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Adolescentes usuários de substâncias psicoativas: experiências e desafios durante a internação psiquiátrica

Resumo

Introdução

O alcance do cuidado e a adesão ao tratamento de adolescentes usuários de substâncias psicoativas (SPA) é um desafio para profissionais e pesquisadores. Compreender os contextos situacionais e os itinerários percorridos por adolescentes pode auxiliar a busca de soluções para essa problemática.

Objetivo

Identificar as experiências e desafios durante a internação psiquiátrica a partir da percepção de adolescentes usuários de SPA.

Método

Estudo exploratório, qualitativo com a participação de quatro adolescentes com histórico de internação psiquiátrica, vinculados a dois Centros de Atenção Psicossocial - álcool e outras drogas (CAPSad) em diferentes cidades do interior do Estado de São Paulo, Brasil. Os dados foram coletados por meio de entrevistas semiestruturadas abordando uso de SPA, percursos e contexto de vida, itinerário terapêutico e vivências durante a internação. As respostas foram transcritas na íntegra e analisadas pelo método de Análise de Conteúdo de Bardin.

Resultados

Os resultados evidenciaram início precoce do uso de SPA, experiências de uso abusivo de SPA, vulnerabilidade no contexto sociofamiliar e histórico de internações involuntárias. Os principais desafios vivenciados e retratados por esses adolescentes durante a internação foram: confinamento associado ao longo período de reclusão, distanciamento familiar, falta de segurança e carência de abordagens terapêuticas.

Conclusão

Evidenciou-se dificuldade de inserção dos adolescentes usuários de SPA nos dispositivos da Rede de Atenção Psicossocial dos municípios, assim como nos processos de articulação e responsabilização do cuidado. Há uma discrepância entre o que está preconizado e indicado nas políticas públicas e nas premissas da atenção psicossocial em comparação com a realidade de adolescentes internados em hospitais psiquiátricos.

Palavras-chave:
Adolescente; Usuários de Drogas; Transtornos Relacionados ao Uso de Substâncias; Tratamento Psiquiátrico Involuntário; Terapia Ocupacional

Abstract

Introduction

The scope of care and adherence to treatment of adolescent users of psychoactive substances (PAS) is a challenge for professionals and researchers. Understanding the situational contexts and itineraries taken by adolescents can assist in searching for solutions to this problem.

Objective

Identify the experiences and challenges during psychiatric hospitalization from the perception of adolescent users of PSA.

Method

This is an exploratory, qualitative study conducted with four adolescents with a history of psychiatric hospitalization, linked to two Psychosocial Care Centers - alcohol and other drugs (CAPSad) in different cities in the interior of the state of São Paulo, Brazil. Data were collected through semi-structured interviews on substance use, life paths and context, therapeutic itinerary, and experiences during hospitalization. The responses were fully transcribed and analyzed using Bardin’s Content Analysis method.

Results

The results showed an early start of PAS use, experiences of PAS abuse, vulnerability in the socio-family context, and a history of involuntary hospitalizations. The main challenges experienced and reported by these adolescents during hospitalization were: confinement associated with the long seclusion period, distance from family, lack of safety, and lack of therapeutic approaches.

Conclusion

It has become evident that there is a significant challenge in integrating adolescent users of PAS into the Psychosocial Care Network devices within municipalities, as well as into the processes of coordination and accountability of proper care. There is a discrepancy between what is recommended and indicated in public policies and the premises of psychosocial care versus the actual reality of adolescents in psychiatric hospitals.

Keywords:
Adolescent; Drug Users; Substance Use Disorders; Involuntary Treatment; Psychiatric; Occupational Therapy

Introdução

O uso de substâncias psicoativas (SPA) foi apontado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime (UNODC) como um grave e crescente problema de saúde pública. Essa afirmação foi baseada nos apontamentos do Relatório Mundial sobre Drogas referente ao ano de 2021, que indicam que 284 milhões de pessoas com idade entre 15 e 64 anos haviam utilizado alguma SPA e que uma parcela expressiva delas havia desenvolvido algum tipo de transtorno relacionado a isso. O Relatório aponta, também, um aumento significativo do uso dessas substâncias pelo público jovem, assim com um aumento de 9 milhões no número de usuários de maconha (canabis) em um ano (United Nations Office on Drugs and Crime, 2022United Nations Office on Drugs and Crime - UNODC. (2022). World Drug Report 2022. Vienna: UNODC. Recuperado em 22 de fevereiro de 2023, de https://www.unodc.org/unodc/en/data-and-analysis/world-drug-report-2022.html
https://www.unodc.org/unodc/en/data-and-...
).

No cenário brasileiro, a situação não é diferente. De acordo com os dados estatísticos do III Levantamento Nacional sobre o Uso de Drogas pela População Brasileira, realizado pela Fundação Oswaldo Cruz em 2017, 15 milhões de brasileiros já haviam usado alguma substância ilícita na vida - a mediana da idade quando do primeiro consumo foi de 16 anos. Esses adolescentes referiram maior facilidade de acesso e aquisição de substâncias como cocaína, crack e anabolizantes em comparação com maiores de 18 anos (Bastos et al., 2017Bastos, F. I. P. M., Leite de Vasconcellos, M. T., Brandini De Boni, R., Bertoni dos Reis, N., & Souza Coutinho, C. F. (2017). III Levantamento Nacional sobre o uso de drogas pela população brasileira. Rio de Janeiro: FIOCRUZ/ICICT.). Alguns autores relataram que esses transtornos são de ordem multicausal e multifatorial e, portanto, de alta complexidade e difícil tratamento (Miranda et al., 2018Miranda, T. B., Vasconcelos, M. R., Araujo, T. S., Carvalho, N. C. C., Costa, H. A., Espírito Santo, S. G., & de Paula, P. P. (2018). Álcool e outras drogas na perspectiva da política de redução de danos. Pretextos - Revista da Graduação em Psicologia da PUC Minas, 3(5), 35-50.; Silva et al., 2021Silva, M. L., Araujo, M. E., & da Silva, N. R. (2021). Grupo de Terapia Ocupacional na prevenção de recaídas de dependentes químicos. Saúde, 47(1), 1-12.).

Frequentemente, os jovens tendem a enaltecer as drogas, de forma que seu uso pode ser apreciado, reconhecido e validado pelo grupo, aumentando as chances de adolescentes e jovens iniciarem seu uso a partir de uma lógica de pertencimento (Duan et al., 2009Duan, L., Chou, C. P., Andreeva, V. A., & Pentz, M. A. (2009). Trajectories of peer social influences as long-term predictors of drug use from early through late adolescence. Journal of Youth and Adolescence, 38(3), 454-465.).

Esse aspecto é reforçado pelo Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e Crime, que aponta que a adolescência (12 a 17 anos) é o período de risco crítico para o início do uso de SPA (United Nations Office on Drugs and Crime, 2019United Nations Office on Drugs and Crime - UNODC. (2019). World Drug Report 2019. Vienna: UNODC. Recuperado em 11 de maio de 2022, de https://wdr.unodc.org/wdr2019/?msclkid=e7f13707cfee11ec89437f9e62df5983
https://wdr.unodc.org/wdr2019/?msclkid=e...
).

O uso abusivo e descontrolado de SPA por adolescentes é preocupante em razão dos prejuízos físicos, psicológicos, sociais e ocupacionais causados, além de estar geralmente associado ao desenvolvimento e agravamento de transtornos mentais, envolvimento com a criminalidade, abandono escolar, entre outros (Raposo et al., 2017Raposo, J. C. D. S., Costa, A. C. Q., Valença, P. A. M., Zarzar, P. M., Diniz, A. D. S., Colares, V., & Franca, C. D. (2017). Binge drinking and illicit drug use among adolescent students. Revista de Saúde Pública, 51, 1-6.).

No Brasil, o Sistema Único de Saúde (SUS) oferece ao usuário de drogas tratamento em serviços/dispositivos da Rede de Atenção Psicossocial (RAPS). A RAPS foi consolidada por meio da portaria n° 3.088/2011, configurando-se como um arranjo de serviços e estratégias territoriais voltado ao cuidado integral e continuado, abarcando diferentes níveis de densidade tecnológica e complexidade. A RAPS está presente na Atenção Primária à Saúde, Atenção Especializada, Atenção às Urgências e Emergências, Atenção Residencial de Caráter Transitório, Atenção Hospitalar e Estratégias de Desinstitucionalização e Reabilitação. Essa proposta surge em oposição às ações curativas isoladas e à fragmentação de programas e práticas clínicas (Brasil, 2011Brasil. (2011, 23 de dezembro). Portaria nº 3.088 de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1, p. 230.).

Especificamente no caso de usuários de SPA, o tratamento deve ocorrer, preferencialmente, nos Centros de Atenção Psicossocial a usuários de álcool e outras drogas (CAPSad). Esse dispositivo pertence à atenção especializada e estratégica da RAPS. No que se refere aos CAPS, cabe mencionar que são serviços de portas abertas, onde as equipes, usuários e familiares se reúnem para a construção do projeto terapêutico singular (PTS). Nesse sentido, o PTS se constitui como uma importante ferramenta no cuidado na medida em que incorpora um conjunto de propostas terapêuticas articuladas e resultantes da discussão/pactuação entre a equipe multidisciplinar, o sujeito e sua família (Brasil, 2011Brasil. (2011, 23 de dezembro). Portaria nº 3.088 de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1, p. 230.).

