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Adaptação de um equipamento para ensaios de desgaste de materiais cerâmicos

Experimental setup for wear testing of ceramic materials

Resumos

É descrita em detalhes a montagem de um equipamento simples e de baixo custo para a medida da resistência ao desgaste de materiais cerâmicos. Para demonstrar a aplicação deste equipamento foram realizadas medidas de desgaste em amostras de alumina e zircônia parcialmente estabilizada com ítria. A resistência ao desgaste das amostras de zircônia foi medida antes e depois da formação de um recobrimento de ZrC, mediante tratamento térmico a 1600 ºC, com a peça envolta por carbono, em atmosfera de argônio. Foi observado que a formação de ZrC proporciona uma resistência ao desgaste similar à da alumina, aproximadamente 50% superior à da zircônia.

coeficiente de desgaste; alumina; zircônia; ZrC


The assembly of a simple, low cost equipment for the measurement of the wear coefficient of ceramic materials is described in some detail. This equipment was applied to the determination of the wear coefficient of alumina and yttria-partially stabilized zirconia. The wear resistance of zirconia was measured before and after the formation of a ZrC coating on the surface, as the result of a thermal treatment at 1600ºC with the sample wrapped in a carbon powder bed in an argon atmosphere. It was observed that the formation of ZrC provides a surface wear resistance similar to that obtained for alumina, almost 50% higher than that of bulk zirconia.

wear coefficient; alumina; zirconia; ZrC


Adaptação de um equipamento para ensaios de desgaste de materiais cerâmicos

Experimental setup for wear testing of ceramic materials

R. F. de L. Lorenzi; C. A. Perottoni; J. E. Zorzi

Laboratório de Materiais Cerâmicos, Universidade de Caxias do Sul, Caxias do Sul, RS 95070-560 jezorzi@ucs.br

RESUMO

É descrita em detalhes a montagem de um equipamento simples e de baixo custo para a medida da resistência ao desgaste de materiais cerâmicos. Para demonstrar a aplicação deste equipamento foram realizadas medidas de desgaste em amostras de alumina e zircônia parcialmente estabilizada com ítria. A resistência ao desgaste das amostras de zircônia foi medida antes e depois da formação de um recobrimento de ZrC, mediante tratamento térmico a 1600 ºC, com a peça envolta por carbono, em atmosfera de argônio. Foi observado que a formação de ZrC proporciona uma resistência ao desgaste similar à da alumina, aproximadamente 50% superior à da zircônia.

Palavras-chave: coeficiente de desgaste, alumina, zircônia, ZrC.

ABSTRACT

The assembly of a simple, low cost equipment for the measurement of the wear coefficient of ceramic materials is described in some detail. This equipment was applied to the determination of the wear coefficient of alumina and yttria-partially stabilized zirconia. The wear resistance of zirconia was measured before and after the formation of a ZrC coating on the surface, as the result of a thermal treatment at 1600ºC with the sample wrapped in a carbon powder bed in an argon atmosphere. It was observed that the formation of ZrC provides a surface wear resistance similar to that obtained for alumina, almost 50% higher than that of bulk zirconia.

Keywords: wear coefficient, alumina, zirconia, ZrC .

INTRODUÇÃO

A técnica de microabrasão é comumente empregada para a determinação da espessura de filmes depositados sobre a superfície de materiais. Seu princípio de funcionamento é simples: uma esfera de aço endurecido é apoiada ao mesmo tempo sobre a superfície da amostra e sobre uma depressão de um eixo ligado a um motor elétrico. Durante o ensaio, o eixo gira a esfera atritando-a contra a superfície da amostra ao mesmo tempo em que um líquido abrasivo é gotejado sobre a esfera. Este processo promove o desgaste do material da superfície da amostra, formando duas crateras concêntricas, uma devido ao filme e a outra devido ao substrato [1]. A espessura do filme depositado (t) é dada por t = XY/2R, onde R é o raio da esfera e X e Y são dimensões exibidas na Fig. 1.


