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Corrente Aussie em estudantes com cervicalgia crônica: um ensaio clínico randomizado

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A cervicalgia é uma síndrome dolorosa, aguda ou crônica, que acomete a coluna cervical. Uma das formas de tratamento é a eletroestimulação, que proporciona analgesia local trazendo mais conforto e funcionalidade ao paciente. Contudo ainda existem formas de corrente pouco exploradas. O objetivo do estudo foi avaliar os efeitos analgésicos e funcionais da corrente Aussie em estudantes com cervicalgia crônica.

MÉTODOS:

Vinte e quatro indivíduos foram separados em grupo controle (n=11) e grupo de eletroestimulação (n=13), com intensidade da corrente em nível sensorial. Foram realizadas 3 intervenções por semana, durante 4 semanas, totalizando 12 terapias por indivíduo. A avaliação foi feita com a aplicação do questionário Neck Disability Index, da escala analógica visual, do dinamômetro de preensão manual, e da goniometria da coluna cervical antes da intervenção, logo após o período de tratamento, e depois de um mês de seguimento.

RESULTADOS:

Em relação a todos os quesitos avaliados, não se verificou diferença significativa entre as três avaliações no grupo controle e no grupo tratado.

CONCLUSÃO:

A corrente Aussie, atingindo apenas o nível sensorial, não proporcionou efeitos analgésicos e funcionais significativos em estudantes com cervicalgia crônica.

Descritores:
Cervicalgia; Mensuração da dor; Terapia por estimulação elétrica

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

Neck pain is a painful acute or chronic syndrome that affects the region of the cervical spine. Electrostimulation is one type of treatment, which provides local analgesia bringing more comfort and functionality to the patient. However, there are still there are other current forms not fully explored. Therefore, the objective of the study was to evaluate the analgesic and functional effects of the Aussie current on students with chronic neck pain.

METHODS:

Twenty-four individuals were separated in a control group (n=11) and an electrostimulation group (n=13) with current intensity at the sensory level. There were 3 interventions per week for 4 weeks, totaling 12 interventions per individual. The assessment was performed applying the Neck Disability Index, the visual analog scale of pain, the handgrip dynamometer, and the cervical spine goniometry before the intervention, shortly after the treatment period, and after a month of follow-up.

RESULTS:

In relation to all the assessed items, there was no significant difference between the three evaluations in the control group and in the treated group.

CONCLUSION:

The Aussie current at the sensory level did not provide significant analgesic and functional effects in students with chronic neck pain.

Keywords:
Electric stimulation therapy; Neck pain; Pain measurement

INTRODUÇÃO

A cervicalgia é uma queixa de dor comum em indivíduos adultos sendo muito relacionada ao uso de computadores e à sobrecarga de trabalho; fatores que influenciam na exacerbação dos sintomas11 Delfino PD, Rampim DB, Alfieri FM, Tomikawa LC, Fadel G, Stump PR, et al. Cervicalgia: reabilitação. Acta Fisiatr. 2012;19(2):73-81.. Afeta o bem-estar global do indivíduo e a saúde da sociedade de forma geral, definindo-se como um problema de saúde pública e de grande importância na sociedade mundial22 Silva AF, Costa MA, Soutinho RS, Pedrosa AS. Prevalência de cervicalgia em acadêmicos de odontologia de um Centro Universitário. Rev Port Saúde e Sociedade. 2017;2(2):422-34.. Pode advir de diversas causas, tais como radiculopatias, cefaleia cervicogênica, tumores, espondilites e artrites. São comuns em diversas faixas etárias, com maior incidência no sexo feminino, trazendo prejuízos nas suas atividades de vida diária11 Delfino PD, Rampim DB, Alfieri FM, Tomikawa LC, Fadel G, Stump PR, et al. Cervicalgia: reabilitação. Acta Fisiatr. 2012;19(2):73-81..

