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DIFICULDADES INSTITUCIONAIS E ECONÔMICAS PARA O ORÇAMENTO PARTICIPATIVO EM MUNICÍPIOS BRASILEIROS

INSTITUTIONAL AND ECONOMIC DIFFICULTIES FOR PARTICIPATORY BUDGETING IN BRAZILIAN MINICIPALITIES

DIFFICULTÉS INSTITUTIONNELLES ET ÉCONOMIQUES POUR LA BUDGÉTISATION PARTICIPATIVE DANS LESMUNICIPALITÉS BRÉSILIENNES

Resumos

Este artigo faz parte de uma agenda de pesquisa que tem origem na abordagem institucional e na economia política do orçamento público para a construção de modelo de análise da governança orçamentária em cidades brasileiras. O objetivo do artigo é analisar o processo de participação e conflito distributivo inerente ao orçamento público partindo de evidências dos municípios brasileiros no período de 2005 a 2018. Este texto apresenta reflexões iniciais sobre os limites para a realização do Orçamento Participativo decorrentes da crescente setorialização de gastos, da estrutura de receitas municipais e da crise de financiamento nos municípios, principalmente, a partir de 2014, que têm infligido dificuldades para a construção de uma arena coletiva para participação e negociação do conflito distributivo.

Orçamento Público; Governo Local; Conflito Distributivo; Orçamento Participativo; Municípios


This article is part of a research agenda based on the institutional approach and the political economy of public budgeting to develop an analyticalframeworkfor the budgetary governance in Brazilian cities. The article aims to understand the participatory and distributive conflict inherent to the public budgeting,based on evidence from Brazilian municipalities from 2005 to 2018. This paper presents initial remarks on the limits to the Participatory Budgeting arising from the growing sectorization of spending, the structure of municipal revenues and the fiscal crisis in the municipalities, especially since 2014, which have complicated the construction of a collective arena for participation and negotiation of distributive conflict.

Public budgeting; Local government; Distributive conflict; Participatory budgeting; Municipalities


Cet article a pour origine un programme de recherche issu de l’approcheinstitutionnelle et de l’économie politique du budget public pour la construction d’un modèled’analyse de la gouvernancebudgétaire des villesbrésiliennes. L’objectif de cet article est de comprendre le processus de participation et les conflits de répartition intrinsèques au budget public à partir des informations financières des municipalités brésiliennes entre 2005 et 2018. Cet étude présente des réflexions initiales à propos des limites de la budgétisation participative suite à la croissante spécialitébudgétairedes dépenses, à la structure de recettes municipales et à la crise du financement municipal, en particulier depuis 2014, qui brident la construction d’un espace collectif de participation et de négociation des conflits distributifs.

Budget public; Gouvernement local; Conflit distributif; Budget publique; Budgétisation participative; Municipalités


INTRODUÇÃO

O período que se inicia após vinte anos de governo militar no Brasil (1964-1985) é de grande ebulição de ideias e demandas e de emergência de novos atores sociais buscando espaço para a inserção política. Após uma fase de participação “espontânea”, nas palavras de Cardoso (1994)CARDOSO , R. “ A Trajetória dos Movimentos Sociais ”, in DAGNINO , E. ( org .) , Os Anos 90: Política e Sociedade no Brasil . São Paulo : Brasiliense , 1994 , pp. 81 - 90 . , na qual movimentos sociais tendiam a se confrontar ao Estado, num posicionamento antagônico e desconfiado, há um processo contínuo e crescente de institucionalização da participação. Neste curso, são revistas as bases de construção do Estado e os repertórios de participação, que passam das manifestações de rua e enfrentamento direto para a coparticipação ou a gestão participativa. As experiências participativas ganharam tanta velocidade e volume ao longo dos anos 1990 e início dos 2000 que o Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas – Ipea construiu uma linha de pesquisa para mapeá-las, criando um censo da participação no Brasil ( Pires, 2011PIRES , R. R. C. ( Org .) . Efetividade das instituições participativas no Brasil: estratégias de avaliação . Brasília : IPEA , 2011 . ; Pires e Vaz, 2014PIRES , R. R ; VAZ , A. C. N. Para além da participação: interfaces socioestatais no governo federal . Lua Nova . n. 93 , pp. 61 - 91 , 2014 . ).

Essas diferentes construções foram denominadas Instituições Participativas - IPs 1 1 Instituições Participativas – IPs são espaços institucionalizados, dentro da estrutura governamental, de debate e interação entre governos e sociedade civil. e apresentam tipologia extensa e variada em todo o território nacional, nas três esferas de governo. Ao longo das últimas décadas, os Conselhos Gestores de Políticas Públicas e, no que tange ao conflito distributivo, o modelo do Orçamento Participativo – OP, a partir da experiência exitosa de Porto Alegre, têm sido considerados como expoentes das instituições participativas. No que tange ao conflito distributivo, o OP destacou-se como forma de gestão com vantagens e benefícios, tanto para o poder público como para a sociedade, ao abrir a possiblidade de aumentar a transparência e accountability dos recursos públicos e permitir ganhos na relação Estado-sociedade ao aproximar o cidadão da definição alocativa de recursos, antes dependente da representação parlamentar/legislativa, ativando assim a democracia direta.

A arena participativa do orçamento, como passou a ser conhecida, seria um espaço para disputa e construção democrática de consensos em torno do conflito distributivo, permitindo inverter prioridades e investir recursos de forma mais equânime no atendimento da demanda social, e evitando clientelismo e corrupção. Além de todos esses ganhos, essa instituição participativa ainda permitiria o aprendizado contínuo da prática democrática, ao que Pontual (2000)PONTUAL , P. de C. O Processo Educativo no Orçamento participativo: Aprendizados dos Atores da Sociedade Civil e do Estado. 2000 . Tese (Doutorado no Programa de Estudos Pós-Graduados em Educação) – Pontifícia Universidade Católica de São Paulo . São Paulo , 2000 . denominou de Pedagogia da Participação. Tal modelo de gestão orçamentária chamou a atenção mundial desde Porto Alegre e sua exposição no Fórum Social Mundial, como relata Oliveira (2016)OLIVEIRA , O. P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos . Opinião Pública , v. 22 , n. 2 , pp. 219 - 249 , 2016 . , atraindo para o Brasil diversos estudiosos da democracia direta e exportando seu modus operandi para diferentes países em vários continentes. Segundo o Atlas Mundial do Orçamento Participativo ( Dias; Enríquez; Júlio, 2019DIAS , N. ; ENRÍQUEZ , S. ; JÚLIO; S. The Participatory Bugdgeting World Atlas . Portugal : Epopeia e Oficina , 2019 . ), existem mais de 11 mil experiências de Orçamentos Participativos pelo mundo. O sucesso desse modelo fez com que a experiência nacional não ficasse restrita aos partidos de esquerda, que a desenvolveram inicialmente. De acordo com o Atlas Mundial do Orçamento Participativo ( Dias; Enríquez; Júlio, 2019DIAS , N. ; ENRÍQUEZ , S. ; JÚLIO; S. The Participatory Bugdgeting World Atlas . Portugal : Epopeia e Oficina , 2019 . ), o país apresenta 436 locais em que o OP está presente.

Apesar de sua relevância, a experiência do OP no Brasil tem vivido um refluxo importante após 2004, com maior intensidade a partir de 2008. São muitos os municípios que abandonaram o OP ou mantiveram a experiência em formato mais modesto que o de outrora. O próprio Atlas Mundial do OP ( Dias; Enríquez; Júlio, 2019DIAS , N. ; ENRÍQUEZ , S. ; JÚLIO; S. The Participatory Bugdgeting World Atlas . Portugal : Epopeia e Oficina , 2019 . ) sustenta essa análise, com especial foco para a sua queda posteriormente às eleições de 2016. De Renzio, Spada e Wampler (2019) são ainda mais contundentes sobre este cenário. Ao analisar experiências de Orçamento Participativo em cidades com mais de 50 mil habitantes e com mais de dois ciclos de existência, os autores viram o número cair de 101, entre 2009 e 2012, para 58, entre 2013 e 2016. Assim, a expectativa de que um novo mundo de inversão de prioridades, transparência, abertura e controle social seria possível a partir de Porto Alegre parece hoje mais distante de nossa realidade.

Este artigo está interessado em debater as dificuldades de implementação e manutenção de propostas de gestão participativa no processo orçamentário brasileiro, buscando traçar alguns elementos que possam elucidar causas dessas dificuldades.

O pressuposto fundamental do texto é de que a existência do Orçamento Participativo no Brasil esteve ao longo dos anos associada à possibilidade de revisão de prioridades alocativas por meio da destinação de uma porção discricionária do orçamento para a definição de investimentos em conjunto com a população. Seguindo a compreensão de Wildavsky (1969)WILDAVSKY , A. B. Rescuing Policy Analysis from PPBS . Public Administration Review , vol. 29 , nº 2 , pp. 189 - 202 , 1969 . e Wildalvsky e Caiden (2004), é o incremento orçamentário que permite essa acomodação de demandas e a expansão e/ou inclusão de projetos anualmente.