Se o material desgastado não possui uma camada depositada, o resultado será a formação de uma única cratera, cujo diâmetro é medido por microscopia óptica. A partir deste diâmetro, pode se calcular o coeficiente de desgaste, K,a partir da relação [2-4]

K=

onde L é a distância percorrida pela esfera sobre a amostra, FN é a força normal sobre a esfera, b é o diâmetro da cratera formada e R é o raio da esfera. Em ensaios de desgaste de materiais recobertos com filmes finos, são observadas duas crateras concêntricas (filme e substrato), a partir das quais se calcula a espessura do filme depositado e o coeficiente dedesgaste do filme (Kc) e do substrato (Ks), pela análise dos dados em um gráfico de (LFN/b4)versus(πt/4b2-πRt2/b4) [3-7]. O número mínimo recomendado de crateras em cada ensaio é seis, o diâmetro interno mínimo é dado por (8R d1)0,5, onde d1 é o diâmetro do abrasivo, e o diâmetro externo máximo é da ordem de 1,6 mm (para uma esfera com raio de 12,5 mm) [5]. Conforme a equação A, para a determinação do coeficiente de desgaste por microabrasão é necessário que o equipamento tenha uma célula de carga para a determinação da força normal que age sobre a esfera de metal (Fig. 2) [2].


Neste trabalho, um equipamento usado na determinação da espessura de filmes foi adaptado para a realização de estudos de desgaste em materiais cerâmicos. Este equipamento foi empregado na determinação da resistência ao desgaste de amostras de alumina e zircônia parcialmente estabilizada e, também, de uma amostra da mesma zircônia carbonetada termicamente a 1600 ºC em atmosfera de argônio.

MATERIAIS E MÉTODOS

A amostra de alumina usada neste trabalho foi obtida a partir do pó Martoxid MR70/S (Martinswerk). A zircônia utilizada foi TZ-3YB (parcialmente estabilizada com 3% em mol de ítria (Y2O3), Tosoh). Ambos pós cerâmicos são comerciais e já possuem ligantes próprios para prensagem. As amostras foram conformadas por prensagem uniaxial (1 kbar) em um molde metálico (discos com 10 mm de diâmetro e 2 mm de espessura) e sinterizadas a 1600 ºC/2 h (alumina) e 1500 ºC/2 h (zircônia) ao ar, com rampa de aquecimento 1 ºC/min. Após a sinterização, uma amostra de zircônia foi submetida a tratamento térmico em leito de pó de carbono amorfo (Printex, Degussa) a 1600 ºC em um forno com resistências de grafite em atmosfera de argônio (Thermal Inc.) por 3 h. As amostras de alumina e a de zircônia parcialmente estabilizada com ítria (3Y-PSZ) foram polidas com pastas diamantadas até 1 µm. A amostra de zircônia tratada termicamente não foi polida para preservar a camada carbonetada.

Equipamento para a determinação do coeficiente de desgaste

Para a análise da resistência ao desgaste, primeiramente necessitamos conhecer a força normal que a superfície do material exerce sobre a esfera. Para isso foi adquirida uma célula de carga HBM (Weightech) PW4MC3 com capacidade 500 g e sensibilidade 1 mV/V [8]. Foi montado um circuito para amplificar o sinal de saída da célula de carga, utilizando para isso um CI amplificador para instrumentação INA125P (Fig. 3) [9]. Além do CI, complementam o circuito eletrônico uma fonte de computador para alimentação do circuito, um potenciômetro P para ajuste do zero e um transistor TIP29C para a alimentação da ponte de Wheatstone da célula de carga. O ganho do amplificador é alterado no resistor variável RG. Um multímetro exibe a tensão oriunda do desbalanceamento da ponte de Wheatstone da célula de carga, que é proporcional à força que age sobre ela. Também foi adquirida uma bomba peristáltica (Provitec DM AXD) [10] para gotejar controladamente a suspensão abrasiva sobre a esfera rolante e um agitador magnético (VELP) para manter em constante agitação a suspensão abrasiva. A Fig. 4 ilustra a montagem final do equipamento. Na Fig. 5 pode-se ver em detalhe a fixação do suporte para a amostra sobre a célula de carga.




A célula de carga foi calibrada usando esferas de aço de diferentes massas. O peso de cada uma destas esferas foi calculado utilizando o valor da aceleração da gravidade obtido a partir da expressão

na qual g é a aceleração da gravidade, H é a altitude (km) e θ é latitude [11]. A aceleração da gravidade calculada para Caxias do Sul é 9,763 m/s2. A Fig. 6 exibe a curva de calibração obtida para a célula de carga, FN = 0,0131(2)V, Vé tensão (mV) e FNé a força normal (N).


