ao envelhecimento55 Martín-Ponce E, Hernández-Betancor I, González-Reimers E, Hernández-Luis R, Martínez-Riera A, Santolaria F. Prognostic value of physical function tests: hand grip strength and six-minute walking test in elderly hospitalized patients. Sci Rep. 2014;4:7530.. Sua etiologia envolve vários fatores, como aspectos genéticos, aspectos metabólicos, o estilo de vida, fome, semi-inanição, doenças inflamatórias, atrofia muscular decorrente da insuficiência neuromuscular, mobilidade reduzida ou hipóxia crônica, podendo causar lesões gerais no organismo, percebidos ao longo da vida, e redução da capacidade fisiológica dos sistemas cardiovascular, respiratório, neuromuscular e metabólico55 Martín-Ponce E, Hernández-Betancor I, González-Reimers E, Hernández-Luis R, Martínez-Riera A, Santolaria F. Prognostic value of physical function tests: hand grip strength and six-minute walking test in elderly hospitalized patients. Sci Rep. 2014;4:7530.,66 Leite LE, Resende TL, Nogueira GM, Cruz IB, Schneider RH, Gottlieb MG. Envelhecimento, estresse oxidativo e sarcopenia: uma abordagem sistêmica. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):365-80.. Em linhas gerais, a sarcopenia é resultante do desequilíbrio entre a degradação e a síntese de proteínas77 Teixeira Vde O, Filippin LI, Xavier RM. Mechanisms of muscle wasting in sarcopenia. Rev Bras Reumatol. 2012;52(2):252-9. English, Portuguese. e pode estar associada ao aumento da morbidade e mortalidade em pessoas de meia-idade e idosos88 Ling CH, Taekema D, de Craen AJ, Gussekloo J, Westendorp RG, Maier AB. Handgrip strength and mortality in the oldest old population: the Leiden 85-plus study. CMAJ. 2010;182(5):429-35..

Devido à transição demográfica vivida atualmente houve um aumento exacerbado de idosos frágeis necessitando de cuidados especializados99 Cordeiro LM, Paulino JL, Bessa ME, Borges CL, Leite SF. Qualidade de vida do idoso fragilizado e institucionalizado. Acta Paul Enferm. 2015;28(4):361-6.. Em consequência ao comprometimento da capacidade funcional e às implicações no âmbito familiar, na comunidade, na saúde pública e na própria vida do idoso, houve um aumento na procura por instituições de longa permanência para idosos (ILPI), um local de atendimento integral para idosos, dependentes ou não, sem condições familiares ou domiciliares de permanência na sua comunidade de origem. Os efeitos da institucionalização nos idosos causam maior vulnerabilidade e dependência, o que influi negativamente na QV e no seu bem-estar1010 Gallon D, Gomes AR. Idosos institucionalizados e os efeitos do exercício no processo de envelhecimento musculoesquelético: uma revisão. RBCEH. 2012;8(1):137-47..

A associação entre incapacidade funcional, sexo e grupo etário demonstra que os idosos mais suscetíveis a desenvolver incapacidades são as mulheres e os longevos. Assim, as ações preventivas e promocionais de saúde devem ser dirigidas a esses indivíduos. A incapacidade funcional em idosos tornou-se um problema de saúde pública, gerando impacto para o indivíduo, seus familiares e serviços de saúde. Identificar tais alterações precocemente e seus fatores relacionados compete aos profissionais de saúde e deve ser incorporada à rotina dos serviços básicos de saúde em qualquer nível de atenção1111 Brito KQ, de Menezes TN, de Olinda RA. Functional disability and socioeconomic and demographic factors in elderly. Rev Bras Enferm. 2015;68(4):548-55, 633-40. English, Portuguese..

O objetivo deste estudo foi verificar a relação entre a sarcopenia e a dor crônica em idosas institucionalizadas.

MÉTODOS

Trata-se de um estudo de corte transversal, de base populacional, que faz parte de um projeto intitulado “Padrões de envelhecimento e longevidade: aspectos biológicos, educacionais e psicossociais de idosos institucionalizados” (PROCAD) desenvolvido pelo Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano da Universidade de Passo Fundo.

