Acessibilidade / Reportar erro

Cannabis versus neuromoduladores na dor crônica

RESUMO

JUSTIFICATIVA E OBJETIVOS:

A mudança de paradigma, em nível mundial, em relação ao uso medicinal de cannabis e seus respectivos componentes no tratamento da dor é indiscutível nos tempos atuais. Entender o funcionamento do sistema endocanabinoide e sua interação com fármacos já disponíveis no mercado se faz necessário aos profissionais que cuidam de pacientes com dor crônica. O objetivo deste estudo foi mostrar os mecanismos pelos quais os canabinoides atuam, não somente nos receptores CB1 e CB2, mas também em diversos outros receptores, agindo na modulação da dor crônica, bem como incentivar os profissionais da saúde a reconhecerem a necessidade de ampliar o conhecimento acerca desse funcionamento e sinergismo com diversos fármacos para que ocorra o uso seguro da cannabis no tratamento de múltiplas doenças, sobretudo dores crônicas.

CONTEÚDO:

A ação dos canabinoides no sistema endocanabinoide tem a capacidade de neuro e imunomodulação da transmissão da dor de forma multifatorial e extremamente complexa, atuando simultaneamente em múltiplos alvos, no sistema nervoso periférico, espinhal e supraespinhal. Os mecanismos de analgesia determinados pelos canabinoides incluem a inibição de liberação de neurotransmissores e neuropeptídeos nos terminais nervosos pré-sinápticos, a modulação da excitabilidade neuronal pós-sináptica, a ativação da via inibitória descendente e a redução da inflamação neural. Existe ainda a possibilidade de que a interação dos canabinoides com receptores opioides e serotoninérgicos tenha uma ação amplificadora do efeito analgésico de fármacos pertencentes à classe opioide.

CONCLUSÃO:

O sistema endocanabinoide desempenha um papel fundamental no controle da dor e na sua fisiopatologia. Espera-se que esse sistema continue a ser estudado para uma melhor compreensão das suas vias de sinalização e metabolismo. É preciso também que se realizem mais ensaios clínicos, de maior dimensão e duração, para compreender até que ponto essa abordagem poderá ser benéfica no tratamento da dor crônica.

Descritores:
Cannabis sativa ; Dor crônica; Endocanabinoides

ABSTRACT

BACKGROUND AND OBJECTIVES:

The change of paradigm in relation to the medical use of cannabis and its components in the treatment of pain is undeniable nowadays. Understanding the functioning of the endocannabinoid system and its interaction with drugs already available on the market is necessary for professionals who care for patients with chronic pain. The aim of this study was to show the mechanisms by which cannabinoids act, not only on CB1 and CB2 receptors, but also on various other receptors, modulating chronic pain, and encourage health professionals to recognize the need to expand the knowledge about its functioning and synergism with several medications so that the safe use of cannabis occurs in the treatment of multiple diseases, especially chronic pain.

CONTENTS:

The action of cannabinoids on the endocannabinoid system has the ability to neuro and immunomodulate pain transmission in a multifactorial and extremely complex way, acting simultaneously on multiple targets, in the peripheral, spinal and supraspinal nervous system. The analgesia mechanisms determined by cannabinoids include the inhibition of the release of neurotransmitters and neuropeptides in presynaptic nerve terminals, modulation of postsynaptic neuronal excitability, activation of the descending inhibitory pathway and reduction of neural inflammation. There is also the possibility that the interaction of cannabinoids with opioid and serotonergic receptors has an amplifying effect on the analgesic effect of drugs belonging to the opioid class.

CONCLUSION:

The endocannabinoid system plays a key role in pain control and its pathophysiology. It is expected that this system will continue to be studied for a better understanding of its signaling pathways and metabolism, and also that more clinical trials of greater size and duration will be carried out to understand to what extent this approach can be beneficial in the treatment of chronic pain.

Keywords:
Cannabis sativa ; Chronic pain; Endocannabinoids

INTRODUÇÃO

O interesse pela Cannabis sativa tem sido demonstrado, com as atuais pesquisas científicas, para as mais diferentes e crescentes aplicações terapêuticas.

No século XX, quando os primeiros componentes químicos da planta foram identificados, houve esforços crescentes para entender o mecanismo de ação dos mesmos e sua interação com a fisiologia humana, o que levou à descoberta de receptores específicos para os canabinoides e ligantes endógenos, denominados endocanabinoides. Foram também identificadas suas vias metabólicas, o que deu origem ao que hoje se conhece como sistema endocanabinoide11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.. Posteriormente, alterações na sinalização, concentrações modificadas de endocanabinoides e alteração na expressão dos receptores canabinoides foram encontradas e associadas a diversas doenças, o que levou a um esforço em modular esse sistema com vista a obter resultados terapêuticos. Atualmente sabe-se que o sistema endocanabinoide desempenha um papel fundamental no controle da dor e na sua fisiopatologia11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46..

O interesse em investigar a relação entre o sistema endocanabinoide e a dor crônica deve-se ao fato desse tipo de dor, além de ser uma condição complexa que compromete intensamente a qualidade de vida, estar associado a um grande custo econômico e a uma menor produtividade laboral. A dor crônica é definida pela Associação Internacional para Estudo da Dor (IASP) como a dor que persiste ou recorre por mais de 3 meses22 Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennett MI, Benoliel R, Cohen M, Evers S, Finnerup NB, First MB, Giamberardino MA, Kaasa S, Korwisi B, Kosek E, Lavand’homme P, Nicholas M, Perrot S, Scholz J, Schug S, Smith BH, Svensson P, Vlaeyen JWS, Wang SJ. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain; 2019;160(1):19-27.. Ela representa um dos problemas de saúde mais prevalentes, afetando cerca de 20% das pessoas em todo o mundo. A dor crônica é multifatorial: fatores biológicos, psicológicos e sociais contribuem para a síndrome dolorosa. Os mecanismos fisiopatológicos da dor crônica são complexos, havendo uma carência de fármacos eficazes no seu tratamento, o que leva à necessidade de descobrir novas estratégias terapêuticas.

