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Dor física e desesperança em adolescentes escolares

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A dor física e a desesperança podem ser fatores de risco para a saúde e gerar impacto biopsicossocial na adolescência. Pesquisas sobre tais fatores em adolescentes ainda são escassas. O objetivo deste estudo foi analisar aspectos relativos à dor física e à desesperança em uma amostra de adolescentes escolares.

MÉTODOS:

Os dados foram coletados em duas escolas, com a aplicação de dois instrumentos: Multidimensional Pain Assessment Scale, e Beck Hopelessness Scale. Foi empregada a regressão logística para análise de fatores associados com a dor física e com a desesperança.

RESULTADOS:

Foram incluídos 270 adolescentes. Houve prevalência relevante de dor leve 88,1% e intensa 90,90% e de desesperança moderada 11,1% e intensa 5,6%. No modelo de regressão logística multivariada, a localização da dor nas costas e a dor crônica estiveram independentemente associadas com a desesperança grave definida como uma pontuação entre 14 e 20 na Beck Hopelessness Scale. Adolescentes que reportaram dor nas costas e dor crônica apresentaram respectivamente 2,07 (IC95%: 1,04-4,14) e 2,01 (IC95%: 1,03-3,93) vezes mais chance de apresentarem desesperança grave. Já no modelo dos fatores associados com a presença de dor, adolescentes do sexo feminino apresentaram 3,87 vezes mais chance de ter dor (OR: 3,87; IC 95%: 1,74-8,60).

CONCLUSÃO:

A maior ocorrência de dor em adolescentes do sexo feminino e a associação entre aspectos específicos da dor e a presença de desesperança indicaram a existência de grupos prioritários para as ações de cuidado em saúde.

Descritores:
Adolescente; Dor; Tentativa de suicídio

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Physical pain and hopelessness can be risk factors for health and have a biopsychosocial impact on adolescence. Studies on such factors in adolescents are still scarce. This study aimed to evaluate aspects related to physical pain and hopelessness in a sample of school adolescents.

METHODS:

Data was collected in two schools using the Multidimensional Pain Assessment Scale, and Beck Hopelessness Scale. Logistic regression was used to analyze factors associated with physical pain and hopelessness.

RESULTS:

270 adolescents were included. There was a significant prevalence of pain (mild 88.1% and intense 90.90%) and hopelessness (moderate 11.1% and severe 5.6%). In the multi-variate logistic regression model, the location of back pain and chronic pain were independently associated with severe hopelessness (defined as a Beck Hopelessness Scale score between 14 and 20). By multivariate logistic regression, adolescents who reported back pain and chronic pain presented, respectively, 2.07 (95% CI: 1.04-4.14) and 2.01 (95% CI: 1.03-3.93) times more chance to experience severe hopelessness. In the model of factors associated with the presence of pain, female adolescents were 3.87 times more likely to have pain (OR: 3.87; 95% CI: 1.74-8.60).

CONCLUSION:

The greater occurrence of pain in female adolescents and the association between specific aspects of pain and the presence of hopelessness indicate the existence of priority groups for health care actions.

