Acessibilidade / Reportar erro

Saúde mental na atenção básica: percepção dos Agentes Comunitários de Saúde

Mental health in primary care: perception of Community Health Workers

Resumo

Introdução

Os fluxos de encaminhamento dos pacientes portadores de transtornos mentais e o seu devido acolhimento representam um grande desafio na área da saúde mental.

Objetivo

Conhecer a percepção dos Agentes Comunitários de Saúde em relação aos usuários da saúde mental e suas atividades nesse campo.

Método

Estudo de ordem qualitativa utilizando a técnica de grupo focal. Os dados coletados foram transcritos e submetidos à Técnica de Análise Qualitativa de Conteúdo. Participaram do estudo 15 agentes de saúde.

Resultados

Os dados foram organizados utilizando os temas que se destacaram nos depoimentos dos Agentes Comunitários de Saúde e agrupados em três categorias selecionadas previamente: Conhecimento sobre Transtornos Mentais, Ações em Saúde Mental, Entraves dos Serviços.

Conclusão

Os agentes demonstraram interesse pelo trabalho com os pacientes, mas apontaram dificuldades envolvendo os diversos pontos da rede de atenção à saúde. Melhor preparação técnica e teórica dos agentes resultaria em ganhos para a equipe de saúde e para os pacientes. Apesar de contemplar a realidade de um município de médio porte, este estudo pode fornecer subsídios para a discussão sobre a assistência em saúde mental na atenção básica de saúde.

Palavras-chave:
Agentes Comunitários de Saúde; saúde mental; grupos focais

Abstract

Background

The referral flows of patients with mental disorders and their proper reception represent a major challenge in the mental health area.

Objective

To know the perception of Community Health Agents concerning mental health patients and their activities in this field.

Method

This is a qualitative study using the focus group technique. The collected data were transcribed and submitted to the Qualitative Content Analysis Technique. Fifteen health agents participated in the study.

Results

The data were organized using the themes that stood out in the testimonies of the Community Health Agents and grouped into three previously selected categories: Knowledge about Mental Disorders, Mental Health Actions, and Service Barriers.

Conclusion

The agents showed interest in working with patients but pointed out difficulties involving the different points of the healthcare network. Better technical and theoretical preparation of agents would result in gains for the health team and for patients. Despite considering the reality of a medium-sized municipality, this study can provide support for the discussion on mental health care in primary health care.

Keywords:
Community Health Workers; mental health; focus groups

INTRODUÇÃO

Um grande desafio no campo da Saúde Mental diz respeito à organização dos serviços e os respectivos fluxos de encaminhamento dos pacientes, de forma que garantam os direitos dos usuários e atendam aos princípios e às diretrizes do Sistema Único de Saúde (SUS): de universalidade do acesso, da integralidade, do cuidado centrado na pessoa, da longitudinalidade do cuidado e da participação da comunidade. Pacientes portadores de transtornos psiquiátricos, principalmente aqueles com quadros severos e persistentes, representam um grupo vulnerável em função da cronicidade da própria doença, da dependência de terceiros, do estigma e da vulnerabilidade social11 Ventura CAA, Moraes VCO, Jorge MS. Os profissionais de saúde e o exercício dos direitos humanos por portadores de transtornos mentais. Rev Eletrônica Enferm. 2013;15(4):854-61. http://dx.doi.org/10.5216/ree.v15i4.19746.
http://dx.doi.org/10.5216/ree.v15i4.1974...
.

No Brasil, os serviços de atenção à saúde mental (Centros de Atenção Psicossocial - CAPS, Ambulatórios, Serviços de Urgência e Emergência, dentre outros) constituem a Rede de Atenção Psicossocial (RAPS) e atuam, idealmente, articulados com a Estratégia Saúde da Família (ESF), trabalhando de forma conjunta para garantir a reinserção dos pacientes ao convívio social de maneira digna e igualitária.

A RAPS estabelece e articula os pontos de atenção à saúde para pessoas com problemas mentais e com necessidades decorrentes do uso de crack, álcool e outras drogas. Do ponto de vista prático, os objetivos da RAPS são o de ampliar o acesso da população à atenção psicossocial, criar vínculos com os usuários dos serviços e suas famílias e garantir a articulação e a integração nos componentes da referida rede, oferecer acolhimento, acompanhamento contínuo e atenção às urgências22 Brasil. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Instituída a Rede de Atenção Psicossocial, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União [Internet], Brasília, 26 de dezembro de 2011; Seção 1. p. 230-32 [citado em 2019 ago 15].Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis...
.

No campo da atenção primária, a Unidade Básica de Saúde (UBS) representa a porta de entrada na rede. Entre suas competências, destaca-se o desenvolvimento de ações de promoção da saúde e prevenção e cuidado em saúde mental, compartilhadas, quando necessário, com os demais serviços33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
,44 Souza LGS, Menandro MCS, Couto LLM, Schimith PB, Lima RP. Saúde mental na estratégia saúde da família: revisão da literatura brasileira. Saúde Soc. 2012;21(4):1022-34. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012000400019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012...
.

O Agente Comunitário de Saúde (ACS), pela sua atuação direta no território, e agindo em conjunto com os demais membros da equipe de saúde, favorece este cuidado, envolvendo a comunidade e contribuindo em vários aspectos relacionados à saúde mental, como, por exemplo, a detecção de casos, o agendamento de consultas médicas, os encaminhamentos para os demais dispositivos e o uso adequado da medicação psiquiátrica55 Cabral TMN, Albuquerque PC. Saúde mental sob a ótica de Agentes Comunitários de Saúde: a percepção de quem cuida. Saúde Debate. 2015;39(104):159-71. http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151040415.
http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151...
,66 Nascimento LG, Melo W, Silva MV. Oficinas de intervenção psicossocial com agentes comunitários de saúde: reflexões e intervenções dialogadas. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2014;9(33):336-42. http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc9(33)716.
http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc9(33)716...
. No entanto, estudos apontam para falhas ou ausência de capacitação, treinamento e preparação no processo de formação do ACS no campo da saúde mental55 Cabral TMN, Albuquerque PC. Saúde mental sob a ótica de Agentes Comunitários de Saúde: a percepção de quem cuida. Saúde Debate. 2015;39(104):159-71. http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151040415.
http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151...
.