Os canabinoides agem de modo simultâneo ou sinérgico em múltiplos alvos relacionados à dor no sistema nervoso central (SNC) e periférico (SNP)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Além de atuarem nos receptores canabinoides (CB1 e CB2), os canabinoides podem modular a dor através da interação com o receptor 55 acoplado à proteína G – RPG55 (GPR55) e o RPG18 (GPR18), que é também conhecido como receptor N-araquidonil glicina (NAGly), assim como outros receptores acoplados à proteína G – RAPG (G protein-coupled receptors – GPCRs) bem conhecidos, tais como serotonina (5-HT) e receptores opioides33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Os canabinoides podem interagir com diferentes canais iônicos receptores de potencial transitório (TRPV, TRPA e TRPM)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,44 Pertwee RG, Howlett AC, Abood ME, Alexander SP, Di Marzo V, Elphick MR, Greasley PJ, Hansen HS, Kunos G, Mackie K, Mechoulam R, Ross RA. International union of basic and clinical pharmacology. LXXIX. Cannabinoid receptors and their ligands: beyond CB1 and CB2. Pharmacol Rev. 2010;62(4):588-631.. O TRPV1 está envolvido no controle de temperatura, transmissão e modulação da dor, bem como na integração de diversos estímulos dolorosos33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Também têm vários efeitos sobre a superfamília de receptores cys-loop de canais iônicos ativados por ligante (por exemplo, receptores nicotínicos acetilcolina, glicina, GABAA, GABAA-ρ, 5-HT3)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Anandamida, tetrahidrocanabinol (THC) e canabidiol (CBD) ativam diretamente os receptores de glicina, contribuindo para a analgesia induzida pelo canabinoide na dor inflamatória e neuropática, enquanto o 2-araquidonoilglicerol (2-AG) e o CBD são moduladores alostéricos positivos, principalmente nas subunidades α2 do receptor GABAA33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Por outro lado, o THC é um modulador alostérico negativo e inibe receptores nicotínicos e 5-HT333 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,55 Barann M, Molderings G, Brüss M, Bönisch H, Urban BW, Göthert M. Direct inhibition by cannabinoids of human 5-HT3A receptors: probable involvement of an allosteric modulatory site. Br J Pharmacol. 2002;137(5):589-96.. Os canabinoides podem exercer outros efeitos antinociceptivos mediados por receptor não CB1/não CB2 ao interagir com receptores 5HT3 e N-metil-d-aspartato (glutamatérgico)44 Pertwee RG, Howlett AC, Abood ME, Alexander SP, Di Marzo V, Elphick MR, Greasley PJ, Hansen HS, Kunos G, Mackie K, Mechoulam R, Ross RA. International union of basic and clinical pharmacology. LXXIX. Cannabinoid receptors and their ligands: beyond CB1 and CB2. Pharmacol Rev. 2010;62(4):588-631..

A ação anti-inflamatória dos canabinoides pode contribuir para seus efeitos analgésicos. A ação do CBD como um agonista inverso do CB2 pode explicar suas propriedades anti-inflamatórias. Alguns canabinoides modulam e ativam diferentes isoformas dos receptores nucleares ativados por proliferadores de peroxissoma (PPAR α, β e γ)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

Adicionalmente, os componentes não canabinoides da planta cannabis (por exemplo, terpenoides e flavonoides) podem contribuir para os efeitos analgésico e anti-inflamatório da cannabis33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

O sistema endocanabinoide (SEC) é um sistema neuromodulador que desempenha um papel no desenvolvimento do SNC, na plasticidade sináptica e na resposta frente a estimulações nocivas endógenas e ambientais.

O SEC é composto por:

  1. endocanabinoides ou canabinoides endógenos ou ligantes endógenos: anandamida e 2-araquidonoilglicerol (2-AG). Existem outras moléculas canabimiméticas endógenas sendo investigadas que ampliarão o número de endocanabinoides;

  2. receptores: receptores de canabinoides 1 e 2 (CB1 e CB2);

  3. enzimas responsáveis pela síntese, transporte e degradação dos endocanabinoides: NAPE-PLD, DAGL, FAAH, MAGL.

O SEC caracteriza-se por uma ampla distribuição em todo o corpo. Constitui um sistema neuromodulatório ubiquitário, fundamental na fisiologia básica e em aspectos comportamentais. Parece estar envolvido em condições fisiopatológicas em nível central e periférico66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22..

ENDOCANABINOIDES – MECANISMO DE AÇÃO

Os endocanabinoides são uma das exceções à lei da polarização dinâmica, proposta por um estudo de 1891, o qual postulou que o sentido ortodrômico da comunicação interneural procede dos terminais axonais pré-sinápticos para dendritos pós-sinápticos. Diferentemente dos neurotransmissores clássicos, os endocanabinoides funcionam como mensageiros retrógados extracelulares em sentido antidrômico, sendo liberados do neurônio pós-sináptico para atuar nos CB1 pré-sinápticos de forma autócrina e parácrina66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22..

Os endocanabinoides derivam de precursores fosfolipídicos da membrana celular, sendo produzidos sob demanda nos neurônios pós-sinápticos, portanto não são sintetizados nas terminações pré-sinápticas ou armazenados em vesículas como os neurotransmissores clássicos66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22.. A síntese de endocanabinoides ocorre em resposta ao aumento da concentração intracelular de cálcio (Ca2+) por despolarização neuronal ou mobilização dos depósitos intracelulares (via estimulação de receptores acoplados a proteínas Gq/G11) e/ou por ativação enzimática direta pelas proteínas Gq/G11. Após a síntese, são transportados através da membrana celular e atingem os locais de ligação, situados nas hélices dos receptores que atravessam e ultrapassam os limites internos e externos da membrana (transmembrana), difundindo-se lateralmente entre suas camadas. O consequente influxo de Ca2+ (via CCV – canais de cálcio dependentes de voltagem e receptores tipo NMDA, NMDA-R) funciona como segundo mensageiro, modulando a liberação de outros neurotransmissores66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22., que são inativados principalmente por recaptação (neurônios e glia), posteriormente hidrolisados por enzimas específicas. A anandamida é metabolizada pelo ácido graxo amida hidroxilase (FAAH) em etanolamina e ácido araquidônico, e o 2-AG por uma lipase de monoacilglicerol (embora também pela FAAH)66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22.. O sistema endocanabinoide constitui uma defesa celular contra a excitotoxicidade em situações de hiperatividade aguda de vias neuronais.