Keywords:
Adolescent; Pain; Suicide attempt

INTRODUÇÃO

A dor física musculoesquelética é um problema relevante em nível de saúde pública devido à sua alta prevalência, alto custo e impacto negativo na qualidade de vida dos acometidos11 Cordeiro Q, El Khourl M, Corbetti CE. Dor musculoesquelética na atenção primária a saúde em uma cidade do Vale do Mucuri, nordeste de Minas Gerais. Acta Fisiátrica. 2008;15(4):241-4.,22 Moura CC, Chaves ECL, Souza VHS, Lunes DH, Ribeiro CRG, Paraizo CMS, et al. Impactos da dor crônica na vida das pessoas e a assistência de enfermagem no processo. Rev Enferm. 2017;35(1):53-62.. Pessoas com dor consomem duas vezes mais recursos de cuidados de saúde, quando comparadas com a população geral22 Moura CC, Chaves ECL, Souza VHS, Lunes DH, Ribeiro CRG, Paraizo CMS, et al. Impactos da dor crônica na vida das pessoas e a assistência de enfermagem no processo. Rev Enferm. 2017;35(1):53-62.. Além disso, a presença de dor pode estar associada ao aumento do risco de comportamento suicida33 Elman I, Borsookb D, Volkowc ND. Pain e suicidality insights from reward and addiction neurosciense. Prog Neurobiol. 2013;109:1-27.. A presença de dor em crianças e adolescentes, por sua vez, pode gerar problemas no sono, incapacidade de realizar os hobbies e ausência escolar44 Roth-Isigkeit A, Thyen U, Stoven H, Schwarzenberger J, Schmucker P. Pain among children and adolescents: restrictions in daily living and triggering factors. Pediatrics. 2005;115(2):e152-62..

A desesperança pode ser compreendida como atitude ou expectativa pessimista sobre eventos ou pensamentos futuros. A pessoa que apresenta desesperança tende a ver o futuro sem expectativas, perde a motivação pela vida e não encontra razões para viver55 Marback RF, Pelisoli C. Terapia cognitivo-comportamental no manejo da desesperança e pensamentos suicidas. Rev Bras Ter Cogn. 2014;10(2):122-9.. A desesperança constitui fator de risco para o comportamento suicida66 Borges VR, Werlang BSG. Estudo de ideação suicida em adolescentes de 15 a 19 anos. Est Psicol. 2006;11(3):345-51.,77 Brito MEM, Goes LSP, Costa VB, Gurgel MGI, Alves MDS, Timbó MA, et al. Tentativa de suicídio por queimadura: ideação suicida e desesperança. Rev Bras Queimaduras. 2013;12(1):30-6..

No período da adolescência ocorrem inúmeras alterações biopsicossociais88 Selle Júnior D, Noll M, Chaise FO, Condotti CT, Latorre M. Prevalência de dor em adolescentes estudantes do ensino médio diurno do município de Garibaldi/RS. Saúde (Santa Maria). 2015;41(2):211-6., e a dor física e desesperança tornam o adolescente mais vulnerável.

Uma vez que são escassos os estudos brasileiros que avaliem a relação entre dor física e desesperança, especialmente no público adolescente, o presente estudo analisou a prevalência e os fatores associados com a dor física e a desesperança em adolescentes escolares.

MÉTODOS

Estudo transversal, quantitativo e exploratório, com amostra definida por conveniência, realizado de abril a novembro de 2018, em duas escolas estaduais na cidade de Divinópolis/MG. Os critérios de inclusão foram adolescentes de 15 a 19 anos, matriculados e regularmente frequentes nas duas escolas, presentes na sala de aula no dia e horário da coleta de dados, após a assinatura dos Termos de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) pelos responsáveis. Após orientação quanto às implicações do estudo, aqueles que consentiram foram instruídos a levar para casa o TCLE e a solicitar que os pais e/ou responsáveis o lessem e assinassem. Após o recolhimento do TCLE, os alunos eram instruídos a lerem e assinarem o Termo de Assentimento Livre e Esclarecido (TALE).

A população foi composta por 489 adolescentes estudantes, dos quais 119 desejaram não participar do estudo e 100 foram excluídos por não estarem em conformidade com os critérios de inclusão adotados. Dessa maneira, a amostra foi de 270 adolescentes. O quantitativo estudado foi superior ao tamanho amostral mínimo calculado inicialmente por meio do programa Open Epi, versão 3.01, para um nível de confiança de 95%, com erro amostral de 5% e poder estatístico de 80%.