Não obstante, importa destacar que, nos últimos anos, especialmente ao longo do governo de Jair Bolsonaro (2019-2022), o desinvestimento nos aportes a políticas públicas de saúde mental evidenciaram estratégias de desmonte do setor e, claramente, retrocederam na direção de práticas de cuidados comprovadamente ultrapassadas e não resolutivas. Tais ações de retrocesso e da ausência de garantia de direitos estão ilustradas na portaria n° 3.588, de 21 de dezembro de 2017, que passa a incluir os hospitais psiquiátricos na RAPS (Brasil, 2017Brasil. (2017, 28 de dezembro). Portaria nº 3.588, de 21 de dezembro de 2017. Altera as Portarias de Consolidação nº 3 e nº 6, de 28 de setembro de 2017, para dispor sobre a Rede de Atenção Psicossocial, e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.).

Os hospitais psiquiátricos caracterizam-se por serem instituições de internação que atendem usuários de SPA e pessoas com transtornos mentais em três modalidades: voluntária, na qual o usuário tem consciência da necessidade do tratamento; involuntária, na qual a internação é geralmente solicitada pela família e/ou responsável e é realizada contra a vontade do usuário; e compulsória, na qual a internação é determinada pela justiça mediante laudo médico e sob alegação de proteção ao usuário e à sociedade.

Para além dessas características, esses retrocessos apontam para o retorno da “Indústria da Loucura”, onde os gastos com tratamento são destinados ao financiamento de leitos hospitalares e minoritariamente a equipamentos comunitários (Pitta & Guljor, 2019Pitta, A. M. F., & Guljor, A. P. (2019). A violência da contrarreforma psiquiátrica no Brasil: um ataque à democracia em tempos de luta pelos direitos humanos e justiça social. Cadernos do CEAS: Revista Crítica de Humanidades, (246), 6-14.).

Alguns autores apontam que esses retrocessos implicam não somente a reversão dos gastos públicos na saúde, mas também o abandono de estratégias bem sucedidas, como a redução de danos e o cuidado em liberdade (Pitta & Guljor, 2019Pitta, A. M. F., & Guljor, A. P. (2019). A violência da contrarreforma psiquiátrica no Brasil: um ataque à democracia em tempos de luta pelos direitos humanos e justiça social. Cadernos do CEAS: Revista Crítica de Humanidades, (246), 6-14.; Lussi et al., 2019Lussi, I. A. O., Ferigato, S. H., Gozzi, A. P. N. F., Fernandes, A. D. S. A., Morato, G. G., Cid, M. F. B., Furlan, P. G., Marcolino, T. Q., & Matsukura, T. S. (2019). Saúde mental em pauta: afirmação do cuidado em liberdade e resistência aos retrocessos. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 27(1), 1-3.).

É sabido que a redução de danos não foca somente na redução do uso, mas também implica a prevenção e redução de agravos à saúde de usuários de SPA, sendo uma estratégia utilizada em dezenas de países (Beg et al., 2015Beg, M., Strathdee, S. A., & Kazatchkine, M. (2015). State of the art science addressing injecting drug use, HIV and harm reduction. The International Journal on Drug Policy, 26(Supl. 1), S1-S4.). Porém, a oferta de um tratamento baseado na redução de danos somente é possível mediante uma rede de serviços e equipamentos estruturados que garanta ao usuário um itinerário terapêutico que considere a continuidade de seu cuidado pós-alta hospitalar.

Perante os apontamentos acima, que abarcam a multifatorialidade e a complexidade envolvidas no tratamento da dependência química, bem como os diferentes atores sociais envolvidos no processo do cuidado (usuário, família, profissionais e serviços), verifica-se a relevância da continuidade de estudos investigativos sobre aspectos associados ao uso de SPA e possíveis deficiências que os tratamentos têm demonstrado sob o olhar dessa população.

Associado a esse fator, verifica-se, ainda, a escassez de estudos que considerem a opinião dos sujeitos sobre o tratamento recebido; geralmente, as pesquisas relatam o ponto de vista de profissionais e gestores (Messias et al., 2020Messias, N. K., Martins, M. H. M., & Castro, C. B. (2020). Versões de usuários sobre a internação psiquiátrica involuntária. Revista Polis e Psique, 10(1), 123-143.). Tal constatação evidencia a carência de estudos que valorizem a experiência do usuário no serviço de saúde mental.

Considerar a perspectiva dos adolescentes sobre seu próprio tratamento é uma importante ferramenta na adequação dos serviços, de maneira que atendam suas escolhas e necessidades.

Nesse sentido, o objetivo deste estudo foi identificar as experiências e desafios durante a internação psiquiátrica a partir da percepção de adolescentes usuários de SPA.

Método

Este é um estudo exploratório qualitativo. Esse tipo de pesquisa objetiva desenvolver, esclarecer e modificar concepções e pressupostos e, posteriormente, elaborar questões objetivas que subsidiem futuros estudos. Dessa forma, visa apresentar um panorama geral em torno de um determinado fato (Gil, 2008Gil, A. C. (2008). Como elaborar projetos de pesquisa. São Paulo: Atlas.).

Cabe destacar que o presente artigo é parte de uma dissertação de mestrado que objetivou identificar as experiências de adolescentes usuários de SPA durante sua internação psiquiátrica nos CAPSad.

A pesquisa foi submetida à análise do Comitê de Ética e Pesquisa da Universidade Federal de São Carlos — Certificado de Apresentação para Apreciação Ética (CAAE) 39624920.8.0000.5504 — e aprovada sob parecer nº 4.477.341. Todos os aspectos éticos que garantem a participação voluntária, o sigilo e o anonimato foram cumpridos. Ressalta-se que os conteúdos do Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE) e/ou Termo de Assentimento (TA) foram explanados aos participantes, que assinaram o documento e receberam uma cópia também assinada pelos pesquisadores contendo seus respectivos contatos.

Participaram do estudo quatro adolescentes com idades entre 17 e 18 anos, com histórico de internação psiquiátrica para tratamento de dependência química e em atendimento nos CAPSad. Adotou-se como critérios de inclusão: ter entre 12 e 21 anos, estar vinculado a um CAPSad no momento da coleta dos dados, ter histórico de uso de SPA e possuir uma ou mais internações para tratamento de uso de SPA. Os critérios de exclusão foram: estar sob efeito de SPA no momento da coleta dos dados e apresentar comprometimento cognitivo identificado pelos profissionais do serviço.

A pesquisa foi realizada em dois CAPSad pertencentes à RAPS de diferentes municípios do interior paulista, ambos regularmente registrados no Cadastro Nacional dos Estabelecimentos de Saúde (CNES). A seleção dos municípios foi feita em função das dificuldades de circulação impostas no primeiro ano do período pandêmico e, portanto, por conveniência.

Um dos CAPSad estava localizado em um município de médio porte, com aproximadamente 240 mil habitantes, que possuía um Departamento Regional de Saúde (DRS), responsável por formular e avaliar o Programa Municipal de Saúde Mental em conjunto com o Grupo Gestor da Secretaria Municipal de Saúde do município, um ambulatório especializado de Saúde Mental, um CAPS II, um CAPSad II, um CAPS infantojuvenil II, uma enfermaria psiquiátrica com 18 leitos em um hospital geral e um hospital psiquiátrico. Porém, o atendimento a adolescentes usuários de SPA era realizado somente pelo CAPSad II. Neste estudo, esse município será denominado A. O outro CAPSad estava localizado em um município de pequeno porte, integrante da mesma DRS do município A, com aproximadamente 44 mil habitantes, que possuía 12 Unidades de Saúde da Família, um hospital psiquiátrico como referência para internações psiquiátricas, um CAPS I e um CAPSad I. Esse município será denominado B.

Os dados foram coletados por meio de dois instrumentos: uma ficha de caracterização do perfil socioeconômico do usuário e seus familiares e uma entrevista semiestruturada.

O roteiro da entrevista foi divido em duas sessões abordando diferentes temáticas. Na primeira sessão, foi abordado o uso de SPA, permitindo identificar o início do uso, os tipos de substâncias já usadas e a caracterização do uso, seu contexto histórico e impactos. A segunda sessão abordou a trajetória nos serviços de saúde, a internação psiquiátrica (tipo, dinâmica e rotina institucional, profissionais do cuidado, limitações da internação, avaliação do serviço) e as experiências durante a internação.

O contato com as instituições participantes se iniciou em outubro de 2020, destinado a colher informações sobre procedimentos para solicitação de desenvolvimento da pesquisa. Após autorização da Diretora Assistencial e da Gerência de Educação em Saúde e Superintendência, foram iniciados os procedimentos para a coleta dos dados. Em razão do período de isolamento social e da adoção de medidas restritivas, não foi possível a permanência da pesquisadora nos serviços, sendo mantido contato com alguns dos profissionais de cada local para identificar possíveis participantes.