Porém, há momentos de crise em que a escassez orçamentária não permite a existência de incremento. Conforme Schick (1976)SCHICK , A. O PPB e o orçamento incremental . Revista de Administração Pública , v. 10 , n. 2 , pp. 65 - 84 , 1976 . , os orçamentos públicos estão em um estado permanente de escassez, visto que a demanda por bens e serviços públicos é sempre superior à oferta, mas essa escassez moderada, que é caracterizada pela existência de algum incremento anualmente, pode atingir graus mais elevados, tornando-se crônica, ou até aguda. Neste último estágio, os recursos podem ser insuficientes, inclusive, para a manutenção das políticas já existentes, inviabilizando novos investimentos ou serviços.

A variação do nível de escassez importa, então, para a existência de incremento. Essa é afetada por três variáveis fundamentalmente nos municípios brasileiros: a estrutura das receitas, a estrutura das despesas e o nível de crescimento das receitas.

A proposta analítica deste texto está centrada na compreensão de como essas variáveis se comportaram nos últimos anos, levando a uma redução do nível de discricionariedade do orçamento e, dessa forma, podendo estar relacionadas às dificuldades de participação no orçamento municipal, como segue: 1) a setorialização das despesas orçamentárias; 2) a estrutura de receitas dos municípios; e 3) a crise fiscal brasileira que afeta o crescimento das receitas dos municípios desde 2014, reduzindo o espaço disponível para investimentos ( Rezende, 2015REZENDE , F. A Política e a Economia da Despesa Pública. Escolhas Orçamentárias, ajuste fiscal e gestão pública: elementos para o debate da reforma do processo orçamentário . Rio de Janeiro : Editora FGV , 2015 . ; Peres; Mattos, 2017PERES , U. D ; MATTOS , B. B. A participação social e o conflito distributivo na planificação e orçamentação públicas: o caso do município de São Paulo . Cadernos Gestão Pública e Cidadania , v. 22 , n. 73 , pp. 456 - 477 , 2017 . ).

Em relação à setorialização das despesas, o argumento do artigo parte da compreensão de que mudanças institucionais desenvolvidas e implementadas no Brasil, em especial pela esfera federal, ao longo do final dos anos 1990 e início dos anos 2000, garantiram novos espaços de participação, mas ao mesmo tempo restringiram o poder decisório local sobre a alocação de recursos orçamentários. O que pode parecer uma contradição em si, na verdade, significou uma verticalização e setorialização do processo decisório dos governos locais. Conselhos setoriais de políticas públicas, em especial, aqueles protegidos por sistemas nacionais de políticas como a Saúde e a Assistência Social, ou aqueles associados aos repasses fundo-a-fundo, como o Conselho de Acompanhamento e Controle Social do Fundeb - Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, foram fortalecidos, enquanto arenas amplas e coletivas, como orçamento participativo ou planos plurianuais participativos, que implicam a construção transversal e programática de políticas, tiveram limitação do espaço de negociação ( Peres; Mattos, 2017PERES , U. D ; MATTOS , B. B. A participação social e o conflito distributivo na planificação e orçamentação públicas: o caso do município de São Paulo . Cadernos Gestão Pública e Cidadania , v. 22 , n. 73 , pp. 456 - 477 , 2017 . ).

A composição estrutural das receitas municipais é, na maioria das Prefeituras, centrada na arrecadação do Fundo de Participação dos Municípios – FPM e do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS ( Rezende, 1995REZENDE , F. Federalismo Fiscal no Brasil . Revista de Economia Política , v. 15 , nº 3 ( 59 ), 1995 . ). Isso acontece porque os municípios brasileiros cobram pouco Imposto sobre Propriedade Territorial Urbana – IPTU, ou outro tipo de arrecadação associada a serviços urbanos, impostos de tributação direta que poderiam ser a base das políticas da cidade. Estudo realizado por Afonso; De Castro e Santos (2016) projeta que mais de 80% dos municípios brasileiros tem uma gestão e arrecadação ineficientes de IPTU, fato que ocorre em todas as regiões brasileiras e com municípios de diferentes portes. A maioria dos municípios é então dependente de impostos provenientes do consumo e da renda (transferidos pelos estados e pela União), o que os deixa mais sujeitos às oscilações das crises econômicas.

Desde 2014, com a crise macroeconômica do país, as receitas municipais oscilaram entre queda real e estagnação. Desvinculadas da receita, as despesas obrigatórias seguiram crescendo no mesmo período (Orair et al., 2016). Para piorar o cenário, sendo a maior parte da arrecadação municipal baseada em impostos, que são vinculados às áreas de educação e saúde, sobra pouco espaço para investimentos em outras áreas, o que restringe a possibilidade de discussão participativa dos investimentos locais, em especial, em momentos nos quais a receita cai ou cresce pouco. Finalmente, os municípios contam com pouca disponibilidade e/ou autorização para operações de crédito e investimentos de longo prazo em áreas como habitação e saneamento.

Neste estudo, buscamos, a partir de dados orçamentários dos municípios brasileiros entre 2005 e 2018, demonstrar a setorialização orçamentária no período, a estrutura das receitas e a crise fiscal dos últimos anos que associadas, segundo esta visão, têm dificultado as experiências de Orçamento Participativo. O artigo está estruturado em três seções além desta introdução e das considerações finais. A próxima sessão apresenta os fundamentos da participação a partir dos Conselhos de Políticas Públicas e do modelo de orçamento participativo, mostrando como este se difundiu ao redor do mundo. A seção 3 apresenta as mudanças institucionais recentes no federalismo brasileiro, como a determinação de garantias de recursos para certas políticas públicas, e suas consequências para a participação e para o processo orçamentário. A seção 4 apresenta os dados orçamentários de despesas e receitas dos municípios brasileiros, extraídos do Sistema de Informações Contábeis e Fiscais do Setor Público Brasileiro – Siconfi 2 2 O Siconfi é um sistema de informações ligado à secretaria do Tesouro Federal – STN. Disponível em < https://siconfi.tesouro.gov.br/> . Acesso em 05.fev.2020. , organizados por porte habitacional, para discutir o espaço de negociação no uso de recursos e as dificuldades do período recente. Por fim, são desenvolvidas algumas conclusões e perspectivas a partir dos dados analisados.

A INSTITUCIONALIZAÇÃO DA PARTICIPAÇÃO

Após mais de vinte anos de regime ditatorial no Brasil, a sociedade civil vivenciou, na década de 1980, um processo de reabertura democrática com muita expectativa sobre a possibilidade de democracia direta e participativa. Antes mesmo do final do governo Figueiredo (1979-1985), uma série de eventos e movimentos sociais são dignos de nota em sua importância em animar a sociedade para um outro tipo de relação Estado-Sociedade. De forma muito mais enfática e opositora, os movimentos iniciais buscavam o direito à saúde, à moradia e, sobretudo, à própria democracia, o direito a ter direitos ( Telles, 1994TELLES , V. da S. Sociedade civil e a construção de espaços públicos . In: DAGNINO , Evelina ( org .) . Os anos 90: Política e Sociedade no Brasil . São Paulo : Brasiliense , 1994 , pp. 91 - 102 . ). Para isso, usavam “repertórios de confronto”, conforme conceito de (Tilly, 1995, apud Alonso, 2012ALONSO , A. Repertório, segundo Charles Tilly: história de um conceito . Sociologia & antropologia , v. 2 , n. 3 , p. 21 - 41 , 2012 . ), como manifestações, piquetes e enfrentamento policial. O processo de retomada democrática no Brasil traria novos contornos, e essa participação se transformaria de espontânea, como chamada por Cardoso (1994)CARDOSO , R. “ A Trajetória dos Movimentos Sociais ”, in DAGNINO , E. ( org .) , Os Anos 90: Política e Sociedade no Brasil . São Paulo : Brasiliense , 1994 , pp. 81 - 90 . , em institucionalizada.

A Constituição Federal de 1988, como já descrito na literatura, foi um marco para a participação democrática ao introduzir a previsão de novos instrumentos para o aprimoramento do diálogo Estado-sociedade, como a possibilidade de referendos e audiências públicas 3 3 A Constituição Federal não determina, em seu texto, a definição destes instrumentos. De forma genérica, pode-se definir referendo como o procedimento de democracia semi-direta em que os cidadãos são chamados a se pronunciar sobre determinada questão de interesse público por meio de sufrágio direto e secreto, após a edição de determinada norma; a audiência pública como reunião pública, aberta a todos os interessados, para discussão de tema de interesse público. (Brasil, 1988; De Souza; Lamounier, 1989; Romão, 2015ROMÃO , W. de M. et al . Reflexões sobre as dificuldades da implementação da participação institucional no Brasil . Ideias - Rev. Inst. Filos. Ciênc. Hum. UNICAMP , v. 6 , n. 2 , p. 35 - 58 , jul/dez . 2015 . ).

