SENTIDOS E SINGULARIDADES DOS NOVOS COLETIVOS DE AÇÃO

Gaiger, Luiz Inácio

doi:10.9771/ccrh.v38i0.51678

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ARTIGO • Cad. CRH 38 • 2025 • https://doi.org/10.9771/ccrh.v38i0.51678 linkcopiar

SENTIDOS E SINGULARIDADES DOS NOVOS COLETIVOS DE AÇÃO

SIGNIFICADOS Y SINGULARIDADES DE LOS NUEVOS COLECTIVOS DE ACCIÓN

SENSES AND SINGULARITIES OF THE NEW ACTION COLLECTIVES

Autoria SCIMAGO INSTITUTIONS RANKINGS

Resumos

O artigo examina formas recentes de ativismo cuja designação de coletivos tem sido assimilada pelos estudos acadêmicos, conformando assim um novo campo de pesquisa. Com base em revisões bibliográficas, análises de documentos e pesquisas de campo em vários países, o artigo sintetiza o processo de emergência dessas iniciativas e propõe uma delimitação conceitual que os diferencia de outras formas de mobilização social. A seguir, trata de algumas características inovadoras dos coletivos, com ênfase na superação de clivagens correntes em movimentos sociais anteriores, como entre demandas materiais e imateriais, individualidade e coletividade, vida privada e compromisso público, entre outras. Conclui que os coletivos constituem uma resposta inovadora ao cenário atual do capitalismo, configurando um novo padrão de ativismo e de mobilização social.

Ativismo; Autonomia; Coletivos; Globalização; Movimentos sociais

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

Em Porto Alegre, o Coletivo Nimba nasceu em 2018 a partir do encontro de três artistas que desejavam organizar um espaço para valorizar e promover o trabalho das mulheres negras na cena artística da cidade, como também para propiciar um ambiente seguro de acolhimento e compartilhamento de experiências. Sua principal atividade são saraus, virtuais ou presenciais. Além de cinquenta pessoas apoiadoras, há subgrupos executivos, como o de comunicação. As atividades, voluntárias, são realizadas conforme a disponibilidade das integrantes. Seu foco de atuação, a partir da arte, relaciona-se às desigualdades de gênero, raça e econômicas, envolvendo questões de identidade e reconhecimento (Teixeira, 2022).¹²

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

A associação Nittúa, situada em Valência, Espanha, foi fundada em 2006 com o propósito de transformar o modelo econômico vigente, de dentro. Apresenta-se como uma plataforma para a inovação socioeconômica, por meio da elaboração, implementação ou assessoria a projetos vinculados a empresas sociais, a ações de natureza ambiental, à economia social e solidária e ao campo do empreendedorismo social. Propugna um modelo de desenvolvimento com valor triplo: social, meio-ambiental e financeiro. Coloca-se a serviço de agentes econômicos cuja visão estratégica seja inovadora, responsável e qualificada. Reunindo especialistas de várias áreas, propõe-se a dinamizar o intercâmbio de conhecimentos e a geração de valores, criando pontes entre o econômico e o social, de forma a promover a aproximação e a cooperação entre os atores sociais. Entre suas ações, figura o desenvolvimento da plataforma Mercado Social, uma das mais importantes ferramentas de conexão entre as iniciativas alternativas e solidárias da Espanha.

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

A Rainbow Grocery, de San Francisco, USA, fundada em 1975 e convertida em cooperativa em 1993, conta atualmente com 250 trabalhadores, todos cooperados. Sua missão é colocar em prática os ideais de um modo sustentável de vida e, ao mesmo tempo, assegurar a oferta de produtos alimentícios saudáveis e orgânicos. Sua atuação social centra-se na comunidade local (distrital), na qual atua apoiando lutas e movimentos e dando suporte a novas cooperativas, como também em educação, disseminação de tecnologias e, ainda, por meio de doações a organizações sem fins lucrativos, como escolas. Emprega energias limpas e propugna seu uso na cidade (meios de transporte, reciclagem, energia social etc.). Em relação aos trabalhadores, desenvolve uma política de inclusão e diversidade, de renda, geracional, de raça e culturas. A cooperativa se recusa a instituir diferentes tipos de associados e a contratar trabalhadores externos ao quadro social. Mantém uma única categoria de membros, sócios trabalhadores e coproprietários, com direitos similares, não obstante a complexidade decorrente do porte de sua atividade econômica, por conta do volume e da variedade de produtos.