Ao chegar aos serviços, juntamente a um profissional de ambos os CAPSad, os adolescentes e familiares foram convidados a participar do estudo, sendo-lhe apresentadas informações sobre os objetivos da pesquisa, suas etapas, duração das entrevistas e sigilo das informações. Após concordância e esclarecimento de todas as dúvidas e assinatura dos termos de consentimento pelos adolescentes e seus familiares, os adolescentes foram levados a uma sala disponibilizada pelo serviço para realização das entrevistas, cumprindo-se todos os protocolos de segurança em relação à COVID-19. As entrevistas ocorreram entre fevereiro e maio de 2021. Foram realizadas individualmente, sem a presença de familiares, com duração média de 30 minutos. Um aparelho celular e um gravador portátil foram utilizados para registrar o conteúdo das falas dos participantes.

As respostas foram analisadas por meio da técnica de Análise de Conteúdo proposta por Bardin (2016)Bardin, L. (2016). Análise de conteúdo. São Paulo: Edições 70.. O conteúdo das entrevistas foi transcrito na íntegra e depois lidos minuciosamente visando compreender os significados e identificar os núcleos de sentido. Após a identificação, os conteúdos foram agrupados em duas categorias temáticas: “Trajetória percorrida até o cuidado atual” e “Experiências e desafios vivenciados durante a internação”.

Resultados e Discussão

Inicialmente, realizaremos uma breve apresentação dos participantes e, posteriormente, uma explanação das duas categorias temáticas.

Caracterização do perfil dos participantes e históricos de uso e tratamento

Os participantes receberam nomes fictícios: Luiz, João, Ana e Vitor. Todos começaram a usar SPA precocemente, entre 12 e 16 anos. Todos relataram uso de múltiplas substâncias, em maioria ilícitas, com prevalência da maconha e das drogas sintéticas, seguidas da cocaína. Verificou-se contexto de vulnerabilidade socioeconômica das famílias. Esses apontamentos podem ser verificados a seguir na descrição individual dos participantes.

Luiz tinha 18 anos de idade, cursou o ensino médio completo, morava no município A com a mãe e três irmãos mais novos. Quanto às condições socioeconômicas da família, moravam em casa alugada, recebiam auxílio emergencial do governo e a mãe era a única pessoa que trabalhava na casa. Iniciou o uso de SPA aos 14 anos como estratégia para suportar os conflitos familiares. Já fez uso de maconha, drogas sintéticas (Ecstasy, LSD, PCP e quetamina) e cocaína. Já teve problemas com a justiça em razão de furto. Relatou ter recebido atendimento pela primeira vez no CAPSad e referiu que o próprio serviço solicitou ordem judicial para tratamento em regime de internação em hospital psiquiátrico.

João tinha 17 anos de idade, cursava o 1º ano do ensino médio, morava no município A com o pai e a madrasta e tem um filho de 1 ano de idade. Quanto às condições econômicas familiares, moravam em casa alugada, referiu que todos os membros da família trabalhavam, inclusive ele, que coletava óleo usado. Iniciou o uso de SPA aos 14 anos de idade. Já fez uso de maconha e drogas sintéticas (Ecstasy, LSD, Lança perfume) e referiu a curiosidade como motivo do uso. Havia passado por três internações voluntárias em hospital psiquiátrico. Nunca teve problemas judiciais.

Ana tinha 17 anos de idade, cursava o 3º ano do ensino médio, morava no município A com a mãe e o padrasto. Em relação às condições econômicas da família, moravam em casa alugada, a mãe e o padrasto eram aposentados. Iniciou o uso de substâncias aos 12 anos de idade, já fez uso de maconha, drogas sintéticas (LSD e lança perfume) e cocaína e apontou a influência de amigos e a curiosidade como motivos de início do uso. Possui histórico de três internações involuntárias em hospital psiquiátrico, sendo esta a primeira modalidade de tratamento. Nunca teve problemas judiciais.

Vitor tinha 18 anos de idade, cursava o ensino superior, morava no município B com a mãe e o avô. Quanto às condições socioeconômicas da família, moravam em uma casa própria, somente a mãe trabalhava. Iniciou o uso de SPA aos 16 anos de idade e apontou como motivo para isso o desejo de sentir-se incluso no grupo dos colegas. Fez uso de maconha, drogas sintéticas (LSD), cocaína e álcool. Possui uma internação psiquiátrica. Sobre o início do tratamento para uso de SPA, o participante referiu o CAPSad como estratégia para dar início ao processo de internação. Possui uma única internação, que ocorreu de forma involuntária em leito psiquiátrico de hospital geral. Tem histórico de problemas com a justiça por bullying.

Apesar do pequeno número de participantes deste estudo, os dado coletados aqui assemelham-se aqueles de outros estudos, que mostram que a faixa etária predominante na análise da população adolescente atendida no CAPSad é de 15 a 19 anos (Gonçalves et al., 2019Gonçalves, J. R. L., Canassa, L. W., da Cruz, L. C., Pereira, A. R., dos Santos, D. M., & Gonçalves, A. R. (2019). Adesão ao tratamento: percepção de adolescentes dependentes químicos. SMAD. Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas, 15(1), 57-63.; Araujo et al., 2012Araujo, N. B., Marcon, S. R., Silva, N. G., & de Oliveria, J. R. T. (2012). Perfil clínico e sociodemográfico de adolescentes que permaneceram e não permaneceram no tratamento em um CAPSad de Cuiabá/MT. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 61(4), 227-234.; Mendes, 2020Mendes, M. M. M. O. (2020). Infância, adolescência e substâncias psicoativas: atendimentos realizados nos CAPS da I macrorregião de saúde de Pernambuco (Trabalho de conclusão de curso). Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco, Recife.). Da mesma forma, os relatos dos participantes sobre suas condições de moradia, trabalho e familiares mostram que os jovens vivem em condições de vulnerabilidade social e econômica, vivenciam realidade familiar complexa, o que pode nos remeter a aspectos evidenciados por estudos que focalizam fatores de risco e proteção associados ao uso de SPA, que apontam que condições socioeconômicas, vivencias e situações de vida familiar, dentre outras, são fatores de risco para seu uso (Pratta & Santos, 2006Pratta, E. M. M., & Santos, M. A. (2006). Reflexões sobre as relações entre drogadição, adolescência e família: um estudo bibliográfico. Estudos de Psicologia, 11(3), 315-322.; Paiva & Ronzani, 2009Paiva, F. S., & Ronzani, T. M. (2009). Estilos parentais e consumo de drogas entre adolescentes: revisão sistemática. Psicologia em Estudo, 14(1), 177-183.; Cid-Monckton & Pedrão, 2011Cid-Monckton, P., & Pedrão, L. J. (2011). Factores familiares protectores y de riesgo relacionados al consumo de drogas en adolescentes. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 19, 738-745.)

Acerca da situação escolar, diferentemente de outras pesquisas (Galhardi & Matsukura, 2018Galhardi, C. C., & Matsukura, T. S. (2018). O cotidiano de adolescentes em um Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e outras Drogas: realidades e desafios. Cadernos de Saude Publica, 34(3), 1-12.; Oliveira et al., 2022Oliveira, G. M., Faria Bastos, E., Aragão Martins, R., & Cassia Rondia, R. (2022). Perfil de adolescentes usuários de drogas atendidos em um centro de atenção psicossocial. Revista Família, Ciclos de Vida e Saúde no Contexto Social, 10(2), 100-115.), os resultados deste estudo apontam que os adolescentes participantes finalizaram os estudos ou ainda mantém vínculo escolar. No entanto, vale destacar também que os quatro participantes relataram várias mudanças de escola ao longo do percurso; porém, apesar disso, verifica-se que eles ou já se formaram ou continuam na escola. Embora não seja possível especificar os motivos que levaram a essas repetidas mudanças de escola, a literatura mostra que os problemas relacionados ao ambiente escolar, como repetências, expulsões e baixo desempenho com relação à idade, parecem ocorrer com regularidade entre os adolescentes que fazem uso de SPA, o que leva a crer que essa situação demanda ações preventivas urgentes (Andretta et al., 2014Andretta, I., Limberger, J., & Silva Oliveira, M. (2014). Abandono de tratamento de adolescentes com uso abusivo de substâncias que cometeram ato infracional. Aletheia Revista de Psicologia, 27(43-44), 116-128.; Araujo et al., 2012Araujo, N. B., Marcon, S. R., Silva, N. G., & de Oliveria, J. R. T. (2012). Perfil clínico e sociodemográfico de adolescentes que permaneceram e não permaneceram no tratamento em um CAPSad de Cuiabá/MT. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 61(4), 227-234.; Oliveira et al., 2022Oliveira, G. M., Faria Bastos, E., Aragão Martins, R., & Cassia Rondia, R. (2022). Perfil de adolescentes usuários de drogas atendidos em um centro de atenção psicossocial. Revista Família, Ciclos de Vida e Saúde no Contexto Social, 10(2), 100-115.).