Em geral, pode estar relacionada com movimentos bruscos, longa permanência em posição forçada, movimentos repetitivos, esforço ou trauma, resultando quadros dolorosos, inflamatórios, com perda de amplitude de movimento (ADM), fadigabilidade de flexores e extensores de cervical, rigidez local e redução da propriocepção22 Silva AF, Costa MA, Soutinho RS, Pedrosa AS. Prevalência de cervicalgia em acadêmicos de odontologia de um Centro Universitário. Rev Port Saúde e Sociedade. 2017;2(2):422-34.. Além disso, leva uma grande parte das pessoas a vícios farmacológicos, instabilidade emocional, quadros deprimentes, disfunções relacionadas às atividades laborais e deficiências nas atividades diárias33 Sprung CL, Silvério-Lopes S. Utilização de técnicas da medicina tradicional chinesa (MTC) para analgesia da cervicalgia em adultos: revisão sistemática. Rev Bras Terap e Saúde. 2016;7(1):7-15..

A eletroestimulação se mostra eficaz para a inibição de dor, promovendo analgesia por meio das vias ascendentes e descendentes de controle da dor44 Neves RH, Lima VA, Maria RA, Sant'Ana HG. Modalidades terapêuticas no tratamento e prevenção da dor muscular tardia - revisão de literatura. Ciências Biológicas e Saúde Unit. 2017;4(1):147-58.. As correntes mais comumente utilizadas na prática clínica são a estimulação elétrica nervosa transcutânea (TENS), tanto de frequên cia baixa quanto alta, a corrente interferencial (bi ou tetrapolar) e a estimulação elétrica neuromuscular (FES), sendo que as duas primeiras geralmente são as escolhidas quando se objetiva a redução de quadros dolorosos55 Zeng C, Li H, Yang T, Deng ZH, Yang Y, Zhang Y, et al. Electrical stimulation for pain relief in knee osteoarthritis: systematic review and network meta-analysis. Osteoarthritis Cartilage. 2015;23(2):189-202.. Porém, ao avaliar correntes de média frequência, com diferentes correntes carreadoras, Ward e Robertson66 Ward AR, Robertson VJ. Variation in torque production with frequency using medium frequency alternating current. Arch Phys Med Rehabil. 1998;79(11):1399-404. observaram que 1kHz apresentou maiores torques do que frequências superiores. Ainda dentro dessa gama de correntes, a modulação em bursts com menores frequências do que as observadas na interferencial e Russa, têm características de melhor produção de torque e sensibilidade77 Ward AR, Chuen WL. Lowering of sensory, motor, and pain-tolerance thresholds with burst duration using kilohertz-frequency alternating current electric stimulation: part II. Arch Phys Med Rehabil. 2009;90(9):1619-27.,88 Ward AR, Lucas-Toubourou S. Lowering of sensory, motor, and pain-tolerance thresholds with burst duration using kilohertz-frequency alternating current electric stimulation. Arch Phys Med Rehabil. 2007;88(8):1036-41..

Ward, Oliver e Bucella99 Ward AR, Oliver WG, Buccella D. Wrist extensor torque production low-frequency and burst-modulated kilohertz-frequency currents. Phys Ther. 2006;86(10):1360-7. compararam duas formas de corrente de média frequência (correntes Russa e Aussie) com duas formas de baixa frequência monopolares, avaliando tanto o torque produzido quanto o seu desconforto. Observaram que a corrente Russa produziu menor torque que as demais, sendo que as de média frequência foram mais agradáveis. Assim, concluíram que a Aussie (1kHz e pequena duração de burst) é uma boa opção quando se deseja conforto associado a altos níveis de torque. Apesar de relatos favoráveis a seu uso, há uma lacuna com relação ao uso da corrente Aussie para analgesia abaixo do limiar motor.

O objetivo deste estudo foi avaliar os efeitos da corrente Aussie em estudantes com cervicalgia crônica, bem como suas características de acomodação.

