Acessibilidade / Reportar erro

Efeito de células-tronco mesenquimais na regeneração das estruturas associadas à articulação temporomandibular: revisão narrativa

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

As desordens temporomandibulares constituem-se em um termo coletivo de problemas que envolvem os músculos mastigatórios e/ou a articulação temporomandibular. Dentre esses, destacam-se os processos degenerativos ósseos e do disco articular, contudo, ainda não foi identificado na literatura um tratamento eficaz para esses casos. Dessa forma, o objetivo desse estudo foi avaliar o potencial reparador das células-tronco mesenquimais sobre as alterações degenerativas das estruturas associadas à articulação temporomandibular em humanos e em modelos animais.

CONTEÚDO:

Foram incluídos ensaios de intervenção em humanos e em animais que apresentassem como variável desfecho o reparo dos discos articulares e/ou da articulação temporomandibular. Foram realizadas buscas nas seguintes bases de dados: Pubmed, LILACS, Scielo e Google Acadêmico. Os títulos e resumos foram analisados para a pré-seleção dos artigos potencialmente elegíveis para sua inclusão. As informações coletadas de cada artigo foram incluídas em planilha específica para essa finalidade contendo o ano de publicação, título do artigo, nome do autor, local do estudo, tipo de estudo, metodologia, resultado e conclusões. Foram selecionados 2 estudos em humanos e 4 estudos em animais para compor este estudo. Em todas essas pesquisas apresentadas, a presença de células-tronco foi capaz de melhorar parâmetros clínicos, histológicos e morfológicos da articulação temporomandibular.

CONCLUSÃO:

O uso de células-tronco parece ser eficaz no tratamento das alterações degenerativas das estruturas associadas à articulação temporomandibular. Todavia, devido ao reduzido número de estudos e sua heterogeneidade, os resultados apresentados devem ser avaliados com parcimônia.

Descritores:
Células-tronco; Disco da articulação temporomandibular; Transtornos da articulação temporomandibular

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Temporomandibular disorders are the problems involving the masticatory muscles and/or the temporomandibular joint and, among them, the bone and joint disc degenerative processes stand out. However, an effective treatment for these cases has not yet been identified in the literature. Thus, the primary objective of this study was to evaluate the reparative potential of mesenchymal stem cells on degenerative changes in structures associated with the temporomandibular joint in humans and animal models.

CONTENTS:

This narrative review included intervention trials in humans and animals that presented as an outcome variable the repair of joint discs and/or temporomandibular joint. The following databases were used: Pubmed, LILACS, Scielo and Google Scholar. Titles and abstracts were analyzed for the pre-selection of articles potentially eligible for inclusion in this review. The information collected from each article was included in a specific spreadsheet for this purpose containing the year of publication, article title, author’s name, study location, type of study, methodology, results, and conclusions. Two human studies and four animal studies were selected to compose the narrative review. In all studies presented, the presence of stem cells was able to improve the clinical, histological, and morphological parameters of the temporomandibular joint.

CONCLUSION:

The use of stem cells seems to be effective in treating degenerative changes in temporomandibular joint associated structures in both animal and human models. However, due to the small number of studies and their heterogeneity, the results presented should be evaluated sparingly.

Keywords:
Stem cells; Temporomandibular joint disc; Temporomandibular joint disorders

INTRODUÇÃO

As desordens temporomandibulares (DTM) constituem-se em um termo coletivo de problemas que envolvem os músculos mastigatórios e/ou a articulação temporomandibular (ATM). Dor, estalidos e limitação mandibular formam a clássica tríade de sintomas das DTMs, podendo ser referidos aos músculos mastigatórios, à área pré-auricular ou ambos11 Okeson JP, de Leeuw R. Differential diagnosis of temporomandibular disorders and other orofacial pain disorders. Dent Clin North Am. 2011;55(1):105-20.,22 Ohrbach R, Dworkin SF. The evolution of TMD diagnosis: past, present, future. J Dent Res. 2016;95(10):1093-101.. Os seus subtipos mais comuns incluem as dores musculares e articulares, principalmente os deslocamentos do disco articular e as doenças articulares degenerativas22 Ohrbach R, Dworkin SF. The evolution of TMD diagnosis: past, present, future. J Dent Res. 2016;95(10):1093-101.. Estudos epidemiológicos demonstraram que 20-25% da população apresentou, ao menos, um sintoma associado à DTM22 Ohrbach R, Dworkin SF. The evolution of TMD diagnosis: past, present, future. J Dent Res. 2016;95(10):1093-101..