Foram utilizadas para coleta de dados a Escala Multidimensional de Avaliação de Dor (EMADOR) e a Beck Hopelessness Scale (BHS). A EMADOR, já validada para a língua portuguesa99 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10., possibilita avaliar vários descritores da dor, desde sua ausência ou presença, bem como a presença de dor aguda e crônica em diferentes experiências, identificando componentes sensitivos, afetivos e avaliativos do fenômeno álgico. Nesta escala, quanto maior o escore maior a dor e seus descritores99 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10..

A EMADOR é um instrumento autoaplicável composto por 10 questões fechadas no qual se quantifica o nível de dor considerando uma escala numérica de zero a 10, em que zero indica “sem dor” e 10 “dor intensa”, sendo ainda possível identificar descritores que caracterizam a dor percebida. Essa escala é amplamente utilizada em estudos científicos e tem por objetivo identificar e validar os descritores de dor99 Sousa FA, Pereira LV, Cardoso R, Hortense P. Multidimensional pain evaluation scale. Rev Lat Am Enfermagem. 2010;18(1):3-10..

A BHS é um instrumento estruturado de autoadministração, composto por afirmativas que avaliam o grau de desesperança medindo atitudes negativas referentes ao futuro e seu grau de pessimismo, e apresenta resultados satisfatórios de fidedignidade e validade1010 Cunha JA. Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo: Pearson Clinical Brasil; 2001.. A BHS tem sido utilizada em estudos nacionais e internacionais como um indicador de risco de suicídio.

A BHS foi traduzida e adaptada para a língua portuguesa por Cunha1010 Cunha JA. Manual da versão em português das Escalas Beck. São Paulo: Pearson Clinical Brasil; 2001.. O instrumento caracteriza-se como uma escala dicotômica tipo certo e errado, e seus itens são pontuados em zero ou 1, com um intervalo de pontuação de zero a 20, em que a soma de seus itens individuais resulta em um escore total, a partir do qual se classifica em nível de: desesperança mínima: (zero-4 pontos), desesperança leve (5-8 pontos), desesperança moderada (9-13 pontos) e desesperança grave (14-20 pontos).

Este estudo respeitou a Resolução 466 sobre pesquisa com seres humanos1111 Brasil, Ministério da Saúde. Conselho Nacional de Saúde, Resolução N. 466, de 12 de dezembro de 2012.. O projeto de pesquisa foi aprovado em 22 de setembro de 2017 pelo Comitê de Ética em Pesquisa (CEPES) da Universidade Federal de São João del-Rei (CAAE 70602917.8.0000.5545 e Parecer nº. 2.291.115).

Análise estatística

Os dados foram analisados no programa Statistical Package for the Social Sciences (versão 20.0, SPSS, Chicago, Illinois) por meio de dupla digitação, o que permitiu a análise de consistência e validação. No início foi realizada a análise descritiva incluindo o cálculo de distribuição de frequência absoluta e relativa e medidas de tendência central e de dispersão. Em seguida, foi realizado o teste de normalidade Shapiro Wilk para a variável idade; como essa não apresentou distribuição normal, ela foi apresentada em mediana e amplitude interquartil (p25-p75). Posteriormente, calculou-se o Alfa de Cronbach para os componentes da BHS.

A classificação da BHS foi agrupada em duas categorias: desesperança leve e grave, com intuito de aumentar o poder estatístico na realização das análises. Os grupos leve e mínima foram determinados para desesperança leve quando o somatório da escala era menor que 9, e os grupos moderada e grave em desesperança grave quando o somatório era igual ou maior que 9.

Para verificar os fatores independentemente associados à desesperança grave e à presença de dor, foram construídos modelos de regressão logística multivariada. Deste modo, foram apresentados dois modelos multivariados. Em um dos modelos a variável dependente foi a desesperança grave; e, no outro, a variável dependente do modelo foi a presença de dor.

