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Indicação do uso de canabinoides

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

O uso cada vez mais disseminado dos canabinoides no controle da dor aguda e crônica gera uma necessidade urgente do estudo de como os canabinoides agem nos receptores CB1 e CB2 e quais seus efeitos no organismo. É importante entender a diferença de ação entre os canabinoides naturais (canabidiol, delta 9-tetrahidrocanabinol, canabigerol, canabinol, terpenos) e os sintéticos, para que a escolha adequada seja realizada em cada caso, sendo que dependendo da fisiopatologia da dor é mais indicado um ou outro ativo.

CONTEÚDO:

Foram analisados estudos coletados na Pubmed, Cochrane Library e Web of Science. Os estudos se concentram em canabinoides naturais (canabidiol, delta 9-tetrahidrocanabinol, canabigerol, canabinoil, terpenos) e canabinoides sintéticos no uso para o tratamento da dor crônica, sua ação no sistema endocanabinoide através da ativação do receptor CB1 e CB2 e seu efeito após ativar esse receptor, visando compilar qual canabinoide é mais indicado no tratamento da patologia álgica.

CONCLUSÃO:

O assunto ainda requer muito estudo e diariamente novos artigos vem sendo publicados. A análise dos estudos deve ser realizada com critério para avaliar sua seriedade. O sistema endocanabinoide está intimamente ligado ao tratamento da dor crônica e alguns canabinoides como: canabidiol, delta 9-tetrahidrocanabinol, canabigerol, canabinoil, assim como alguns terpenos já são considerados importantes no tratamento da dor crônica inferindo efeito poupador de opioides, anticonvulsivantes, antidepressivos entre outros.

Descritores:
Canabidiol; Canabigerol; Canabinoides sintéticos; Delta 9-tetrahidrocanabinol; Dor crônica; Terpenos; Tratamento dor crônica com cannabis medicinal

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The increasingly widespread use of cannabinoids in the management of acute and chronic pain generates an urgent need to study how cannabinoids act on CB1 and CB2 receptors and what their effects are on the organism. It is important to understand the difference in action between natural cannabinoids (cannabidiol, delta 9-tetrahydrocannabinol, cannabigerol, cannabinoil, terpenes) and synthetic ones, so that the appropriate choice is made in each case, and depending on the pathophysiology of pain, one or the other active is more indicated.

CONTENTS:

Studies collected in the Pubmed, Cochrane Library and Web of Science databases were analyzed. These studies focus were on natural cannabinoids (cannabidiol, delta 9-tetrahydrocannabinol, cannabigerol, cannabinoil, terpenes) and synthetic cannabinoids in the use for the treatment of chronic pain, their action on the endocannabinoid system through the activation of the CB1 and CB2 receptor and their effect after activating this receptor, aiming to compile which cannabinoid is more indicated in the treatment of pain pathology.

CONCLUSION:

The subject still requires much study and new articles are being published daily. The analysis of the studies must be carried out with criteria to evaluate their seriousness. The endocannabinoid system is closely linked to the treatment of chronic pain and some cannabinoids such as: cannabidiol, delta 9-tetrahydrocannabinol, cannabigerol, cannabinoil, as well as some terpenes are already considered important in the treatment of chronic pain inferring sparing effect of opioids, anticonvulsants, antidepressants among others.

Keywords:
Cannabidiol; Cannabigerol; Chronic pain; Chronic pain treatment with medical cannabis; Delta 9-tetrahydrocannabinol; Synthetic cannabinoids; Terpenes

INTRODUÇÃO

O entendimento do sistema endocanabinoide (SEC), seus receptores e suas funções na manutenção da homeostase do ser humano vem permitindo sua utilização em diversas doenças. O uso da cannabis medicinal cresce a cada nova descoberta em relação a novos componentes e aos benefícios desta fascinante planta e ao estudo de sua ação no corpo humano. Os diferentes canabinoides se ligam aos receptores endocanabinoides de diferentes maneiras e produzem efeitos fisiológicos distintos.

Os canabinoides podem ser classificados em endocanabinoides, fitocanabinoides e canabinoides sintéticos. A cannabis tem sido empregada medicinalmente ao longo da história, mas sua complexidade e variabilidade, o controle de qualidade e falta de educação médica e de pacientes atrapalham no aconselhamento médico de seu uso como tratamento. Os receptores CB1 estão presentes no sistema nervoso central (SNC), principalmente: córtex, cerebelo, hipocampo, amígdala e núcleos da base e cerebelo. Também estão em menor quantidade na raiz dorsal da medula espinhal, na substância cinzenta periaquedutal e nas áreas relacionadas aos efeitos neuroendócrinos do hipotálamo.