Quando as alternativas conservadoras para o tratamento das alterações articulares não são efetivas, pode ocorrer a progressão da doença, culminando na modificação das estruturas ósseas e do disco articular. O mecanismo do fenômeno doloroso ainda não foi completamente elucidado, todavia sabe-se que quando a membrana sinovial da ATM está danificada, muitas citocinas inflamatórias são produzidas e secretadas para o líquido sinovial, fomentando o processo degenerativo e doloroso, o qual varia bastante entre os pacientes33 Kellesarian SV, Al-Kheraif AA, Vohra F, Ghanem A, Malmstrom H, Romanos GE, et al. Cytokine profile in the synovial fluid of patients with temporomandibular joint disorders: a systematic review. Cytokine. 2016;77:98-106..

As superfícies articulares da ATM são constituídas pelo osso temporal, a fossa mandibular, o tubérculo articular e o côndilo mandibular (CM). A parte escamosa do osso temporal faz parte da formação do arco zigomático e da ATM, incluindo em sua extensão a fossa mandibular e o tubérculo articular, que atuam como anteparo para o côndilo da mandíbula durante a sua movimentação44 Grossmann E. Algias Craniofaciais: Diagnóstico e Tratamento. São Paulo: Editora dos Editores; 2019..

Do ponto de vista anatômico, o CM é mediolateralmente mais longo do que no sentido anteroposterior, formando uma elipse no plano transversal. O tecido conjuntivo fibroso se estende até a periferia do disco, fixando o disco articular ao côndilo da mandíbula inferiormente e ao osso temporal superiormente. Anteriormente e posteriormente, o CM se conecta ao disco da ATM via ligamentos capsulares, enquanto mediolateralmente, conecta-se ao disco através dos ligamentos colaterais. Esse arranjo garante um contato próximo entre o disco e o CM durante o movimento articular44 Grossmann E. Algias Craniofaciais: Diagnóstico e Tratamento. São Paulo: Editora dos Editores; 2019..

O disco da ATM é caracterizado como uma fibrocartilagem e está localizado entre o CM e o osso temporal, provendo os movimentos de rotação e translação mandibular55 Willard VP, Kalpakci KN, Reimer AJ, Athanasiou KA. The regional contribution of glycosaminoglycans to temporomandibular joint disc compressive properties. J Biomech Eng. 2012;134(1):1-8.. A matriz extracelular do disco articular é composta por uma trama de colágeno do tipo I, que representa 80-90% do seu peso seco55 Willard VP, Kalpakci KN, Reimer AJ, Athanasiou KA. The regional contribution of glycosaminoglycans to temporomandibular joint disc compressive properties. J Biomech Eng. 2012;134(1):1-8., e glicosaminoglicanos (GAGs), os quais representam até 10% do seu peso66 Fazaeli S, Ghazanfari S, Everts V, Smit TH, Koolstra JH. The contribution of collagen fibers to the mechanical compressive properties of the temporomandibular joint disc. Osteoarthritis Cartilage. 2016;24(7):1292-301.. Aproximadamente dois terços das suas células são fibroblastos, enquanto um terço apresenta morfologia semelhante aos condroblastos77 Mäenpää K, Ellä V, Mauno J, Kellomäki M, Suuronen R, Ylikomi T, et al. Use of adipose stem cells and polylactide discs for tissue engineering of the temporomandibular joint disc. J R Soc Interface. 2010;7(42):177-88..

Apesar das funções e das propriedades mecânicas do disco articular da ATM já estarem bem descritos, ainda não estão claras as suas características biomecânicas nos processos inflamatórios e degenerativos33 Kellesarian SV, Al-Kheraif AA, Vohra F, Ghanem A, Malmstrom H, Romanos GE, et al. Cytokine profile in the synovial fluid of patients with temporomandibular joint disorders: a systematic review. Cytokine. 2016;77:98-106.,55 Willard VP, Kalpakci KN, Reimer AJ, Athanasiou KA. The regional contribution of glycosaminoglycans to temporomandibular joint disc compressive properties. J Biomech Eng. 2012;134(1):1-8.,88 Colombo V, Palla S, Gallo LM. Temporomandibular joint loading patterns related to joint morphology: a theoretical study. Cells Tissues Organs. 2008;187(4):295-306.. Nesse contexto, o estudo99 Wang XD, Cui SJ, Liu Y, Luo Q, Du RJ, Kou XX, et al. Deterioration of mechanical properties of discs in chronically inflamed TMJ. J Dent Res. 2014;93(11):1170-6. destaca que tanto o disco articular como a membrana sinovial podem sofrer processos degenerativos após processos inflamatórios crônicos.