Os dados sociodemográficos, o grau de desesperança no caso do modelo dos fatores associados a dor, as variáveis presença de dor crônica e aguda e localização de dor nas costas, na cabeça e no pescoço, no caso do modelo dos fatores associados à desesperança, foram considerados como variáveis explicativas dos modelos de regressão multivariada. As variáveis explicativas que obtiveram valor de p inferior a 20% (p<0,20) na análise bivariada foram inseridas pelo método backward no modelo multivariado de regressão logística múltipla, sendo que aquelas com menor significância (maior valor p) foram retiradas uma a uma do modelo. O procedimento foi repetido até que todas as variáveis presentes no modelo possuíssem significância estatística (p<0,05). Odds Ratio (OR) e seus respectivos intervalos de confiança (IC 95%) foram calculados nos modelos bivariado e multivariado.

RESULTADOS

O estudo evidenciou elevada incidência de dor física nos adolescentes, mais frequente na parte anterior do corpo, mais localizada na cabeça, seguida de tronco e dos membros. Na parte posterior a dor foi mais frequente na região lombar, seguida de cabeça e pescoço e membros.

A maioria dos estudantes apresentou desesperança mínima, embora tenha havido proporção elevada de indivíduos com desesperança moderada ou grave. Em relação à dor, 62,20% relataram dor moderada e 21,10% dor intensa. A dor aguda (52,20%) foi mais frequente que a dor crônica (35,60%) (Tabela 1).

Tabela 1
Caracterização da amostra do estudo

O valor do coeficiente alfa de Cronbach dos componentes da BHS foi 0,823, considerado satisfatório e de boa consistência interna.

A tabela 2 apresenta os modelos de regressão logística simples e o modelo de regressão logística múltipla dos fatores associados à desesperança grave. No modelo de regressão logística simples, a existência de ocupação, a presença de dor crônica e de dor nas costas estiveram associadas à desesperança grave. No modelo de regressão logística multivariado, a localização da dor nas costas e a dor crônica estiveram independentemente associadas à desesperança grave.

Tabela 2
Modelos de regressão logística binária simples (odds ratio bruto) e múltipla (odds ratio ajustado) para as variáveis explicativas associadas à desesperança grave

Já em relação aos modelos de regressão logística bi e multivariada dos fatores relacionados à presença de dor, a única variável com associação significativa em ambos foi a presença de dor no sexo feminino (Tabela 3).

Tabela 3
Modelos de regressão logística binária simples (odds ratio bruto) e múltipla (odds ratio ajustado) para as variáveis explicativas associadas a dor

DISCUSSÃO

O estudo evidenciou elevada prevalência de dor e de desesperança nos adolescentes. A presença de dor na adolescência tem sido pouco estudada no Brasil. Revisão sistemática evidenciou que, nos Estados Unidos, a prevalência de dor em adolescentes esteve entre 11 e 38%, gerando um custo anual estimado em 19.500 bilhões de dólares1212 King S, Chambers CT, Huguet A, MacNevin RC, McGrath P, Parker L, MacDonald AJ. The epidemiology of chronic pain in children and adolescents revisited: a systematic review. Pain. 2011;152(12):2729-38.,1313 Groenewald CB, Essner BS, Wright D, Fesinmeyer MD, Palermo TM. The economic costs of chronic pain among a cohort of treatment seeking adolescents in the United States. J Pain. 2014;15(9):925-33.. Em relação à presença de desesperança em adolescentes brasileiros, estudo66 Borges VR, Werlang BSG. Estudo de ideação suicida em adolescentes de 15 a 19 anos. Est Psicol. 2006;11(3):345-51. realizado na cidade de Porto Alegre com adolescentes de 15 a 19 anos obteve resultados semelhantes aos identificados no presente estudo.

A elevada ocorrência de dor e desesperança em adolescentes, principalmente em se tratando de uma população não clínica, pode indicar o importante sofrimento biopsicossocial que muitas das vezes é despercebido ou ignorado.