O estudo foi realizado no município de Passo Fundo, entre dezembro de 2016 e julho de 2017. Esta é uma das cidades mais populosas do Rio Grande do Sul, localizada ao norte do estado, distante 293 km da capital, Porto Alegre. A população estimada é de 198.799 mil habitantes, sendo que desses, 22.222 são idosos com 60 anos ou mais1212 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística. Cidades. Brasília, Brasil: 2017. Disponível em: <https://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil.php?codmun=431410>. Acesso em: 19 de novembro de 2017.
https://cidades.ibge.gov.br/xtras/perfil...
. Caracteriza-se como importante polo regional de saúde e de educação, assim como se destaca nos setores da agricultura, comércio e prestação de serviços. O município conta com 24 ILPI, as quais abrigam cerca de 450 idosos.

Para o cálculo amostral foi utilizada a fórmula “n=Z2.p.(1-p) / e2”, onde a letra “n” corresponde ao tamanho amostral desejado, a letra “Z” corresponde ao desvio do valor médio aceitável para alcançar o nível de confiança desejado (adotado o valor mais comumente utilizado para esse tipo de cálculo: 1,96), a letra “p” corresponde à proporção esperada (adotado o valor de 73,3%, levando-se em consideração os resultados de Reis e Torres, 201111 Reis LA, Torres GV. Influência da dor crônica na capacidade funcional de idosos institucionalizados. Rev Bras Enferm. 2011;64(2):274-80.) e a letra “e” corresponde à margem de erro admitida (adotado o valor mais comumente utilizado para esse tipo de cálculo: 0,05). Assim, o tamanho amostral necessário para responder ao objetivo deste estudo seria de 300 indivíduos.

Os critérios de inclusão foram indivíduos do sexo feminino, com idade igual ou superior a 60 anos, que residiam em ILPI na cidade de Passo Fundo/RS. Os critérios de exclusão foram indivíduos com dor aguda, incapazes de deambular, de verbalizar ou de realizar os testes propostos (restritos ao leito ou cadeira de rodas), que estivessem hospitalizados no dia do encontro com a equipe de pesquisa, portadores de sequelas neuromotoras ou que estivessem em quadro agudizados de doenças degenerativas. Foram considerados como perdas os indivíduos elegíveis que se recusaram a participar ou que não assinaram o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE). As participantes do estudo assinaram o TCLE.

A equipe de entrevistadores foi composta por mestrandos do Programa de Pós-Graduação em Envelhecimento Humano, graduandos de cursos da área da saúde, que poderiam ou não ser bolsistas de iniciação científica, todos vinculados a UPF e colaboradores. Todos os componentes da equipe foram apresentados ao projeto de pesquisa e passaram por um treinamento prévio, onde receberam orientações quanto à abordagem ao idoso e informações sobre o questionário, com instruções e esclarecimento de dúvidas. Todas as etapas foram supervisionadas e coordenadas por docentes da UPF.

O instrumento de coleta de dados utilizado foi um questionário estruturado pelo grupo de pesquisadores doutores da UPF, em conjunto com profissionais da mesma qualificação da Universidade de Campinas e da Universidade Católica de Brasília. Ele é composto por 23 blocos, porém no presente estudo, foram utilizadas as variáveis dos blocos A (tipo de ILPI), B (faixas etárias, cor, estado civil, escolaridade), F (sarcopenia) e G (dor crônica).

As informações dos blocos A e B foram avaliadas sob forma de entrevista com os responsáveis pelo departamento administrativo das ILPI. O bloco G, onde consta a informação sobre a ocorrência ou não de dor crônica, foi analisado por meio do autorrelato dos idosos (revisado com a equipe de saúde responsável). O bloco F foi realizado por meio do questionário SARC-F, traduzido e adaptado para a língua portuguesa.

O questionário SARC-F inclui cinco componentes: força (se o indivíduo conseguiria levantar 2,5kg), deambulação (se o indivíduo conseguiria andar por uma sala ou em seu quarto), levantar de uma cadeira (se o indivíduo conseguiria levantar de uma cadeira), subir escadas (se o indivíduo conseguiria subir um lance de 10 degraus) e quedas (se o indivíduo sofreu quedas no último ano). Os escores variam de zero a 2 pontos, sendo que para os quatro primeiros a interpretação é zero = sem dificuldade, 1 = alguma dificuldade e 2 = muita dificuldade ou incapacidade de fazer, enquanto para o último a interpretação é zero = não sofreram quedas no último ano, 1 = caíram 1-3 vezes no último ano e 2 = 4 ou mais quedas no último ano. Pontuavam para o indicativo de sarcopenia aqueles indivíduos com 04 pontos ou mais na soma total dos escores dos cinco componentes. O SARC-F apresenta uma excelente especificidade (94,2-99,1%), porém pouca sensibilidade (3,8-9,9%) para a classificação de sarcopenia1313 Malmstrom TK, Miller DK, Simonsick EM, Ferrucci L, Morley JE. SARC-F: a symptom score to predict persons with sarcopenia at risk for poor functional outcomes. J Cachexia Sarcopenia Muscle. 2016;7(1):28-36..