Após a amostra ser fixada no porta-amostra, o multímetro indicador da força normal é zerado e uma esfera de aço é apoiada sobre a amostra e o eixo do motor. Em seguida, a bomba peristáltica é ligada e a suspensão abrasiva começa a gotejar sobre a esfera. Uma suspensão abrasiva de base aquosa com partículas de diamante com diâmetros que variam de 0,5 a 1 µm foi utilizada durante os ensaios de desgaste. O tempo de ensaio e a velocidade de rotação do eixo são ajustados e, então, realiza-se o ensaio.

Medida das crateras e cálculo do coeficiente de desgaste

O movimento da esfera sobre a superfície da amostra promove a formação de uma cratera de desgaste cujo diâmetro depende da resistência ao desgaste do material e das condições do ensaio. O diâmetro destas crateras é determinado com o auxílio de um microscópio óptico e um programa de aquisição e análise de imagens.

O coeficiente de desgaste de um material é obtido a partir da declividade da reta ajustada aos dados experimentais em um gráfico de (π b4/64 FN R) versus (L). A distância percorrida pela esfera sobre a amostra, L, é obtida de [2-4]

onde N representa o número de voltas dadas durante o ensaio pelo eixo que sustenta a esfera, R' é o raio de giro do eixo, d é o diâmetro da esfera e R" é a metade da largura da depressão do eixo sobre a qual a esfera fica apoiada.

Aplicação a materiais cerâmicos

O equipamento descrito neste artigo foi aplicado na determinação da resistência ao desgaste de amostras de alumina e zircônia parcialmente estabilizada (3Y-PSZ) e, também, de uma amostra da mesma zircônia carbonetada termicamente em atmosfera de argônio. O objetivo da carbonetação é aumentar a resistência ao desgaste e a dureza superficial da zircônia, mantendo a elevada tenacidade à fratura do substrato. A seleção de materiais teve dois critérios: primeiro, usou-se amostras de alumina já estudadas previamente com um equipamento comercial, de modo a permitir a validação dos resultados obtidos com o equipamento descrito neste artigo. Segundo, escolheu-se uma amostra de zircônia que permitiu evidenciar o efeito da carbonetação da superfície sobre a resistência ao desgaste. Nestes ensaios usamos uma esfera de aço endurecido com uma polegada de diâmetro e a largura da depressão do eixo sobre a qual a esfera foi apoiada era de 8 mm. A rotação do eixo foi fixada em 200 rpm e a duração do ensaio foi variada, aumentado a cada medida a distância percorrida pela esfera sobre a amostra. Como se trata de um ensaio comparativo, é fundamental que se mantenham constantes os parâmetros do ensaio para todas as amostras. O ensaio de microabrasão indica o quanto um material é mais resistente ao desgaste do que outro, nas mesmas condições de análise. Quanto menor o coeficiente de desgaste, mais resistente à abrasão é o material.

A Fig. 7 exibe a micrografia de uma cratera típica, gerada em um dos ensaios de desgaste com uma amostra de zircônia.


Os resultados dos ensaios de desgaste das amostras de alumina e zircônia 3Y-PSZ (esta última antes e depois da formação do recobrimento de ZrC) se encontram resumidos na Fig. 8 e na Tabela I. O coeficiente de desgaste determinado para a alumina é similar ao obtido em um trabalho anterior, usando outro abrasivo (SiC) e um equipamento comercial [13]. A amostra de zircônia carbonetada, cuja superfície é constituída essencialmente de ZrC [12] exibe um coeficiente de desgaste inferior ao da zircônia, sendo tão resistente ao desgaste quanto a alumina testada neste trabalho. Medidas de dureza feitas na superfície da zircônia recoberta com ZrC demonstraram a ausência de trincas nos vértices das impressões Vickers e constituem um indicativo de que a tenacidade à fratura da zircônia 3Y-PSZ não foi significativamente alterada com a carbonetação da superfície [12].