Três dos quatro adolescentes que participaram deste estudo eram homens, corroborando pesquisas recentes que apontam para um padrão de inserção de jovens usuários de SPA nos CAPSad majoritariamente masculino (Mendes, 2020Mendes, M. M. M. O. (2020). Infância, adolescência e substâncias psicoativas: atendimentos realizados nos CAPS da I macrorregião de saúde de Pernambuco (Trabalho de conclusão de curso). Escola de Governo em Saúde Pública de Pernambuco, Recife.; Oliveira et al., 2022Oliveira, G. M., Faria Bastos, E., Aragão Martins, R., & Cassia Rondia, R. (2022). Perfil de adolescentes usuários de drogas atendidos em um centro de atenção psicossocial. Revista Família, Ciclos de Vida e Saúde no Contexto Social, 10(2), 100-115.). Pesquisadores da área têm indicado a carência de estudos envolvendo a população feminina e uso de SPA (Galhardi & Matsukura, 2018Galhardi, C. C., & Matsukura, T. S. (2018). O cotidiano de adolescentes em um Centro de Atenção Psicossocial de Álcool e outras Drogas: realidades e desafios. Cadernos de Saude Publica, 34(3), 1-12.; Menezes & Pereira, 2019Menezes, A. L. C., & Pereira, A. R. (2019). Desempenho ocupacional de adolescentes usuárias de drogas. Cadernos Brasileiros De Terapia Ocupacional, 27(4), 754-764.). Assim, vale destacar a necessidade de investigações que possam também aprofundar-se nas experiências e especificidades de vivencias no que concerne a diversidade de gêneros e o acesso ao cuidado em saúde na situação do uso abusivo de SPA.

Importa destacar que os adolescentes iniciaram o uso de múltiplas substâncias muito precocemente e que a maconha foi a substância de uso mais prevalente entre eles, seguida do LSD, cocaína, e lança-perfume e ecstasy igualmente. Os resultados corroboram pesquisas realizadas com adolescentes inseridos nos CAPSad, que relatam que a maconha é a substância ilícita mais prevalente entre essa população (Araujo et al., 2012Araujo, N. B., Marcon, S. R., Silva, N. G., & de Oliveria, J. R. T. (2012). Perfil clínico e sociodemográfico de adolescentes que permaneceram e não permaneceram no tratamento em um CAPSad de Cuiabá/MT. Jornal Brasileiro de Psiquiatria, 61(4), 227-234.; Mancilha, 2015Mancilha, G. B. (2015). A permanência de adolescentes em CAPSad: um olhar para a vulnerabilidade (Dissertação de mestrado). Universidade de São Paulo, São Paulo.; Silva et al., 2014Silva, M. A. I., Mello, F. C. M., Mello, D. F., Ferriani, M. G. C., Sampaio, J. M. C., & Oliveira, W. A. (2014). Vulnerabilidade na saúde do adolescente: questões contemporâneas. Ciência & Saúde Coletiva, 19(2), 619-627.; Vasters & Pillon, 2011Vasters, G. P., & Pillon, S. C. (2011). Drugs use by adolescents and their perceptions about specialized treatment adherence and dropout. Revista Latino-Americana de Enfermagem, 19(2), 317-324.).

A seguir, apresentamos os resultados advindos da análise das entrevistas com os adolescentes a partir das duas categorias identificadas.

Trajetória percorrida até o cuidado atual

A internação na modalidade involuntária foi um aspecto comum a três (Luiz, Ana e Vitor) dos quatro participantes, ocorrendo por exigência da família, da justiça ou, ainda, por solicitação do CAPSad; portanto, esses adolescentes foram impossibilitados de exercer livremente seu direito de escolha - apenas João optou pela internação na modalidade voluntária:

Olha… no começo, assim...eu fui contra minha vontade, por isso que foi ordem... (Luiz).

Foi a minha família... (Ana).

Ah, foi o caps na verdade que decidiu. Porque eu tava bem surtado aqui né. Aí eles decidiram que eu ia internar (Vitor).

Primeira vez foi quando...teve a primeira internação no ano passado. Eu quis. Eu decidi fazer o tratamento (João).

Paradoxalmente, percebemos que o ingresso do adolescente no sistema de internação ocorreu também por meio do CAPSad. Essa informação evidencia a ausência de atuação dos serviços territoriais no circuito desses adolescentes, culminando na sua internação. O estudo de Ribeiro et al. (2019b)Ribeiro, J. P., Gomes, G. C., Eslabão, A. D., & Oliveira, N. A. (2019b). Trajetória dos adolescentes usuários de crack até o Centro de Atenção Psicossocial Álcool e Drogas. Revista de Enfermagem da UFSM, 9, 1-21., que objetivou analisar a trajetória de adolescentes usuários de crack até a sua chegada ao CAPSad, corrobora os achados desta pesquisa, identificando que os serviços utilizados com maior frequência pelos adolescentes demonstram uma cultura de tratamento manicomial e destacando, ainda, que raramente são acionados serviços públicos comunitários de atenção e proteção à saúde.

Nesta pesquisa, foi constatado que os adolescentes já haviam passado pelo CAPSad antes das internações, e que apesar dessas passagens, dois dos participantes apresentaram várias internações (3), ainda quando adolescentes.

Os motivos relacionados à demanda pela internação foi outro aspecto destacado pelos adolescentes:

Antes da internação eu já vinha no CAPS. Eles [CAPS] inclusive que foram no juiz, pedir ordem judicial e tudo mais. [...] Eu já tava viciado, eu não queria ajuda (Luiz).

Ah, porque as coisas da…da minha família tava indo por água abaixo né...ninguém tinha mais confiança em mim, ninguém queria mais dá...confiança...ninguém acreditava nas coisas que eu falava então eu resolvi pedir ajuda… (João).

Eu não tava conseguindo me comunicar muito bem porque eu tava em crise né, e ela [médica] tava tentando adivinhar o que eu tinha..ai minha irmã falou...que eu tinha usado maconha, e tava um tempo sem usar por isso que eu tava surtando. Aí depois de...depois de eu brigar muito aqui ficar mexendo eles acabaram me internando (Vitor).

A pesquisa de Araujo (2018)Araujo, C. N. P. (2018). Sentidos construídos com familiares de usuários de drogas sobre a internação involuntária ou compulsória (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo. objetivou compreender como os sentidos sobre a internação involuntária ou compulsória dos usuários de SPA foram construídos com seus familiares. Dentre os resultados, verifica-se que a internação involuntária foi procurada pelos familiares como um recurso capaz de educar os usuários, visto que eles se manteriam abstinentes a fim de evitar outra hospitalização. Por causa do contexto progressivo do uso abusivo de SPA, as internações involuntárias foram vistas como uma forma de conseguir abstinência imediata. Para os familiares, a internação também foi vista como uma forma de cuidar dos usuários, buscando eliminar características que levam a sua maior estigmatização, como a falta de higiene e associação com pessoas que vivem em situação de rua. De modo semelhante, as internações foram vistas como um alívio para os familiares, pois ofereceram aos usuários um período sem uso de SPA, visto que os familiares ficaram sobrecarregados pelas situações de conflito com eles. O tempo de internação também permitiu que a família se reorganizasse minimamente.

Como se não bastasse a problemática das internações, a situação se complica com a intervenção do judiciário. De acordo com Guareschi et al. (2016)Guareschi, N. M. F., Lara, L., & Ecker, D. D. (2016). A internação compulsória como estratégia de governamentalização de adolescentes usuários de drogas. Estudos de Psicologia, 21(1), 25-35., após a conclusão do “tratamento”, os adolescentes retornam para os mesmos contextos de vulnerabilidade, recebendo apenas medicação e tendo somente as comunidades terapêuticas e os serviços de saúde mental como próximos percursos e projetos de vida. O procedimento de internação compulsória, somado à classe diagnóstica que a legitima, é imposta aos adolescentes e passa a gerir o cotidiano desses jovens no momento em que os reconhece como sujeitos que necessitam de acompanhamento especializado para que possam circular livremente em virtude de uma suposta “doença” que estaria presente em seus corpos (Guareschi et al., 2016Guareschi, N. M. F., Lara, L., & Ecker, D. D. (2016). A internação compulsória como estratégia de governamentalização de adolescentes usuários de drogas. Estudos de Psicologia, 21(1), 25-35.).

A internação parece ser uma alternativa de tratamento pontual, no qual predomina a visão reducionista, moralista, que desconsidera a singularidade dos sujeitos e fere seu direito à liberdade, dignidade, cultura e convivência familiar e comunitária previsto no Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) (Brasil, 1990Brasil. Casa Civil. (1990, 13 de julho). Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990. Dispõe sobre o Estatuto da Criança e do Adolescente e dá outras providências. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.). Ademais, destaca-se que não há a construção de um PTS pensado no cuidado pós-alta para a continuação do cuidado na RAPS, dificultando o itinerário terapêutico que o adolescente deveria percorrer. Em suma, esse circuito acaba direcionando o adolescente para determinados percursos de vida regidos conforme as necessidades econômicas e amparados sob o argumento do cuidado.

Conforme frequentemente observado, quando a internação não é feita por vias judiciais, ocorre por solicitação da família. Refletir sobre a necessidade da família diante da prática da internação — como fenômeno que perdura até os dias atuais — nos remete, entre alguns aspectos, ao papel da família como a primeira instituição de disciplinamento, responsável por corrigir determinados comportamentos e que, quando colocada diante de situações insustentáveis, recorre a um poder maior, como o poder médico e a internação (Foucault, 1987Foucault, M. (1987). Vigiar e punir: nascimento da prisão. Petrópolis: Vozes.).