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética e Pesquisa em Seres Humano da UPF sob parecer número 2.097.278. O estudo está de acordo com as diretrizes da Resolução 466/2012, do Conselho Nacional de Saúde, que trata das normas regulamentadoras e dos aspectos éticos das pesquisas envolvendo seres humanos, e com a Declaração de Helsinki.

Análise estatística

A análise dos dados foi realizada por meio do software estatístico. Para a caracterização da amostra foi realizada a estatística descritiva e para o cruzamento dos dados foi realizado o teste Qui-Quadrado com relação de Pearson, considerando significativo um p≤0,05.

RESULTADOS

A população do estudo foi composta por 161 idosos residentes em ILPI do município de Passo Fundo/RS. Com base nos critérios de inclusão e exclusão, a amostra envolveu 79 idosas. A idade média dos indivíduos era de 81,38±8,79 anos (61-100 anos). A tabela 1 apresenta os dados referentes à caracterização da amostra estudada.

Tabela 1
Caracterização da amostra. Passo Fundo/RS, 2017

Observou-se que a maioria da amostra se concentrou na faixa etária dos 80-89 anos, residentes em ILPI privadas. Eram predominantemente da cor branca, viúvas e com escolaridade de 1 a 8 anos de estudos. Ainda, a maioria dos indivíduos apresentou indicativo de sarcopenia e um expressivo número de indivíduos relatou sofrer de dor crônica. A tabela 2 apresenta a relação entre a ocorrência de sarcopenia e a dor crônica na amostra estudada.

Tabela 2
Relação entre a sarcopenia e a dor crônica. Passo Fundo/RS, 2017

Observou-se que houve associação entre a sarcopenia e a dor crônica, sendo que os indivíduos com sarcopenia apresentaram maior prevalência de dor crônica. A tabela 3 apresenta a relação entre a sarcopenia e a dor crônica com as faixas etárias na amostra estudada.

Tabela 3
Relação entre a sarcopenia e as faixas etárias. Passo Fundo/RS, 2017

Não se observou relação entre a sarcopenia e as faixas etárias e nem entre a dor crônica e as faixas etárias.

DISCUSSÃO

Algumas informações encontradas neste estudo com relação aos aspectos sociodemográficos das idosas institucionalizadas corroboram a literatura. Observou-se, em fontes prévias, que a população geriátrica apresenta predomínio do sexo feminino e com baixo nível de escolaridade1414 Barbosa MH, Silva LC, Andrade EV, Luiz RB, Bolina AF, Mattia AL, et al. Evaluation of chronic pain in the institutionalized elderly. REME Rev Min Enferm. 2012;16(1):63-8.,1515 Rosa PV, Glock L, Berlezi EM, Rossato DD, Rosa LH. Perfil dos idosos residentes em instituições de longa permanência da região sul do país. RBCEH, Passo Fundo. 2011;8(1):38-47., este último frequentemente apresentado em estudos de perfis geriátricos, pois a educação era pouca valorizada na época em que os idosos de hoje viveram sua infância, principalmente para as mulheres1616 Alves-Silva JD, Scorsolini-Comin F, Santos MA. Idosos em instituições de longa permanência: desenvolvimento, condições de vida e saúde. Psicol Reflex Crit. 2013;26(4):820-30.. Embora a literatura demonstre que a maioria das instituições brasileiras é de natureza filantrópica, as mulheres predominam entre os residentes, confirmando a “feminilização da velhice”1717 Camarano AA, Kanso S. As instituições de longa permanência para idosos no Brasil. Rev Bras Estud Popul. 2010;27(1):232-5..