Apesar dessas três instituições participativas – IP ( Avritzer, 2008AVRITZER , L. Instituições participativas e desenho institucional: algumas considerações sobre a variação da participação no Brasil democrático . Opinião pública . Campinas , v. 14 , n. 1 , jun 2008 , pp. 43 - 64 . ; 2012) terem sido criadas pela Constituição, apenas as Audiências Públicas figuram entre as mais utilizadas nas últimas décadas 4 4 As audiências públicas são reuniões realizadas sempre que direitos coletivos estão em jogo ( De Oliveira, 1997) . São organizadas pelo poder executivo, legislativo, judiciário e/ou Ministério Público para apresentação, discussão e aprimoramento de políticas e projetos em conjunto com a comunidade. . Além dessas instituições, ao longo dos anos, diferentes formatos participativos foram sendo desenvolvidos, com destaque para os Conselhos de políticas públicas, Consórcios, Orçamento Participativo, e Conferências de Políticas Públicas, como relata Romão (2015)ROMÃO , W. de M. et al . Reflexões sobre as dificuldades da implementação da participação institucional no Brasil . Ideias - Rev. Inst. Filos. Ciênc. Hum. UNICAMP , v. 6 , n. 2 , p. 35 - 58 , jul/dez . 2015 . .

Dentre essas diferentes IPs, duas são muito importantes para a compreensão da tensão e do conflito distributivo tratados neste artigo: os Conselhos de políticas públicas e a prática do orçamento participativo. A adoção do primeiro, se intensificou entre os anos 1990 e 2000 a partir da indução federal, dentro de uma perspectiva de criação de sistemas de políticas públicas. A área da Saúde foi pioneira com a construção do Sistema Único de Saúde – SUS, a previsão de implementação de conselhos estaduais e municipais de saúde em todo território, associados aos fundos municipais de saúde, instrumentos obrigatórios para o recebimento de repasses federais ( Ribeiro,1997RIBEIRO , J. M. Conselhos de saúde, comissões intergestores e grupos de interesses no Sistema Único de Saúde (SUS) . Cadernos de Saúde Pública , v. 13 , p. 81 - 92 , 1997 . ). Esse processo repetiu-se na Educação, de forma mais aprofundada a partir da criação do Fundo de Manutenção e Valorização do Ensino Fundamental - Fundef em 1996 e alterado para Fundeb em 2006 ( Pinto, 2007PINTO , J. M. de R. A política recente de fundos para o financiamento da educação e seus efeitos no pacto federativo . Educação e Sociedade , v. 28 , n. 100 , pp. 877 - 897 , 2007 . ). E, ainda que tardiamente, também na Assistência Social houve a construção do Sistema Único de Assistência Social - SUAS com a criação de conselhos e fundos nas três esferas da federação.

Nestas três áreas de políticas públicas tivemos, portanto, uma indução federativa importante para a organização das políticas, seu financiamento, e suas formas de prestação de contas dos recursos públicos, com o acompanhamento de Conselhos de Políticas Públicas, o que transformou essa Instituição Participativa em algo presente no cotidiano dos municípios em todo o território (Lavalle; Voigt; Serafim, 2016). De forma ampla, os conselhos de políticas públicas são organizações criadas na estrutura governamental, de forma temática, com composição geralmente paritária (metade de membros da sociedade civil e metade de representantes do governo), podendo atuar com poder consultivo, deliberativo ou fiscalizatório, de acordo com seu ordenamento jurídico.

Em relação às iniciativas municipais que buscavam atrelar a dimensão participativa às atividades de planificação e orçamentação públicas, estas foram mais desenvolvidas inicialmente por governos do Partido dos Trabalhadores. O exemplo mais frutífero e duradouro é o Orçamento Participativo - OP, iniciado na década de 1990 no município de Porto Alegre (RS), tendo sido também replicado em outras localidades brasileiras e também internacionalmente ( Teixeira; Albuquerque, 2006TEIXEIRA , A.C. C. ; ALBUQUERQUE , M. do C. Orçamentos participativos: projetos políticos, partilha de poder e alcance democrático . In: DAGNINO , Evelina ; OLIVERA , Alberto J. ; PANFICHI , Aldo . ( Org .) . A disputa pela construção democrática na América Latina . São Paulo : Paz e Terra ; Campinas : UNICAMP , 2006 , pp. 179 - 227 . ). Entre os pilares conceituais do OP estava a busca pela inversão de prioridades na alocação de recursos, buscando aumentar a equidade no território e a intensificação do processo democrático por meio da participação direta da população na apresentação de suas demandas e escolhas orçamentárias. A atuação do OP se organiza pela realização de plenárias abertas à população sem necessidade de filiação a um grupo ou entidade, geralmente por região do município ou estado, onde são definidas as prioridades orçamentárias para uma porcentagem do orçamento destinado ao investimento, determinada pelo governo. Usualmente, cada região elege um conselheiro que passa a compor o Conselho do Orçamento Participativo – COP, responsável pelo acompanhamento e fiscalização dos investimentos escolhidos em plenária. Na maior parte dos locais que adota o OP, o ciclo dura dois anos: no primeiro, são feitas as plenárias para definição de prioridades, e no segundo, plenárias de prestação de contas de andamento das ações priorizadas.

Apesar de o OP ter ingressado inicialmente como uma agenda política do Partido dos Trabalhadores, paulatinamente outros partidos também o propuseram, tornando-se uma das experiências mais associadas à democracia direta e à possiblidade de modificar as prioridades da gestão pública a partir da pressão da sociedade, a qual define as prioridades juntamente com o governo, desde a formulação até a implementação das políticas públicas, com a possibilidade de controle dos processos e entregas realizadas pelo Poder Executivo. Desse modo, os seus representantes eleitos a partir de assembleias realizadas com base territorial municipal, estavam respaldados para discutir o recurso público com os representantes das secretarias do governo.

O Orçamento Participativo foi implementado com distintos formatos em cidades brasileiras de diferentes portes, como as capitais de estado Belo Horizonte e Recife ou Floriano Peixoto (RS), município com 2 mil habitantes, todas com o objetivo de permitir a incidência da população na escolha alocativa de despesas, sobretudo na categoria investimentos. A proposta foi difundida internacionalmente e também apresenta experiências diversificadas no mundo entre grandes metrópoles como Paris e cidades menores no Peru, país que adotou uma legislação nacional para realização do OP em todos os municípios ( Oliveira, 2016OLIVEIRA , O. P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos . Opinião Pública , v. 22 , n. 2 , pp. 219 - 249 , 2016 . ). A disseminação internacional, segundo Oliveira (2016)OLIVEIRA , O. P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos . Opinião Pública , v. 22 , n. 2 , pp. 219 - 249 , 2016 . , foi feita com o apoio de atores políticos e sociais que haviam atuado em governos no Brasil e circularam em diferentes países, portando-se como embaixadores das ideias desse modelo de democracia participativa, e de representantes de órgãos internacionais como o Banco Mundial, o qual adotou o OP como uma das boas práticas de gestão local para fortalecer a democracia, combater o clientelismo e aumentar a eficiência do gasto público ( Oliveira, 2016OLIVEIRA , O. P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos . Opinião Pública , v. 22 , n. 2 , pp. 219 - 249 , 2016 . ).

Apesar de o OP ter sido implementado em mais de 256 municípios no Brasil, como apontado por Bezerra (2017), esta autora aponta que, após o pico de criação, que se deu entre 2000 e 2004, há uma tendência ao declínio de suas experiências a partir de 2008 (Bezerra, 2017). Além da redução do número de experiências, a expectativa dos participantes e da sociedade em geral a respeito do OP se altera, conforme Fedozzi e Martins (2015)FEDOZZI , L ; MARTINS , A. L. B. Trajetória do orçamento participativo de Porto Alegre: representação e elitização política . Lua Nova , n. 95 , pp. 181 - 225 , 2015 . . Os autores que estudaram o caso mais emblemático de OP brasileiro mostram que no processo de Porto Alegre há mudanças ao longo do ciclo de implementação, e apesar de sua longevidade, esta experiência enfrenta críticas de seus participantes nos anos mais recentes, avaliando que há um processo de elitização do OP, isto é, um aumento de representantes de camadas mais altas de renda e maior nível educacional em comparação com a redução dos participantes de menor renda e educação. Também, houve uma redução da renovação dos representantes o que aumenta o distanciamento dos mais pobres e sua desconfiança sobre o processo, trazendo o descrédito, além do elitismo, e o fato de que o número de entregas atrasadas ou inconclusas do OP de Porto Alegre aumentou a cada ano ( Fedozzi, 2009FEDOZZI , L. J. Orçamento Participativo de Porto Alegre. Gênese, avanços e limites de uma ideia que se globaliza . Cidades Comunidades e Territórios . v. 18 , pp. 41 - 57 , 2009 . ). Nesta situação, a pergunta que nos importa responder é por que, ao longo do tempo, o OP teria perdido impulso?