Anandamida (AEA)

A AEA (N-araquidoniletanolamida), conjugação de “ananda” (sânscrito para “felicidade eterna”) com “amida”, foi o primeiro endocanabinoide descoberto. É um agonista parcial dos receptores CB1 e CB2, mas um agonista total (com baixa afinidade) do receptor de potencial transitório vaniloide 1 (TRPV1). Embora a AEA seja um agonista parcial, tem uma seletividade e maior afinidade ao receptor CB1 do que o 2-AG e parece ser o principal endocanabinoide33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22..

A AEA pode desempenhar um papel duplo na nocicepção: antinociceptivo em receptores canabinoides e pronociceptivo no receptor TRPV1. Ela tem um “efeito tétrade” notável quando injetada em camundongos. A tétrade é uma combinação de inibição da atividade motora, catalepsia, hipotermia e hipoalgesia, também interagindo com outros sistemas neurotransmissores que podem ter um papel na nocicepção. Os canabinoides podem inibir diretamente os receptores 5-HT3, levando a analgesia e efeitos de neuroproteção. A anandamida exerce parte de seus efeitos no SNC através dos receptores 5-HT3. Além disso, foi demonstrado que concentrações micromolares de anandamida ligam-se a receptores 5-HT1 e 5-HT2, descrevendo assim o papel da anandamida em outros sistemas neurotransmissores33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

2-Araquidonoilglicerol (2-AG)

O 2-AG é um agonista total nos receptores CB1 e CB2 que pode ser liberado a partir do neurônio pós-sináptico por difusão simples e/ou através de processo facilitado por uma proteína transportadora. Uma vez ligado ao CB1, a ativação leva à inibição da liberação do neurotransmissor na célula pré-sináptica via canais de Ca2+ dependentes de voltagem e estimulação dos canais de K+ retificadores de entrada na célula.

Após a despolarização neuronal, a liberação de glutamato das vesículas pré-sinápticas dependentes de Ca2+ ativa os receptores NMDA nos neurônios pós-sinápticos, levando a correntes pós-sinápticas. Essa variação da excitabilidade da membrana desencadeia rapidamente a síntese de 2-AG. Então, o 2-AG, de forma retrógrada, vai aos terminais pré-sinápticos para estimular os receptores CB1 que, por sua vez, ativam os canais K+ e inversamente inibem os canais de Ca2+, inibindo assim a liberação de neurotransmissores excitatórios (Figura 1).

Figura 1.
Síntese de 2-AG e sinalização retrógrada.

ENDOCANABINOIDES MODULAÇÃO DA DOR

A dor é caracterizada pela detecção de estímulos nocivos pelos receptores sensitivos específicos, os nociceptores, anatomicamente apresentados como terminações nervosas livres de fibras axonais Aδ e C, cada uma com as suas particularidades, com a capacidade de detectar estímulos dolorosos e conduzi-los ao córtex cerebral, onde são interpretados como dor11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.. Na dor crônica (DC), os mecanismos fisiopatológicos não estão totalmente elucidados, tornando difícil o tratamento, com resultados nem sempre satisfatórios.

Estudos neurofisiológicos têm contribuído no esclarecimento da fisiopatologia da doença, revelando, por exemplo, o aumento de atividade nas fibras nervosas somatossensitivas ou mudanças no controle endógeno da nocicepção11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46..

Os mecanismos fisiopatológicos subjacentes à DC incluem processos complexos de sensibilização periférica e central. Ações antinociceptivas a partir do sistema endocanabinoide foram demonstradas em numerosos modelos de dor animal77 Guindon J, Hohmann A. The endocannabinoid system and pain. CNS Neurol Disord Drug Targets. 2009;8(6):403-21.. Os endocanabinoides são produzidos sob demanda (sem armazenamento em vesículas sinápticas) nos neurônios pós-sinápticos. Quando ocorrem estímulos nociceptivos, há um aumento da liberação de endocanabinoides, levando a efeitos de modulação da dor. Pesquisas em animais mostram que os endocanabinoides têm ações analgésicas nas vias de dor periférica, espinhal e supraespinhal33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

Mecanismos periféricos

Na periferia, receptores CB1 localizam-se em terminais aferentes sensitivos onde os endocanabinoides agem para controlar a transdução da dor a partir de estímulos nociceptivos, enquanto os receptores CB2, localizados em células do sistema imune e queratinócitos, intervêm na liberação de endorfinas, atuando nos receptores opioides dos neurônios aferentes primários, inibindo assim a nocicepção11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.,33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. Os modelos de dor inflamatória mostram concentrações elevadas de anandamida e 2-AG nos tecidos periféricos33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. O receptor canabinoide CB2 na periferia desempenha um papel vital na analgesia.

Estudos mostram que o 2-AG participa de múltiplos mecanismos que levam à modulação da dor, incluindo a inibição da produção e liberação de espécies reativas de oxigênio (ROS) e citocinas, assim como a liberação de opioides endógenos periféricos33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. Há mais pesquisas descrevendo as ações anti-inflamatórias e antinociceptivas mediadas pelo 2-AG em comparação com a anandamida.

Essa ação na periferia constitui uma promessa considerável para separar os efeitos terapêuticos dos efeitos adversos indesejados no SNC77 Guindon J, Hohmann A. The endocannabinoid system and pain. CNS Neurol Disord Drug Targets. 2009;8(6):403-21..

Mecanismos espinhais

Os endocanabinoides têm efeitos antinociceptivos na medula espinhal devido à elevada expressão dos receptores CB1 nos gânglios da raiz dorsal e nos terminais nociceptivos do corno dorsal, onde inibe a liberação de neurotransmissores envolvidos na transmissão da dor11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.. Nesse nível, o 2-AG inibe a liberação de neurotransmissores pronociceptivos dos terminais aferentes primários mediados pelos receptores CB133 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43..