Por outro lado, as internações involuntárias e/ou compulsórias são procuradas pelas famílias por elas não acreditarem ser possível controlar o consumo de drogas dentro das residências. Desse modo, as internações são vistas como forma de proteção, na medida em que afastam o usuário de drogas do contexto de risco (Araujo, 2018Araujo, C. N. P. (2018). Sentidos construídos com familiares de usuários de drogas sobre a internação involuntária ou compulsória (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.; Paula et al., 2017Paula, M. L., Jorge, M. S. B., Lima, L. L., & Bezerra, I. C. (2017). Experiências de adolescentes em uso de crack e seus familiares com a atenção psicossocial e institucionalização. Ciência & Saúde Coletiva, 22(8), 2735-2744.).

Contudo, o trabalho com famílias no cenário da saúde mental ainda é um desafio nas práticas desses serviços, suscitando dificuldades nas relações familiares, as quais podem perpassar pela interdição e/ou invisibilidade dos direitos e autonomia dos usuários (Assad & Pedrão, 2011Assad, F. B., & Pedrão, L. J. (2011). O significado de ser portador de transtorno mental: contribuições do teatro espontâneo do cotidiano. SMAD. Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas, 7(2), 92-97.; Ferreira et al., 2022Ferreira, T. P. S., Sampaio, J., Oliveira, I. L., & Gomes, L. B. (2022). A família no cuidado em saúde mental: desafios para a produção de vidas. Saúde em Debate, 43(121), 441-449.).

Outra hipótese a respeito dessa entrada no sistema de saúde através da atenção hospitalar em vez da atenção primária é apontada no estudo de Araújo, 2018, que objetivou compreender como os sentidos sobre a internação involuntária e/ou compulsória de usuários de álcool e outras drogas são construídos com seus familiares. Essa pesquisa evidencia que as internações forçadas foram vistas como uma forma de alcançar a abstinência, considerando-se que esse tipo de intervenção foi valorizado, por anos, como a única e melhor forma de cuidar de usuários de SPA. Entretanto, tal concepção acabou contribuindo para a culpabilização do usuário pelo problema.

Teixeira et al. (2021)Teixeira, V. S., Monteiro, C. B., Ferreira, E. C., Pacheco, M. A. B., Santiago, M. P., & Loyola, C. M. D. (2021). Primeira internação psiquiátrica na visão dos familiares. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 24(3), 704-720. analisaram a primeira experiência de internação sob a ótica dos familiares. A internação psiquiátrica é indicada quando os comportamentos dos usuários colocam em risco sua integridade (moral e/ou física) ou a de terceiros (Braga & Pegoraro, 2020Braga, R. B., & Pegoraro, R. F. (2020). Internação Psiquiátrica: O que as famílias pensam sobre isso? Revista Psicologia e Saúde, 12(1), 61-73.). A partir das narrativas dos familiares, percebeu-se que não há qualquer diferenciação no cuidado ofertado para o usuário em situação aguda ou em crise, o paciente crônico ou aquele de primeira internação. A dinâmica do processo de trabalho é a mesma, sem qualquer exceção ou priorização dos casos de primeira internação e os impactos dessa internação em instituição fechada e disciplinadora (Teixeira et al., 2021Teixeira, V. S., Monteiro, C. B., Ferreira, E. C., Pacheco, M. A. B., Santiago, M. P., & Loyola, C. M. D. (2021). Primeira internação psiquiátrica na visão dos familiares. Revista Latinoamericana de Psicopatologia Fundamental, 24(3), 704-720.).

A composição de uma rede de serviços integral atuante nos casos de crise ainda necessita de investimentos. A falha de comunicação entre os serviços, a dificuldade na seleção e direcionamento dos casos, o baixo número de CAPS III, o déficit de equipes, entre outras questões, têm contribuído para que o hospital continue sendo, aparentemente, uma alternativa viável para a resolução dessas dificuldades (Roquette, 2019Roquette, R. D. (2019). A atenção à crise em saúde mental: refletindo sobre as práticas, a organização do cuidado e os sentidos da crise (Dissertação de mestrado). Escola Nacional de Saúde Pública Sérgio Arouca, Fundação Oswaldo Cruz, Rio de Janeiro.).

Experiências e desafios durante a internação

Um aspecto comum evidenciado pelos adolescentes ao abordarem a experiência da internação foi a forte demarcação da rotina de tarefas e a ausência de atividades significativas e diversas ao longo dos dias. A homogeneidade da rotina durante as internações foi citada especialmente com respeito aos horários das refeições, medicações e alguns atendimentos profissionais. Nota-se no discurso dos adolescentes a ausência de atividades apreciadas e específicas para essa população e a não compreensão do significado e importância do tratamento, conforme exemplificado por Ana e Vitor.

A gente acordava, e… tinha o café da manhã às oito horas, depois tinha, dessa última internação, tinha a terapia ocupacional, depois tinha o almoço que era às onze horas, depois tinha café da tarde que era às três horas, depois tinha janta às cinco e a ceia a noite, que era às oito. Tinha o... tinha o educador físico, que era o... e…ai meu deus… [...] T.O, educador físico, atendimento com a psicóloga, atendimento com a assistente social (Ana).

Eu acordava de manhã, arrumava minha cama, escovava o dente, aí eu tomava o remédio. Aí eu ficava lendo até dar o horário...do almoço. Tomava banho depois do almoço. E a tarde, tomava café da tarde, e a noite eu tomava remédio. Aí tinha o café da noite, e dormir. [...] Era o... era um grupinho de...as vezes era de conversa, as vezes era de fazer uma receita por exemplo, de desenhar, pintar...eles sempre faziam uma dinâmica pra... pra gente lá (Vitor).

Um aspecto importante pontuado por Luiz é que, durante sua internação, fez uso de SPA, conforme observado abaixo:

Porque ali a droga tava envolvida, entendeu. Então...não é só porque eu estava dentro de um hospital psiquiátrico que não vai ter droga lá dentro...vai ter! [...] o local em si, as pessoas, os enfermeiros...em relação aos enfermeiros, eles são bem gente boa...mas assim... algumas coisas, nem todos os enfermeiros tinham a mesma cabeça sabe...Alguns até levavam droga pra nós lá dentro...eu...acho que não seria relevante falar o enfermeiro que fazia isso, mas...geralmente acontecia (Luiz).

É, no mínimo, preocupante pensar que o uso de drogas seja acessível em uma instituição que se propõe à abstinência total através do isolamento. O diálogo de Luiz mostra que situações de negligência e de falta de segurança são frequentes nas internações e tornam-se ainda mais graves quando associadas à prática de profissionais que se propõem ao cuidado. O discurso de Luiz parece denunciar práticas no mínimo abusivas, indicando a necessidade de alerta máximo diante de práticas que remetem a instituições totais, no exato oposto aos pressupostos da reforma psiquiátrica brasileira e da atenção psicossocial. Sobre as dificuldades vivenciadas no período de internação, o distanciamento familiar foi citado por todos os adolescentes.

Ah, saudade. Saudade tipo da família [...] (Luiz).

Da minha família…Da droga né… (Ana).

Minha família…Meu filho... (João).

Outro desafio relatado foi a sensação de confinamento, assim como situações de falta de segurança e a agressividade de alguns internos:

[...] Na ala dos adultos...é lá que acontecia as visitas né. Então era um clima agradável, eu saia um pouco de lá de dentro, que era a ala dois, ai eu tipo assim... porque sai só do quarto pro refeitório e do refeitório também...é meio complicado (Luiz).

O simples fato de estar lá. Ah, porque você tá privado da sua liberdade [...] (João).

A ambivalência de sentimentos durante a internação foi verificada no discurso dos adolescentes.

Verificou-se desconforto em razão da sensação de aprisionamento e falta de liberdade; entretanto, para Luiz, o confinamento foi permeado por sentimentos ambivalentes, quando ele fala sobre como era agradável sair de dentro da ala, ainda que isso não atingisse o ambiente extra-hospitalar. Esse achado assemelha-se ao que foi encontrado na pesquisa de Ely et al. (2014Ely, G. Z., Terra, M. G., Silva, A. A., Freitas, F. F., Padoin, S. M. M., & Lara, M. P. (2014). Internação psiquiátrica: significados para usuários de um centro de atenção psicossocial. SMAD. Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas, 10(1), 23-28., 2017Ely, G. Z., Terra, M. G., Silva, A. A., Freitas, F. F., Leite, M. T., & Brum, B. N. (2017). Percepções do ser humano internado em unidade psiquiátrica sobre o viver com doença mental. Texto & Contexto Enfermagem, 26(3), 1-10.). Nesses estudos, os pacientes relatam sentimentos ambíguos, como tristeza e alegria, aprisionamento e liberdade, ao referirem-se às internações psiquiátricas.

Sentimentos semelhantes foram observados nas pesquisas de Ely et al. (2017)Ely, G. Z., Terra, M. G., Silva, A. A., Freitas, F. F., Leite, M. T., & Brum, B. N. (2017). Percepções do ser humano internado em unidade psiquiátrica sobre o viver com doença mental. Texto & Contexto Enfermagem, 26(3), 1-10. e Cruz (2019)Cruz, N. L. (2019). A percepção de jovens adultos na vivência de sua primeira internação psiquiátrica (Trabalho de conclusão de curso). Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria., que procuraram identificar a percepção de pacientes internados em uma ala psiquiátrica de um hospital geral sobre o tratamento recebido. Esses estudos demonstram que sentimentos como sofrimento, angústia, acuação, aprisionamento e aflição foram relatados pelos internos durante a hospitalização. As restrições ambientais, assemelhadas a uma prisão, também se configuraram como um aspecto negativo.