Os idosos institucionalizados podem apresentar um processo gradativo de deterioração na capacidade funcional e da autonomia, após a admissão na ILPI1515 Rosa PV, Glock L, Berlezi EM, Rossato DD, Rosa LH. Perfil dos idosos residentes em instituições de longa permanência da região sul do país. RBCEH, Passo Fundo. 2011;8(1):38-47., o que poderia estar relacionado com o surgimento de problemas de saúde, dentre eles a sarcopenia e a dor crônica. Além disso, a literatura aponta que as mulheres idosas apresentaram piores escores de QV em relação aos homens idosos, sobretudo em aspectos físicos1818 Castro LD, Freitas C, Gonçalves M, Lucca MG, Melo M, Silva JF, et al. Envelhecimento e qualidade de vida: um estudo comparativo entre mulheres e homens idosos de Uberlândia, Minas Gerais. E-Rac. 2014;4(1):1-11., tornando de interesse a escolha do tema do presente estudo direcionado ao público feminino residente em ILPI.

A dor crônica é vivenciada por grande parte dos idosos institucionalizados1414 Barbosa MH, Silva LC, Andrade EV, Luiz RB, Bolina AF, Mattia AL, et al. Evaluation of chronic pain in the institutionalized elderly. REME Rev Min Enferm. 2012;16(1):63-8., e a sarcopenia acomete a maior parte desses indivíduos. No Brasil, sua prevalência permeia em torno de 15,4% e é ligeiramente maior entre as mulheres (16,1%) em relação aos homens (14,4%). Com relação à idade, há um aumento drástico da prevalência de sarcopenia, sendo de 7,6% para os homens e 7,7% para as mulheres na faixa etária dos 60 a 69 anos, 19,5% para os homens e 19,4% para as mulheres na faixa etária dos 70-79 anos e 44,7% para os homens e 46,6% para as mulheres na faixa etária dos 80-89 anos1919 Alexandre TS, Duarte YA, Santos JL, Wong R, Lebrão ML. Prevalence and associated factors of sarcopenia among elderly in Brazil: findings from the SABE Study. J Nutr Health Aging 2014;18(3):284-90.. Além dos descritos, outros fatores como desnutrição, inatividade física, baixos índices de vitamina D e baixa ingestão de proteína estão relacionados com a sarcopenia2020 Freitas AF, Prado MA, Cação JC, Beretta D, Albertini S. Sarcopenia e estado nutricional de idosos: uma revisão de literatura. Arq Ciênc Saúde. 2015;22(1):9-13.. Em virtude disso, o presente estudo buscou verificar a ocorrência de sarcopenia e dor crônica em idosas institucionalizadas, e a relação entre essas variáveis.

A perda de massa muscular é considerada fisiológica com o processo de envelhecimento e isso aponta divergências entre os autores em classificar a sarcopenia como sendo ou não uma doença. No entanto, a sarcopenia causa uma perda acentuada da massa muscular, provocando uma dependência funcional e interferindo negativamente na qualidade de vida do indivíduo66 Leite LE, Resende TL, Nogueira GM, Cruz IB, Schneider RH, Gottlieb MG. Envelhecimento, estresse oxidativo e sarcopenia: uma abordagem sistêmica. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2012;15(2):365-80.. A partir dos 60 anos de idade ocorre um aumento da prevalência de sarcopenia, e o Brasil torna-se o segundo país no mundo nesse aspecto. A sarcopenia é frequentemente associada à baixa capacidade física, limitações funcionais, incapacidade, comorbidades, condição social, maus hábitos de vida e quedas2121 Diz JB, Queiroz BZ, Tavares LB, Pereira LS. Prevalência de sarcopenia em idosos: resultados de estudos transversais amplos em diferentes países. Rev Bras Geriatr Gerontol. 2015;18(3):665-78., e esse conjunto de fatores também está relacionado à institucionalização dos idosos.

Um estudo que objetivou investigar os fatores associados à sarcopenia em diferentes faixas etárias de indivíduos coreanos, verificou que na faixa etária de 65 anos ou mais houve maior ocorrência de sarcopenia e sua prevalência associou-se com os indivíduos que sofriam com problemas de mobilidade, dificuldade nas atividades de vida diária e dor2222 Bae E, Kim Y. Factors affecting sarcopenia in Korean adults by age groups. CMAJ. 2017;8(3):169-78., o que corrobora o presente estudo onde verificou-se associação entre a sarcopenia e a dor crônica nas idosas institucionalizadas.