O CB2, na medula espinhal, parece modular as respostas imunes centrais, o que foi implicado no desenvolvimento e sensibilização neuronal na dor neuropática11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.. A anandamida mostrou efeitos anti-nociceptivos na dor aguda e crônica através de receptores CB2 expressos em interneurônios inibitórios e células gliais33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. Esses efeitos foram mostrados em um modelo experimental, no qual horas após uma incisão cirúrgica periférica, houve uma diminuição acentuada das concentrações de anandamida, enquanto não houve alterações da concentração de 2-AG33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. As concentrações de anandamida retornaram à linha de base à medida que o comportamento nociceptivo diminuiu. As concentrações de 2-AG aumentaram posteriormente em conjunto com a ativação das células gliais, a regulação positiva do receptor CB2 e a resolução do estado de dor33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43..

Os endocanabinoides têm efeitos diferentes na modulação da dor. A anandamida exerce sua ação no início da dor, enquanto o 2-AG desempenha um papel na resolução da dor33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

Mecanismos supraespinhais

Diversos estudos têm atribuído um papel importante ao sistema endocanabinoide na modulação dos estímulos dolorosos no nível supraespinhal. O CB1 inibe a transmissão nociceptiva ascendente, principalmente no tálamo e no tronco cerebral, modifica a interpretação subjetiva da dor pela modulação da atividade neuronal nos circuitos fronto-límbicos (mais especificamente na amígdala) e nas áreas corticais, e ativa a via inibitória descendente através da inibição da liberação de ácido gama-aminobutírico (GABA) na substância cinzenta periaquedutal (PAG) e núcleos do rafe11 Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.,33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,88 Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.. A anandamida tem efeito bifásico no nível supraespinal de modulação da dor, sendo liberada devido à estimulação da substância cinzenta periaquedutal (PAG) ou à presença de inflamação periférica99 Reggio PH. Endocannabinoid binding to the cannabinoid receptors: what is known and what remains unknown. Curr Med Chem. 2010;17(14):1468-86.. Na dor aguda, a anandamida liberada causa ações antinociceptivas. Quando altas concentrações de anandamida ocorrem devido a uma estimulação prolongada, ela modula as respostas pronociceptivas através da ligação ao TRPV1920 Pertwee RG. The diverse CB1 and CB2 receptor pharmacology of three plant cannabinoids: Δ9-tetrahydrocannabinol, cannabidiol and Δ9-tetrahydrocannabivarin. Br J Pharmacol. 2008;153(2):199-215..

Efeito sinérgico da anandamida e do 2-AG

Na modulação da dor nos níveis espinhal e supraespinhal, a anandamida e o 2-AG têm papéis sinérgicos, porém diferentes. A analgesia induzida por estresse exibe um efeito sinérgico de anandamida e 2-AG através da indução de sinalização GABAérgica inibitória descendente para a medula espinhal, mediando assim a analgesia induzida por estresse99 Reggio PH. Endocannabinoid binding to the cannabinoid receptors: what is known and what remains unknown. Curr Med Chem. 2010;17(14):1468-86.. Em um estudo prolongado de modulação com aplicação de choque no pé, ambos os endocanabinoides foram liberados no gânglio da raiz dorsal de L5 ipsilateral após estimulação33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1010 Luchicch A, Pistis M. Anandamide and 2-arachidonoylglycerol: pharmacological properties, functional features, and emerging specificities of the two major endocannabinoids. Mol Neurobiol. 2012;46(2):374-92.. Os receptores CB1 no gânglio da raiz dorsal e os receptores CB2 na periferia envolveram uma interação sinérgica entre anandamida e 2-AG33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1010 Luchicch A, Pistis M. Anandamide and 2-arachidonoylglycerol: pharmacological properties, functional features, and emerging specificities of the two major endocannabinoids. Mol Neurobiol. 2012;46(2):374-92.. Ambos os níveis de endocanabinoides mostraram-se aumentados após 3 e 7 dias de lesão por constrição crônica no nervo ciático de um rato33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1010 Luchicch A, Pistis M. Anandamide and 2-arachidonoylglycerol: pharmacological properties, functional features, and emerging specificities of the two major endocannabinoids. Mol Neurobiol. 2012;46(2):374-92.. Após 3 dias, os níveis de endocanabinoides aumentaram apenas na medula espinhal e na PAG. No entanto, após 7 dias, concentrações elevadas também foram detectadas no bulbo ventral rostral33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1010 Luchicch A, Pistis M. Anandamide and 2-arachidonoylglycerol: pharmacological properties, functional features, and emerging specificities of the two major endocannabinoids. Mol Neurobiol. 2012;46(2):374-92.. Esse estudo forneceu evidências de cooperação endocanabinoide em relação ao envolvimento sinérgico na regulação da dor.

A DC aumenta os efeitos de sinalização endocanabinoide tanto da anandamida quanto do 2-AG. Uma regulação positiva dos receptores CB2 encontrados em tais estados de dor se beneficiaria do agonismo endocanabinoide33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,99 Reggio PH. Endocannabinoid binding to the cannabinoid receptors: what is known and what remains unknown. Curr Med Chem. 2010;17(14):1468-86.. As cascatas de sinalização de 2-AG das células microgliais mediam os efeitos na dor persistente33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,99 Reggio PH. Endocannabinoid binding to the cannabinoid receptors: what is known and what remains unknown. Curr Med Chem. 2010;17(14):1468-86..

RECEPTORES ENDOCANABINOIDES

Receptores CB1

CB1 centrais

O receptor CB1 é o RAPG (GPCR) mais abundante no cérebro de mamíferos. Assim, é referido como o “receptor canabinoide do cérebro”33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Esses receptores são expressos centralmente em todas as estruturas cerebrais e em densidade decrescente, desde o bulbo olfatório, cerebelo, hipocampo, núcleos da base, córtex e amígdala até o hipotálamo, tálamo e tronco cerebral.