A despeito de representar uma iniciativa emblemática para a participação social no âmbito do Orçamento, possibilitando, inclusive, um processo de aprendizado pedagógico da população sobre a condução das ações do Estado, o OP teria, como um de seus importantes limitadores, a ausência de conexões com a estrutura sistêmica de planejamento governamental. Em outras palavras, por se limitar à definição participativa de uma parcela de recursos da Lei Orçamentária Anual - LOA e estar distanciado de uma visão holística sobre o planejamento, consubstanciado no Plano Plurianual - PPA, o OP tenderia a produzir decisões fragmentadas sobre a alocação de recursos públicos ( Marcondes; Canato, 2015MARCONDES , M. M. ; CANATO , P. de C. Participação Social no Planejamento e Orçamento: a experiência do ciclo participativo na gestão municipal de São Paulo . In: CARDOSO Jr. , José Celso ; SANTOS , José Carlos dos .; PIRES , Roberto Rocha ( Org .) . PPA 2012-2015: A experiência subnacional de planejamento no Brasil . Brasília : IPEA , 2015 , pp. 291 - 311 . ).

Apontar dificuldades em processos participativos não é uma novidade nesse campo de estudos. Boa parte da literatura de participação buscou nos últimos anos entender os dilemas da efetividade da participação ( Avritzer, 2011AVRITZER , L. A qualidade da democracia e a questão da efetividade da participação: mapeando o debate . In: PIRES , R. ( Org .) . Efetividade das instituições participativas no Brasil: estratégias de avaliação . Brasília : IPEA , 2011 . pp. 13 - 25 . ). Esta preocupação estava, no entanto, mais voltada a questões sobre o processo de participação, como o que realmente fariam ou conseguiriam fazer as IP, sem relação com a mudança da realidade e de incidência em políticas públicas - no sentido do estudado por Teixeira e Tatagiba (2008) e mais recentemente por Lavalle; Voigt e Serafim (2016). No entanto, no caso do OP, há uma preocupação em entender a redução do uso desse instrumento para a construção de processos democráticos na definição alocativa. Por que um instrumento capaz de alcançar a possibilidade de levar a “um outro mundo possível”, disseminado em dezenas de países da Europa, América do Norte e África ( Oliveira, 2016OLIVEIRA , O. P. Mecanismos da difusão global do Orçamento Participativo: indução internacional, construção social e circulação de indivíduos . Opinião Pública , v. 22 , n. 2 , pp. 219 - 249 , 2016 . ), teria caído em desuso nas cidades brasileiras?

Para melhor compreender essa discussão, é relevante tratar da importância da participação no processo de planejamento e orçamentação pública e de como o conflito distributivo em torno do fundo público tem se alterado nas últimas décadas, o que será debatido na próxima seção.

CONFLITO DISTRIBUTIVO PÓS-1988

Assim como houve inovações ao processo de participação democrática a partir da Constituição Federal, os processos de planejamento e orçamentação também foram reformulados na nova Carta. Conforme definido no capítulo de Finanças e Orçamentos (Brasil, 1988, Art. 165), as três esferas da federação brasileira passaram a ter que elaborar Planos Plurianuais/PPAS de médio prazo, de forma coordenada com as diretrizes e os orçamentos anuais, isto é, com a Lei de Diretrizes Orçamentárias - LDO e a Lei Orçamentária Anual -LOA. Essa tríade orçamentária composta em cada governo por um PPA, quatro LDOs e quatro LOAs, busca normatizar e institucionalizar o processo orçamentário, obrigando sua discussão e aprovação nas Casas Legislativas (Câmaras Municipais, Assembleias Estaduais e Congresso Nacional), incrementando a accountability orçamentária, que fora suprimida nos anos de ditadura militar.

Como o Orçamento Público é por excelência um espaço de mediação do conflito em torno dos recursos do fundo público, historicamente, o conflito distributivo se dá tanto ao estabelecer regras tributárias e de formação do fundo público, quanto na divisão desse fundo entre as demandas da sociedade em relação a diferentes políticas públicas. Os planos e orçamentos públicos são um reflexo desse processo, e se constituem então como arenas políticas 5 5 Arena política é um conceito amplo que se refere ao espaço ou ambiente em que se travam disputas em torno de temas de interesse público ( Reis, 2013) . . São instrumentos fundamentais para a mediação do conflito distributivo. Uma vez que os recursos públicos são sempre inferiores à demanda por gastos ( Castro, 2014CASTRO , J. A. de . Dilemas para o financiamento da educação . In: CUNHA , Célio da ; GADOTTI , Moacir ; BORDIGNON , Genuíno ; NOGUEIRA , Flávia . ( Org .) . O Sistema Nacional de Educação, diversos olhares 80 anos após o Manifesto . Brasília : MEC/SASE , 2014 , pp. 178 - 196 . ; Peres, 2016PERES , U. D. Financiamento e políticas públicas educacionais: perspectiva normativa, dilemas e mudanças recentes . Revista Parlamento e Sociedade , São Paulo , v. 4 , n. 7 , pp. 65 - 101 , 2016 . ), o Orçamento Público projeta o processo de priorização política e sua matriz de planejamento, definindo assim o real programa de governo. Dessa forma, o processo de orçamentação é fundamentalmente político, e a ponderação de interesses, a barganha e o balizamento de representações sociais e políticas são primordiais para sua construção.

Nas últimas décadas, em nome da busca por equilíbrio e eficiência financeira pautada por políticas de austeridade fiscal permanente ( Ferry; Eckersley, 2011FERRY , L. ; ECKERSLEY , P. Budgeting and governing for deficit reduction in the UK public sector: act one’the Comprehensive Spending Review’ . The Journal of Finance and Management in Public Services , v. 10 , n. 1 , pp. 14 - 23 , 2011 . ; Arantes; Lopreato, 2017ARANTES , F. ; LOPREATO , F. O novo consenso em macroeconomia no Brasil: a política fiscal do plano real ao segundo governo Lula . Revista de Economia Contemporânea , v. 21 , n. 3 , p. 1 - 34 , 2017 . ), tem se veiculado a ideia de que o processo orçamentário deve ser técnico e racional, buscando enquadrar o orçamento como instrumento de gestão, inclusive, por meio da adoção de modelos empresariais na busca de melhor desempenho ( Kelly; Wanna, 2000KELLY , J. ; WANNA , J. New Public Management and the politics of government budgeting . International Public Management Review , v. 1 , n. 1 , pp. 33 - 55 , 2000 . ). O fato é que o Orçamento Público baliza a relação Estado-sociedade e, por maior aprimoramento técnico que possa ter, inclusive, com novas tecnologias e meios digitais, nunca deixará de ser também um instrumento político de ajustes entre quem incide a carga tributária que forma o fundo público e como, quanto e para quem, entre os vários grupos da sociedade, este é redistribuído e de que forma.

Numa democracia, considerando que a realidade social é dinâmica, seguindo o conceito de Matus (2006)MATUS , C. O Plano como aposta . In: GIACOMONI , James .; PAGNUSSAT , José Luiz . ( Org .) Planejamento e Orçamento governamental Coletânea – Volume 1. Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) . Brasília : ENAP , 2006 , pp. 115 - 144 . , espera-se que planos e orçamentos sejam situacionais, ou seja, se adaptem às necessidades de cada território, em uma composição na qual o poder público não tem domínio sobre todas as variáveis que incidem no processo, na formulação, ou na execução dos planos e orçamentos, apesar de ser ator relevante e majoritariamente o responsável pela propositura do plano ( Matus, 2006MATUS , C. O Plano como aposta . In: GIACOMONI , James .; PAGNUSSAT , José Luiz . ( Org .) Planejamento e Orçamento governamental Coletânea – Volume 1. Escola Nacional de Administração Pública (ENAP) . Brasília : ENAP , 2006 , pp. 115 - 144 . ; Reis, 2015REIS , S. R. G. Modelo de integração de agendas: proposta para o desenho de programas governamentais a partir do paradigma de governo aberto . In: CARDOSO Jr. , José Celso . ( Org ) . Planejamento Brasil Século XXI – Inovação Institucional e Refundação Administrativa – elementos para o pensar e o agir . Brasília : IPEA , 2015 , pp. 309 - 336 . ).