Esses receptores estão pouco presentes nos centros cardiorrespiratórios do tronco cerebral (explicando a segurança de seu uso em relação a depressão respiratória). Essa ampla distribuição de receptores CB1 no SNC explica a diversidade de efeitos dos endocanabinoides e dos fitocanabinoides nos processos cognitivos, no desempenho motor, na regulação das emoções e no controle da dor11 Herkenham M, Lynn AB, Little MD, Johnson MR, Melvin LS, de Costa BR, Rice KC. Cannabinoid receptor localization in brain. Proc Natl Acad Sci U S A. 1990;87(5):1932-6.,22 Iversen L. Cannabis and the brain. Brain. 2003;126:1252-70.,33 Mechoulam R, Parker LA. The endocannabinoid system and the brain. Annu Rev Psychol. 2013;64:21-47..

Os canabinoides sintéticos deveriam ser denominados “agonistas dos receptores canabinoides sintéticos” (SCRA), uma classe de fármacos distinta dos canabinoides derivados de plantas, já que seu poder de ligação nos receptores é extremamente forte. Esta ligação gera maior potência e eficácia e propriedades semelhantes a psicoestimulantes. Na Europa, em 2004, surgiram os primeiros canabinoides sintéticos reconhecidos como JWH-018. Este composto se liga aos receptores CB1 e CB2 e, por isso, foi referido como um canabinoide sintético. O efeito da cannabis é atribuído principalmente à ação do tetrahidrocanabinol (THC) nos receptores CB1 do cérebro. Os efeitos do THC (e SCRA) ocorrem devido a sua capacidade de se ligar e ativar os receptores CB1 centrais44 Darke S, Banister S, Farrell M, Duflou J, Lappin J. ‘Synthetic cannabis’: a dangerous misnomer. Int J Drug Policy. 2021;98:103396..

Os canabinoides sintéticos são agonistas totais dos receptores CB1. Seus efeitos adversos são resultantes da ativação máxima desses receptores. Eles podem ser usados como terapia medicinal, assim como de forma recreacional, no intuito de imitar o efeito de euforia da cannabis e vendidos como “misturas de ervas para fumar” ou “incenso de ervas” sob marcas como “Spice” ou “K2”. O Sistema de Alerta Prévio da União Europeia notificou um total de 190 substâncias entre 2008 a 2018 e cerca de 280 foram relatadas em todo o mundo ao Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime. Nos últimos anos, os canabinoides sintéticos têm sido associados a mortes e intoxicações agudas na Europa55 Alves VL, Gonçalves JL, Aguiar J, Teixeira HM, Câmara JS. The synthetic cannabinoids phenomenon: from structure to toxicological properties. A review. Crit Rev Toxicol. 2020;50(5):359-82..

Essas substâncias sintéticas são muito mais potentes que a cannabis natural, com maior eficácia, atuam como agonistas totais nos receptores canabinoides. É possível que, além de serem altamente potentes, alguns também tenham meias-vidas longas, com um efeito psicoativo prolongado66 Pichini S, Lo Faro AF, Busardò FP, Giorgetti R. Medicinal cannabis and synthetic cannabinoid use. Medicina (Kaunas). 2020;56(9):453..

Estudo realizado para analisar pacientes com transtorno de estresse pós-traumático (hiperexcitação, ansiedade, sintomas depressivos e distúrbios do sono) mostrou que o uso de cannabis e dos canabinoides sintéticos são alternativas eficientes e mais bem toleradas que o tratamento convencional realizado com antidepressivos, ansiolíticos, anticonvulsivantes e técnicas de psicoterapia.

CONTEÚDO

Trata-se de uma análise de estudos coletados na Pubmed, Cochrane Library e Web of Science, e compilados em grupos de pacientes tratados com cannabis medicinal versus canabinoides sintético. Ambos se mostraram eficazes para reduzir a ansiedade, modular os processos relacionados à memória e melhorar o sono, porém as evidências são limitadas sobre sua segurança e eficácia77 Orsolini L, Chiappini S, Volpe U, Berardis D, Latini R, Papanti GD, Corkery AJM. Use of medicinal cannabis and synthetic cannabinoids in post-traumatic stress disorder (PTSD): a systematic review. Medicina (Kaunas). 2019;55(9):525..

Devido seu alto poder de gerar efeitos adversos psicoativos prolongados e com o advento de maior eficácia na extração do óleo de cannabis medicinal proveniente da Cannabis sativa, a cannabis sintética começou a perder espaço no mundo comercial e hoje em dia não mais representa um líder de vendas quando comparado ao extrato natural.