Os receptores CB1 são expressos na maioria das áreas do cérebro em terminais pré-sinápticos de neurônios glutamatérgicos e GABAérgicos33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Além disso, os receptores CB1 também podem ser expressos pós-sinapticamente, podendo formar heterodímeros em associação com outros RAPGs (GPCRs), incluindo os receptores de dopamina D2, adenosina A2 ou orexina tipo 133 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

A região intracelular de CB1 é mais regularmente acoplada às proteínas Gi/o. Consequentemente, a ativação dos receptores CB1 inibe a atividade da adenilatociclase com subsequente redução do nível de adenosina monofosfato cíclico intracelular (AMPc) ou promove a atividade da proteína quinase ativada por mitógenos – PQAM (mitogenactivated protein kinase MAPK) (figura 2). A diminuição do nível de AMPc leva à ativação dos canais de K+ dependentes de voltagem e à inibição dos canais de Ca2+, diminuindo assim a liberação de neurotransmissores. Nos neurônios, a ativação CB1 de Gi/o também pode inibir diretamente os canais de Ca2+ dependentes de voltagem1111 Pertwee RG. Pharmacology of cannabinoid CB1 and CB2 receptors. Pharmacol Ther. 1997;74(2):129-80..

Figura 2.
Ativação do receptor CB1

A região intracelular do CB1 é mais regularmente acoplada a proteínas Gi/o. A ativação de receptores CB1 por um ligante (2-AG) inibe a atividade da adenilato ciclase com subsequente redução do monofosfato de adenosina cíclico intracelular (AMPc) ou aumenta a PQAM (proteína quinase ativado por mitógenos). A redução de AMPc leva à ativação de K+ dependente de voltagem e inibição de Canais de Ca2+, inibindo a liberação de neurotransmissores. O conceito mostrado na figura é defendido por um estudo33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. 2-AG, 2-araquidonoilglicerol; CB1, receptor canabinoide 1; CB2, receptor canabinoide 2; PQAM, proteína quinase ativada por mitógenos; RAPG, receptores acoplados à proteína G.

A despolarização neuronal desencadeia rapidamente a síntese de endocanabinoides, particularmente 2-AG, nos neurônios pós-sinápticos. Subsequentemente, o 2-AG atua de forma retrógrada nos receptores CB1, nos terminais pré-sinápticos, e depois é inativado por enzimas hidrolíticas. Essa síntese de endocanabinoides “sob demanda” leva à ativação de canais de K+ e inibição de canais de Ca2+ mediada por CB1, controlando assim a liberação de neurotransmissores excitatórios e inibitórios, que eventualmente sintonizam a duração da atividade sináptica e plasticidade sináptica1212 Wilson RI, Nicoll RA. Endogenous cannabinoids mediate retrograde signaling at hippocampal synapses. Nature. 2001;410(6828):588-92. Erratum in: Nature. 2001.422(6840):974.. O CB1 também é encontrado em células não neuronais do cérebro, predominantemente em astrócitos, onde sua ativação estimula a liberação de neurotransmissores. A ativação do receptor CB1 astroglial parece induzir níveis intracelulares de Ca2+, desencadeando a liberação de glutamato e a ativação subsequente de receptores de glutamato metabotrópicos pré-sinápticos1313 Navarrete M, Araque A. Endocannabinoids potentiate synaptic transmission through stimulation of astrocytes. Neuron. 2010;68(1):113-26..

CB1 periféricos

Os receptores CB1 também são expressos no SNP e em quase todos os tecidos e órgãos de mamíferos, incluindo as glândulas suprarrenais, músculo liso e esquelético, coração, pulmão, trato gastrointestinal, fígado, aparelhos reprodutores masculino e feminino, ossos, tecido adiposo e pele33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.. Os receptores CB1 desempenham papel vital na manutenção da homeostase e na regulação das funções adrenais, cardiovasculares, pulmonares, gastrointestinais e de reprodução, entre outras. Estão localizados principalmente nos terminais sensitivos aferentes, onde os endocanabinoides atuam para controlar a transdução de estímulos nociceptivos, desempenhando assim um papel importante na sensibilização da dor periférica33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

Receptores CB2

CB2 centrais

A função do CB2 no cérebro ainda é controversa. Em contraste aos CB1, os receptores CB2 são limitados no cérebro, sua expressão é restrita a células neuronais específicas e se tornam abundantes em micróglia e astrócitos ativados. Esses receptores desempenham um papel importante na função imunológica, na inflamação e na modulação da dor, especialmente em estados de alodinia e hiperalgesia. Com o objetivo de identificar o papel do receptor CB2 na regulação das respostas imunes centrais que levam ao desenvolvimento da DC neuropática, um grupo de pesquisadores utilizou ratos geneticamente modificados sem expressão de CB2 e com superexpressão de CB2 num modelo de dor neuropática induzida. A eliminação dos receptores CB2 gerou um aumento das manifestações (hiperalgesia e alodinia) da dor neuropática. Por outro lado, a superexpressão dos receptores CB2 atenuou essas manifestações. Essas descobertas fomentaram o interesse em estudar agonistas desse receptor para o tratamento da dor neuropática1414 Racz I, Nadal X, Alferink J, Baños JE, Rehnelt J, Martín M, Pintado B, Gutierrez-Adan A, Sanguino E, Manzanares J, Zimmer A, Maldonado R. Crucial role of CB(2) cannabinoid receptor in the regulation of central immune responses during neuropathic pain. J Neurosci. 2008;28(46):12125-35..

A presença de receptores CB2 na microglia dentro do sistema nervoso pode explicar o papel dos canabinoides na modulação da dor neuropática, reduzindo a neuroinflamação mediada por citocinas1515 Hulsebosch CE. Special issue on microglia and chronic pain. Exp Neurol. 2012;234(2):253-4.. Assim como o CB1, o receptor CB2 é um RAPG (GPCR) e está acoplado à proteína Gi/Go α. Assim, sua estimulação inibe a atividade da adenilato ciclase e ativa a PQAM (MAPK).