Este artigo buscou investigar a amplitude da coordenação do cuidado da saúde mental dentro da RAPS, focalizando as ações a partir da atenção básica em saúde e verificar como os ACS percebem os serviços constituintes da referida rede. Para atingir tal objetivo, propôs-se conhecer a percepção dos ACS em relação aos usuários da saúde mental e ao fluxo desses pacientes tanto na rede de atenção psicossocial, como na atenção primária, analisando a coordenação do cuidado, a integração entre serviços e a identificação das barreiras impostas ao acesso mais oportuno e qualificado do SUS.

MÉTODO

Local do estudo

O estudo foi realizado em duas UBS do município de Barbacena, Minas Gerais, que tem população aproximada de 140 mil habitantes, sendo cidade polo e referência regional para cerca de 250 mil pessoas. No campo da saúde, o município possui a seguinte estrutura de serviços:

  • 19 UBS, 25 equipes de ESF (com aproximadamente 160 ACS), três equipes de Núcleo de Apoio à Saúde da Família (NASF), uma equipe de Consultório na Rua, uma equipe de Melhor em Casa e um Centro de Convivência e Cultura;

  • Um CAPS-AD III, um CAPS III e um CAPS-I;

  • Uma unidade de internação psiquiátrica para pacientes em crise, com 20 leitos masculinos e 10 leitos femininos;

  • Quatro hospitais gerais e uma central reguladora do Samu;

  • 32 Residências Terapêuticas, com, aproximadamente, 220 moradores egressos de internações de longa permanência nos hospitais psiquiátricos de Barbacena;

  • Dois ambulatórios de saúde mental e uma unidade de oficinas terapêuticas.

Tipo de estudo

Tendo em vista o objetivo deste estudo, foi adotado o método de pesquisa qualitativa, de caráter exploratório, o qual responde a questões muito próprias a uma realidade que não pode ser quantificada. Especificamente, para conhecer a percepção dos ACS em relação aos usuários e ao fluxo dos pacientes na RAPS, foi utilizada a técnica de grupo focal. Essa técnica é uma forma de entrevista em grupo que fomenta a comunicação entre os participantes da pesquisa para gerar informações. Os indivíduos são estimulados a falar uns com os outros, trocando ideias e comentando suas experiências, examinando não apenas o que as pessoas pensam, mas como elas pensam e por que pensam dessa forma77 Wilkinson S. Focus group methodology: a review. Int J Soc Res Methodol. 1998;1(3):181-203. http://dx.doi.org/10.1080/13645579.1998.10846874.
http://dx.doi.org/10.1080/13645579.1998....
.

Por meio desse tipo de pesquisa, pretendeu-se coletar informações e compreender como se formam as concepções a respeito dos tópicos estabelecidos, verificando aspectos do programa que poderiam ser alterados e/ou melhorados e observando os processos de interação entre os participantes.

Seleção dos sujeitos

Os ACS foram selecionados de forma não probabilística, dada a natureza do estudo e de acordo com a técnica de grupo focal, devendo cada grupo ser constituído por sete a dez membros em cada UBS. Foram convidados a participar dos grupos, de forma voluntária, aqueles profissionais que atuavam nas respectivas UBS há pelo menos um ano. Critérios como idade, sexo e estado civil dos participantes não foram considerados na formação dos grupos.

Coleta de dados

Os dados foram coletados por meio de entrevista semiestruturada, gravados em meio digital e transcritos posteriormente pelos entrevistadores. Foi utilizado um roteiro de perguntas flexíveis tanto para o investigador quanto para os entrevistados, com o objetivo de conhecer e analisar suas percepções acerca do tema. Além das perguntas relacionadas ao objeto da pesquisa, foram coletadas informações sociodemográficas e sobre conhecimento, experiência e capacitação em saúde mental. A duração de cada grupo foi de aproximadamente uma hora, sendo realizada por dois profissionais, um coordenador do grupo e um observador, ambos autores do presente estudo. A fala de cada participante recebeu uma codificação com a letra maiúscula A, seguida de números em ordem crescente (A1; A2; A3...) em atendimento aos aspectos éticos e legais, sendo preservada a identidade dos sujeitos da pesquisa. As perguntas do roteiro foram: O que o motivou a ser ACS? Quais atividades exercem? Recebeu algum treinamento/curso de ACS ou sobre transtornos mentais? Quais transtornos/doenças mentais conhece e quais identifica na área de atuação? Quais as dificuldades para abordar os casos? Há discussão dos casos e/ou recebem orientações de profissionais da Saúde Mental? Ach que os pacientes recebem os “cuidados adequados”? E, por fim, uma discussão sobre os desafios enfrentados e experiências vividas na área da Saúde Mental como ACS.

Análise dos dados

Os dados coletados foram transcritos e submetidos à Técnica de Análise Qualitativa de Conteúdo, que se utiliza de categorias para descrever o conteúdo das mensagens que comportem a dedução de conhecimentos coerentes a condições de produção e recepção destas mensagens88 Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2006.,99 Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3. ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.,1010 Minayo MCS. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 18. ed. Petrópolis: Vozes; 2001.. O objetivo da investigação é transformar a informação obtida em categorias de análise. Foram selecionadas frases representativas da fala dos participantes, compondo o quadro de análise das categorias1111 Gui RT. Grupo focal em pesquisa qualitativa aplicada: intersubjetividade e construção de sentido. Rev Psicol Organ Trab [Internet]. 2003;3(1):135-59 [citado em 2019 ago 18]. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/rpot/article/view/7071
https://periodicos.ufsc.br/index.php/rpo...
.

O processo de análise do material compreendeu as seguintes fases: a) transcrição das entrevistas; b) leitura das entrevistas transcritas, visando apreender ideias e significados e identificar os temas relacionados ao objeto do estudo; d) identificação e seleção das unidades de análise; e) categorização; f) interpretação e discussão.