Os contornos sobre a demanda de políticas públicas na maioria das vezes não são claros, como tampouco é evidente a avaliação sobre a qualidade dos serviços e bens ofertados pelo poder público. Nesse contexto, o processo participativo e seus subsídios, a pressão e os interesses trazidos pelos participantes do OP são insumos essenciais para a formulação de ações alinhadas às demandas da sociedade, possibilitada por uma análise situacional mais próxima das distintas realidades territoriais (Abers; Keck, 2007; Ipea, 2012INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA – IPEA . Considerações sobre a integração das instituições participativas ao ciclo de gestão de políticas públicas: subsídios à formulação de um sistema de participação. Nota Técnica , nº 3 . Brasília , 2012 . ). A participação direta de representantes da sociedade no processo de alocação de recursos públicos é um meio de alargar a arena política do orçamento, permitindo que a mediação do conflito distributivo considere os mais variados interesses e não apenas aqueles de grupos mais empoderados, seja política e economicamente. Essa arena participativa seria então uma forma privilegiada de encaminhar o conflito distributivo, especialmente, em momentos de escassez crônica e aguda ( Schick, 1976SCHICK , A. O PPB e o orçamento incremental . Revista de Administração Pública , v. 10 , n. 2 , pp. 65 - 84 , 1976 . ).

A participação direta no processo orçamentário não é trivial em nenhuma democracia, pois, como já dito, historicamente há um conflito para a definição e divisão do fundo público (Wildavisky; Caiden, 1997). No entanto, em países pautados por grande desigualdade social, como o Brasil, deveria existir uma preocupação maior com a representatividade dos grupos, em especial os mais excluídos, os quais muitas vezes têm maior dificuldade em participar (Dowbor; Houtzager; Serafim, 2008).

Nesse sentido, o Estado deveria se preocupar em mediar a participação e a representatividade dos diferentes grupos sociais nos espaços institucionalizados. A ausência desta mediação pode resultar na imposição ou sobre-representação de demandas de determinado grupo social, isto é, num “autoritarismo social”, conforme definição de Dagnino (1994)DAGNINO , E. Os movimentos sociais e a emergência de uma nova noção de cidadania . In: DAGNINO , Evelina .( Org .) . Anos 90: Política e Sociedade no Brasil . São Paulo : Editora Brasiliense , 1994 , pp. 103 - 115 . , o que leva invariavelmente à reprodução da desigualdade, mesmo dentro de espaços plurais nos quais o diálogo aberto e horizontal deveria ocorrer.

Ao lado deste dilema da representatividade, que deve ser considerado nos espaços de participação em orçamentos, como em qualquer IP, há outras questões relevantes a serem consideradas quando se avalia a possibilidade de participação no processo orçamentário. Essas questões envolvem discutir qual o tamanho do fundo público, como este é formado e se este está disponível para a discussão participativa ou não.

A Constituição de 1988 teve importância, além da institucionalização do processo orçamentário e da abertura à participação, por também exercer influência no processo de sistematização de setores de políticas públicas, o que viria a se estender pelos anos 1990 e 2000. A discussão do Orçamento implica decidir quais políticas públicas serão financiadas, com quais recursos, para que públicos e em que formato. Em uma república federativa como a brasileira, parte dessas definições cabe a cada ente, e uma parte já está previamente definida na Constituição Federal. Diversas políticas públicas são garantidas pela Constituição, como direitos ou mesmo como direitos universais, o que implica obrigatoriedade de oferta pelo poder público.

O que se denomina federalismo fiscal é uma das divisões decorrentes do pacto federativo de 1988. Neste desenho, assim como são descentralizadas as responsabilidades, também é a capacidade de geração de receitas. No entanto, diversos autores reconhecem que este arranjo é desequilibrado: o ente municipal adquiriu mais reponsabilidades do que capacidade de geração de recursos para cumprir com as obrigações constitucionais. Rezende (1995)REZENDE , F. Federalismo Fiscal no Brasil . Revista de Economia Política , v. 15 , nº 3 ( 59 ), 1995 . aponta que desenhar um sistema federativo para um país extremamente heterogêneo é desafiador, já que as necessidades acompanham as diversas realidades existentes. Além disso, a tradição municipalista, reforçada na Constituição de 1988, poderia acabar por reforçar tais distorções – sendo que municípios com maior base fiscal acabam por perfomar melhor fiscalmente do que municípios com baixa intensidade de atividade econômica.

Neste artigo, defende-se que o processo de criação de sistemas de políticas públicas é muito relevante para entender a dimensão que o conflito distributivo assumiu nas cidades brasileiras nas últimas décadas e a dificuldade que criou para implementação dos OPs. Para compreender esse processo, temos que partir do fato de que os governos não se constituem em organizações e instituições homogêneas que compartilham a mesma visão de mundo. Ao contrário disso, e conforme compreendido por Dagnino (2004)DAGNINO , E. Construção democrática, neoliberalismo e participação: os dilemas da confluência perversa . Política e Sociedade , nº 5 , pp. 139 - 164 , 2004 . e Dagnino; Olvera e Panfichi (2006), existe uma forte dimensão de heterogeneidade nos governos e no próprio aparelho estatal. Em função disso, é natural que grupos de atores, comunidades de políticas públicas, instituições e processos se apresentem de forma diferenciada.

Essa heterogeneidade do Estado tem várias dimensões, como apresentado em Peres e Mattos (2017)PERES , U. D ; MATTOS , B. B. A participação social e o conflito distributivo na planificação e orçamentação públicas: o caso do município de São Paulo . Cadernos Gestão Pública e Cidadania , v. 22 , n. 73 , pp. 456 - 477 , 2017 . . Neste momento, a dimensão mais relevante para o foco deste artigo, é a chamada “arqueologia do Estado”, isto é, a não-linearidade de estruturação de instituições em diversas áreas temáticas do governo, como a Saúde, a Educação ou a Assistência Social, devido a arranjos institucionais próprios desenvolvidos ao longo da história constitutiva do setor.

A transposição dessa dimensão para o processo orçamentário implica a existência de áreas mais ou menos cobertas por estruturas federativas, mais ou menos disputadas no âmbito da governabilidade local e com diferentes níveis e arranjos institucionais. Tudo isso pode lhes garantir ou dificultar o desenvolvimento de capacidades de organização, defesa e pressão por maior disponibilidade de recursos financeiros. O conflito distributivo tende, portanto, a se acirrar entre setores de políticas públicas com maior institucionalização - que se refere, por exemplo, à existência de órgãos, normativas e grupos em defesa das ações para o referido campo - garantindo maior possibilidade de ganhos para áreas que se organizam para influenciar a formatação do plano e do orçamento públicos.

O controle dos recursos públicos no processo orçamentário cresceu de forma relevante após a institucionalização dos espaços participativos. A criação dos Conselhos de Políticas Públicas, as audiências públicas e os processos como os de OP, que levam à participação direta no processo orçamentário, aumentaram a discussão da sociedade sobre recursos públicos, e levaram ao ingresso de novos atores nesse processo.

É importante destacar, no entanto, que mesmo quando mais decentralizado, o processo de debate, decisão e construção participativa das políticas públicas não é linear nem equânime, consideradas aqui as necessidades das populações implicadas. Os grupos sociais envolvidos e formadores das comunidades de políticas públicas, seja da sociedade seja dentro do governo, têm formações distintas, aspirações e capacidades de financiamento da política que são bastante diferenciadas, quando consideramos áreas como Saúde, Educação, Assistência social ou Cultura.

Dentre as políticas públicas sistematizadas nas últimas décadas, algumas são pioneiras 6 6 O pioneirismo tem muita relevância orçamentária, uma vez que a escassez de recursos é um fundamento econômico o que implica uma limitação à vinculação de receitas, em especial impostos. Assim, as políticas que conseguem vinculação orçamentária de forma pioneira garantem seu nicho orçamentário e reduzem o espaço para demais políticas/direitos ( Peres e Mattos, 2017) . em sua sistematização, regramento e controle. É exemplo disso a área da educação, cuja definição de vinculação de impostos para seu financiamento em todas as esferas federativas foi normatizada antes mesmos da Constituição, em 1986, pela Emenda Calmon, assim como a possibilidade de criação de Conselhos de Educação. Algumas áreas têm recursos designados, embora com menor nível de controle social e monitoramento, ao passo que outras sequer chegaram a ser sistematizadas. A área de habitação, por sua vez, até hoje não é organizada em um sistema nacional que estabeleça recursos perenes para o enfrentamento de seu déficit, não obstante sua importância econômica e social.