MÉTODOS

Estudo quantitativo, experimental e aleatorizado (amostras colhidas por conveniência). Para este estudo foram recrutados 26 estudantes da Universidade Estadual do Oeste do Paraná (UNIOESTE) de ambos os sexos (20 mulheres e 6 homens), com idade média de 21,81±2,48 anos, altura 1,67±0,08m, peso 66,31±14,95kg, e índice de massa corporal (IMC) 23,12±4,27kg/m2, que apresentavam cervicalgia crônica. Os participantes foram separados equitativamente em grupo controle (GC - foram submetidos a tratamento placebo) e grupo corrente Aussie (GA). O cálculo para a amostra, com base na força de preensão, com desvio padrão e diferença a ser detectada de 2,8I/cm22 Silva AF, Costa MA, Soutinho RS, Pedrosa AS. Prevalência de cervicalgia em acadêmicos de odontologia de um Centro Universitário. Rev Port Saúde e Sociedade. 2017;2(2):422-34., poder de 80%, apresentou para cada grupo 12 indivíduos.

Para participar do estudo, os participantes deveriam ter idade de 18 a 30 anos, serem discentes da UNIOESTE, apresentar dor cervical por mais de três meses, com dor ao movimento da cervical, nunca ter feito nenhum tipo de eletroestimulação no local, ter disponibilidade para estar presente durante os períodos de tratamento ou avaliação, e assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

Foram critérios de exclusão: cirurgia relacionada à cervical, gestação, marca-passo cardíaco, ingestão de fármacos analgésicos 30 dias antes da aplicação e durante o período experimental, radiculopatia, alteração de sensibilidade local. Devido a faltas, foram excluídos dois voluntários do GC.

A coleta de dados e as intervenções foram realizadas no Centro de Reabilitação Física (CRF) da UNIOESTE. Foi aplicado o Neck Disability Index (NDI)1010 Cook C, Richardson JK, Braga L, Menezes A, Soler X, Kume P, et al. Cross-cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the Neck Disability Index and Neck Pain and Disability Scale. Spine. 2006;31(14):1621-7., adaptado para o português, que coletou os dados individuais a respeito de intensidade de dor, cuidado pessoal, levantamento de objetos, leitura, dores de cabeça, atenção, trabalho, condução de automóveis, dormir e diversão. Além desse questionário, foi utilizada a escala analógica visual (EAV), por meio de um dispositivo de madeira, com escalímetro variando em 10cm com indicações de sem dor (nível zero) e máxima dor (nível 10). No lado contralateral (visão do avaliador) havia uma régua centimetrada. As avaliações foram aplicadas pré (Av1) e pós-intervenção (Av2), além da sua reaplicação com um mês de seguimento (Av3).

Além das avaliações citadas, foram realizadas nos mesmos momentos a goniometria ativa da coluna cervical, nos movimentos de flexão, extensão, e flexão lateral, com goniômetro universal com avaliação em graus; o teste de força de preensão com uso de um dinamômetro manual (North Coast Medical®), com mensuração em libras por cm2.

A intervenção com a corrente Aussie (Neurodyn - Ibramed®) foi realizada três vezes na semana durante quatro semanas, totalizando 12 aplicações em cada indivíduo. A frequência da base foi de 1000Hz (1kHz), modulada em 50Hz, com duração de ciclo de quatro milissegundos. A intensidade utilizada foi considerada forte, porém não dolorosa, não atingindo o limiar motor. Foram utilizados dois eletrodos de borracha-silicone (2 por 4cm), um sobre a região atlanto-occipital e outro sobre o processo espinhoso da segunda vértebra torácica (Figura 1).

Figura 1
Posição dos eletrodos durante a aplicação da corrente Aussie, utilizados em ambos os grupos

Visto o fenômeno da acomodação à corrente elétrica, foram avaliadas a intensidade e o tempo que demorou para ocorrer a primeira acomodação, na 1ª, 4ª, 8ª e 12ª terapias.

Este estudo foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da UNIOESTE sob nº 2.162.923.

Análise estatística

Os dados são apresentados em mediana, 1º e 3º quartis para NDI e EAV, com comparação dentro dos grupos com teste de Kruskal-Wallis e comparação entre os grupos com Mann-Whitney. Para a força de preensão e goniometria, os dados são apresentados em média e desvio padrão, com comparações realizadas por ANOVA unidirecional e teste t para amostras não pareadas, intra e intergrupos, respectivamente. Para as variáveis de acomodação da corrente, os dados são apresentados em média e desvio padrão, com comparações realizadas por ANOVA unidirecional. Em todos os casos o nível de significância aceito foi de 5%.