Tais constatações vão na contramão dos pressupostos da atenção psicossocial. Portanto, torna-se urgentemente necessário romper com as tradicionais formas de tratamento baseadas no isolamento e na segregação. Para a realização de um cuidado efetivo é preciso reconhecer o outro em sua liberdade, dignidade e singularidade. Conforme reforçado por Ferreira et al. (2017), aFerreira, T. P. S., Sampaio, J., Souza, A. C., Oliveira, D. L., & Gomes, L. B. (2017). Produção do cuidado em Saúde Mental: desafios para além dos muros institucionais. Interface: Comunicação, Saúde, Educação, 21(61), 373-384. principal função do ato de cuidar é a defesa pela vida, o exercício da cidadania e o pertencimento/participação na comunidade - dimensões impossíveis de serem contempladas em um tratamento baseado no confinamento.

E... lá assim, se...lá tinha uma regra. Quem não cumprisse essa regra, levava o salve. O que que é o salve...geralmente alguém fica de campana na porta, e fica 2 ou 3 no banheiro, geralmente fica o Jet, o Jet seria a pessoa que ta ali para botar a ordem no lugar, e os disciplina, disciplina, primeira voz, segunda voz, essas gracinha toda ai...ai você fica no banheiro, você tem que ficar com a mão para trás, se colocar a mão para frente é pior, e eles...foi uma vez que...eles falaram para mim ajudar eles a pular o muro, que eles queriam buscar maconha e lança, e tipo...eu cai, cai feio, e tipo, perdi um pouco a consciência ainda, mas isso não foi motivo para eu ir no banheiro e levar 100 murros na caixa do peito. Foram cem. E eles conta, por isso que eu sei que foi cem murros. Porque eles...é... tipo, é 10 de cada...e… vai revisando, até chegar a cem. Já aconteceu mais de uma vez, foram duas na verdade...eu...era ameaçado né [...] eles queria botar ordem, queria sentir o poder, sabe...e essa galera...se você fizesse alguma coisa contra o que elas pregavam, você...simplesmente apanhava [...] de verdade…era tipo…tipo, na cadeia eles falam que é a lei do cão, era semelhante lá na internação (Luiz).

Destaca-se, ainda, no discurso de Luiz sobre a situação de internação, a presença de práticas, termos (salve, disciplina, Jet) e princípios advindos do mundo do tráfico, que envolvem violência e disciplina particular (Biondi, 2018Biondi, K. (2018). Junto e misturado: uma etnografia do PCC. São Paulo: Terceiro Nome.).

As experiências de violência vividas por Luiz se assemelham às normas de conduta do Primeiro Comando da Capital (PCC). Termos semelhantes foram verificados na pesquisa de Ribeiro et al. (2019a)Ribeiro, J. P., Gomes, C. G., Soares, M. M., & Lopes, K. B. (2019a). Aspectos que dificultam o tratamento do adolescente usuário de crack na rede de atenção psicossocial. Journal of Nutrition and Health, 9(3), 1-15., que descreveram a sociabilidade prisional no sistema penitenciário. Esse estudo mostra que “irmãos” e “companheiros” se relacionam nos pavilhões do PCC a partir da imposição de rígidas regras de disciplina impostas pela facção e, portanto, torna-se inevitável a punição imediata para qualquer desvio de conduta.

Os “Jets” e os “disciplinas” são instâncias responsáveis pela manutenção da organização e da ordem interna. A função dos “disciplinas” é o ensinamento das normas do estatuto do PCC, além de serem responsáveis pela vigilância e fiscalização do comportamento dos presos. Nesse contexto, Ribeiro et al. (2019c, pRibeiro, L., Oliveira, V. N., & Bastos, L. (2019c). Pavilhões do Primeiro Comando da Capital: tensões e conflitos em uma unidade prisional de segurança máxima em Minas Gerais. O Público e o Privado: Caderno dos Nucleos e Grupos de Pesquisa Vinculados ao Mestrado Academico em Politicas Publicas e Sociedade da Universidade Estadual do Ceara, 17(33), 213-241.. 228) afirmam:

Quando situações de indisciplina (trocas entre os internos, dívidas de drogas, brigas, discussões etc.) surgem ou são detectadas na convivência, os integrantes do grupo da disciplina chamam os envolvidos, solicitam a elaboração de relatórios sobre o caso de cada uma das partes (acusação e defesa) e, por fim, enviam os relatórios para os “Jets” analisarem e convocarem as partes para o “julgamento” do caso dependendo da gravidade do fato.

Conforme observado, apesar do presente estudo não tratar do sistema prisional, mas de uma unidade de internação psiquiátrica, compreende-se que as denominações relativas ao mundo do tráfico estiveram presentes na situação de internação de pelo menos um dos adolescentes e, ainda mais relevante, vale ressaltar que esses adolescentes deveriam estar sob o resguardo de uma instituição de saúde, mas que, como visto, isso não garantiu a eles segurança e proteção, não havendo responsabilização da instituição por essas situações de violência e omissão.

A seguir, em outra dimensão, Luiz apresenta uma reflexão, uma espécie de autocrítica sobre seus comportamentos na internação. No entanto, nesses relatos, é como se as críticas alcançassem apenas a ele e aos outros adolescentes envolvidos na situação, e não há uma responsabilização da instituição nesses acontecimentos.

Eu cometi falhas...tem uma época que eu combinei com os garotos, o M., mas não era o M. P., era o japa, e o pedrinha...não, era o...não, era o...o apelido dele era feinho, o D., ai nois pegou e o G. levou nois pro campo né, e eles foi, pulou o muro, e foi na biqueira né, e pegou duas paranga de maconha, nois trouxe pra dentro da internação, e lá nois fez o uso [...] Nois também levou uma HAF, basicamente é haldol, fenergan e prometazina, aquilo chapa pra caramba, você fica 2 dias dormindo, só acorda pra almoçar, jantar...sabe...merecido, pelo que eu fiz, poderia ter sido pior né, poderia ter sido pior. E também, a minha pena, tipo assim, pena… ela foi aumentada sabe...era pra mim ter saído antes, eu não sai por conta disso daí, que ficou no meu prontuário, e fiquei um tempo a mais (Luiz).

A pesquisa de Ely et al. (2014)Ely, G. Z., Terra, M. G., Silva, A. A., Freitas, F. F., Padoin, S. M. M., & Lara, M. P. (2014). Internação psiquiátrica: significados para usuários de um centro de atenção psicossocial. SMAD. Revista Eletrônica Saúde Mental Álcool e Drogas, 10(1), 23-28. procurou compreender o significado da internação psiquiátrica para pacientes em acompanhamento no CAPS. De acordo com o relato dos pesquisadores, a dominação dos corpos como objeto da relação de poder estabelecida, muitas vezes pelos profissionais e pelo corpo da instituição, torna-se evidente na rotina hospitalar. A vigilância constante e o abuso de condutas tidas como “cuidado”, por exemplo, as contenções e medicalizações, assemelham-se ao relato de Luiz, que, apesar de não ter sido contido, foi medicado para dormir após cometer ato impensado. O aumento do período de internação também reforça a ideia da punição por comportamentos tidos como “inadequados”.

Nesse sentido, Guareschi et al. (2016)Guareschi, N. M. F., Lara, L., & Ecker, D. D. (2016). A internação compulsória como estratégia de governamentalização de adolescentes usuários de drogas. Estudos de Psicologia, 21(1), 25-35. fazem importantes constatações, demonstrando a necessidade de romper com os discursos consolidados sobre a criminalização do uso de drogas e a vigilância sobre os adolescentes (especialmente os pobres e moradores de rua), sobre as configurações familiares tradicionais, e sobre as formas de higiene, comportamentos e valores, que se apresentam como rachaduras para que outras formas de cuidado sejam pensadas.

Conforme previamente mencionado, a resolução nº 8 de 14 de agosto de 2019 (Brasil, 2019aBrasil. (2019a, 14 de agosto). Resolução nº 8, de 14 de agosto de 2019. Dispõe sobre soluções preventivas de violação e garantidoras de direitos aos portadores de transtornos mentais e usuários problemáticos de álcool e outras drogas. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1, p. 55.) vem para se opor à Lei n° 13.840 de 5 de junho de 2019 (Brasil, 2019bBrasil. (2019b, 5 de junho). Lei nº 13.840, de 5 de junho de 2019. (Lei da Internação Compulsória) Altera as Leis [...], para dispor sobre o Sistema Nacional de Políticas Públicas sobre Drogas e as condições de atenção aos usuários ou dependentes de drogas e para tratar do financiamento das políticas sobre drogas. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília.), que acaba por retroceder décadas ao prescrever internações involuntárias como estratégia central no cuidado aos usuários de drogas, a exemplo de outras medidas retrógradas, com prejuízo de experiências exitosas e avanços técnico-científicos; descaracterizando os agentes fiscalizadores, a participação da sociedade e reduzindo os recursos/estratégias direcionados à inclusão social, trabalho e geração de renda.