Delta-9-Tetrahidrocanabinol (THC)

O THC atua como um agonista parcial dos receptores CB1, mesmo em doses elevadas. Este é o motivo pelo qual o THC apresenta baixa toxicidade e excelente perfil de segurança quando comparado aos canabinoides sintéticos.

A dose diária total do THC deve ser limitada a 30 mg/dia ou menos, preferencialmente em conjunto com o canabidiol (CBD), para evitar sequelas psicoativas e desenvolvimento de tolerância. Quando o paciente apresenta como efeito adverso a psicoatividade com o uso do THC, introduzir dose baixa de CBD é uma estratégia eficaz porque este compete com o receptor CB1 deslocando a molécula do THC, diminuindo desta maneira o efeito psicoativo.

O THC é o responsável pelo efeito psicoativo da planta, culminando em euforia, alteração na memória, no humor, na coordenação motora, mas tem um efeito medicinal muito importante em algumas doenças. Para o tratamento da dor, por exemplo, o THC é fundamental. Seus efeitos mais conhecidos são: analgésico, anticonvulsivante, potencial antineoplásico antiemético, estimulador do apetite, relaxante muscular, ansiolítico, indutor do sono. Além disso, tem efeito protetor da neuroplasticidade, sendo de grande valia para o tratamento da dor neuropática88 Nadal X, Del Río C, Casano S, Palomares B, Ferreiro-Vera C, Navarrete C, Sánchez-Carnerero C, Cantarero I, Bellido ML, Meyer S, Morello G, Appendino G, Muñoz E. Tetrahydrocannabinolic acid is a potent PPARγ agonist with neuroprotective activity. Br J Pharmacol. 2017;174(23):4263-76.,99 Takeda S, Misawa K, Yamamoto I, Watanabe K. Cannabidiolic acid as a selective cyclooxygenase-2 inhibitory component in cannabis. Drug Metab Dispos. 2008;36(9):1917-21..

Canabidiol (CBD)

Dentre os muitos canabinoides existentes na Cannabis sativa, o CBD se destaca por ser conhecido a mais tempo, ser o mais prescrito e com o qual a população médica está mais familiarizada. O CBD atua nos receptores CB1 de diferentes formas, como antagonistas neutros, ou seja, não ativam o receptor em si, mas bloqueiam a ação do agonista, impedindo a ligação com o receptor. É por esse motivo que o CBD modula os efeitos potencialmente tóxicos do THC. O CBD também atua como um modulador alostérico, modulando os efeitos do agonista no receptor CB1 para mais ou para menos. Induz uma mudança conformacional na estrutura do receptor CB1 que aumenta ou diminui a ativação do receptor pelo agonista. Desta forma, os efeitos potencialmente tóxicos do THC são modulados e efeitos terapêuticos potencializados1010 Marinotti O, Sarill M. Differentiating full-spectrum hemp extracts from cbd isolates: implications for policy, safety and science. J Diet Suppl. 2020;17(5):517-26..

O CBD não apresenta o perfil de efeitos adversos dos bloqueadores sintéticos do CB1, como o Rimonabant, apesar de ser um antagonista funcional dos receptores CB1. Isso se deve a potência com a qual ele se liga ao receptor. O mecanismo de ação dos fitocanabinoides nos receptores endocanabinoides se mostra mais seguro e eficaz que o mecanismo de ação dos canabinoides sintéticos nos receptores CB1. Seus efeitos no ser humano são relaxamento muscular, alívio do estresse, alívio da dor, inflamação entre outros, como a atenuação da ansiedade e taquicardia associadas ao THC.

O CBD, ao contrário do THC, é menos potente e pode exigir doses muito mais altas para seus benefícios. A titulação da dose deve ser feita de forma gradual com incremento a cada 2 dias, iniciando com baixos níveis para evitar efeitos colaterais desagradáveis. A titulação de qualquer preparação de cannabis deve ser realizada lentamente durante um período de até duas semanas.

Doenças como epilepsia, cuidados paliativos, dor crônica, uso em idosos, doença de Parkinson se beneficiam com os canabinoides associados ao tratamento convencional, podendo inclusive poupar o uso de alguns fármacos, diminuindo sua utilização (exemplo: diminuição das doses de anticonvulsivantes – poupando o paciente de efeitos como sonolência). Nos pacientes oncológicos com dores crônicas e que precisam de opioides, sua prescrição ajuda a poupar opioides. Nestes pacientes, eles também são usados para o tratamento de náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia.