Um estudo apontou para uma prevalência de 73,3% de dor crônica em idosos residentes numa ILPI11 Reis LA, Torres GV. Influência da dor crônica na capacidade funcional de idosos institucionalizados. Rev Bras Enferm. 2011;64(2):274-80., dado esse que vai ao encontro dos resultados do presente estudo, onde a maioria dos indivíduos não relatou sofrer de dor crônica, embora tenha ocorrido um expressivo número de casos (41%).

Os idosos sujeitos a um quadro doloroso podem excluir-se socialmente e estarem propensos ao sedentarismo, à diminuição da autoestima e ao abandono dos autocuidados. O comprometimento da capacidade funcional pode resultar em dependência física e mental e incapacidade de realizar as atividades de vida diária11 Reis LA, Torres GV. Influência da dor crônica na capacidade funcional de idosos institucionalizados. Rev Bras Enferm. 2011;64(2):274-80., reforçando a ideia de que a sarcopenia possa ser desencadeada em virtude da inanição do idoso que sofra de dor crônica.

Os resultados presentes corroboram o estudo de Barbosa et al.2323 Barbosa MH, Bolina AF, Tavares JL, Cordeiro AL, Luiz RB, de Oliveira KF. Sociodemographic and health factors associated with chronic pain in institutionalized elderly. Rev Lat Am Enfermagem. 2014;22(6):1009-16. English, Portuguese, Spanish., onde analisou-se 124 idosos institucionalizados e constatou-se predomínio do sexo feminino, da faixa etária dos 70 a 80 anos, de indivíduos solteiros, com escolaridade básica e que não praticavam atividade física regularmente. A dor crônica prevaleceu em 58,1% da amostra e os idosos longevos apresentaram 70% a mais de chances de relatar dor crônica em comparação aos idosos não longevos.

Acredita-se que a idade elevada encontrada em grande parte dos estudos realizados em ILPI pode estar atribuída ao aumento de dependência dos idosos em realizar as atividades de vida diária, necessitando, assim, de cuidados integrais de saúde física e cognitiva. Além disso, idosos que vivem em ILPI apresentam maior quadro álgico e menor mobilidade quando comparados aos idosos não institucionalizados2424 Santos AR, Lopes BM, Lorenzini M, Resende TL. Depressão e mobilidade em idosos com dor crônica, institucionalizados e não institucionalizados. Rev Graduação. 2011;4(2):1-18.. O que sugere que a institucionalização possa ser um fator determinante para a associação entre a sarcopenia e a dor crônica, como apontado no presente estudo.

Reforçando o apontamento anterior, um estudo realizado com 75 mulheres idosas não institucionalizadas, randomizadas em um grupo com sarcopenia (n=24) e grupo controle (n=51), identificou que a dor não foi um fator determinante para o desenvolvimento de sarcopenia na amostra2525 Lima AR, Portes LA, Oliveira NC, Alfieri FM. Limiar de tolerância de dor à pressão, estilo de vida, força muscular e capacidade funcional em idosas com sarcopenia. Acta Fisiatr. 2016;23(2):73-7., dados esses que vão ao encontro do estudo atual, onde observou-se a associação entre sarcopenia e dor crônica nas idosas institucionalizadas.

O presente estudo não está livre de apresentar limitações. Por tratar-se de um estudo de grande magnitude, foi necessária uma grande equipe para realizar a coleta de dados. Dessa forma, os entrevistadores e aplicadores dos testes propostos não foram os mesmos para coletar os dados de todos os indivíduos incluídos na pesquisa. Para minimizar possíveis vieses, eles foram treinados e orientados previamente, como explicado na seção “métodos” deste estudo. Além disso, o número abaixo do esperado para o tamanho amostral e a não diferenciação dos indivíduos por doenças ou outras causas de dor crônica são fatores que limitam, porém não inviabilizam a geração de dados incentivando futuras pesquisas dentro desta temática.

CONCLUSÃO

Houve associação entre a sarcopenia e a dor crônica em idosas institucionalizadas. A partir disso, ressalta-se a importância de ações interdisciplinares de prevenção e tratamento destinadas a este público.

  • Fontes de fomento: Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), PROCAD Nº 71/2013.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Oct-Dec 2018

Histórico

  • Recebido
    09 Dez 2017
  • Aceito
    20 Ago 2018
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