De acordo com essa resolução (Brasil, 2019aBrasil. (2019a, 14 de agosto). Resolução nº 8, de 14 de agosto de 2019. Dispõe sobre soluções preventivas de violação e garantidoras de direitos aos portadores de transtornos mentais e usuários problemáticos de álcool e outras drogas. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1, p. 55.), a assistência em saúde mental e seus dispositivos devem garantir acesso a cuidados sem qualquer forma de violação dos direitos humanos, abolindo tratamentos cruéis e degradantes, maus tratos, contenções físicas e químicas, perda de direitos civis, ou que estimulem a discriminação, o preconceito e o estigma. Porém, na contramão do proposto por esse marco, ainda se verificam tais práticas durante as internações ainda são observadas na cotidianidade do sistema, conforme mencionado por Luiz.

O período de permanência na instituição se configurou como um aspecto negativo para Ana:

Acho que o tempo que a gente fica lá. Eu acho que é muito demorado né (Ana).

Conforme observado, passadas quase duas décadas, das discussões sobre a desassistência e a inexistência de políticas públicas efetivas para crianças e adolescentes, do processo histórico de controle social e do predomínio de uma mentalidade punitiva e tutelar realizadas no Fórum Nacional de Saúde Mental Infanto-juvenil, o cenário de desassistência ainda se mantém. Todas as situações vivenciadas no processo de internação psiquiátrica dos adolescentes da presente pesquisa apontam para a ineficácia das ações de “cuidado”, ainda baseadas na lógica segregativa e com a presença de práticas punitivas e coercitivas nas quais predomina a imposição de condutas. Tais situações evidenciam um cuidado desumano, institucionalizante, fragilizado e irresoluto, no qual predomina a ausência de garantia de direitos presentes na Declaração Nacional dos Direitos Humanos e no ECA.

Nesse sentido, vale destacar, com base na VIII Reunião Extraordinária do Fórum Nacional de Saúde Mental Infanto-juvenil (Brasil, 2014Brasil. (2014). Fórum Nacional de Saúde Mental Infanto-juvenil: recomendações: de 2005 a 2012. Brasília: Ministério da Saúde.), a recomendação de que o período de internação não deve exceder 45 dias, que, via de regra, não foi empregada para os adolescentes deste estudo, uma vez que as últimas internações de Luiz, João e Ana tiveram durações de 4, 2 e 3 meses, respectivamente, sendo Vitor único internado em hospital geral com leito psiquiátrico por 1 mês, somado ao fato de não ser a primeira internação para dois dos participantes.

Sobre as contribuições das internações, os adolescentes relataram que o ambiente hospitalar foi percebido como meio para cumprir pena, atingir a desintoxicação e reconhecer a necessidade de ajuda e os danos associados ao consumo de SPA.

Ah, ela me ajudou a perceber que eu não tenho que voltar mais pra lá, porque, assim, eu aprendi, muita coisa lá foi um aprendizado, foi uma coisa que...eu fiz errada e eu tive que pagar por aquilo, então hoje eu to com a cara limpa [...] (Luiz).

Ajudou a compreender que eu tenho...preciso de ajuda. Que sozinha eu não vou conseguir… (Ana).

Um...me ajudou em...parar de usar, não ter uso de droga. Ah, no sentido bom né, porque eu cheguei lá, é... totalmente...assim... sobre efeito de...sobre efeito dessas substância. Sobre total domínio dela. Então eu...eu que...eu fui submetido a esse tratamento pra ver se parava. Graças a deus consegui parar (João).

Ah, me ajudou a centralizar meus pensamentos né...porque eu tava bem confuso, aí...ajudou a cair a ficha também né, porque...mesmo depois de ter surtado eu ainda tava sentindo a falta da droga. Aí me ajudou a perceber que não tava fazendo bem pra mim (Vitor).

A perspectiva da internação compreendida como aprendizado através da punição, conforme aborda Araujo (2018)Araujo, C. N. P. (2018). Sentidos construídos com familiares de usuários de drogas sobre a internação involuntária ou compulsória (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo., parece estar presente na fala de Luiz, quando ele associa que, com a internação, pagou por todas as suas violações e, logo, não precisaria mais ser internado.

Ao relatarem suas percepções sobre o que não era bom nas internações, Luiz e Ana fazem recomendações:

Eles podiam zelar mais. Zelar mais pelo...pelo...ainda mais que os adolescentes tão praticando lá dentre eles. Porque eles faziam muitas coisas erradas [...] tem enfermeiro que passa muito pano. Fala, ah esse muleque vacilão, ja vi, ja presenciei, pode pegar ele, eu fico de campana [...] Os enfermeiros deviam ficar ali, mais de olho, mais atento, sabe...porque ali tem drogas, eu tenho certeza, ali tem gente apanhando, gente sofrendo, ali tem gente querendo se matar (Luiz).

Ajuda mais...emocional...faltou bastante. Faltou tipo um ombro amigo, uma pessoa que tenha passado pelo mesmo que eu passei. Porque parecia que ninguém lá tinha depressão, só eu (Luiz).

Eu acho que podia ter mais atividades durante a semana (Ana).

O discurso moral torna a pessoa que faz uso prejudicial de drogas objeto de controle disciplinar durante a internação (Araujo, 2018Araujo, C. N. P. (2018). Sentidos construídos com familiares de usuários de drogas sobre a internação involuntária ou compulsória (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.). A título de exemplo, é possível citar as situações de negligência e violência praticadas pelos próprios responsáveis pela assistência, observadas principalmente em hospitais psiquiátricos e outras instituições fechadas. Nesse contexto, corroborando a fala de Luiz, a literatura revela situações abusivas e desumanas de profissionais para com os sujeitos do cuidado, visto que alguns dos entrevistados denunciaram a prática de atos/condutas de ridicularização e supressão/controle/silenciamento dos pacientes por parte dos profissionais e a utilização de medicalização, contenção/amarração, e até agressões físicas aos sujeitos do cuidado (Araujo, 2018Araujo, C. N. P. (2018). Sentidos construídos com familiares de usuários de drogas sobre a internação involuntária ou compulsória (Tese de doutorado). Universidade de São Paulo, São Paulo.; Messias et al., 2020Messias, N. K., Martins, M. H. M., & Castro, C. B. (2020). Versões de usuários sobre a internação psiquiátrica involuntária. Revista Polis e Psique, 10(1), 123-143.; Rocha et al., 2018Rocha, C., Silva, M., & Asensi, F. (2018). Juridicização engajada da adolescência: sobre um caso de internação psiquiátrica compulsória. Saúde e Sociedade, 27(1), 201-214.).

Desse modo, é imprescindível reavaliar o exercício de tutela sobre jovens, de modo que esta não se reduza a uma tutela integral de controle da mente, das ações e das vontades. É preciso diferenciar o cuidado necessário de uma tutela que anula as pessoas. A linha entre cuidado e controle é tênue e pode gerar implicações perigosas (Couto, 2001Couto, M. C. V. (2001). Por uma política pública de saúde mental para crianças e adolescentes. In T. Ferreira (Ed.), A criança e a saúde mental: enlaces entre a clínica e a política (pp. 61-74). Belo Horizonte: Autêntica/FHC-FUMEC.).

Quando questionados sobre outras formas de ajuda que poderiam ser ofertadas nas internações, três dos adolescentes consideraram que toda a assistência recebida na internação psiquiátrica foi suficiente naquele momento, embora em outros momentos tenham relatado aspectos que poderiam ser melhorados. Ao que parece, não há uma compreensão ou análise crítica acerca da real efetividade e adequação das internações nos relatos dos adolescentes.

Ah, acho que nenhuma porque eles ajudaram de todas as formas né…. (Ana).

Ah, pra mim...já bastou tudo aquilo lá, porque até agora eu to limpo, então… (João).

Ah...foi tudo bem...bem certo. Eu recebi todo tipo de ajuda. Sempre tinha com quem conversar. Porque eu tinha os enfermeiros, caso precisasse, as psicólogas, ficava a tarde...o dia inteiro...a tarde inteira lá. De manhã tinha medica então...eu sempre tinha com quem conversar...eu até cansava [risos]. Ai...não tinha nada que eu precisasse (Vitor).

Analisando conjuntamente as sugestões de Luiz e Ana, apresentadas s seguir, três dos adolescentes demonstraram concordância quanto às propostas para melhorar a assistência nas internações e corroboram as falas sobre a necessidade de atividades significativas e melhoria da infraestrutura. Os aspectos mais citados foram a necessidade de entretenimento e melhorias no espaço físico, conforme estes relatos:

Entendeu...e o espaço fosse mais amplo, entendeu, que tivesse mais atividades, porque lá, assim... lá nois tinha as atividades..., mas a maioria delas não agradava muito os outros. Trazer atividades novas, coisas novas, sabe… (Luiz).

Tenho. Ah podia mudar mais a instalação, o modo de..do tratamento, ele podia ter mais coisa pra se...se distrair. é...te mais coisa pra…esquecer da droga (João).