Além disso, as dores de cabeça estão se tornando mais comuns entre as crianças e adolescentes em idade escolar, e vários estudos confirmam a maior prevalência de dor de cabeça em adolescentes1414 Aquino JHW, Fortes FM. Cefaleias na adolescência. Rev Adolesc Saúde. 2009;6(3):39-41.

15 Puccini RF, Bresolin AMB. Dores recorrentes na infância e na adolescência. J Pediatr. 2003;79(Suppl1):S65-76.

16 Siqueira LFM. Cefaleias na infância e adolescência. Pediatria Moderna. 2011;27(1):5-12.
-1717 Straube A, Heinen F, Ebinger F, von Kries R. Headache in school children: prevalence and risk factors. Dtsch Arztebl Int. 2013;110(48):811-8.. Como a dor de cabeça é frequentemente acompanhada de outras manifestações físicas e/ou emocionais, é relevante o reconhecimento e a repercussão das cefaleias em adolescentes, bem como os efeitos no desenvolvimento psicológico, no rendimento escolar e na interação social, sendo elevada a importância de ser adequadamente tratada para evitar potenciais consequências a longo prazo e minimizar os impactos na vida adulta1616 Siqueira LFM. Cefaleias na infância e adolescência. Pediatria Moderna. 2011;27(1):5-12..

No presente estudo foi possível observar também maior ocorrência de dor na região posterior, sendo a região dorsal o local mais frequente, o que também vem sendo identificado em outros estudos com adolescentes1818 de Oliveira Saes M, Flores Soares MC. Fatores associados à dor na coluna vertebral em adolescentes de escolas públicas de um município do extremo Sul do Brasil. Rev Salud Pública. 2017;19(1):105-11.

19 Furlanetto TS, Medeiros FS, Candotti CT. Prevalência de dor nas costas e hábitos posturais inadequados em escolares do Ensino Fundamental do Colégio de Aplicação da UFRGS. Cadernos do Aplicação, Porto Alegre, 2015, 27/28:99-108.
-2020 Winik V, Wagner LE, Hopp MS, Reuter CP, Reuter EM, Burgos MS, et al. Fatores associados às alterações posturais no plano sagital de adolescentes de escolas públicas. Rev Adolesc Saúde. 2019;16(1):33-45.. Estudo brasileiro2121 Noll M, Fraga RA, Rosa BN, Candotti TC. Fatores de risco associados à intensidade de dor nas costas em escolares no município de Teutônia (RS). Rev Bras Ciênc Esporte, 2016, 38(2):124-31. de base populacional realizado com 1.597 adolescentes escolares verificou que a elevada intensidade de dor nas costas esteve associada com o impedimento de fazer as atividades do dia a dia. Os possíveis problemas de saúde associados com a presença de dores nas costas e a associação identificada entre estas e a desesperança demonstram a relevância que este tipo de dor pode ter na vida dos adolescentes e suas repercussões biopsicossociais.

Além da dor nas costas, a ocupação e dor crônica estiveram associadas à desesperança grave. Esses resultados estão de acordo com informações da OMS e de outros estudos2222 World Health Organization. Preventing suicide: a global imperative. Geneva: WHO, 2014.

23 El-Metwally A, Shaikh Q, Aldiab A, Al-Zahrani K, Al-Ghamdi S, Alrasheed AA, et al. The prevalence of chronic pain and its associated factors among Saudi Al-Kharj population; a cross sectional study. BMC Musculoskelet Disord. 2019;20(1):177.
-2424 Braga LL, Dell'Aglio DD. Suicídio na adolescência: fatores de risco, depressão e gênero. Contextos Clínicos. 2013;6(1):2-14. a respeito da associação entre fatores de vulnerabilidade e o comportamento suicida, como a presença de estresse e de eventos estressores ao longo da vida. Embora ainda sejam escassos os estudos sobre a associação entre a presença da dor crônica e da dor nas costas com a ocorrência de desesperança em adolescentes, é possível hipotetizar que a dor constante é um fator primordial para a ocorrência de quadros de desesperança. Assim, intervenções direcionadas a adolescentes com dor crônica podem ser relevantes em nível de Saúde Pública.