De acordo com a experiência dos autores com o objeto de estudo e tendo por base as perguntas do roteiro da entrevista, as categorias foram predefinidas (Conhecimento sobre Transtornos Mentais, Ações em Saúde Mental e Entraves dos Serviços), mas de forma a permitir que subcategorias emergissem do texto.

Considerações éticas

O estudo foi realizado respeitando os aspectos éticos estabelecidos na Resolução nº 466/2012 do Conselho Nacional de Saúde. O projeto foi aprovado por um Comitê de Ética e Pesquisa em 13/03/2019 (Parecer número 3.197.314). Todos os participantes assinaram um Termo de Consentimento Livre e Esclarecido (TCLE).

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Participaram dos grupos 15 Agentes Comunitários de Saúde, de ambos os sexos (13 mulheres e dois homens), lotados em duas UBS do município. O tempo médio de exercício na função era de três anos para a maioria dos participantes, com ingresso no serviço por meio de concurso público. Nenhum dos ACS conhecia previamente a função que exerceria antes de iniciarem suas funções e/ou se inscreverem para o concurso. Apenas dois agentes não residiam no bairro de atuação.

Os dados foram organizados utilizando os temas que se destacaram nos depoimentos dos ACS, e agrupados nas três categorias selecionadas: Conhecimento sobre Transtornos Mentais, Ações em Saúde Mental e Entraves dos Serviços, representando os resultados obtidos resumidamente na Tabela 1.

Tabela 1
Categorias de análise e resultados resumidos, Barbacena, MG, 2020

Conhecimento sobre transtornos mentais

Todos os participantes referiram conhecer e/ou ter contato com pessoas com transtorno mental. Eles reconhecem essas pessoas por meio do comportamento, por algumas características que apresentam ou ainda por serem moradores de Residência Terapêutica (RT). A maioria dos ACS apresentou dificuldades para conceituar tanto saúde quanto transtorno mental. Na UBS “1”, o grupo informou não saber distinguir entre os diversos transtornos mentais, enquanto na outra unidade, que tem uma RT em sua área de abrangência, os ACS souberam elencar, mesmo que de forma sumária, alguns quadros psiquiátricos, como esquizofrenia, transtorno bipolar, depressão e dependência química. Cabe ressaltar que o agente de saúde não precisa ter conhecimentos elaborados sobre psicopatologia e nosologia psiquiátrica.

Eles são visivelmente diferentes. (A3).

Às vezes os prontuários trazem algumas informações que apontam isso, ou pela receita a gente imagina. (A1).

A gente conversa com a pessoa todo dia, quando ela muda a gente percebe. A gente não sabe o que é, mas vê que ela tá diferente. (A12).

A identificação dos pacientes ocorre em função de características comportamentais diferentes ou desviantes dos padrões mais regulares observados na sociedade55 Cabral TMN, Albuquerque PC. Saúde mental sob a ótica de Agentes Comunitários de Saúde: a percepção de quem cuida. Saúde Debate. 2015;39(104):159-71. http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151040415.
http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151...
,1212 Barros MMMA, Chagas MIO, Dias MSA. Saberes e práticas do agente comunitário de saúde no universo do transtorno mental. Ciên Saúde Colet. 2009;14(1):227-32. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000100028.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009...
. Entende-se que os conhecimentos relacionados a essa área de atuação sejam baseados nas experiências de vida e prática profissional individual, já que apenas dois ACS realizaram uma capacitação sobre o tema intitulada “Caminhos do Cuidado”, oferecida pelo Ministério da Saúde em data anterior ao concurso para admissão no serviço1313 Brasil. Ministério da Saúde. Fundação Osvaldo Cruz. Grupo Hospitalar Conceição. Projeto Caminhos do Cuidado: formação em saúde mental (crack, álcool e outras drogas) para agentes comunitários de saúde, auxiliares e técnicos de enfermagem [Internet]. 2015 [citado em 2019 ago 19]. Disponível em: https://programadrogas.fiocruz.br/projetos_e_atividades/68
https://programadrogas.fiocruz.br/projet...
. Essas limitações no acesso à informação podem dificultar o entendimento sobre saúde mental por parte dos ACS.

Em revisão da literatura brasileira sobre saúde mental na atenção básica, os profissionais declararam falta de preparo para atuar nesse campo e que as capacitações oferecidas eram insuficientes, gerando sentimentos de impotência e frustração44 Souza LGS, Menandro MCS, Couto LLM, Schimith PB, Lima RP. Saúde mental na estratégia saúde da família: revisão da literatura brasileira. Saúde Soc. 2012;21(4):1022-34. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012000400019.
http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012...
.

O pessoal do processo seletivo teve muitas capacitações. Do concurso, não. (A6).

Em 2008 foi pior, só ficou uma agente pra ensinar o trabalho para todo mundo! (A1).

A gente melhora com a prática. Curso não tem não. (A9).

Observa-se, portanto, que a maioria dos ACS não recebeu a capacitação em saúde mental, mas percebem a necessidade de tal demanda. Ademais, mesmo com uma parcela dos ACS sem o conhecimento formalizado sobre o tema, todos os entrevistados acreditam que muitas pessoas fazem uso de medicação psiquiátrica sem o devido acompanhamento ou necessidade.

O novo paradigma da Reforma Psiquiátrica exige, de certa forma, melhor preparo por parte dos profissionais da atenção básica para o manejo com esses usuários. Nesse sentido, o Ministério da Saúde elaborou Diretrizes para Capacitação dos ACS nas diversas linhas de cuidado, incluindo a atenção psicossocial. Mas, apesar dos avanços na área, o MS reconhece que a formação dos agentes representa um desafio e que deve ser realizada de forma contínua e gradual, considerando o contexto e as demandas locais1414 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Diretrizes para capacitação de agentes comunitários de saúde em linhas de cuidado [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado em 2021 mar 27]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
.

O treinamento insuficiente ou mesmo ausente para trabalhar em serviços de atenção à saúde mental é listado como um importante problema que dificulta o processo do trabalho1515 Rézio LA, Oliveira AGB. Equipes e condições de trabalho nos Centros de Atenção Psicossocial em Mato Grosso. Esc Anna Nery. 2010;14(2):346-54. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452010000200019.
http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452010...
, resultando em profissionais despreparados para cuidar dos usuários, podendo gerar sentimentos de frustração e culpa entre esses trabalhadores1616 Mello R, Furegato ARF. Representações de usuários, familiares e profissionais acerca de um centro de atenção psicossocial. Esc Anna Nery. 2008;12(3):457-64. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452008000300010.
http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452008...
.