Os agonistas seletivos de CB2 suprimem a atividade neuronal no corno dorsal por meio da redução da atividade da fibra C e do encerramento envolvendo neurônios de ampla faixa dinâmica (WDR). Há aumento da expressão periférica da proteína do receptor CB2 ou mRNA em tecidos inflamados e no gânglio da raiz dorsal em estados neuropáticos33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

CB2 periféricos

Os CB2 são expressos, sobretudo, nas células do sistema imunológico, como monócitos, macrófagos, células B e T e mastócitos. A ativação do receptor CB2 reduz a liberação de citocinas pró-inflamatórias e fatores linfoangiogênicos.33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p. Além disso, os receptores CB2 também estão presentes em outros órgãos periféricos que desempenham um papel na resposta imune, incluindo o baço, amígdalas, timo e queratinócitos, bem como no aparelho digestivo. Assim, os receptores CB2 representam os principais reguladores das respostas inflamatórias e nociceptivas e podem controlar a ativação e migração de células imunes33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

RECEPTORES ENDOCANABINOIDES PUTATIVOS: TRPV1 E RPG55

TRPV1

O receptor vaniloide tipo 1 (TRPV1), também conhecido como receptor de capsaicina, foi o primeiro membro da subfamília de canais TRPV a ser descoberto e clonado. Os canais TRPV1 são ativados pela capsaicina, endocanabinoides e fitocanabinoides33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p., tendo localização pré-sináptica e, sobretudo, pós-sináptica intracelular. Esses canais são filogeneticamente relacionados com receptores canabinoides, constituindo os receptores putativos66 Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22..

A função do TRPV1 é fortemente dependente da ligação de proteínas reguladoras que induzem mudanças em seu estado de fosforilação. A fosforilação induzida por adenosina trifosfato (ATP), proteína quinase A (PKA) e C (PKC), proteína de ligação a fosfoinositideo (PIRT) e fosfatidilinositol 4,5-bifosfato (PIP2) é necessária para a ativação do TRPV1 e de canais de cátions. A ativação do TRPV1 contribui para transmissão da dor, inflamação neurogênica, plasticidade sináptica, superexcitabilidade neuronal e neurotoxicidade33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1616 Iannotti FA, Hill CL, Leo A, Alhusaini A, Soubrane C, Mazzarella E, Russo E, Whalley BJ, Di Marzo V, Stephens GJ. Nonpsychotropic plant cannabinoids, cannabidivarin (CBDV) and cannabidiol (CBD), activate and desensitize transient receptor potential vanilloid 1 (TRPV1) channels in vitro: potential for the treatment of neuronal hyperexcitability. ACS Chem Neurosci. 2014;5(11):1131-41.. A “dessensibilização” do TRPV1 ocorre quando o aumento do Ca2+ intracelular, após estimulação do TRPV1, ativa a proteína (ou seja, calmodulina) que estabiliza o canal em um estado conformacional fechado ou por fosfatase dependente de Ca2+ (ou seja, calcineurina), que desfosforila e inativa o TRPV1. Acredita-se que esse processo rápido de dessensibilização e inativação do TRPV1 seja a base dos efeitos analgésicos, anti-inflamatórios e anticonvulsivos paradoxais dos agonistas do TRPV133 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.,1616 Iannotti FA, Hill CL, Leo A, Alhusaini A, Soubrane C, Mazzarella E, Russo E, Whalley BJ, Di Marzo V, Stephens GJ. Nonpsychotropic plant cannabinoids, cannabidivarin (CBDV) and cannabidiol (CBD), activate and desensitize transient receptor potential vanilloid 1 (TRPV1) channels in vitro: potential for the treatment of neuronal hyperexcitability. ACS Chem Neurosci. 2014;5(11):1131-41..

Os canais TRPV1 são amplamente expressos nos gânglios da raiz dorsal e nas fibras nervosas tipo Aδ e C. Nos neurônios sensitivos, os canais TRPV1 funcionam como integradores moleculares para vários tipos de entradas sensitivas que contribuem para gerar e transmitir a dor. Nos neurônios centrais, quantidades menores de canais TRPV1 são expressas tanto pré-sinapticamente quanto pós-sinapticamente, assim atuando para regular a força sináptica. Eles geralmente afetam a dor, a ansiedade e a depressão induzindo efeitos opostos aos exercidos, pelos receptores CB1, no mesmo contexto1718 Iannotti FA, Di Marzo V, Petrosino S. Endocannabinoids and endocannabinoid-related mediators: targets, metabolism and role in neurological disorders. Prog Lipid Res. 2016;62:107-28.. Além disso, há crosstalk intracelular entre TRPV1 e CB1 ou CB2, pois são co-localizados em neurônios periféricos e centrais (neurônios sensitivos, gânglios da raiz dorsal, medula espinhal, neurônios cerebrais). Recentemente, foi descoberta uma multiplicidade de interações entre os receptores canabinoides, opioides e TRPV1 na modulação da dor1819 Zádor F, Wollemann M. Receptome: interactions between three pain-related receptors or the “triumvirate” of cannabinoid, opioid and TRPV1 receptors. Pharmacol Res. 2015;102:254-63.. Isso oferece grande oportunidade para o desenvolvimento de novos ligantes de múltiplos alvos para controle da dor com melhores eficácia e perfil de efeitos adversos.

RPG55 (GPR55)

O RPG55 (GPR55) pertence à grande família dos RAPGs, e seu ligante endógeno é o lisofosfatidilinositol (LPI). É considerado por alguns especialistas como o terceiro receptor canabinoide, CB3. O RPG55 é ativado por Δψ-THC quando antagonizado por CBD. Existem dados conflitantes sobre a probabilidade de que baixas concentrações de endocanabinoides possam ativar RPG55. Essas controvérsias podem ser explicadas pela sinalização tendenciosa, dependendo do tipo e da condição da célula ou da formação de heterômeros entre os receptores RPG55 e CB1. A ativação de RPG55 pode desempenhar um papel oposto ao do CB1, aumentando a liberação de neurotransmissores. O RPG55 pode desempenhar um papel na hiperalgesia mecânica associada às dores inflamatória e neuropática33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

FITOCANABINOIDES (THC E CBD)