Considera-se que a morte de condrócitos causada por apoptose ou necrose é uma característica central na doença osteoartrítica clínica ou experimentalmente. Diversas terapias foram instituídas com a intenção de recuperar a lesão articular apresentada em modelos animais, todavia não foram capazes de estimular a proliferação local de condrócitos1010 Wang XD, Kou XX, Mao JJ, Gan YH, Zhou YH. Sustained inflammation induces degeneration of the temporomandibular joint. J Dent Res. 2012;91(5):499-505..

As células-tronco mesenquimais (CTM) são células multipotentes presentes em uma grande variedade de tecidos. Elas constituem uma fonte de tecidos originários da mesoderme, como o tecido ósseo, o cartilaginoso e o adiposo. Essas células são capazes de adotar uma morfologia fibroblastoide e, sob condições especiais, se diferenciam em adipócitos, condrócitos e osteócitos1111 Farrar WB. Characteristics of the condylar path in internal derangements of the TMJ. J Prosthet Dent. 1978;39(3):319-23.

12 Saleh R, Reza HM. Short review on human umbilical cord lining epithelial cells and their potential clinical applications. Stem Cell Res Ther. 2017;8(1):222.
-1313 Huh Y, Ji RR, Chen G. Neuroinflammation, bone marrow stem cells, and chronic pain. Front Immunol. 2017;8:1014..

Evidências também sugerem a existência de CTMs associadas ao fluido sinovial obtido de pacientes submetidos à artrocentese da ATM1414 de Souza Tesch R, Takamori ER, Menezes K, Carias RBV, Dutra CLM, de Freitas Aguiar M, et al. Temporomandibular joint regeneration: proposal of a novel treatment for condylar resorption after orthognathic surgery using transplantation of autologous nasal septum chondrocytes, and the first human case report. Stem Cell Res Ther. 2018;9(1):94.. Além disso, estudos recentes sugerem que a utilização de células-tronco em modelos animais de dor inflamatória, dor neuropática e associada ao câncer produzem poderosos efeitos analgésicos1313 Huh Y, Ji RR, Chen G. Neuroinflammation, bone marrow stem cells, and chronic pain. Front Immunol. 2017;8:1014..

Partindo da perspectiva que ainda não está identificado na literatura um tratamento eficaz para os casos de degeneração das estruturas associadas à ATM e do potencial formador de tecidos e analgésico das CTMs, o objetivo primário deste estudo foi avaliar o potencial reparador das CTMs sobre as alterações degenerativas das estruturas associadas à ATM em humanos e em modelos animais.

CONTEÚDO

Foi realizada uma revisão da literatura utilizando-se as bases de dados Pubmed, LILACS, Scielo e Google (literatura cinza). A estratégia de busca foi dividida para tornar mais sensível a seleção dos artigos. Para a busca em humanos, foram utilizados os seguintes descritores: ((“temporomandibular joint” [MeSH Terms] OR (“temporomandibular”[All Fields] AND “joint”[All Fields]) OR “temporomandibular joint” [All Fields]) AND (“stem cells”[MeSH Terms] OR (“stem”[All Fields] AND “cells”[All Fields]) OR “stem cells” [All Fields])) AND “humans” [MeSH Terms]. Para a busca em animais, foram utilizados os seguintes: ((“temporomandibular joint”[MeSH Terms] OR (“temporomandibular”[All Fields] AND “joint” [All Fields]) OR “temporomandibular joint” [All Fields]) AND (“stem cells” [MeSH Terms] OR (“stem” [All Fields] AND “cells” [All Fields]) OR “stem cells” [All Fields])) AND “animals” [MeSH Terms:noexp].