A regulamentação do financiamento de cada política pública determinará sua forma de execução orçamentária, o que torna a implementação das políticas muitas vezes distante daquilo que foi planejado pelos agrupamentos sociais que lutaram pela garantia de direitos, sobretudo, considerando a etapa de formulação 7 7 O ciclo de políticas públicas é usualmente compreendido por um conjunto de fases subsequentes, que sejam: agenda, momento de definição das prioridades de atuação de um governo; formulação, em que são debatidas as alternativas de solução e é escolhido o plano de ação para resolução do problema; implementação, momento em que a solução escolhida é posta em prática; e avaliação, fase na qual os objetivos da política e seus resultados são confrontados. A fase de avaliação pode resultar em novos temas pela agenda, motivo pelo qual estas fases são dispostas em forma de ciclo. .

Nas últimas décadas os sistemas federativos nacionais buscaram normatizar alguns desses direitos, considerados fundamentais, como Saúde e Educação e, de certa forma, também a Assistência Social. Os três sistemas têm características similares, como o foco na municipalização das políticas de atendimento básico e o fato de estarem sujeitos a forte indução e regramento federal. No entanto, em termos de capacidades estatais ( Pires e Gomide, 2016PIRES , R. R. C ; GOMIDE , A. de Á. Governança e capacidades estatais: uma análise comparativa de programas federais . Revista de sociologia e política , v. 24 , n. 58 , p. 121 - 143 , 2016 . ) e de interlocução social, se diferenciam, o que torna o orçamento dessas políticas públicas mais ou menos sujeito à descontinuidade governamental, interferindo também na sua possibilidade de implementação participativa. Entre esses três sistemas, destaca-se o fato de Saúde e Educação terem constitucionalmente garantidos seus financiamentos 8 8 A Constituição determina que a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino (Art. 212); Para a Saúde, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre a receita líquida (no caso da União, não podendo ser inferior a 15%) e da arrecadação de impostos (no caso de estados e municípios, confirme determinado no art. 198). e a Assistência Social contar com menor fonte de recurso, pois, não há vinculação de impostos para essa área.

De toda sorte, cada um desses três setores se organizou nos últimos anos de maneira sistêmica a partir da definição de regras federais para o uso dos recursos públicos e para recebimentos de repasses fundo-a-fundo controlados pelos Conselhos locais de políticas. Com a indução federal dessas três áreas, a negociação democrática torna-se verticalizada. Isto é, a lógica de negociação orçamentária deixa de passar por uma arena coletiva global na qual todas as áreas de gastos são ponderadas e a demanda da sociedade deve ser administrada a cada período, em cada território, considerando as necessidades de transporte, habitação, saneamento, idosos, cultura, esportes, além das três áreas sistêmicas. O processo é dividido entre a garantia de direitos nos subsistemas já definidos e as demais áreas, levando então a uma verticalização dos três subsistemas, desde a influência federal, na qual os Conselhos Setoriais de políticas de educação, saúde e assistência são destacados das demais áreas e são hoje quase universalizados nos municípios brasileiros (Lavalle; Voigt; Serafim, 2016).

Além da complexidade trazida por essa setorialização orçamentária, que demarca o fundo público e torna sua discussão possível e aprofundada em nichos específicos de recursos, mas complexa no aspecto transversal, ainda há uma questão imbricada e pouco discutida no Brasil, que é o tamanho do fundo público sobre o qual determinam-se os espaços setoriais. Quais impostos e de quem são cobrados para formar os orçamentos locais? Esse recurso é suficiente para atender a toda a gama de direitos constituídos e a constituir? Quão participativa é a discussão sobre as receitas orçamentárias que formam os fundos públicos locais? E como é possível repensar esse montante?

O exame dos Orçamentos Municipais brasileiros e da evolução das despesas e receitas das cidades nos últimos anos pode dar luz às questões aqui colocadas, isto é, como a estrutura setorial é organizada no orçamento público dos municípios e sua estrutura de receitas. Os dados serão apresentados na próxima seção.

SETORIALIZAÇÃO NOS ORÇAMENTOS MUNICIPAIS BRASILEIROS

Metodologia de Análise dos Dados Municipais

Para o desenvolvimento da presente seção foram utilizados dados orçamentários dos municípios brasileiros coletados no Siconfi da Secretaria do Tesouro Nacional (Secretaria do Tesouro Nacional, 2019) para os anos de 2005, 2010 e 2018. Os dados coletados referem-se às receitas e despesas orçamentárias.

Para uma análise mais adequada, considerando a grande heterogeneidade dos municípios brasileiros, estes foram agrupados por porte populacional: i) até 5000 habitantes; ii) de 5001 a 10000 habitantes; iii) 10001 a 20000 habitantes; iv) 20001 a 50000 habitantes; v) 50001 a 100000 habitantes; vi) 100001 a 500000 habitantes e v) mais de 500 mil habitantes.

Foram comparadas as despesas por função, com destaque para as principais funções, conforme definição da Portaria 42/99 ( Brasil, 1999BRASIL . Ministério do Orçamento e Gestão . Portaria n°42, de 14 de abril de 1999 . Diário Oficial da União, Poder Executivo , Brasília , 15 . abr . 1999 . Disponível em http://www.orcamentofederal.gov.br/orcamentos-anuais/orcamento-1999/Portaria_Ministerial_42_de_140499.pdf/ . Acesso em: 02.11.2019 .
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), e agrupamento das demais. Foram também apresentadas as despesas por categorias econômicas com agregação em grandes grupos de despesas, conforme classificação da Portaria 163/2001 ( Brasil, 2001BRASIL . Portaria Interministerial STN/MPOG n° 163, de 4 de maio de 2001 . Diário Oficial da União, Poder Executivo , Brasília , 7 . mai . 2001 . Seção 1 , pp. 15 - 20 . Disponível em http://www.orcamentofederal.gov.br/orcamentos-anuais/orcamento-2015-2/arquivos%20portarias-sof/portaria-interm-163_2001_atualizada_2015_02set2015.pdf/ . Acesso em: Acesso em: 02.11.2019 .
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).

Em relação à evolução das receitas, foram destacadas as principais rubricas (Portaria 163/2001) referentes a impostos e transferências, e para permitir uma análise comparativa entre os anos, os valores foram corrigidos pelo Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo - IPCA, calculado pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística- IBGE.

Os dados foram tabulados e estão apresentados nos gráficos 1 , 2 e 3 nesta seção. Os dados analisados englobam entre 88 e 98% dos municípios brasileiros, a depender do ano da coleta. 9 9 Para uma informação precisa da quantidade de municípios analisados, veja o Anexo 1 deste artigo.

Gráfico 1
Gasto público dos municípios brasileiros por funções e por porte municipal em percentual da despesa total – 2005, 2010 e 2018.

Gráfico 2
Gasto público dos municípios brasileiros por categorias econômicas e por porte municipal em percentual da despesa total – 2005, 2010 e 2018

Gráfico 3
Receita dos municípios brasileiros por origem – de 2005 a 2018.

Análise

Os dados orçamentários dos municípios brasileiros entre 2005 e 2018 permitem mostrar a relevância e o aumento do peso orçamentário da setorialização de políticas públicas neste período. O gráfico 1 , indica, ao longo das últimas décadas, um crescimento intenso de alguns sistemas de políticas públicas em todos os extratos municipais, isto é, tanto em municípios de pequeno porte quanto nas grandes cidades e capitais (mais de 500 mil habitantes). Há uma concentração orçamentária em torno das despesas de Educação e Saúde, que em vários casos chegam a ocupar mais da metade do orçamento anual dos municípios.

A soma de recursos dos três sistemas nacionais organizados como Educação, Saúde e Assistência Social, nos municípios de 50 a 100 mil habitantes em 2018, chegou a aproximadamente 60% das despesas.

Quando adicionadas as despesas obrigatórias com pessoal (classificadas em geral na função administração) e as despesas previdenciárias, chega-se a um comprometimento que pode variar de 65 a 80% do orçamento, a depender do seu porte. Esse comprometimento é alto e foi crescente no período analisado. As funções de transporte e urbanismo chamam a atenção no percentual de despesas a elas dedicadas. A função transporte em geral classifica as despesas com sistema de transporte público e a função urbanismo acolhe as despesas de limpeza urbana, sendo nos dois casos serviços essenciais de oferta constitucionalmente obrigatória do Município.

No que tange ao crescimento da assistência social, cabe ressaltar que esta área, mesmo não tendo recursos de impostos vinculados, como é o caso de Educação e Saúde, recebe repasses fundo a fundo do governo federal desde a instituição do SUAS. O recurso recebido do Fundo Nacional de Assistência Social - FNAS é complementado com recursos próprios municipais, e apesar do peso bastante restrito desta função, ela está presente em todos os extratos e chama a atenção seu crescimento entre 2005 e 2018 nos extratos de menor porte municipal, tanto os municípios até 5mil habitantes quanto os de 5 a 10 mil que ampliaram seus gastos nessa função. Finalmente, o que se depreende deste quadro é que outras funções, como habitação, cultura, e esportes, perderam espaço orçamentário ao longo do tempo. Esse dado está ligado a dois fatores: a estagnação das receitas dos municípios, que será mostrado mais adiante, e a ampliação do peso das áreas com regras de vinculação de recursos, como saúde, educação, pessoal ativo e inativo. Quanto menor o volume orçamentário, maior o peso das áreas obrigatórias e menor o espaço para funções de governo menos institucionalizadas e por consequência para os investimentos, espaço histórico de discussão do OP.