O CBD, assim como o THC, também atua em receptores endocanabinoides, influenciando as funções fisiológicas. Eles também se ligam a grupos de receptores, como o sistema opioide, serotoninérgico, dopaminérgico, acetilcolinérgico e gabaérgico, atuando nas suas funções fisiológicas. Desta forma, entende-se sua ação no humor, no apetite, no sono, na memória, nos processos inflamatórios, assim como nas funções cardiovascular e gastrointestinal1111 Pamplona FA, da Silva LR, Coan AC. Potential clinical benefits of CBD-rich cannabis extracts over purified CBD in treatment-resistant epilepsy: observational data meta-analysis. Front Neurol. 2018;9:759..

Na esclerose múltipla, o CBD isolado é empregado para aliviar a dor e a espasticidade. É indicado nas doenças neurodegenerativas, dermatológicas, infecções virais entre outras doenças. Age no SEC encontrado em diferentes áreas do sistema nervoso, como os gânglios da base, o cerebelo e a medula espinhal, explicando seus efeitos na memória, emoção, movimento e transmissão da dor. Estudos recentes destacaram que o SEC é, de fato, ativo em todos os níveis de transmissão nociceptiva, visando preferencialmente os componentes afetivos da dor, devido à distribuição frontal e límbica dos receptores CB no cérebro. O CB1, especificamente, é definido como o receptor com o principal papel nos efeitos analgésicos dos canabinoides, embora o CB2 também pareça estar envolvido. O CBD começou a ser utilizado para a dor de diversas etiologias e por este motivo é um dos canabinoides mais utilizado na medicina1212 Pagano C, Navarra G, Coppola L, Avilia G, Bifulco M, Laezza C. Cannabinoids: therapeutic use in clinical practice. Int J Mol Sciences. 2022; 23(6):3344..

O CBD deve ser prescrito predominantemente como extrato oral durante o dia e deve se considerar adicionar tetrahidrocanabinol (THC) em alguns pacientes que se beneficiarão das suas qualidades. Para adicionar THC, sugere-se começar com doses baixas e observar qual o efeito o paciente apresenta e iniciar a redução gradual de opioides quando o paciente relatar melhoria na função, intensidade da dor e/ou a dose de cannabis for otimizada. O esquema de redução gradual dos opioides pode ser de 5% a 10% da dose equivalente de morfina (MED) a cada 1 a 4 semanas. O sucesso clínico ocorre quando acontece melhora na função/qualidade de vida, uma redução ≥30% na intensidade da dor e redução ≥25% na dose de opioide utilizada associados a menos eventos adversos. Tanto o CBD quanto o THC têm efeito antioxidante, neuroprotetor, ansiolítico, anticonvulsivante e anti-neoplásico1313 Sihota A, Smith BK, Ahmed SA, Bell A, Blain A, Clarke H, Cooper ZD, Cyr C, Daeninck P, Deshpande A, Ethans K, Flusk D, Le Foll B, Milloy MJ, Moulin DE, Naidoo V, Ong M, Perez J, Rod K, Sealey R, Sulak D, Walsh Z, O’Connell C. Consensus-based recommendations for titrating cannabinoids and tapering opioids for chronic pain control. Int J Clin Pract. 2021 Aug;75(8):e13871..

Canabinol (CBN)

O CBN provém da alcalinização do Δ9(THC) quando este é exposto ao ar ambiente, luz ou calor. Ele é um canabinoide menos utilizado comercialmente, porém sua indicação é melhorar para a indução do sono em pacientes que têm dificuldade para dormir. Sua afinidade pelo receptor CB1 é fraca, seu efeito psicoativo é ínfimo quando comparado ao THC (25%) e tem efeito ansiolítico. Também apresenta efeito anti-inflamatório, antimicrobiano, analgésico, estimulador de apetite e indutor da formação do tecido ósseo. O CBN tem sido prescrito principalmente para os pacientes que precisam de um indutor do sono de forma isolada ou quando o paciente já está medicado com outro canabinoide1414 Zygmunt PM, Andersson DA, Hogestatt ED. Delta 9-tetrahydrocannabinol and cannabinol activate capsaicin-sensitive sensory nerves via a CB1 and CB2 cannabinoid receptor-independent mechanism. J Neurosci. 2002;22(11):4720-7..