Observa-se que a ausência de conhecimentos atualizados e cursos de especialização na área da Saúde Mental faz com que grande parte desses profissionais perpetue práticas adquiridas no cotidiano, sujeitas a vícios e permeadas pelo antigo modelo assistencial1717 Pessoa JM Jr, Santos RCA, Clementino FS, Nascimento EGC, Miranda FAN. Formação em saúde mental e atuação profissional no âmbito do hospital psiquiátrico. Texto Contexto Enferm. 2016;25(3):e3020015. https://doi.org/10.1590/0104-07072016003020015.
https://doi.org/10.1590/0104-07072016003...
. O resultado são encaminhamentos não qualificados para os serviços especializados, gerando a fragmentação e desresponsabilização do cuidado1818 Delfini PS, Reis AO. Articulação entre serviços públicos de saúde nos cuidados voltados à saúde mental infanto-juvenil. Cad Saúde Pública. 2012;28(2):357-66. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000200014. PMid:22331161.
http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012...
.

Os profissionais das equipes da atenção básica precisam de capacitação e educação permanente em saúde de forma geral, não apenas no campo psicossocial, de forma a desenvolver um trabalho conjunto, aprofundar e renovar os saberes teóricos e técnicos, visando à atualização frequente do conhecimento e aprimoramento de suas habilidades e competências, podendo assim ofertar aos usuários do sistema o melhor cuidado baseado em evidências1717 Pessoa JM Jr, Santos RCA, Clementino FS, Nascimento EGC, Miranda FAN. Formação em saúde mental e atuação profissional no âmbito do hospital psiquiátrico. Texto Contexto Enferm. 2016;25(3):e3020015. https://doi.org/10.1590/0104-07072016003020015.
https://doi.org/10.1590/0104-07072016003...
.

O Agente Comunitário de Saúde e as ações em saúde mental

Nas UBS, os ACS estão engajados no cotidiano da comunidade, estabelecendo vínculos e propiciando ações de promoção e educação para a saúde33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
. Como o agente de saúde é morador da região, experimenta situações semelhantes aos usuários da comunidade, o que favorece a abordagem e interação com eles1919 Pereira MAO, Barbieri L, Paula VP, Franco MSP. Saúde mental no Programa de Saúde da Família: conceitos dos agentes comunitários sobre o transtorno mental. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(4):567-72. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342007000400005. PMid:18193610.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342007...
. As equipes devem estabelecer vínculos com a população de abrangência do serviço, buscando conhecer os indivíduos, suas famílias e os recursos disponíveis na comunidade33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
. Para tanto, deve haver a articulação entre os diferentes níveis de atenção, tomada de decisão compartilhada e trabalho inteirado, de modo multiprofissional e interdisciplinar2020 Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2011., com ênfase no estudo e discussão de casos e construção de projetos terapêuticos1414 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Diretrizes para capacitação de agentes comunitários de saúde em linhas de cuidado [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado em 2021 mar 27]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
. Assim, torna-se possível a construção de um vínculo afetivo entre os trabalhadores e os usuários, facilitando o tratamento e favorecendo a relação deles com a equipe de saúde2121 Jorge MS, Pinto DM, Quinderé PH, Pinto AG, Sousa FS, Cavalcante CM. Promoção da saúde mental - tecnologias do cuidado: vínculo, acolhimento, co-responsabilização e autonomia. Cien Saúde Colet. 2011;16(7):3051-60. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232011000800005. PMid:21808893.
http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232011...
.

Depois que a gente entrou, a gente viu que é muito interessante! (A1).

Além da estabilidade do concurso, os agentes escolheram esta profissão para “conhecer e ajudar as pessoas”. (A7).

Apesar de a maioria dos ACS não ter recebido capacitação, eles relataram não encontrar grande dificuldade nas abordagens, demonstrando entendimento quanto aos cuidados e sobre os recursos que tanto a UBS quanto o próprio território podem oferecer para a concretização desse cuidado2222 Santos GA, Nunes MO. O cuidado em saúde mental pelos agentes comunitários de saúde: o que aprendem em seu cotidiano de trabalho? Physis. 2014;24(1):105-25. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312014000100007.
http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312014...
.

Tem liberdade com a gente, acaba acostumando porque a gente tá sempre ali com eles. A gente não julga nem cria dificuldades. (A1).

São os mais fáceis, que mais se abrem; que mais perguntam. (A7).

Quando a gente não conhece o paciente, até que tem dificuldade, depois não, porque os vizinhos dão dicas e facilitam o acesso a eles. O primeiro contato é sempre difícil. (A10).

É importante que esses profissionais incorporem competências de cuidado em saúde mental na sua prática cotidiana, e que suas intervenções sejam capazes de considerar a subjetividade, a singularidade e a visão de mundo do usuário2323 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. Cadernos de Atenção Básica, nº 34.. Geralmente as práticas mais observadas são aquelas “centradas na doença”, como acompanhamento de medicação e consultas3, e3 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
administração de psicofármacos injetáveis em alguns usuários. Mas os agentes percebem a necessidade de outras maneiras de condução dos casos e compreendem que a abordagem deve ser diferenciada e específica a cada pessoa.

Desse modo, o Projeto Terapêutico Singular, considerado uma diretriz de cuidado, deve ser desenvolvido em conjunto com o usuário, como estratégia de corresponsabilidade e estímulo à autonomia da pessoa, tornando possível o resgate da autonomia e autoestima através do projeto de vida de cada um1414 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Diretrizes para capacitação de agentes comunitários de saúde em linhas de cuidado [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado em 2021 mar 27]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
.

Cada caso é um caso. Então, temos algumas abordagens diferentes. Tenho um que só toma banho com receita médica. (A2).