RESULTADOS

Não se verificou diferença significativa entre as três avaliações na comparação intra e intergrupos para o NDI e a EAV (Tabela 1).

Tabela 1
Resultados do Neck Disability Index e escala analógica visual, comparando as avaliações realizadas em cada grupo e entre os grupos

Novamente, não foram observadas diferenças significativas na força de preensão e nos movimentos avaliados (Tabela 2).

Tabela 2
Resultados da preensão e goniometria, em média e desvio padrão, comparando as avaliações dentro de cada grupo e entre os grupos

Para a acomodação, com relação ao tempo necessário para ocorrer o primeiro evento, não houve diferenças significativas entre as terapias avaliadas, mas houve para a intensidade, sendo que a primeira apresentou valores menores do que as outras (Tabela 3).

Tabela 3
Resultados das intervenções no grupo tratado, observando o limiar de acomodação (tempo em segundos) e intensidade (miliamperes)

DISCUSSÃO

A crescente utilização das correntes de média frequência na reabilitação segue a teoria de que elas são mais confortáveis e mais eficazes que as correntes de baixa frequência; visto que as primeiras possuem menor impedância na pele, podendo estimular tecidos mais profundos, apesar de relatos apontarem para efeitos antinociceptivos variados entre as correntes1111 Acedo AA, Luduvice Antunes AC, Barros dos Santos A, Barbosa de Oliveira C, Tavares dos Santos C, Colonezi GL, et al. Upper trapezius relaxation induced by tens and interferential current in computer users with chronic nonspecific neck discomfort: an electromyographic analysis. J Back Musculoskelet Rehabil. 2015;28(1):19-24.

12 Dissanayaka TD, Pallegama RW, Suraweera HJ, Johnson MI, Kariyawasam AP. Comparison of the effectiveness of transcutaneous electrical nerve stimulation and interferential therapy on the upper trapezius in myofascial pain syndrome: a randomized controlled study. Am J Phys Med Rehabil. 2016;95(9):663-72.
-1313 Facci LM, Nowotny JP, Tormem F, Trevisani FV. Effects of transcutaneous electrical nerve stimulation (TENS) and interferential currents (IFC) in patients with nonspecific chronic low back pain: randomized clinical trial. São Paulo Med J. 2011;129(4):206-16.. Há necessidade de novas pesquisas com a eletroestimulação no tratamento de algias da coluna vertebral1414 Resende L, Merriwether E, Rampazo ÉP, Dailey D, Embree J, Deberg J, et al. Meta-analysis of transcutaneous electrical nerve stimulation for relief of spinal pain. Eur J Pain. 2018;22(4):663-78..