Estratégias de buscas manuais foram realizadas na lista de referências das publicações incluídas no estudo. Os títulos e resumos foram analisados para a pré-seleção dos artigos potencialmente elegíveis para inclusão no estudo.

Foram incluídos os artigos cujos delineamentos fossem ensaios de intervenção em animais ou humanos e que apresentassem como variável desfecho o reparo dos discos articulares e/ou das estruturas ósseas da ATM utilizando CTMs. Foram excluídos estudos de revisão de literatura, estudos in vitro, estudos realizados de forma subcutânea e os que não apresentassem a referida variável desfecho. Não foram incluídas restrições referentes ao período de publicação do manuscrito, exceto para o Google Acadêmico onde a busca foi realizada nos últimos 3 anos a fim de identificar os estudos mais recentes. As informações coletadas para a análise qualitativa foram: autores, ano, local de publicação, metodologia, resultados e conclusões.

Foram encontrados 527 artigos através da utilização dos descritores estipulados para avaliação da efetividade do uso das CTMs na regeneração das estruturas relacionadas à ATM em humanos. Destes, 52 foram localizados através do Pubmed e 475 no Google Acadêmico. Nas bases de dados LILACS e Scielo não foram encontrados artigos. Após a leitura dos títulos e resumos, foram selecionados 3 artigos para leitura na íntegra, conforme a figura 1. Desses, apenas 2 foram incluídos para a análise qualitativa, perfazendo um total de 41 pacientes (28 mulheres e 13 homens), com idades que variaram entre 23 e 47 anos. Os países de origem dos estudos foram Brasil e Itália.

Figura 1
Fluxograma para seleção dos artigos em humanos

Para os estudos em animais, foram encontrados 330 artigos, sendo 65 no Pubmed e 265 no Google Acadêmico. Nas bases de dados LILACS e Scielo não foram encontrados artigos. Após a leitura dos títulos e resumos, foram selecionados 14 artigos para leitura na íntegra, conforme a figura 2. Desses, 10 foram excluídos, restando 4 artigos para a leitura na íntegra. Os estudos foram realizados na Finlândia, Egito, China, Estados Unidos e Itália.

Figura 2
Fluxograma para seleção dos artigos em animais

Os dados foram tabulados e apresentados na tabela 1 (estudos em humanos) e tabela 2 (estudos em animais).

Tabela 1
Apresentação dos estudos realizados em humanos incluídos na revisão
Tabela 2
Apresentação dos estudos realizados em animais incluídos na revisão

DISCUSSÃO

Após a leitura crítica dos estudos, foi possível identificar resultados promissores com a utilização das CTMs, tanto em humanos quanto em modelos animais, nas perspectivas clínica, histológica e morfológica.

A engenharia tecidual tem procurado encontrar substâncias que possam substituir os discos removidos, incluindo substâncias autógenas, tais como a derme e a fáscia do músculo temporal, até materiais sintéticos produzidos a partir do silicone e politetrafluoretano. Nas últimas décadas, a implantação de condrócitos autólogos (ACI) desenvolveu-se rapidamente. No entanto, a velocidade limitada de proliferação celular e diferenciação de condrócitos durante culturas in vitro restringiu o uso de ACI2020 Nejadnik H, Hui JH, Feng Choong EP, Tai BC, Lee EH. Autologous bone marrow-derived mesenchymal stem cells versus autologous chondrocyte implantation: an observational cohort study. Am J Sports Med. 2010;38(6):1110-6..

Por outro lado, as CTMs tornaram-se objeto de crescente estudo nessa área devido a sua alta capacidade proliferativa, custo inferior e menor morbidade ao local do doador2020 Nejadnik H, Hui JH, Feng Choong EP, Tai BC, Lee EH. Autologous bone marrow-derived mesenchymal stem cells versus autologous chondrocyte implantation: an observational cohort study. Am J Sports Med. 2010;38(6):1110-6.. Sua obtenção tem sido associada a polpa dentária, tecido adiposo, cordão umbilical e, mais recentemente, o septo nasal1414 de Souza Tesch R, Takamori ER, Menezes K, Carias RBV, Dutra CLM, de Freitas Aguiar M, et al. Temporomandibular joint regeneration: proposal of a novel treatment for condylar resorption after orthognathic surgery using transplantation of autologous nasal septum chondrocytes, and the first human case report. Stem Cell Res Ther. 2018;9(1):94.. Durante o crescimento in vitro, as CTMs formam colônias chamadas unidade formadora de colônia fibroblástica (CFU-F). A caracterização fenotípica dessas células revela a expressão de CD44, CD29, CD105, CD73 e CD166 e ausência de marcadores de linhagem hematopoiética, como CD45 e CD342121 Kanafi MM, Ramesh A, Gupta PK, Bhonde RR. Dental pulp stem cells immobilized in alginate microspheres for applications in bone tissue engineering. Int Endod J. 2014;47(7):687-97..