Um estudo transversal2525 Koenig J, OelkersAx R, Parzer P, Haffner J, Brunner R, Resch F, Kaess M. The association of self-injurious behaviour and suicide attempts with recurrent idiopathic pain in adolescents: evidence from a population-based study. Child Adolesc Psychiatry Ment Health. 2015;9:32. de base populacional realizado com 5.504 adolescentes alemães em idade escolar mostrou que aqueles que reportaram dor tiveram quase o dobro da chance de morte por suicídio. A presença de dor foi também significativamente associada a aumento das razões de chances para a ideação suicida, para as tentativas de suicídio e para tentativas múltiplas. O mesmo foi observado em estudo2626 KowaL J, Wilson KG, McWilliams LA. Change in suicidal ideation after interdisciplinary treatment of chronic pain. Clin J Pain. 2014, 30(6):463-71. com 250 pacientes adultos internados com dor crônica, o qual identificou ser a ideação suicida comum nas pessoas com dor crônica.

Em relação às análises dos fatores associados à presença de dor, o sexo feminino foi o único fator com associação significativa. Estudos anteriores1919 Furlanetto TS, Medeiros FS, Candotti CT. Prevalência de dor nas costas e hábitos posturais inadequados em escolares do Ensino Fundamental do Colégio de Aplicação da UFRGS. Cadernos do Aplicação, Porto Alegre, 2015, 27/28:99-108.,2121 Noll M, Fraga RA, Rosa BN, Candotti TC. Fatores de risco associados à intensidade de dor nas costas em escolares no município de Teutônia (RS). Rev Bras Ciênc Esporte, 2016, 38(2):124-31.,2727 Martínez-Crespo G, Duran MRP, Salguero AIL, Perinan MJZ. Dolor de espalda en adolescentes: prevalencia y factores asociados. Rehabilitación. 2009;43(2):72-80.,2828 Nunes SEB, Furlanetto TS, Rosa BN, Noll M, Condotti CT. Prevalência de dor nas costas e fatores associados em escolares do ensino fundamental e médio de uma escola estadual de Gravataí/RS. Pensar a Prática, Goiânia. 2016;19(1):31-41. têm demostrado resultados semelhantes. A maior prevalência de dor musculoesquelética na coluna vertebral em adolescentes do sexo feminino pode ser explicada pela existência de alterações multifatoriais, como aquelas do sistema endógeno de modulação da dor, que contribuem para maior sensibilidade e para maior prevalência de diversas condições dolorosas no sexo feminino. Além disso, características anatomofuncionais, alterações hormonais induzidas pela puberdade e/ou características sociais também podem ter papel relevante2020 Winik V, Wagner LE, Hopp MS, Reuter CP, Reuter EM, Burgos MS, et al. Fatores associados às alterações posturais no plano sagital de adolescentes de escolas públicas. Rev Adolesc Saúde. 2019;16(1):33-45..

Apesar de não ter sido identificada associação entre a desesperança e o sexo dos adolescentes, tem sido relatada maior presença de ideação suicida no sexo feminino77 Brito MEM, Goes LSP, Costa VB, Gurgel MGI, Alves MDS, Timbó MA, et al. Tentativa de suicídio por queimadura: ideação suicida e desesperança. Rev Bras Queimaduras. 2013;12(1):30-6.. Assim, tal questão deve ser mais bem investigada na literatura.

CONCLUSÃO

O presente estudo identificou elevada prevalência de dor e de desesperança em adolescentes escolares, bem como maior ocorrência de dor em adolescentes do sexo feminino e a associação entre a presença de dor crônica e dor nas costas com a presença de desesperança.

  • Fontes de fomento: CAPES.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    09 Nov 2020
  • Data do Fascículo
    Oct-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    18 Nov 2019
  • Aceito
    11 Set 2020
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