No presente estudo, a corrente Aussie com base de 1kHz foi utilizada em estudantes com cervicalgia crônica não específica, e avaliada a intensidade da dor pela EAV e a incapacidade funcional pelo NDI. Ambas são formas validadas e consagradas na literatura1010 Cook C, Richardson JK, Braga L, Menezes A, Soler X, Kume P, et al. Cross-cultural adaptation and validation of the Brazilian Portuguese version of the Neck Disability Index and Neck Pain and Disability Scale. Spine. 2006;31(14):1621-7.,1313 Facci LM, Nowotny JP, Tormem F, Trevisani FV. Effects of transcutaneous electrical nerve stimulation (TENS) and interferential currents (IFC) in patients with nonspecific chronic low back pain: randomized clinical trial. São Paulo Med J. 2011;129(4):206-16.,1515 Kawamura H, Nishigami T, Yamamoto A, Tsujishita M, Ito K, Ohya N, et al. Comparison of the pain-relieving effects of transcutaneous electrical nerve stimulation applied at the same dermatome levels as the site of pain in the wrist joint. J Phys Ther Sci. 2017;29(11):1996-9.. Apesar de relatos que a eletroestimulação afeta de forma positiva o tratamento de indivíduos com cervicalgia, como a TENS1212 Dissanayaka TD, Pallegama RW, Suraweera HJ, Johnson MI, Kariyawasam AP. Comparison of the effectiveness of transcutaneous electrical nerve stimulation and interferential therapy on the upper trapezius in myofascial pain syndrome: a randomized controlled study. Am J Phys Med Rehabil. 2016;95(9):663-72.,1616 Maayah M, Al-Jarrah M. Evaluation of transcutaneous electrical nerve stimulation as a treatment of neck pain due to musculoskeletal disorders. J Clin Med Res. 2010;2(3):127-36.,1717 Park C, Choi JB, Lee YS, Chang HS, Shin CS, Kim S, et al. The effect of intra-operative transcutaneous electrical nerve stimulation on posterior neck pain following thyroidectomy. Anaesthesia. 2015;70(4):434-9. e a interferencial1111 Acedo AA, Luduvice Antunes AC, Barros dos Santos A, Barbosa de Oliveira C, Tavares dos Santos C, Colonezi GL, et al. Upper trapezius relaxation induced by tens and interferential current in computer users with chronic nonspecific neck discomfort: an electromyographic analysis. J Back Musculoskelet Rehabil. 2015;28(1):19-24., no presente estudo, as variáveis relacionadas à dor e incapacidade não apresentaram diferenças com relação aos valores basais ou entre os grupos. Já Corrêa et al.1818 Corrêa JB, Costa LO, Oliveira NT, Lima WP, Sluka KA, Liebano RE. Effects of the carrier frequency of interferential current on pain modulation and central hypersensitivity in people with chronic nonspecific low back pain: a randomized placebo-controlled trial. Eur J Pain. 2016;20(10):1653-66. observaram em indivíduos com dor lombar crônica que a corrente interferencial, com base de 1 e 4kHz (AMF de 100Hz, durante 30 minutos, 3 dias na semana por 4 semanas), produziu significativa redução na intensidade da dor. Com o passar do tempo de terapia, houve redução no uso de analgésicos e aumento no limiar de dor à pressão. De forma diferente do presente estudo, o tempo por terapia foi maior, mas, Oliveira et al.1919 Oliveira L, Mota C, Lima L, Abner T, Agripino M, DeSantana J. Effect of different times of administration of transcutaneous electric nerve stimulation (TENS) on the duration of its hypoalgesic effect. J Pain. 2014;15(Suppl 4):S102. avaliando os efeitos analgésicos da TENS mostraram resultados semelhantes entre 20 e 40 minutos.

Também utilizando a corrente interferencial com 1kHz, mas em indivíduos saudáveis, Venancio et al.2020 Venancio RC, Pelegrini S, Gomes DQ, Nakano EY, Liebano RE. Effects of carrier frequency of interferential current on pressure pain threshold and sensory comfort in humans. Arch Phys Med Rehabil. 2013;94(1):95-102. observaram que 20 minutos de estimulação produziram aumento no limiar de dor à pressão, porém é uma frequência mais desconfortável que 4, 8 e 10kHz. Agripino2121 Agripino ME. Efeito hipoalgésico da corrente alternada de média frequência em quilohertz (Aussie) em indivíduos saudáveis: ensaio clínico randomizado. Universidade Federal de Sergipe; 2017. avaliando indivíduos saudáveis, observou eficácia da corrente alternada de média frequência, Aussie, durante 20 minutos, com base de 1 e 4kHz (duração do burst de 2ms, modulada em 50Hz), sobre a intensidade de dor percebida, mas não para o limiar de dor à pressão, sendo que 4kHz mostrou-se superior. No estudo realizado por Pereira et al.2222 Pereira GD, Cassolato KM, Lazarin PH, Canto TO, Portolez JL, Bertolini GR. Interferential current effect, 2000hz, on the induced pain threshold. Rev Bras Med Esporte. 2011;17(4):257-60. foram avaliados os efeitos da corrente interferencial, com base de 2kHz, no limiar de dor induzida, aplicada durante 15 minutos, com os eletrodos dispostos nas raízes nervosas de C3 a T1, de forma transcutânea, pela técnica bipolar. Também não houve alteração no limiar de dor à pressão, mas produziu diminuição do limiar de dor ao frio. Assim, supõe-se que um aumento da frequência base utilizada poderia trazer mais benefícios em relação ao limiar de dor, com intensidade mantida abaixo do limiar de contração e a aplicação em raízes nervosas semelhantes.