Ah, mais entretenimento...seria bom...porque lá só tinha uma televizãozinha que o pessoa…. povo assistia novela à noite. Mais jogos seria legal também, porque lá tinha 3 jogos só, mais jogos de tabuleiro também seria legal…mais entretenimento em geral mesmo...porque...fica lá o dia inteiro é meio chato (Vitor).

Dados semelhantes foram encontrados no estudo de Camargo & Oliveira (2009)Camargo, R. M. P., & Oliveira, R. M. (2009). Internação psiquiátrica: ouvindo quem passou pela experiência. Revista Mineira de Enfermagem, 13(2), 293-301. que analisou as percepções de pacientes internados sobre o tratamento recebido. Os relatos mostram que a falta de atividades, a ociosidade, a escassez de espaçoso no local, a presença de grades e a rigidez dos horários de dormir se constituíram como aspectos negativos. Sugestões para melhoria do local, atividades físicas, passeios, caminhadas, atividades artesanais e maior entretenimento de forma geral também foram feitas pelos pacientes, de forma a contribuir para melhorar a assistência prestada. Na mesma direção, a pesquisa de Cruz (2019)Cruz, N. L. (2019). A percepção de jovens adultos na vivência de sua primeira internação psiquiátrica (Trabalho de conclusão de curso). Universidade Federal de Santa Maria, Santa Maria. procurou analisar a experiência de jovens adultos durante a primeira internação psiquiátrica e identificou que a ausência de atividades e recursos materiais aumentava a sensação de inutilidade e a angústia dos usuários.

Outro aspecto explorado pelos adolescentes sobre o que poderia ajudar as pessoas que saem da internação foi a obrigatoriedade de suporte psicológico e familiar, autoconsciência de dano associado ao uso de SPA e a construção de uma nova rotina.

Olha, uma atenção por parte dos familiares e dos psicólogos. Teria que, nem que fosse obrigatório, entendeu? Por parte dos familiares, fica zelando pela saúde mental dos filhos. Saúde Mental e tudo mais, porque muita gente sai de lá pior, entendeu? Pessoal vai pra lá sendo obrigado...não é culpa da instituição em si, é culpa da pessoa que não quer mudar. Eu fui um caso, eu sou um exemplo vivo disso… (Luiz).

Um...acho que atendimento com o psicólogo…. É uma ajuda emocional né… (Ana).

Ah, tenho. Ajudar as pessoas né...é... que as pessoas caiam em si que isso aí não é bom, que isso aí só destrói a vida da gente, é bom também a pessoa perceber que isso aí não vai levar a nada (João).

Ah...procurar uma rotina né, continuar uma rotina, porque lá eles criam uma rotina pra você, aí você continuar a rotina seria bem interessante né, porque ajuda a não ficar surtado (Vitor).

Mesmo sem terem conhecimento sobre PTS e atenção psicossocial, os adolescentes apontam para a necessidade de continuidade do cuidado envolvendo todos os atores e enfatizam aspectos que consideram importantes ferramentas de cuidado, que visivelmente não estiveram presentes em seu tratamento, como escuta, acolhimento, atividades significativas, presença/acompanhamento dos familiares, autonomia em suas possibilidades de escolha, espaços de trocas sociais onde fosse possível expressar a singularidade e sentir-se pertencido aos espaços coletivos, enfim, ser protagonista.

Em conformidade com a observação de Luiz, a pesquisa de Messias et al. (2020)Messias, N. K., Martins, M. H. M., & Castro, C. B. (2020). Versões de usuários sobre a internação psiquiátrica involuntária. Revista Polis e Psique, 10(1), 123-143. aponta para a necessidade de a família assumir papel de corresponsável pelo cuidado e pela promoção de saúde de seus membros, juntamente aos serviços de saúde, uma vez que a família carrega suas experiências e modos de conceber a vida, que influenciam na forma de lidar com o sofrimento de seus membros.

Um fator que pode explicar a carência desse suporte é a possibilidade de que, após as altas das internações, as famílias supostamente acreditam que os adolescentes estejam “curados” e, logo, não pensam sobre a necessidade de dar-lhes atenção e acompanhá-los. Assim, aponta-se a relevância, na rotina dos serviços, do desenvolvimento de ações que contemplem não apenas o adolescente, mas também seus familiares.

Considerando as recomendações de todas as edições dos Fóruns Nacionais de Saúde Mental Infanto-juvenis e o nítido fracasso de modelos de cuidado com características asilares baseados na exclusão do convívio social e familiar, ainda nos surpreendemos com inúmeros casos de violação dos direitos - também estampados nas trajetórias dos quatro participantes deste estudo, nos quais persiste a ausência do cuidado em rede; a manutenção de serviços de atenção psicossocial atuando sob a perspectiva da abstinência total, sem embasamento técnico e científico; a predominância sobretudo das internações como recurso excludente, punitivo e que desconsidera a autonomia; a singularidade e os interesses dos sujeitos. A começar pela indicativa de internação, que é considerada como último recurso a ser empregado no caso de adolescentes, depois que todos os outros recursos extra hospitalares se mostrem ausentes (Brasil, 2001Brasil. (2001, 6 de abril). Lei nº 10.216, de 6 de abril de 2001. Dispõe sobre a proteção e os direitos das pessoas portadoras de transtornos mentais e redireciona o modelo assistencial em saúde mental. Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1.).

Os participantes deste estudo sinalizam que a internação foi adotada prioritariamente, sem sequer serem discutidas outras possibilidades de intervenção para o manejo de suas necessidades. Apesar do caráter dúbio das internações, ainda que estejam previstas na Lei, salienta-se que elas devem ocorrer preferencialmente em leitos psiquiátricos de hospitais gerais, o que se mostra incoerente com a realidade observada nesta pesquisa, na qual três dos quatro participantes foram internados em hospitais psiquiátricos.

Considerando-se o caráter vigilante das internações psiquiátricas, que é comumente uma das principais justificativas para o tratamento de usuários de SPA por conseguir afastar os sujeitos do contexto de risco iminente, faz-se necessário considerar a capacidade de outros dispositivos realizarem essa função, a começar pelos CAPSad III e, considerando a população abordada neste estudo, os CAPSij, que são dispositivos que permitem o acompanhamento de crianças, adolescentes e adultos usuárias de SPA 24 horas por dia, inclusive aos feriados, no período de 14 a 30 dias, com o propósito de oferecer desintoxicação, diagnóstico e tratamento (Brasil, 2011Brasil. (2011, 23 de dezembro). Portaria nº 3.088 de 23 de dezembro de 2011. Institui a Rede de Atenção Psicossocial para pessoas com sofrimento ou transtorno mental e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial [da] República Federativa do Brasil, Brasília, seção 1, p. 230.).

Considerações Finais

Os resultados evidenciaram que os adolescentes pouco são ouvidos no que se refere ao seu próprio cuidado. Cabe destacar que toda a expectativa sobre o “sucesso do tratamento” recai sobre esses adolescentes, colocando-os em uma posição de intensa pressão, ao mesmo tempo em que suas necessidades e possibilidades de escolha se fazem ausentes. A concepção de que os resultados do tratamento dependem unicamente do adolescente representa um importante obstáculo, como rachaduras no atual modelo de atenção, evidenciando que o cuidado não tem ocorrido conforme as políticas de atenção psicossocial preconizam: prezar o cuidado compartilhado com responsabilização do sujeito, da equipe de saúde e dos familiares.

Ainda nesse contexto, enfatiza-se a necessidade de maiores investimentos nos serviços comunitários para que as políticas de atenção usuários abusivos de SPA de fato se efetivem. Sugere-se também a necessidade de ações de capacitação e educação continuada sobre o cuidado na adolescência enquanto ferramentas estratégicas para maior entendimento sobre a complexidade dessa etapa da vida.

Aponta-se que o número reduzido de participantes e de municípios envolvidos, assim como o próprio período pandêmico, constituíram-se nas principais limitações deste estudo. Apesar disso, os dados demonstram que os adolescentes não se encontram plenamente inseridos no serviço ou acolhidos e atendidos pela rede como um todo, o que pode estar contribuindo para a manutenção das internações enquanto principal forma de tratamento para esse grupo.

Cabe destacar que apesar de todos os adolescentes terem sido atendidos nos CAPSad, embora um dos municípios contasse com um Centro de Atenção Psicossocial Infanto Juvenil (CAPSij), a recomendação é que também compete ao CAPSij o atendimento a crianças e adolescentes usuários de SPA.

Sugere-se que estudos futuros investiguem a realidade dos técnicos nos serviços e os desafios para a efetivação do cuidado em rede voltado para crianças e adolescentes que fazem uso problemático de SPA.

  • Como citar: Pereira, N. A., Silva, M. L., & Matsukura, T. S. (2023). Adolescentes usuários de substâncias psicoativas: experiências e desafios durante a internação psiquiátrica. Cadernos Brasileiros de Terapia Ocupacional, 31, e3412. https://doi.org/10.1590/2526-8910.ctoAO261434121

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Editado por

Editora de seção

Profa. Dra. Daniela Tavares Gontijo

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    27 Nov 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    02 Set 2022
  • Revisado
    15 Fev 2023
  • Revisado
    10 Abr 2023
  • Aceito
    18 Jul 2023
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