A gestão de caso é um processo que se desenvolve entre o agente e o usuário do serviço no planejamento e monitoramento das ações, de acordo com as necessidades da pessoa, incluindo a compreensão dos problemas de saúde, bem como dos riscos e vulnerabilidades do sujeito1414 Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Diretrizes para capacitação de agentes comunitários de saúde em linhas de cuidado [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado em 2021 mar 27]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoe...
. Nesse contexto, a visita domiciliar foi descrita como capaz de facilitar um vínculo entre ACS e os indivíduos, associada ao fato de atuarem na área em que residem, permitindo melhor abordagem dos usuários e da família. A visita possibilita conhecer a realidade do portador de transtorno mental e da sua família, entendendo que o núcleo familiar muitas vezes precisa de apoio por parte da equipe de saúde e que tem papel fundamental no cuidado ao usuário33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
.

As visitas que a gente faz, a gente orienta, conversa. (A3).

Visitas domiciliares são uma ferramenta eficaz de apoio que pode ser usada como um dispositivo de cuidado, fortalecendo os vínculos e construindo pontes entre o usuário, os serviços e a sociedade. É considerado um importante mecanismo terapêutico, permitindo que os profissionais entendam a dinâmica familiar onde o usuário está inserido, proporcionando suporte e valorizando o apoio da família como parte do tratamento, podendo até atenuar conflitos previamente existentes no contexto familiar2424 Pinho L, Hernández A, Kantorski L. Serviços substitutivos de saúde mental e inclusão no território: contradições e potencialidades. Ciênc Cuid Saúde. 2010;9(1):28-35.,2525 Kantorski L, Machado R, Lemões M, Quadros L, Coimbra V, Jardim V. Avaliação da estrutura e processo na visão dos familiares de usuários de saúde mental. Ciênc Cuid Saúde. 2012;11(1):173-80..

Eles se sentem à vontade pra conversar com a gente. Falam que não tá bem! (A10).

Em relação às intervenções na atenção primária, os entrevistados acreditam que os usuários recebem uma assistência adequada neste nível de atenção. Algumas pontuações foram feitas, no entanto, em relação ao entendimento que o usuário tem sobre a medicação e ao tratamento.

As que procuram, sim! (recebem o cuidado adequado). (A2).

A maioria vem com receita antiga... de dois anos... acham que vão tomar o remédio para a vida inteira. Até morrer! (A12).

Acham que, porque somos agentes, podemos dar remédio. (A15).

Dentre as ações estão o encaminhamento para a unidade, orientações, indicação para grupos de atividades na comunidade, para centros de convivência, oficinas terapêuticas e para o CAPS, consultas com o médico clínico, renovação de receitas e encaminhamento para consultas especializadas, em conformidade com o relatado em outros estudos33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
.

Quanto ao acolhimento e cuidado no atendimento a esse público, os ACS demonstraram atuar com mais atenção, porém sem diferenças em relação aos demais usuários das UBS.

São carentes. Lidamos com mais atenção, com mais jeito. (A6).

A comunidade num geral tá. Todo mundo tá assim, da mesma forma, todo mundo tem problema. (A4).

O atendimento e os entraves nos serviços de saúde mental

Um dos obstáculos citados pelos entrevistados é a demora nos encaminhamentos e a carência de serviços e profissionais especializados ou, ainda, a falta de contrarreferenciamento. A articulação entre os CAPS e a rede básica é ainda precária e os serviços disponíveis se apresentam dispersos, isolados e sem articulação entre eles33 Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032. PMid:22241213.
http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011...
,2626 Rotoli A, Silva MRS, Santos AM, Oliveira AMN, Gomes GC. Saúde mental na Atenção Primária: desafios para a resolutividade das ações. Esc Anna Nery. 2019;23(2):e20180303. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0303.
http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-...
,2727 Gonçalves M Jr, Tobias GC, Teixeira CC. Saúde mental na atenção primária à saude. Rev Atenção Saúde. 2019;17(60):101-16.. De fato, apesar de ser um processo em construção e com perspectiva de melhoria, é perceptível a baixa sintonia entre os serviços componentes da RAPS no município.

A necessidade de comunicação entre os profissionais de saúde e os provedores, para uma melhor coordenação do cuidado, é um consenso2828 Boerma WGW. Coordenação e integração em atenção primária europeia. In: Saltman RB, Rico A, Boerma WGW, organizadores. Atenção primária conduzindo as redes de atenção à saúde: reforma organizacional na atenção primária europeia. Berkshire: Open University Press; 2010. p. 25-47.,2929 McDonald KM, Schultz E, Albin L, Pineda N, Lonhart J, Sundaram V, et al. Care coordination Atlas version 4. Rockville: Agency for Healthcare Research and Quality; 2014. AHRQ publication N.14-0037-EF.. Como a APS é uma das portas de entrada possíveis para o usuário à rede de saúde, sua atuação na coordenação do cuidado entre os pontos de atenção na rede desempenha um papel fundamental3030 Pereira AA, Andrade DCL. Estratégia educacional em saúde mental para médicos da Atenção Básica. Rev Bras Educ Med. 2018;42(1):6-14. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n4rb20160021.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v...
. Os profissionais que atuam nesta área devem receber apoio e supervisão de especialistas, pois somente através desta articulação será possível atender às demandas de saúde mental fora do espaço da especialidade3030 Pereira AA, Andrade DCL. Estratégia educacional em saúde mental para médicos da Atenção Básica. Rev Bras Educ Med. 2018;42(1):6-14. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n4rb20160021.
http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v...
.

Os médicos questionam a contrarreferência. A malandragem do paciente em tomar o remédio que acha que deve. Não entregam a receita certa e o médico não tem como saber a medicação que ele usa. Na dúvida dá a receita para o paciente, porque senão ele diz: eu vou surtar se ficar sem remédio! (A12).

A dificuldade é atenção secundária marcar a consulta dentro do prazo. (A6).

De vez em quando, não é sempre, eles ligam e passam o caso. O CAPS iniciou reuniões aqui no bairro, de dois em dois meses neste ano. Começou agora. Casos específicos, de vez em quando ligava, de vez em quando; só em casos extremos. (A3).