THC

O Δ9-tetrahidrocanabinol (THC) é um análogo do endocanabinoide anandamida (AEA). É responsável pela maioria das ações farmacológicas da cannabis, incluindo as atividades psicoativas, na memória, analgésicas, anti-inflamatórias, antioxidantes, antipruriginosas, broncodilatadoras, antiespasmódicas e como relaxante muscular. O THC atua como agonista parcial nos receptores CB1 e CB21920 Pertwee RG. The diverse CB1 and CB2 receptor pharmacology of three plant cannabinoids: Δ9-tetrahydrocannabinol, cannabidiol and Δ9-tetrahydrocannabivarin. Br J Pharmacol. 2008;153(2):199-215.. O THC tem uma afinidade de ligação muito alta ao receptor CB1, que medeia suas propriedades psicoativas. Curiosamente, a maioria dos efeitos negativos do THC, efeitos psíquicos, prejuízo da memória, ansiedade e imunossupressão, podem ser revertidos por outros constituintes da planta cannabis (outros canabinoides, CBD, terpenoides e flavonoides)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

Canabidiol (CBD)

O CBD é o outro canabinoide importante na planta cannabis. É o análogo não psicoativo do THC. Ele tem atividades analgésicas, anti-inflamatórias, anticonvulsivantes e ansiolíticas significativas sem o efeito psicoativo do THC. O CBD apresenta pouca afinidade de ligação aos receptores CB1 ou CB2, mas pode antagonizá-los na presença de THC. O CBD se comporta como um modulador alostérico negativo não competitivo do receptor CB1 e reduz a eficácia do THC e da AEA2021 Laprairie RB, Bagher AM, Kelly ME, Denovan-Wright EM. Cannabidiol is a negative allosteric modulator of the cannabinoid CB1 receptor. Br J Pharmacol. 2015;172(20):4790-805.. Isso pode explicar o “efeito entourage” que o CBD exibe, pois melhora a tolerabilidade e a segurança do THC, reduzindo a probabilidade de efeitos psicoativos e de outros efeitos adversos, como taquicardia, sedação e ansiedade.

FITOCANABINOIDES – MODULAÇÃO DA DOR

Os fitocanabinoides THC e CBD são substâncias lipofílicas que atravessam prontamente a barreira hematoencefálica e interagem com receptores tanto no sistema nervoso central quanto no periférico, exercendo efeitos analgésicos especialmente em hiperalgesia e estados inflamatórios.

THC

O THC proporciona antinocicepção mediada pelo receptor CB1 através da ativação de níveis supraespinhais e vias descendentes serotoninérgicas e noradrenérgicas moduladoras da dor para produzir efeitos antinociceptivos via ativação espinal de 5-HT7, 5-HT2A e alfa-2 adrenoceptor2122 Dogrul A, Seyrek M, Yalcin B, Ulugol A. Involvement of descending serotonergic and noradrenergic pathways in CB1 receptor-mediated antinociception. Prog Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2012;38(1):97-105..

A distribuição fronto-límbica dos receptores canabinoides explica o mecanismo central da analgesia do THC, pois visa preferencialmente as qualidades afetivas da dor. Um estudo com ressonância magnética funcional revelou que a atividade da amígdala contribui para o efeito dissociativo do THC sobre a percepção da dor relacionada à dor cutânea contínua e à hiperalgesia que foram temporariamente induzidas pela capsaicina2222 Lee MC, Ploner M, Wiech K, Bingel U, Wanigasekera V, Brooks J, Menon DK, Tracey I Amygdala activity contributes to the dissociative effect of cannabis on pain perception. Pain. 2013;154(1):124-34.. O THC reduziu o desconforto relatado, mas não intensidade da dor contínua e hiperalgesia. O THC também reduziu a conectividade funcional entre a amígdala e as áreas sensitivo-motoras primárias durante o estado de dor em curso. Os autores concluíram que os mecanismos periféricos por si só não podem explicar os efeitos dissociativos do THC na dor observada e a atividade da amígdala contribui para a resposta interindividual à analgesia com canabinoides.

Os efeitos analgésicos do THC são mediados por mecanismos distintos daqueles responsáveis pelos efeitos psicoativos. O THC tem efeito analgésico adicional com agonistas do receptor opioide kappa. Esse efeito é bloqueado pelo antagonismo kappa, mas o antagonismo do receptor opioide não altera os efeitos psicoativos do THC33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

CBD

O CBD regula a percepção da dor, principalmente por meio de mecanismos não-CB1/não-CB2. O CBD interage com um número significativo de outros alvos, incluindo RAPG não canabinoides (por exemplo, 5-HT1A), canais iônicos (TRPV1, TRPA1, TPRM8, GlyR) e PPAR. Além disso, o CBD aumenta os efeitos da AEA inibindo sua absorção, bem como sua hidrólise pela enzima amida hidrolase de ácido graxo (FAAH)33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

O CBD pode atuar sinergicamente com o THC e contribuir para o seu efeito analgésico, proporcionando um “efeito entourage”, minimizando os efeitos psicoativos negativos do THC. Isso depende das diferenças na concentração de THC/CBD no quimiotipo de cannabis. Embora o CBD como monoterapia não tenha sido avaliado clinicamente no manejo da dor, seus efeitos anti-inflamatórios e antiespasmódicos e o bom perfil de segurança sugerem que pode ser um analgésico seguro e eficaz33 Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p..

CONCLUSÃO

Os ensaios pré-clínicos demonstram amplamente o potencial interesse do sistema endocanabinoide no tratamento da dor, realçando que os receptores como o CB1, CB2, e as enzimas FAAH e MAGL, entre outros, têm sido identificados como possíveis novos alvos para desenvolver fármacos mais seletivos desprovidos dos efeitos adversos clássicos.

Em relação aos ensaios clínicos, embora nem sempre demonstrem eficácia, demonstram que é possível que os fármacos que atuam no sistema endocanabinoide tenham um efeito no controle da DC. No futuro, espera-se que este sistema continue a ser estudado para uma melhor compreensão das suas vias de sinalização e metabolismo, e também que se realizem mais ensaios clínicos de maior dimensão e duração para compreender até que ponto esta abordagem poderá ser benéfica no tratamento da DC.