Em relação a goniometria, o presente estudo não constatou aumento da amplitude em nenhum dos movimentos cervicais testados, apesar de estarem todos restritos. Já Dissanayaka et al.1212 Dissanayaka TD, Pallegama RW, Suraweera HJ, Johnson MI, Kariyawasam AP. Comparison of the effectiveness of transcutaneous electrical nerve stimulation and interferential therapy on the upper trapezius in myofascial pain syndrome: a randomized controlled study. Am J Phys Med Rehabil. 2016;95(9):663-72. observaram melhoras na ADM cervical em indivíduos que foram submetidos à corrente de baixa frequência, mas não encontraram tais resultados naqueles submetidos à média frequência (interferencial).

Moberg et al.2323 Moberg LL, Lunde LK, Koch M, Tveter AT, Veiersted KB. Association between V̇O-2max, handgrip strength, and musculoskeletal pain among construction and health care workers. BMC Public Health. 2017;17(1):272)., avaliando profissionais da saúde, observaram uma associação entre VO2max, força de preensão e dor musculoesquelética. Assim, no presente estudo, buscou-se observar se a corrente Aussie poderia melhorar a força de preensão por alterações na dor cervical crônica. No entanto, como já descrito, não houve mudanças no quadro álgico, tampouco na força de preensão manual. Resultado semelhante foi visto por Myśliwiec et al.2424 Mysliwiec A, Saulicz E, Kuszewski M, Kokosz M, Wolny T. Assessment of the influence of Sauders traction and transcutaneous electrical nerve stimulation on hand grip force in patients with neck pain. Ortop Traumatol Rehabil. 2011;13(1):37-44. que compararam tração Saunders com TENS em indivíduos com cervicalgia. Eles observaram efeitos de melhora da força de preensão apenas para a primeira opção de tratamento. Já com relação aos efeitos agudos da manipulação vertebral, tanto em indivíduos saudáveis2525 Pereira A, Ogliari P, Debiazi P, Pacini VC, Picanço VV, Carvalho AR, et al. Análise da influência da manipulação na coluna vertebral sobre a força de preensão palmar e limiar de dor. Ter Man. 2011;9(43):278-83. quanto com dor cervical crônica2626 Bautista-Aguirre F, Oliva-Pascual-Vaca Á, Heredia-Rizo AM, Boscá-Gandía JJ, Ricard F, Rodriguez-Blanco C. Effect of cervical vs. thoracic spinal manipulation on peripheral neural features and grip strength in subjects with chronic mechanical neck pain: a randomized controlled trial. Eur J Phys Rehabil Med. 2017;53(3):333-41., não foram observadas diferenças na força de preensão manual.

Com relação à característica de acomodação da corrente elétrica, que é comum a outras formas de eletroestimulação2727 Krueger-Beck E, Nogueira-Neto GN, Neves EB, Nohama P. Potencial de ação: do estímulo à adaptação neural. Fisioter Bras. 2011;24(3):535-47., buscou-se no presente estudo avaliar o comportamento ao longo das terapias, sendo que apenas para a intensidade foi possível observar que houve diferenças entre a primeira terapia e as demais. Isso pode ter ocorrido pela sensação de novidade do uso da corrente, sendo que nos dias seguintes, os voluntários suportavam melhor a intensidade inicial mais elevada. Salienta-se que uma das limitações foi não avaliar o comportamento de outras acomodações dentro da mesma terapia.

CONCLUSÃO

A corrente Aussie, aplicada sem produzir contração muscular, não proporcionou efeitos analgésicos e funcionais significativos em estudantes com cervicalgia crônica, sendo que eles suportaram maiores intensidades ao longo das terapias até que ocorresse sua acomodação.

  • fontes de fomento: não há.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    Jul-Sep 2018

Histórico

  • Recebido
    12 Mar 2018
  • Aceito
    27 Jun 2018
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