Canabigerol (CBG)

Assim como o THC e o CBD, o CBG também é estudado para uso como potente anti-inflamatório. O tratamento com CBG reduz a produção de óxido nítrico em macrófagos através do receptor CB2 e reduz a formação de espécies reativas de oxigênio (ROSS) nas células epiteliais intestinais e a expressão de iNOS (óxido nítrico-sintase nos cólons inflamados). O tratamento com CBG também reduz o edema na submucosa do cólon, reduz a inflamação intestinal, diminui a infiltração de neutrófilos induzida pelo ácido dinitro benzeno sulfônico (DNBS), conforme avaliado pela atividade da MOP1515 Borrelli F, Fasolino I, Romano B, Capasso R, Maiello F, Coppola D, Orlando P, Battista G, Pagano E, Di Marzo V, Izzo AA. Beneficial effect of the non-psychotropic plant cannabinoid cannabigerol on experimental inflammatory bowel disease. Biochem Pharmacol. 2013;85(9):1306-16..

Sua potente ação anti-inflamatória tem despertado interesse no uso de pacientes com osteoartrite de grandes articulações, postergando cirurgias em pacientes mais idosos e clinicamente comprometidos, melhorando sua qualidade de vida.

Autores1616 Mammana S, Cavalli E, Gugliandolo A, Silvestro S, Pollastro F, Bramanti P, Mazzon E. Could the combination of two non-psychotropic cannabinoids counteract neuroinflammation? Effectiveness of cannabidiol associated with cannabigerol. Medicina (Kaunas). 2019;55(11):747. descreveram as propriedades farmacológicas do CBD sozinho e em combinação com o fitocanabinoide CBG e suas potenciais aplicações clínicas, especialmente em doenças neurodegenerativas. O CBD e o CBG tem propriedades anti-inflamatórias, antioxidantes e antiapoptóticas.

Existem outros canabinoides sendo estudados exaustivamente para verificar suas propriedades e benefícios nas diversas doenças que afetam o ser humano, e ao longo do tempo muitos artigos têm sido descritos e estudos mais robustos e melhor desenhados estão em andamento.

Terpenos

Os terpenos também apresentam efeitos fisiológicos importantes através do SEC. Sempre que possível, no tratamento da dor, optou-se por utilizar óleos full spectrum. A vantagem é beneficiar-se com o efeito entourage, sinergismo de ações, para uso da menor dose, com eficácia comprovada. Alguns exemplos são: mirceno, que apresenta efeitos analgésico e sedativo; limoneno, que apresenta propriedades antidepressiva e imunoestimuladora; pineno, que mostra potencial inibidor da acetilcolinesterase e ação broncodilatadora e anti-inflamatória; e beta-cariofileno, um agonista seletivo do receptor CB2 e tem forte potencial analgésico e anti-inflamatório.

Os receptores CB1 e CB2 são encontrados em vários locais do ser humano, explicando sua influência em praticamente todos os processos fisiológicos e patológicos. O SEC atua na proteção e no desenvolvimento e/ou progressão de transtornos cardiovasculares, neuropsiquiátricos, imunológicos e gastrointestinais.

Pesquisas em modelos animais de enxaqueca, fibromialgia e doença de Crohn confirmam que os órgãos-alvo desses distúrbios (cérebro, sistema musculoesquelético e intestino) expressam níveis abaixo da média de anandamida e/ou 2-AG, reforçando o conceito de que essas patologias apresentam um desbalanço do SEC e justificando a melhora expressiva de pacientes portadores desses transtornos quando submetidos à terapia suplementar de fitocanabinoides. Os fitocanabinoides podem contribuir no tratamento de inúmeros estados patológicos, ajudando a reequilibrar o SEC1717 Pollastro F, De Petrocellis L, Schiano-Moriello A, Chianese G, Heyman H, Appendino G, Taglialatela-Scafati O. Amorfrutin-type phytocannabinoids from Helichrysum umbraculigerum. Fitoterapia. 2017;123:13-7,1818 ElSohly MA, Radwan MM, Gul W. Chandra S, Galal A. Phytochemistry of Cannabis sativa L. Prog Chem Org Nat Prod. 2017;103:1-36..

CONCLUSÃO

É importante ficar atento aos novos estudos que são publicados com frenética velocidade, rever os critérios que foram utilizados para desenhá-los, assim como rever possíveis influências da indústria que têm interesse no uso da medicina canábica. O critério de análise desses estudos deve ser levado em consideração.

Após decidir como se deseja medicar o paciente, qual o canabinoide de escolha baseado no quadro clínico, é importante ter o Certificado de Análise Laboratorial dos produtos à base de cannabis. Este certificado é a forma de garantir que se está medicando com a substância de escolha para o paciente, garantindo que a planta não está contaminada, por exemplo, com metais pesados, ou infectada com fungos e bactérias.

A melhor forma de achar a dose ideal para cada paciente é iniciar titulando vagarosamente, revendo os efeitos adversos e, caso isso ocorra, reduzir a sua dose.

REFERÊNCIAS

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Out 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Out 2022
  • Aceito
    07 Jul 2023
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