O prontuário eletrônico foi criado para facilitação do acesso à medicação, tratamento e outras informações, mas não corresponde às expectativas e não supre as necessidades dos profissionais. Os entrevistados entendem que a qualidade dos serviços é uma percepção individual, assim como a melhora do paciente.

Tem a expectativa da família, da gente. Ela volta abobada, aí a família acha que não foi bem tratada. Ela não vai na FHEMIG [Hospital Psiquiátrico do município] porque lá é lugar de gente doida, e lá ela não quer ir. (A8).

O familiar não quer pegar pra si; a rede não quer pegar pra si [responsabilidade]. (A6).

A van busca, leva. Eles trazem a medicação... (A10).

Ela não quer ficar no CAPS porque lá não tem atividade. (A7).

A falta de recursos dos serviços de Saúde Mental foi relatada como entrave para a assistência. A distância geográfica e a baixa renda também dificultam o tratamento desses usuários. Participantes do Grupo “2” desconheciam o transporte gratuito para essa clientela em algumas situações.

É o serviço público! Não tem carro, como que o CAPS vai? (A7).

As pessoas não entendem que não tem recursos! (A6).

A Organização Mundial de Saúde (OMS) informa que o investimento em saúde mental deve ser de aproximadamente 5% do orçamento da saúde, em função da elevada prevalência de transtornos mentais3131 Gonçalves RW, Vieira FS, Delgado PGG. Política de saúde mental no Brasil: evolução do gasto federal entre 2001 e 2009. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):51-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011005000085. PMid:22183515.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...
na atenção básica à saúde e seu impacto na assistência. Entretanto, o governo brasileiro gasta apenas 2,3% do orçamento total da saúde nesse campo3131 Gonçalves RW, Vieira FS, Delgado PGG. Política de saúde mental no Brasil: evolução do gasto federal entre 2001 e 2009. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):51-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011005000085. PMid:22183515.
http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011...
,3232 Trapé TL, Campos RO. Modelo de atenção à saúde mental no Brasil: análises do financiamento, processos de governança e mecanismos de avaliação. Rev Saúde Pública. 2017;51:19. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2017051006059.
https://doi.org/10.1590/s1518-8787.20170...
, refletindo o subfinanciamento da saúde mental, dentro de um sistema já subfinanciado.

Outra questão elencada refere-se à falta de comprometimento do usuário em relação ao tratamento.

A gente marca e ele não vem! Tirava a vaga de quem dormia na fila. (A7).

É relativo. Funciona para os que querem, para os que não querem, mas eles sabem onde estão os serviços e não vão. (A1).

Ele não aceita ir ao psiquiatra. Ele é feliz assim! (A9).

Eles se dão alta, se medicam. Pegam medicação com a vizinha. (A6).

Os ACS relataram conhecer os serviços de saúde mental a partir da percepção dos próprios usuários. O entendimento sobre a proposta desses serviços não é claro para os ACS que, quando os procuram, são orientados a buscar outro serviço e não conseguem direcionar o paciente para um local apropriado. Algumas demandas são dos profissionais e não do paciente.

A Política Nacional de Saúde Mental rompeu com o modelo centrado na hegemonia médica, englobando as diversas áreas da saúde e outros campos de conhecimento, enfatizando as relações de cuidado e a transversalidade. Entretanto, muitas vezes pode-se observar a necessidade de encaminhamento médico prévio para acesso à equipe multiprofissional, de modo que o atendimento continua a depender da consulta psiquiátrica antes da introdução de outras modalidades não farmacológicas de abordagem3333 Jorge MSB, Sales FDA, Pinto AGA, Sampaio JJC. Interdisciplinaridade no processo de trabalho em Centro de Atenção Psicossocial. Rev Bras Promoç Saúde. 2010;23(3):221-30. http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2010.p221.
http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2010....
. Essa circunstância, de ordem cultural e organizacional, contribui para as filas de espera de atendimento e representa um entrave no sistema.

Conhecemos os serviços pelo relato dos pacientes. O paciente que passou por lá e você fica sabendo. A gente mesmo nunca foi conhecer. (A5).

Sei que tem atividades na FHEMIG porque a Dona Maria vai. (A10).

Tem casos que não são para o posto, mas ele não está em crise. O CAPS só aceita o paciente em crise. Aí até sair a consulta... o CAPS deveria atender ele naquele momento. (A9).

Tá vendo que algo vai acontecer, mas não atendem. Deveriam agir na prevenção, mas esperam acontecer! Aí o paciente tem que esperar, porque não é aqui, o CAPS não aceita e tem que esperar o sistema e a fila que é enorme! (A15).

O Samu não põe a mão enquanto o CAPS não chega. O CAPS não tem carro. Como que faz? O Samu não leva sozinho, mas ele não tem família. Como que faz? (A10).

Se o Samu chegar, obrigado não vai; se a polícia chegar, obrigado não vai. (A7).

Era uma intercorrência clínica, mas ninguém queria levar porque ele é psiquiátrico. (A2).

A frequência do acompanhamento nos serviços foi relatada como defasada. O acompanhamento psicológico foi citado como precário no município. A falta de vagas dificulta o acesso ao acompanhamento psicológico que foi relatado como importante no tratamento em Saúde Mental.

Ela vai lá de 6 em 6 meses só fazer acompanhamento do lítio. Não sabem como ela tá! (A1).

Psiquiatra ela tem, mas e o psicólogo? Porque não é só tomar remédio! (A10).

Tento encaminhar para o psicólogo. (A5).

Não é uma consulta que sai com facilidade [psiquiatra]. (A7).

Outra dificuldade encontrada pelos entrevistados refere-se às outras atribuições que precisam realizar com a falta de profissional da unidade. Eles realizam atividades administrativas, serviços gerais ou outras. Quando precisam cobrir a unidade, seu território de atuação não recebe as intervenções necessárias e os usuários não são acompanhados de forma integral durante aquele período. Observa-se ainda que os afazeres burocráticos, como preenchimento de fichas e elaboração de relatórios de atividades diárias, podem consumir tempo substancial das atividades assistenciais.

Fiquei 11 meses afastada da minha área. Aí ela só ia lá entregar os exames. (A16).

A área fica sem assistência. Só entrega os exames. (A13).