O gráfico 2 a seguir, mostra agora as mesmas despesas analisadas por categoria econômica e, dessa forma, fica nítida a redução do espaço orçamentário para investimentos em todos os extratos municipais.

O gráfico 2 permite perceber que ao longo dos últimos anos, em especial entre 2010 e 2018, houve um aumento do peso da despesa de pessoal e uma redução da participação das outras despesas correntes (contratação de serviços) e dos investimentos. A redução em investimento é de aproximadamente 40% nos municípios de menor porte e chega a quase 50% nos de médio e grande porte.

O processo de redução dos investimentos pode ser compreendido a partir do gráfico 3 acima. Este gráfico representa a receita média dos municípios brasileiros no período de 2005 a 2018. É possível perceber que, após um crescimento contínuo das receitas até 2013, os municípios vivem uma estagnação entre 2013 e 2018. Nesse período, há forte queda da arrecadação do ICMS e também uma oscilação e queda da cota parte do FPM, que são os principais itens de receita de cerca de 90% dos municípios brasileiros. O pequeno aumento que se percebe em 2018 não é geral, mas reservado aos municípios mais urbanizados e diversificados que tem importante entrada de Imposto Sobre Serviços - ISS. Apesar desse leve aumento em 2018, ele não é suficiente para compensar o aperto fiscal dos anos anteriores, pois, mesmo com a queda de receitas, boa parte das despesas municipais continuou crescendo, como pessoal e previdência. Esse movimento de expansão de gastos com pessoal é natural, mas obriga à redução de outras despesas, como os investimentos.

O gráfico 3 expõe a estrutura de receitas dos municípios brasileiros que, conforme apresentamos no início deste artigo, também dificulta a discussão participativa do orçamento nas cidades. O principal imposto local deveria ser, por definição constitucional, o IPTU. Sua arrecadação está bastante associada à capacidade de oferta de serviços urbanos ( Kelly, 2013KELLY , R. Making the Property Tax Work. Working Paper Series 42 . Atlanta : International Center for Public Policy . 2013 . Disponível em: https://scholarworks.gsu.edu/icepp/4 . Acesso em 12.02.2020 .
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) e sua distribuição é facilmente identificada no território, o que possibilitaria à população uma discussão sobre quem paga e quanto paga de imposto na cidade. Além disso, por incidir sobre o patrimônio, é um imposto menos sujeito às oscilações macroeconômicas que aqueles decorrentes de vendas, como o ICMS. Pelo gráfico 3 , percebe-se que este imposto não é prioritário na maioria dos municípios brasileiros. Nossas cidades são majoritariamente dependentes de impostos de administração estadual (ICMS) ou federal (cota parte do FPM), o que aumenta sua vulnerabilidade econômica e reduz o espaço para discussão e proposições participativas sobre carga tributária local.

Além desse ponto, há uma outra dificuldade na estrutura de receitas das cidades brasileiras que é o baixo acesso a receitas de capital. Como a maior parte dos impostos é vinculado à saúde e educação, despesas obrigatórias de pessoal e dívida, sobra pouco espaço orçamentário para investimentos em outras áreas, como habitação e saneamento, e sua realização necessitaria de receitas advindas, por exemplo, de operações de crédito. O acesso a esse crédito não é uma realidade para maior parte dos municípios. Em que pesem os avanços das últimas décadas em relação a Lei de Responsabilidade Fiscal (Lei Complementar nº 101/2000), que estabeleceu um limite claro ao endividamento dos municípios, a arrecadação municipal não é suficiente para cumprir com a folha de pagamento da Prefeitura e da Câmara Municipal em mais de 1/3 dos municípios brasileiros ( Firjan, 2019FIRJAN . Índice Firjan de Gestão Fiscal . 2019 . Disponível em: < https://www.firjan.com.br/ifgf/> . Acesso em 08.02.2020 .
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). Ainda segundo a Firjan (2019)FIRJAN . Índice Firjan de Gestão Fiscal . 2019 . Disponível em: < https://www.firjan.com.br/ifgf/> . Acesso em 08.02.2020 .
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, 75% dos municípios brasileiros estão em situação fiscal difícil ou crítica. Nesta situação, como debater investimentos em áreas urbanas sem debater antes como financiar esses investimentos?

Esse processo de redução e enrijecimento orçamentário tem consequências importantes para a administração do conflito distributivo. Apesar de termos áreas importantes protegidas com recurso assegurado, seu volume absoluto é menor e este vai sendo comprometido com contratos e investimentos anteriores, sobrando pouco “incremento” para decisões coletivas. As áreas desprotegidas institucionalmente têm espaço ainda menor quando não há crescimento econômico, o que acirra o conflito e torna uma arena de decisão coletiva do orçamento um espaço de difícil mediação. Nesta situação, a tendência é que as arenas setoriais discutam seus orçamentos procurando garantir e proteger seus direitos já constituídos, como acontece nos conselhos participativos da educação, saúde e assistência.

Isto é, em momentos de escassez aguda ( Schick, 1976SCHICK , A. O PPB e o orçamento incremental . Revista de Administração Pública , v. 10 , n. 2 , pp. 65 - 84 , 1976 . ), como o que estamos vivendo desde 2014, com menos receitas e maior demanda por despesas públicas em direitos constituídos (além de novos direitos), mais difícil se torna a pactuação para recursos além dos espaços pré-determinados e mesmo dentre estes (em momentos de escassez a tendência é o conservadorismo da despesa). A Confederação Nacional dos Municípios (CNM) apontou, em 2015, que a crise econômica iniciada em 2014 é fruto da baixa atividade econômica, o que, consequentemente zera os cofres municipais, dependentes da arrecadação de recursos que são frutos das interações econômicas – como o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter-Vivos – ITB e o Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS. O Governo Federal agravou a situação das Prefeituras ao desonerar impostos compartilhados com os municípios e atrasar repasses que deveriam ser mensais. O Fundo de Participação dos Municípios – FPM, do qual muitas prefeituras dependem, também apresentou, em 2015, valores menores dos estimados ( CNM, 2015CONFEDERAÇÃO NACIONAL DE MUNICÍPIOS – CNM . Crise dos Municípios: a falta de recursos. Estudos Técnicos/CNM . Brasília : CNM , janeiro de 2015 . ).

O resultado disso tende a ser o esvaziamento das arenas coletivas tanto pelo Executivo, por conta da dificuldade em operar o orçamento, quanto pelos grupos e movimentos sociais, mais descrentes sobres as promessas de entregas de serviços e obras e descontentes com o volume ínfimo de recursos disponível para a real negociação.

REFLEXÕES FINAIS

Este artigo adota o pressuposto de que o Orçamento Público se constitui como uma peça eminentemente política e que, em ambientes democráticos, há sempre um nível de conflito distributivo a ser administrado, seja pelas fontes de receita ou pelas despesas orçamentárias. Nesse aspecto, a participação da sociedade civil e sua representação mais variada entre setores, regiões, grupos sociais e políticos é parte fundamental no processo de explicitação, negociação e encaminhamento do conflito distributivo. A disputa orçamentária, portanto, figura como parte constituinte das democracias, assim como também representa um relevante indicador sobre a permeabilidade política do Estado.

Como objetos empíricos do estudo, foram analisadas as despesas orçamentárias dos municípios brasileiros, divididos por porte, e também a evolução das receitas dos municípios no período de 2005 a 2018. O artigo buscou apresentar hipóteses visto que, a despeito da forte institucionalização das experiências participativas pós Constituição de 1988 e do grande sucesso da experiência do OP de Porto Alegre, percebe-se no período recente uma diminuição no número de cidades que adotam esse modelo participativo.

O argumento do artigo é de que a diminuição do número de experiências de OP pode estar influenciada por três causas. Uma primeira, extremamente importante, está associada ao processo de setorialização e verticalização de alguns sistemas de políticas públicas que levaram à fragmentação da participação. Isto é, o fortalecimento de subsistemas de políticas produz um processo de natureza ambígua, na medida em que possibilita a estruturação de áreas, e de conselhos setoriais de participação, como educação, saúde e assistência social. Porém, de certa forma, resulta no esvaziamento de uma potencial arena de negociação coletiva. Isso quer dizer que, ao setorializar o orçamento, abre-se um espaço menor para que um porcentual considerável seja posto em discussão. Enquanto o país encontrava-se em pleno crescimento, principalmente na década de 2000, ainda que o orçamento fosse setorializado, havia incremento, isto é, discricionariedade, para que o OP colocasse, em plenária, a possibilidade de debate do orçamento. A crise econômica restringe essa margem e faz com que cada setor busque proteger sua parcela do orçamento, esvaziando os processos participativos de discussão orçamentária.