REFERENCES

  • 1
    Hall JM, Capela JP. O sistema endocanabinoide no controlo da dor neuropática Acta Farm Portuguesa. 2019;8(2):31-46.
  • 2
    Treede RD, Rief W, Barke A, Aziz Q, Bennett MI, Benoliel R, Cohen M, Evers S, Finnerup NB, First MB, Giamberardino MA, Kaasa S, Korwisi B, Kosek E, Lavand’homme P, Nicholas M, Perrot S, Scholz J, Schug S, Smith BH, Svensson P, Vlaeyen JWS, Wang SJ. Chronic pain as a symptom or a disease: the IASP Classification of Chronic Pain for the International Classification of Diseases (ICD-11). Pain; 2019;160(1):19-27.
  • 3
    Narouze SM. Cannabinoids and Pain: Mechanisms of Action. In: Narouze SM, Maccallum Caroline. Cannabinoids and Pain. Cuyahoga Falls: Springer, 2021. 191-204p.
  • 4
    Pertwee RG, Howlett AC, Abood ME, Alexander SP, Di Marzo V, Elphick MR, Greasley PJ, Hansen HS, Kunos G, Mackie K, Mechoulam R, Ross RA. International union of basic and clinical pharmacology. LXXIX. Cannabinoid receptors and their ligands: beyond CB1 and CB2. Pharmacol Rev. 2010;62(4):588-631.
  • 5
    Barann M, Molderings G, Brüss M, Bönisch H, Urban BW, Göthert M. Direct inhibition by cannabinoids of human 5-HT3A receptors: probable involvement of an allosteric modulatory site. Br J Pharmacol. 2002;137(5):589-96.
  • 6
    Costas JLG, Pinho Maia LO, Mattos-Orlandi P, Villares JC, Esteves MAF. Neurobiology of cannabis: from the endocannabinoid system to cannabis-related dissorders. J Bras Psiquiatr. 2011;60(2)111-22.
  • 7
    Guindon J, Hohmann A. The endocannabinoid system and pain. CNS Neurol Disord Drug Targets. 2009;8(6):403-21.
  • 8
    Woodhams SG, Sagar DR, Burston JJ, Chapman V. The role of the endocannabinoid system in pain. Handb Exp Pharmacol. 2015;227:119-43.
  • 9
    Reggio PH. Endocannabinoid binding to the cannabinoid receptors: what is known and what remains unknown. Curr Med Chem. 2010;17(14):1468-86.
  • 10
    Luchicch A, Pistis M. Anandamide and 2-arachidonoylglycerol: pharmacological properties, functional features, and emerging specificities of the two major endocannabinoids. Mol Neurobiol. 2012;46(2):374-92.
  • 11
    Pertwee RG. Pharmacology of cannabinoid CB1 and CB2 receptors. Pharmacol Ther. 1997;74(2):129-80.
  • 12
    Wilson RI, Nicoll RA. Endogenous cannabinoids mediate retrograde signaling at hippocampal synapses. Nature. 2001;410(6828):588-92. Erratum in: Nature. 2001.422(6840):974.
  • 13
    Navarrete M, Araque A. Endocannabinoids potentiate synaptic transmission through stimulation of astrocytes. Neuron. 2010;68(1):113-26.
  • 14
    Racz I, Nadal X, Alferink J, Baños JE, Rehnelt J, Martín M, Pintado B, Gutierrez-Adan A, Sanguino E, Manzanares J, Zimmer A, Maldonado R. Crucial role of CB(2) cannabinoid receptor in the regulation of central immune responses during neuropathic pain. J Neurosci. 2008;28(46):12125-35.
  • 15
    Hulsebosch CE. Special issue on microglia and chronic pain. Exp Neurol. 2012;234(2):253-4.
  • 16
    Iannotti FA, Hill CL, Leo A, Alhusaini A, Soubrane C, Mazzarella E, Russo E, Whalley BJ, Di Marzo V, Stephens GJ. Nonpsychotropic plant cannabinoids, cannabidivarin (CBDV) and cannabidiol (CBD), activate and desensitize transient receptor potential vanilloid 1 (TRPV1) channels in vitro: potential for the treatment of neuronal hyperexcitability. ACS Chem Neurosci. 2014;5(11):1131-41.
  • 18
    Iannotti FA, Di Marzo V, Petrosino S. Endocannabinoids and endocannabinoid-related mediators: targets, metabolism and role in neurological disorders. Prog Lipid Res. 2016;62:107-28.
  • 19
    Zádor F, Wollemann M. Receptome: interactions between three pain-related receptors or the “triumvirate” of cannabinoid, opioid and TRPV1 receptors. Pharmacol Res. 2015;102:254-63.
  • 20
    Pertwee RG. The diverse CB1 and CB2 receptor pharmacology of three plant cannabinoids: Δ9-tetrahydrocannabinol, cannabidiol and Δ9-tetrahydrocannabivarin. Br J Pharmacol. 2008;153(2):199-215.
  • 21
    Laprairie RB, Bagher AM, Kelly ME, Denovan-Wright EM. Cannabidiol is a negative allosteric modulator of the cannabinoid CB1 receptor. Br J Pharmacol. 2015;172(20):4790-805.
  • 22
    Dogrul A, Seyrek M, Yalcin B, Ulugol A. Involvement of descending serotonergic and noradrenergic pathways in CB1 receptor-mediated antinociception. Prog Neuropsychopharmacol Biol Psychiatry. 2012;38(1):97-105.
  • 22
    Lee MC, Ploner M, Wiech K, Bingel U, Wanigasekera V, Brooks J, Menon DK, Tracey I Amygdala activity contributes to the dissociative effect of cannabis on pain perception. Pain. 2013;154(1):124-34.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    25 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    10 Jun 2022
  • Aceito
    11 Ago 2023
Sociedade Brasileira para o Estudo da Dor Av. Conselheiro Rodrigues Alves, 937 Cj2 - Vila Mariana, CEP: 04014-012, São Paulo, SP - Brasil, Telefones: , (55) 11 5904-2881/3959 - São Paulo - SP - Brazil
E-mail: dor@dor.org.br