Várias alternativas terapêuticas têm sido propostas para recuperar a função e melhora dos parâmetros clínicos em indivíduos que apresentaram alterações articulares. Nesse contexto, as alterações do disco articular são classificadas em 4 estágios com características patológicas progressivas: a) Deslocamento do disco articular. Estágio 1: deslocamento do disco articular com redução; Estágio 2: deslocamento do disco articular com redução e travamento fechado intermitente; Estágio 3: deslocamento do disco articular sem redução (travamento fechado); Estágio 4: deslocamento do disco articular sem redução com evidência de perfuração do disco articular ou doença articular degenerativa2222 Salash JR, Hossameldin RH, Almarza AJ, Chou JC, McCain JP, Mercuri LG, et al. Potential indications for tissue engineering in temporomandibular joint surgery. J Oral Maxillofac Surg. 2016;74(4):705-11.. Dessa forma, ficou evidente que as abordagens terapêuticas devem estar relacionadas à gravidade da alteração apresentada pelo paciente e sua implicação clínica, tendo na infiltração articular de CTMs mais um promissor tratamento para essas doenças2222 Salash JR, Hossameldin RH, Almarza AJ, Chou JC, McCain JP, Mercuri LG, et al. Potential indications for tissue engineering in temporomandibular joint surgery. J Oral Maxillofac Surg. 2016;74(4):705-11..

Em relação às evidências apresentadas nos dois estudos realizados em humanos, observou-se melhora dos parâmetros clínicos, bem como a presença de reparo ósseo avaliado através de exames de imagem. Todavia, o número de estudos e de pacientes ainda é bastante reduzido, devendo ser ampliado para que se possa ter resultados mais robustos e concretos em relação à utilização de CTMs. Além disso, devem ser estabelecidos padrões ouro para a definição de critérios diagnósticos a fim de padronizar os estudos e os seus resultados derivados.

Quanto às pesquisas realizadas em animais, caracterizadas como estudos pré-clinicos, foi possível observar comportamento semelhante ao obtido em humanos no que tange à recuperação da morfologia das estruturas afetadas pelos modelos de osteoartrite da ATM. Todavia, cabe ressaltar que há presença de modelos bastante heterogêneos entre os diferentes estudos. Neste contexto, o estudo2323 Helgeland E, Shanbhag S, Pedersen TO, Mustafa K, Rosén A. Scaffold-based temporomandibular joint tissue regeneration in experimental animal models: a systematic review Tissue Eng Part B Rev. 2018;24(4):300-16. relatou que estudos realizados em uma única espécie animal não são capazes de prover resultados experimentais padrão com repeito às alterações da ATM, sendo necessária a obtenção de modelos animais mais fidedignos2424 Zhang M, Yang H, Lu L, Wan X, Zhang J, Zhang H, et al. Matrix replenishing by BMSCs is beneficial for osteoarthritic temporomandibular joint cartilage. Osteoarthritis Cartilage. 2017;25(9):1551-62..

O exato mecanismo através do qual a presença de CTMs é capaz de melhorar as alterações degenerativas presentes na ATM ainda é pouco conhecido. Todavia, acredita-se que fatores de crescimento tais como o fator de crescimento tumoral β1 (TGF-β1) e a família das proteínas morfogenéticas ósseas (BMPs) estão diretamente envolvidas nesse processo2323 Helgeland E, Shanbhag S, Pedersen TO, Mustafa K, Rosén A. Scaffold-based temporomandibular joint tissue regeneration in experimental animal models: a systematic review Tissue Eng Part B Rev. 2018;24(4):300-16.. Além disso, autores2525 Zhou Y, Wang T, Hamilton JL, Chen D. Wnt/?-catenin signaling in osteoarthritis and in other forms of arthritis. Curr Rheumatol Rep. 2017;19(9):53. demonstraram que a regulação da via Wnt promove o reparo das cartilagens mediado pela presença de CTMs.