O segundo fator constitui-se na atual estrutura de receitas dos municípios, fundamentalmente constituída por impostos indiretos (ICMS e FPM), o que além de tornar boa parte dos recursos orçamentários pré-definidos em função da vinculação de impostos, deixa os municípios mais sujeitos às oscilações macroeconômicas e à estagnação de receitas, como no período recente, pós-2014.

Essa estagnação de receitas é a terceira causa de dificuldades para a implementação ou manutenção do Orçamento Participativo. Com pouco ou nenhum crescimento das receitas e ao mesmo tempo crescimento de despesas obrigatórias com pessoal, educação e saúde, há menor espaço para investimentos, levando a um esvaziamento da arena coletiva.

Por fim, é importante adicionar a essas questões o fato de que a discussão participativa dos orçamentos, quando ocorre, na grande maioria dos casos, restringe-se às despesas, não havendo debate sobre a possibilidade de revisão da carga tributária ou cobrança de novas receitas. Isto, em muito, deve-se à consolidação social da ideia de que as fontes de receita para financiamento do orçamento têm cálculo técnico não passível de negociação e mudança pela sociedade civil.

Essa visão leva à compreensão errônea de que para garantir o financiamento de um novo setor ou um novo direito, a única possibilidade é rever o anterior, quando não é. Como resultado deste processo, a administração do conflito distributivo torna-se uma tarefa centralizada nos governos, das diferentes esferas, construindo uma relação bilateral entre a área finalística e a de finanças, pouco transparente com setores específicos da sociedade e mercado.

O avanço da discussão participativa no processo orçamentário depende da existência de arenas coletivas que possam discutir tanto receitas quanto despesas, a partir da compreensão de direitos já constituídos, mas também da necessidade de garantia de novos, a partir de propostas de arranjos institucionais distintos e que inclusive proponham uma revisão da carga tributária e sua divisão pela sociedade, conforme as possibilidades dos diferentes grupos sociais e econômicos.

ANEXO I

Relação da quantidade de municípios analisados nos gráficos de despesas e receitas.

Tabela 1 Total de Municípios por Despesa Categoria Econômica.

Porte do Município Ano
2005 2010 2018
Até 5000 1310 1286 1133
De 5001 a 10000 1216 1195 1103
De 10001 a 20000 1209 1384 1247
De 20001 a 50000 956 1026 1010
De 50001 a 100000 303 324 327
De 100001 a 500000 217 243 258
Mais de 500000 34 37 38
Total 5245 5495 5116

Tabela 2 Total de Municípios por Despesa por Função

Porte do Município Ano
2005 2010 2018
Até 5000 1310 1286 1088
De 5001 a 10000 1216 1195 1055
De 10001 a 20000 1209 1384 1203
De 20001 a 50000 956 1026 974
De 50001 a 100000 303 324 328
De 100001 a 500000 217 243 245
Mais de 500000 34 37 38
Total 5245 5495 4931

Tabela 3 Total de Municípios por Receita Orçamentária.

Porte do Município Ano
2005 2010 2018
Até 5000 1310 1286 1148
De 5001 a 10000 1216 1195 1122
De 10001 a 20000 1209 1384 1281
De 20001 a 50000 956 1026 1030
De 50001 a 100000 303 324 336
De 100001 a 500000 217 243 260
Mais de 500000 34 37 40
Total 5245 5495 5217

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  • WILDAVSKY , A. B. . The new politics of the budgetary process . 5ª edição. New York : Pearson/Longman , 2004 .
  • 1
    Instituições Participativas – IPs são espaços institucionalizados, dentro da estrutura governamental, de debate e interação entre governos e sociedade civil.
  • 2
    O Siconfi é um sistema de informações ligado à secretaria do Tesouro Federal – STN. Disponível em < https://siconfi.tesouro.gov.br/> . Acesso em 05.fev.2020.
  • 3
    A Constituição Federal não determina, em seu texto, a definição destes instrumentos. De forma genérica, pode-se definir referendo como o procedimento de democracia semi-direta em que os cidadãos são chamados a se pronunciar sobre determinada questão de interesse público por meio de sufrágio direto e secreto, após a edição de determinada norma; a audiência pública como reunião pública, aberta a todos os interessados, para discussão de tema de interesse público.
  • 4
    As audiências públicas são reuniões realizadas sempre que direitos coletivos estão em jogo ( De Oliveira, 1997)DE OLIVEIRA , G. H. J. As audiências e o processo administrativo brasileiro . Revista de direito administrativo , v. 209 , p. 153 - 167 , 1997 . . São organizadas pelo poder executivo, legislativo, judiciário e/ou Ministério Público para apresentação, discussão e aprimoramento de políticas e projetos em conjunto com a comunidade.
  • 5
    Arena política é um conceito amplo que se refere ao espaço ou ambiente em que se travam disputas em torno de temas de interesse público ( Reis, 2013)REIS , B. P. W. Verbete: Arena Política . In: FUNDAP . Dicionário de Políticas Públicas . São Paulo : Fundap , 2013 . .
  • 6
    O pioneirismo tem muita relevância orçamentária, uma vez que a escassez de recursos é um fundamento econômico o que implica uma limitação à vinculação de receitas, em especial impostos. Assim, as políticas que conseguem vinculação orçamentária de forma pioneira garantem seu nicho orçamentário e reduzem o espaço para demais políticas/direitos ( Peres e Mattos, 2017)PERES , U. D ; MATTOS , B. B. A participação social e o conflito distributivo na planificação e orçamentação públicas: o caso do município de São Paulo . Cadernos Gestão Pública e Cidadania , v. 22 , n. 73 , pp. 456 - 477 , 2017 . .
  • 7
    O ciclo de políticas públicas é usualmente compreendido por um conjunto de fases subsequentes, que sejam: agenda, momento de definição das prioridades de atuação de um governo; formulação, em que são debatidas as alternativas de solução e é escolhido o plano de ação para resolução do problema; implementação, momento em que a solução escolhida é posta em prática; e avaliação, fase na qual os objetivos da política e seus resultados são confrontados. A fase de avaliação pode resultar em novos temas pela agenda, motivo pelo qual estas fases são dispostas em forma de ciclo.
  • 8
    A Constituição determina que a União aplicará, anualmente, nunca menos de dezoito, e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios vinte e cinco por cento, no mínimo, da receita resultante de impostos, compreendida a proveniente de transferências, na manutenção e desenvolvimento do ensino (Art. 212); Para a Saúde, a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios aplicarão, anualmente, em ações e serviços públicos de saúde recursos mínimos derivados da aplicação de percentuais calculados sobre a receita líquida (no caso da União, não podendo ser inferior a 15%) e da arrecadação de impostos (no caso de estados e municípios, confirme determinado no art. 198).
  • 9
    Para uma informação precisa da quantidade de municípios analisados, veja o Anexo 1 ANEXO I Relação da quantidade de municípios analisados nos gráficos de despesas e receitas. Tabela 1 Total de Municípios por Despesa Categoria Econômica. Porte do Município Ano 2005 2010 2018 Até 5000 1310 1286 1133 De 5001 a 10000 1216 1195 1103 De 10001 a 20000 1209 1384 1247 De 20001 a 50000 956 1026 1010 De 50001 a 100000 303 324 327 De 100001 a 500000 217 243 258 Mais de 500000 34 37 38 Total 5245 5495 5116 Tabela 2 Total de Municípios por Despesa por Função Porte do Município Ano 2005 2010 2018 Até 5000 1310 1286 1088 De 5001 a 10000 1216 1195 1055 De 10001 a 20000 1209 1384 1203 De 20001 a 50000 956 1026 974 De 50001 a 100000 303 324 328 De 100001 a 500000 217 243 245 Mais de 500000 34 37 38 Total 5245 5495 4931 Tabela 3 Total de Municípios por Receita Orçamentária. Porte do Município Ano 2005 2010 2018 Até 5000 1310 1286 1148 De 5001 a 10000 1216 1195 1122 De 10001 a 20000 1209 1384 1281 De 20001 a 50000 956 1026 1030 De 50001 a 100000 303 324 336 De 100001 a 500000 217 243 260 Mais de 500000 34 37 40 Total 5245 5495 5217 deste artigo.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    20 Jul 2020
  • Data do Fascículo
    2020

Histórico

  • Recebido
    29 Out 2019
  • Aceito
    15 Fev 2020
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