CONSIDERAÇÕES FINAIS

A atuação do Agente Comunitário de Saúde é fundamental para o trabalho das equipes no âmbito da atenção primária. Durante a realização dos grupos, e posteriormente por meio da análise das falas dos participantes, percebeu-se que o conhecimento e as habilidades dos ACS foram construídos a partir da vivência diária com os pacientes e, portanto, limitada à visão subjetiva de cada indivíduo, indicando ser necessária a realização de cursos de capacitação, educação continuada e apoio matricial. Mesmo com muitos avanços, a formação dos ACS permanece um desafio a ser superado para se fortalecer o cuidado em saúde, especialmente no que tange à saúde mental.

Por outro lado, foi observado que os ACS gostam do que fazem, demonstram preocupação com os usuários, conhecem os moradores e as características da comunidade onde atuam, o que favorece a longitudinalidade do cuidado aos pacientes. As equipes de atenção básica, por sua proximidade com famílias e comunidades, representam importante estratégia para o enfrentamento dos problemas de saúde da população, especialmente aqueles relacionados à saúde mental. Sendo assim, uma melhor preparação técnica e teórica dos ACS resultaria em ganhos para ambas as partes.

Os relatos dos profissionais apontaram também para dificuldades envolvendo os diversos pontos da rede de atenção à saúde, desde questões de ordem estrutural, como transporte, até precariedade no sistema de referência/contrarreferência, marcação de consultas de retorno e ausência de profissionais. Apesar das dificuldades, a rede é fundamentalmente baseada nas necessidades do usuário, exigindo articulação entre seus componentes para atendê-las.

A rede de assistência à saúde mental no Brasil não é homogênea, havendo diferenças importantes entre as diversas localidades no que diz respeito à infraestrutura, organização dos serviços e recursos humanos. Este artigo, apesar de contemplar apenas a realidade local, oferece elementos para fomentar a compreensão da construção desta importante política pública, além de fornecer material para desvendar potencialidades e desafios enfrentados no cotidiano do cuidado da saúde mental na atenção básica.

  • Como citar: Salgado JW, Zanela LRM, Rocha LT, Calmeto MN, Meneguetti JA, Vidal CEL. Saúde mental na atenção básica: percepção dos Agentes Comunitários de Saúde. Cad Saúde Colet, 2023; 31 (2):e31020065. https://doi.org/10.1590/1414-462X202331020065
  • Trabalho realizado na Faculdade de Medicina de Barbacena e Unidades Básicas de Saúde de Barbacena - Barbacena (MG), Brasil.
  • Fonte de financiamento: nenhuma.
    Conflito de interesses: nada a declarar.
  • Número do Parecer Comitê de Ética/FHEMIG: 2.373.187. Aprovado em Nov. 09, 2017.