Em relação a redução da dor e do processo inflamatório, vários estudos relatam alívio da dor com a administração de CTMs em modelos de roedores após injeção sistêmica ou local. A injeção percutânea de CTMs também causou alívio, em longo prazo, em um estudo piloto de dor discogênica lombar em seres humanos2626 Chen G, Park CK, Xie RG, Ji RR. Intrathecal bone marrow stromal cells inhibit neuropathic pain via TGF-? secretion. J Clin Invest. 2015;125(8):3226-40.. Além disso, outro estudo2727 Di Cesare Mannelli L, Tenci B, Micheli L, Vona A, Corti F, Zanardelli M, et al. Adipose-derived stem cells decrease pain in a rat model of oxaliplatin-induced neuropathy: role of VEGF-A modulation. Neuropharmacology. 2018;131:166-75. demonstrou que o uso de CTMs pode representar uma nova abordagem no tratamento da dor neuropática através da redução significativa da dor. Estes resultados colaboram ainda mais para a compreensão do alívio da dor mediado pelo uso de CTMs.

Dentre os vieses dos estudos em animais, apenas um estudo apresentou cálculo amostral para a realização dos experimentos. Além disso, a necessidade do aparato laboratorial para diferenciação das CTMs ainda impede a aproximação da técnica com a clínica odontológica, sendo necessário o estabelecimento de protocolos mais simples para que possam ser utilizados na rotina odontológica.

CONCLUSÃO

O uso de CTMs parece ser eficaz no tratamento das alterações degenerativas das estruturas associadas à ATM tanto em modelos animais quanto em humanos. Devido ao reduzido número de estudos e sua heterogeneidade, os resultados apresentados devem ser avaliados com parcimônia. Um número maior de pesquisas deve ser realizado a fim de produzir evidências mais robustas em relação à implementação dessa nova terapia.