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

O Hackerspace Matehackers, criado em 2011, realiza eventos abertos em Porto Alegre, na área de software, eletrônica, cultura, música, dados abertos, culinária e outros. Basicamente, trata-se de um espaço físico no qual hackers se encontram livremente para trocar ideias e fazer diversas coisas, de programação web à pizza, de robôs à criptografia, dentro de um espírito de comunidade. Seus integrantes são em maioria estudantes ou recém formados em ciências da computação. O coletivo, aberto à livre adesão, funciona com base em deliberações coletivas, por meio de listas de discussão e encontros presenciais, evitando compartimentações e estruturas burocráticas. O ponto de atração está precisamente na autonomia concedida a cada participante. Inexiste remuneração dos membros, tampouco condicionantes contratuais. O financiamento do local provém de doações, vendas de material promocional, coletas em eventos e contribuições associativas modestas, que ainda não garantem a autossuficiência financeira, mesmo com despesas módicas (Cfr. Burtet, 2014). O coletivo mantém relações com outras iniciativas, vistas como “Grupos Amigos”, e participa de encontros locais e globais.

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

A Amada Massa é uma iniciativa fundada em 2018 com vistas à reinclusão social e à reinserção econômica de pessoas em situação de vulnerabilidade, como moradores de rua, apenados e dependentes químicos. Trata-se de um panifício com endereço em Porto Alegre, nos qual os responsáveis pela produção de pães, fabricados com ingredientes orgânicos e processos naturais, são os próprios beneficiários diretos da iniciativa (chamados de “Peregrinos”), que assim aprendem um ofício, obtêm uma renda mensal e passam a dispor de um teto. Eles são acompanhados por uma rede de apoio, formada de participantes externos e por consumidores habituais (pessoas “fermentadoras”) ou compradores eventuais. Voluntários coordenam ou auxiliam nas reuniões semanais e nas tarefas administrativas aos poucos assumidas pelos beneficiários diretos, além de atuarem como provedores de cuidados e acolhimento. A dinâmica do coletivo assenta-se em princípios de redução de danos, comunicação não-violenta e justiça restaurativa. O panifício promove a alimentação consciente e saudável, oferecendo pães de qualidade, num sistema misto de encomendas, tele-entregas e compras na loja. Busca criar novas relações entre quem produz e quem consome os alimentos, para que sejam menos imediatas, mais próximas e duradouras, e mais cuidadosas. A iniciativas está associada à economia solidária e à economia verde, bem como à culinária vegana e outras, propostas na área da alimentação saudável e do comércio justo (Bretas, 2019; Câmara et al., 2020).

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

Na França, encontramos em Marselha a Associação La Tchatche (bate-papo), uma iniciativa com atuação regional centrada na informação jornalística, no debate público e na educação popular. A associação foi criada em 2003 por algumas pessoas, em sua maioria jornalistas, para dar lugar ao jornal Le Ravi, cujas edições mensais mesclam artigos e desenhos, sátira e reportagens. Em seus números impressos (de leitura gratuita no website do jornal), publicam-se matérias sobre vários assuntos (ecologia, política, feminismo, justiça, questões sociais e lazer), parte delas provenientes de projetos de jornalismo participativo em meio popular, o que envolve contatos presenciais e por diversos canais à distância. La Tchatche possui hoje mais de uma centena de associados, basicamente leitores do jornal e das matérias divulgadas pela internet. A associação tem na assembleia geral seu órgão deliberativo máximo. Conta com um colégio de administração e um diretor de publicação, todos voluntários, além de sete assalariados, estagiários e voluntários em várias funções (de reportagens à tesouraria). O jornal sustenta-se basicamente com as vendas avulsas e as assinaturas, além de doações e subvenções públicas destinadas às associações, porquanto a publicidade paga é bastante reduzida e selecionada (Richen, 2015, paginação).

Síntese do fichamento descritivo dos casos empíricos

No centro de Madrid, funciona desde 2016 um pequeno restaurante agroecológico, cooperativo e vegetariano. Trata-se de um estabelecimento comercial com ideologia explícita: “partimos de la premisa de que queremos una sociedad más justa, en la que el poder y los recursos estén distribuidos equitativamente entre todas las personas. Una sociedad más libre, donde la diversidad sea un valor fundamental. Y una sociedad que respete los límites del planeta y a todos los seres vivos” (https://elfogonverde.net/nuestro-argumentario/). Em sua carta de apresentação, ademais, o Fogón Verde alinha seus propósitos em uma perspectiva feminista. O restaurante serve pratos vegetarianos (com opções veganas e sem glúten), com base em ingredientes orgânicos de produtores locais, obtidos via cooperativas, uniões e associações agroecológicas. Funciona também por encomendas a domicílio e tele-entregas, além de abastecer eventos relacionados à economia social e solidária, entre outros.

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