CONCLUSÕES

Um equipamento para a medição da espessura de filmes foi adaptado para a medição do coeficiente de desgaste de materiais cerâmicos. Os resultados obtidos em ensaios com amostras de alumina foram similares aos obtidos anteriormente com um equipamento comercial [13]. Os resultados obtidos com a amostra de zircônia recoberta com ZrC mostraram um aumento na resistência ao desgaste em cerca de 50% em comparação com a amostra de zircônia 3Y-PSZ original, sem diminuição aparente da tenacidade à fratura. Este resultado sugere a possibilidade da obtenção de amostras de zircônia de elevada tenacidade e maior resistência ao desgaste mediante a formação de um recobrimento de ZrC por meio de tratamento térmico em leito de carbono.

AGRADECIMENTOS

Este trabalho foi parcialmente financiado por FAPERGS, CAPES e CNPq. Agradecemos a empresa Jacotrade, SP, pela doação da alumina. Agradecemos também ao Laboratório de Altas Pressões e Materiais Avançados do IF/UFRGS pelo uso do forno Thermal. Um agradecimento especial para Águeda Turatti, pelo auxílio na operação do forno Thermal e ao estudante Gustavo R. Ramos pelo auxílio prestado.

(Rec. 29/07/2009, Rev. 30/09/2009, Ac. 25/11/2009)

Errata

Cerâmica 56, 340 (2010) 315-319

Adaptação de um equipamento para ensaios de desgaste de materiais cerâmicos (Experimental setup for wear testing of ceramic materials) R. F. de L. Lorenzi, C. A. Perottoni, J. E. Zorzi

A equação (B) da página 317 é:

g (m/s 2 ) = 9,780356 (1 + 0,0052885 sen2 θ – 0,0000059 sen2 2θ) – 0,003086H (B)

na qual g é a aceleração da gravidade, H é a altitude (em km) e θ é a latitude [11]. A aceleração da gravidade calculada para Caxias do Sul é 9,789 m/s2 .

Cerâmica 59, 352 (2013) 563-569

O título correto do artigo é: Produção de zeólita analcima a partir de caulim amazônico (Analcime zeolite production from amazon kaolin) C. G. Moraes, E. C. Rodrigues, R. S. Angélica, E. N. Macêdo, R. F. Neves

  • [1] Disponível em: http://www.stinstruments.com/Brochures/Calotest.pdf, acesso em 2/07/2009.
    » link
  • [2] Disponível em: http://www.stinstruments.com/Brochures/Calowear.pdf, acesso em 2/7/2009.
    » link
  • [3] K. L. Rutherford, I. M. Hutchings, Surf. Coat. Technol. 79 (1996) 231-239.
  • [4] M. G. Gee, A. J. Gant, I. M. Hutchings, R. Bethke, K. Schiffman, K. Van Acker, S. Poulat, Y. Gachon, J. von Stebut, Wear 255 (2003) 1-13.
  • [5] Y. Kusano, K. Van Acker, I. M. Hutchings, Surf. Coat. Technol. 183 (2004) 312-327.
  • [6] M. G. Gee, Wear 259 (2005) 1448-1452.
  • [7] M. G. Gee, A. J. Gant, I. M. Hutchings, Y. Kusano, K. Schiffman, K. Van Acker, S. Poulat, Y. Gachon, J. von Stebut, P. Hatto, G. Plint, Wear 259 (2005) 27-35.
  • [8] Disponível em: http://www.weightech.com.br/PDF/pw4mc3.pdf, acesso em 20/07/2009.
    » link
  • [9] Disponível em: http://www.datasheetcatalog.org/datasheet/texasinstruments/ina125.pdf, acesso em 20/07/2009.
    » link
  • [10] Disponível em: http://www.provitec.com.br/pdf/DM%205000-%20AXD-MTD,%2011-07.pdf, acesso em 20/07/2009.
    » link
  • [11] D. R. Lide (Ed.), Handbook of Chemistry and Physics, 85th Ed., CRC Press (2004-2005) 14-12.
  • [12] J. E. Zorzi, R. Milani, R. F. de L. Lorenzi, C. L. G. de Amorim, C. A. Perottoni, Anais 11th Int. Conf. Adv. Mater., ICAM e VIII SBPMat, Rio de Janeiro, RJ (2009) R538.
  • [13] J. Catafesta, R. Andreola, C. A. Perottoni, J. E. Zorzi, Cerâmica 53, 325 (2007) 29-34.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    07 Fev 2011
  • Data do Fascículo
    Dez 2010

Histórico

  • Revisado
    30 Set 2009
  • Recebido
    29 Jul 2009
  • Aceito
    25 Nov 2009
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