REFERENCES

  • 1
    Okeson JP, de Leeuw R. Differential diagnosis of temporomandibular disorders and other orofacial pain disorders. Dent Clin North Am. 2011;55(1):105-20.
  • 2
    Ohrbach R, Dworkin SF. The evolution of TMD diagnosis: past, present, future. J Dent Res. 2016;95(10):1093-101.
  • 3
    Kellesarian SV, Al-Kheraif AA, Vohra F, Ghanem A, Malmstrom H, Romanos GE, et al. Cytokine profile in the synovial fluid of patients with temporomandibular joint disorders: a systematic review. Cytokine. 2016;77:98-106.
  • 4
    Grossmann E. Algias Craniofaciais: Diagnóstico e Tratamento. São Paulo: Editora dos Editores; 2019.
  • 5
    Willard VP, Kalpakci KN, Reimer AJ, Athanasiou KA. The regional contribution of glycosaminoglycans to temporomandibular joint disc compressive properties. J Biomech Eng. 2012;134(1):1-8.
  • 6
    Fazaeli S, Ghazanfari S, Everts V, Smit TH, Koolstra JH. The contribution of collagen fibers to the mechanical compressive properties of the temporomandibular joint disc. Osteoarthritis Cartilage. 2016;24(7):1292-301.
  • 7
    Mäenpää K, Ellä V, Mauno J, Kellomäki M, Suuronen R, Ylikomi T, et al. Use of adipose stem cells and polylactide discs for tissue engineering of the temporomandibular joint disc. J R Soc Interface. 2010;7(42):177-88.
  • 8
    Colombo V, Palla S, Gallo LM. Temporomandibular joint loading patterns related to joint morphology: a theoretical study. Cells Tissues Organs. 2008;187(4):295-306.
  • 9
    Wang XD, Cui SJ, Liu Y, Luo Q, Du RJ, Kou XX, et al. Deterioration of mechanical properties of discs in chronically inflamed TMJ. J Dent Res. 2014;93(11):1170-6.
  • 10
    Wang XD, Kou XX, Mao JJ, Gan YH, Zhou YH. Sustained inflammation induces degeneration of the temporomandibular joint. J Dent Res. 2012;91(5):499-505.
  • 11
    Farrar WB. Characteristics of the condylar path in internal derangements of the TMJ. J Prosthet Dent. 1978;39(3):319-23.
  • 12
    Saleh R, Reza HM. Short review on human umbilical cord lining epithelial cells and their potential clinical applications. Stem Cell Res Ther. 2017;8(1):222.
  • 13
    Huh Y, Ji RR, Chen G. Neuroinflammation, bone marrow stem cells, and chronic pain. Front Immunol. 2017;8:1014.
  • 14
    de Souza Tesch R, Takamori ER, Menezes K, Carias RBV, Dutra CLM, de Freitas Aguiar M, et al. Temporomandibular joint regeneration: proposal of a novel treatment for condylar resorption after orthognathic surgery using transplantation of autologous nasal septum chondrocytes, and the first human case report. Stem Cell Res Ther. 2018;9(1):94.
  • 15
    Carboni A, Amodeo G, Perugini M, Arangio P, Orsini R, Scopelliti D. Temporomandibular disorders clinical and anatomical outcomes after fat-derived stem cells injection. J Craniofac Surg. 2019;30(3):793-7.
  • 16
    Ahtiainen K, Mauno J, Ellä V, Hagström J, Lindqvist C, Miettinen S, et al. Autologous adipose stem cells and polylactide discs in the replacement of the rabbit temporomandibular joint disc. J R Soc Interface. 2013;10(85):20130287.
  • 17
    Ciocca L, Donati D, Ragazzini S, Dozza B, Rossi F, Fantini M, et al. Mesenchymal stem cells and platelet gel improve bone deposition within CAD-CAM custom-made ceramic HA scaffolds for condyle substitution. Biomed Res Int. 2013;2013:549762.
  • 18
    Zhang M, Yang H, Lu L, Wan X, Zhang J, Zhang H, et al. Matrix replenishing by BMSCs is beneficial for osteoarthritic temporomandibular joint cartilage. Osteoarthritis Cartilage. 2017;25(9):1551-62.
  • 19
    Zaki AA, Zaghloul M, Helal ME, Mansour NA, Grawish ME. Impact of autologous bone marrow-derived stem cells on degenerative changes of articulating surfaces associated with the arthritic temporomandibular joint: an experimental study in Rabbits. J Oral Maxillofac Surg. 2017;75(12):2529-39.
  • 20
    Nejadnik H, Hui JH, Feng Choong EP, Tai BC, Lee EH. Autologous bone marrow-derived mesenchymal stem cells versus autologous chondrocyte implantation: an observational cohort study. Am J Sports Med. 2010;38(6):1110-6.
  • 21
    Kanafi MM, Ramesh A, Gupta PK, Bhonde RR. Dental pulp stem cells immobilized in alginate microspheres for applications in bone tissue engineering. Int Endod J. 2014;47(7):687-97.
  • 22
    Salash JR, Hossameldin RH, Almarza AJ, Chou JC, McCain JP, Mercuri LG, et al. Potential indications for tissue engineering in temporomandibular joint surgery. J Oral Maxillofac Surg. 2016;74(4):705-11.
  • 23
    Helgeland E, Shanbhag S, Pedersen TO, Mustafa K, Rosén A. Scaffold-based temporomandibular joint tissue regeneration in experimental animal models: a systematic review Tissue Eng Part B Rev. 2018;24(4):300-16.
  • 24
    Zhang M, Yang H, Lu L, Wan X, Zhang J, Zhang H, et al. Matrix replenishing by BMSCs is beneficial for osteoarthritic temporomandibular joint cartilage. Osteoarthritis Cartilage. 2017;25(9):1551-62.
  • 25
    Zhou Y, Wang T, Hamilton JL, Chen D. Wnt/?-catenin signaling in osteoarthritis and in other forms of arthritis. Curr Rheumatol Rep. 2017;19(9):53.
  • 26
    Chen G, Park CK, Xie RG, Ji RR. Intrathecal bone marrow stromal cells inhibit neuropathic pain via TGF-? secretion. J Clin Invest. 2015;125(8):3226-40.
  • 27
    Di Cesare Mannelli L, Tenci B, Micheli L, Vona A, Corti F, Zanardelli M, et al. Adipose-derived stem cells decrease pain in a rat model of oxaliplatin-induced neuropathy: role of VEGF-A modulation. Neuropharmacology. 2018;131:166-75.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    12 Abr 2020
  • Aceito
    01 Jun 2020
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br