REFERÊNCIAS

  • 1
    Ventura CAA, Moraes VCO, Jorge MS. Os profissionais de saúde e o exercício dos direitos humanos por portadores de transtornos mentais. Rev Eletrônica Enferm. 2013;15(4):854-61. http://dx.doi.org/10.5216/ree.v15i4.19746
    » http://dx.doi.org/10.5216/ree.v15i4.19746
  • 2
    Brasil. Portaria nº 3.088, de 23 de dezembro de 2011. Instituída a Rede de Atenção Psicossocial, no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS). Diário Oficial da União [Internet], Brasília, 26 de dezembro de 2011; Seção 1. p. 230-32 [citado em 2019 ago 15].Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/saudelegis/gm/2011/prt3088_23_12_2011_rep.html
  • 3
    Correia VR, Barros S, Colvero LA. Saúde mental na atenção básica: prática da equipe de saúde da família. Rev Esc Enferm USP. 2011;45(6):1501-6. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032 PMid:22241213.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342011000600032
  • 4
    Souza LGS, Menandro MCS, Couto LLM, Schimith PB, Lima RP. Saúde mental na estratégia saúde da família: revisão da literatura brasileira. Saúde Soc. 2012;21(4):1022-34. http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012000400019
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0104-12902012000400019
  • 5
    Cabral TMN, Albuquerque PC. Saúde mental sob a ótica de Agentes Comunitários de Saúde: a percepção de quem cuida. Saúde Debate. 2015;39(104):159-71. http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151040415
    » http://dx.doi.org/10.1590/0103-110420151040415
  • 6
    Nascimento LG, Melo W, Silva MV. Oficinas de intervenção psicossocial com agentes comunitários de saúde: reflexões e intervenções dialogadas. Rev Bras Med Fam Comunidade. 2014;9(33):336-42. http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc9(33)716
    » http://dx.doi.org/10.5712/rbmfc9(33)716
  • 7
    Wilkinson S. Focus group methodology: a review. Int J Soc Res Methodol. 1998;1(3):181-203. http://dx.doi.org/10.1080/13645579.1998.10846874
    » http://dx.doi.org/10.1080/13645579.1998.10846874
  • 8
    Bardin L. Análise de conteúdo. Lisboa: Edições 70; 2006.
  • 9
    Flick U. Introdução à pesquisa qualitativa. 3. ed. Porto Alegre: Artmed; 2009.
  • 10
    Minayo MCS. Pesquisa social: teoria, método e criatividade. 18. ed. Petrópolis: Vozes; 2001.
  • 11
    Gui RT. Grupo focal em pesquisa qualitativa aplicada: intersubjetividade e construção de sentido. Rev Psicol Organ Trab [Internet]. 2003;3(1):135-59 [citado em 2019 ago 18]. Disponível em: https://periodicos.ufsc.br/index.php/rpot/article/view/7071
    » https://periodicos.ufsc.br/index.php/rpot/article/view/7071
  • 12
    Barros MMMA, Chagas MIO, Dias MSA. Saberes e práticas do agente comunitário de saúde no universo do transtorno mental. Ciên Saúde Colet. 2009;14(1):227-32. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000100028
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232009000100028
  • 13
    Brasil. Ministério da Saúde. Fundação Osvaldo Cruz. Grupo Hospitalar Conceição. Projeto Caminhos do Cuidado: formação em saúde mental (crack, álcool e outras drogas) para agentes comunitários de saúde, auxiliares e técnicos de enfermagem [Internet]. 2015 [citado em 2019 ago 19]. Disponível em: https://programadrogas.fiocruz.br/projetos_e_atividades/68
    » https://programadrogas.fiocruz.br/projetos_e_atividades/68
  • 14
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde. Departamento de Gestão da Educação na Saúde. Diretrizes para capacitação de agentes comunitários de saúde em linhas de cuidado [Internet]. Brasília: Ministério da Saúde; 2016 [citado em 2021 mar 27]. Disponível em: http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
    » http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/diretrizes_capacitacao_agentes_comunitarios_cuidado.pdf
  • 15
    Rézio LA, Oliveira AGB. Equipes e condições de trabalho nos Centros de Atenção Psicossocial em Mato Grosso. Esc Anna Nery. 2010;14(2):346-54. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452010000200019
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452010000200019
  • 16
    Mello R, Furegato ARF. Representações de usuários, familiares e profissionais acerca de um centro de atenção psicossocial. Esc Anna Nery. 2008;12(3):457-64. http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452008000300010
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1414-81452008000300010
  • 17
    Pessoa JM Jr, Santos RCA, Clementino FS, Nascimento EGC, Miranda FAN. Formação em saúde mental e atuação profissional no âmbito do hospital psiquiátrico. Texto Contexto Enferm. 2016;25(3):e3020015. https://doi.org/10.1590/0104-07072016003020015
    » https://doi.org/10.1590/0104-07072016003020015
  • 18
    Delfini PS, Reis AO. Articulação entre serviços públicos de saúde nos cuidados voltados à saúde mental infanto-juvenil. Cad Saúde Pública. 2012;28(2):357-66. http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000200014 PMid:22331161.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0102-311X2012000200014
  • 19
    Pereira MAO, Barbieri L, Paula VP, Franco MSP. Saúde mental no Programa de Saúde da Família: conceitos dos agentes comunitários sobre o transtorno mental. Rev Esc Enferm USP. 2007;41(4):567-72. http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342007000400005 PMid:18193610.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0080-62342007000400005
  • 20
    Mendes EV. As redes de atenção à saúde. Brasília: Organização Pan-Americana da Saúde; 2011.
  • 21
    Jorge MS, Pinto DM, Quinderé PH, Pinto AG, Sousa FS, Cavalcante CM. Promoção da saúde mental - tecnologias do cuidado: vínculo, acolhimento, co-responsabilização e autonomia. Cien Saúde Colet. 2011;16(7):3051-60. http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232011000800005 PMid:21808893.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S1413-81232011000800005
  • 22
    Santos GA, Nunes MO. O cuidado em saúde mental pelos agentes comunitários de saúde: o que aprendem em seu cotidiano de trabalho? Physis. 2014;24(1):105-25. http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312014000100007
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0103-73312014000100007
  • 23
    Brasil. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à Saúde. Departamento de Atenção Básica. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Saúde mental. Brasília: Ministério da Saúde; 2013. Cadernos de Atenção Básica, nº 34.
  • 24
    Pinho L, Hernández A, Kantorski L. Serviços substitutivos de saúde mental e inclusão no território: contradições e potencialidades. Ciênc Cuid Saúde. 2010;9(1):28-35.
  • 25
    Kantorski L, Machado R, Lemões M, Quadros L, Coimbra V, Jardim V. Avaliação da estrutura e processo na visão dos familiares de usuários de saúde mental. Ciênc Cuid Saúde. 2012;11(1):173-80.
  • 26
    Rotoli A, Silva MRS, Santos AM, Oliveira AMN, Gomes GC. Saúde mental na Atenção Primária: desafios para a resolutividade das ações. Esc Anna Nery. 2019;23(2):e20180303. http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0303
    » http://dx.doi.org/10.1590/2177-9465-ean-2018-0303
  • 27
    Gonçalves M Jr, Tobias GC, Teixeira CC. Saúde mental na atenção primária à saude. Rev Atenção Saúde. 2019;17(60):101-16.
  • 28
    Boerma WGW. Coordenação e integração em atenção primária europeia. In: Saltman RB, Rico A, Boerma WGW, organizadores. Atenção primária conduzindo as redes de atenção à saúde: reforma organizacional na atenção primária europeia. Berkshire: Open University Press; 2010. p. 25-47.
  • 29
    McDonald KM, Schultz E, Albin L, Pineda N, Lonhart J, Sundaram V, et al. Care coordination Atlas version 4. Rockville: Agency for Healthcare Research and Quality; 2014. AHRQ publication N.14-0037-EF.
  • 30
    Pereira AA, Andrade DCL. Estratégia educacional em saúde mental para médicos da Atenção Básica. Rev Bras Educ Med. 2018;42(1):6-14. http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n4rb20160021
    » http://dx.doi.org/10.1590/1981-52712015v41n4rb20160021
  • 31
    Gonçalves RW, Vieira FS, Delgado PGG. Política de saúde mental no Brasil: evolução do gasto federal entre 2001 e 2009. Rev Saúde Pública. 2012;46(1):51-8. http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011005000085 PMid:22183515.
    » http://dx.doi.org/10.1590/S0034-89102011005000085
  • 32
    Trapé TL, Campos RO. Modelo de atenção à saúde mental no Brasil: análises do financiamento, processos de governança e mecanismos de avaliação. Rev Saúde Pública. 2017;51:19. https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2017051006059
    » https://doi.org/10.1590/s1518-8787.2017051006059
  • 33
    Jorge MSB, Sales FDA, Pinto AGA, Sampaio JJC. Interdisciplinaridade no processo de trabalho em Centro de Atenção Psicossocial. Rev Bras Promoç Saúde. 2010;23(3):221-30. http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2010.p221
    » http://dx.doi.org/10.5020/18061230.2010.p221

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Maio 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    26 Mar 2020
  • Aceito
    27 Mar 2021
Instituto de Estudos em Saúde Coletiva da Universidade Federal do Rio de Janeiro Avenida Horácio Macedo, S/N, CEP: 21941-598, Tel.: (55 21) 3938 9494 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cadernos@iesc.ufrj.br