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Podem os dispersantes afetar as propriedades dos concretos refratários após a queima?

Could the dispersants affect the properties of refractory castables after firing?

Resumos

A aplicação de concretos refratários é um processo em constante evolução e apresenta uma forte dependência dos avanços dos conhecimentos sobre os ligantes hidráulicos. Os cimentos de aluminato de cálcio constituem os agentes ligantes mais utilizados em concretos refratários, devido principalmente a sua disponibilidade, custo e capacidade de conferir alta resistência mecânica a verde. No entanto, a perda das ligações hidráulicas nestes materiais prejudica o seu desempenho a temperaturas intermediárias (500 a 1000 °C). Neste trabalho, as propriedades de concretos refratários foram avaliadas nesta faixa de temperatura, tendo como variável o tipo de dispersante utilizado uma vez que eles atuam no processo de hidratação de ligantes. Foi verificado que o efeito da atuação do dispersante é um dos fatores que determina o tipo de hidrato formado, que por sua vez influencia as propriedades de concretos. O aditivo que favoreceu a dispersão do concreto e menor consumo de água levou a formação de hidratos termicamente mais estáveis. Isso contribuiu para aumentar a resistência mecânica em temperaturas intermediárias e influenciou o comportamento termomecânico do concreto em alta temperatura.

concretos refratários; aditivos; tratamento térmico


A growing demand for refractory castables with specific behavior has been inducing a continuous technological evolution, where one of the most important aspects is related to the hydraulic binders. The high alumina cements are the most important hydraulically setting agents used for bonding castables, mainly because they develop high strength within 6-24 h of placement. However, conventional castables show a characteristic drop in the mechanical strength in the 500 to 1000 °C temperature range, when the hydraulic bond is lost due to the dehydration process. In this work, the influence of dispersants in the refractory castables properties was evaluated as a function of firing temperature. It was verified that the hydrate type formed during the curing process depends on the dispersant used and defines the properties of castables. The additive that favored the dispersion of castable and decreased the water consumption resulted hydrates thermally more stable. This contributed to increase the mechanical strength at intermediate temperatures and it also influenced the thermomechanical behavior of castable at high temperature.

refractory castables; additives; thermal treatment


Podem os dispersantes afetar as propriedades dos concretos refratários após a queima?

Could the dispersants affect the properties of refractory castables after firing?

I. R. Oliveira; V. C. Pandolfelli

Departamento de Engenharia de Materiais - DEMa, Universidade Federal de S. Carlos, Rod. Washington Luiz, km 235, S. Carlos, SP 13565-905. vicpando@power.ufscar.br

RESUMO

A aplicação de concretos refratários é um processo em constante evolução e apresenta uma forte dependência dos avanços dos conhecimentos sobre os ligantes hidráulicos. Os cimentos de aluminato de cálcio constituem os agentes ligantes mais utilizados em concretos refratários, devido principalmente a sua disponibilidade, custo e capacidade de conferir alta resistência mecânica a verde. No entanto, a perda das ligações hidráulicas nestes materiais prejudica o seu desempenho a temperaturas intermediárias (500 a 1000 °C). Neste trabalho, as propriedades de concretos refratários foram avaliadas nesta faixa de temperatura, tendo como variável o tipo de dispersante utilizado uma vez que eles atuam no processo de hidratação de ligantes. Foi verificado que o efeito da atuação do dispersante é um dos fatores que determina o tipo de hidrato formado, que por sua vez influencia as propriedades de concretos. O aditivo que favoreceu a dispersão do concreto e menor consumo de água levou a formação de hidratos termicamente mais estáveis. Isso contribuiu para aumentar a resistência mecânica em temperaturas intermediárias e influenciou o comportamento termomecânico do concreto em alta temperatura.

Palavras-chave: concretos refratários, aditivos, tratamento térmico.

ABSTRACT

A growing demand for refractory castables with specific behavior has been inducing a continuous technological evolution, where one of the most important aspects is related to the hydraulic binders. The high alumina cements are the most important hydraulically setting agents used for bonding castables, mainly because they develop high strength within 6-24 h of placement. However, conventional castables show a characteristic drop in the mechanical strength in the 500 to 1000 °C temperature range, when the hydraulic bond is lost due to the dehydration process. In this work, the influence of dispersants in the refractory castables properties was evaluated as a function of firing temperature. It was verified that the hydrate type formed during the curing process depends on the dispersant used and defines the properties of castables. The additive that favored the dispersion of castable and decreased the water consumption resulted hydrates thermally more stable. This contributed to increase the mechanical strength at intermediate temperatures and it also influenced the thermomechanical behavior of castable at high temperature.

Keywords: refractory castables, additives, thermal treatment.

INTRODUÇÃO

Apesar do decréscimo na quantidade de cimento usada em concretos refratários de alto desempenho, os cimentos de aluminato de cálcio (CAC), particularmente aqueles com alta alumina, continuam a ser os agentes hidráulicos mais importantes usados em concretos. Isso se deve principalmente ao fato de propiciar desenvolvimento de alta resistência mecânica no período de 6 a 24 h após início da cura. Geralmente, concretos de alta alumina requerem apenas 24 h para desenvolver 70-80% da sua resistência total quando apropriadamente curados, em contraste com 28 dias necessários para concretos preparados com cimento Portland [1].

Fases típicas presentes em CAC comerciais, como CaO.Al2O3 (CA) e CaO.2Al2O3 (CA2), geram fases hidratadas as quais são responsáveis pelo desenvolvimento de resistência durante a cura do concreto em ambiente úmido. Quando o cimento de aluminato de cálcio é misturado com a água, as fases anidras começam a se dissolver rapidamente formando uma solução saturada de íons Ca2+ e Al(OH)4-. A nucleação dos produtos de hidratação e o posterior crescimento de cristais produzem uma rede interconectada responsável pelo endurecimento e pela resistência mecânica [1, 2].

No início do processo de hidratação o aluminato de cálcio hidratado e o hidróxido de alumínio são formados nas superfícies das partículas anidras. No período de indução, a taxa de hidratação é baixa e a espessura da camada hidratada na superfície cresce lentamente. Quando essa camada de hidratação alcança uma espessura crítica, a tensão causada pelas moléculas de água presas rompe a camada e o período de indução termina com a formação de núcleos cristalinos que crescem por um mecanismo de dissolução-cristalização produzindo hidratos [1-3].

A estrutura dos produtos que se formam durante a hidratação é influenciada, principalmente, pelo teor de água disponível, pelo tempo de reação, pela temperatura e pela relação entre as concentrações dos íons Ca2+ e Al(OH)4- que são geradas em solução durante o processo de dissolução das fases anidras [1, 4]. Em geral, CAH10, C2AH8, C3AH6 e AH3 são reconhecidos como os principais hidratos de aluminato de cálcio, sendo C=CaO, A=Al2O3 e H=H2O.

Embora a formação desses produtos hidratos seja responsável pela resistência a verde dos concretos, esses materiais apresentam uma queda característica na resistência em temperaturas intermediárias (freqüentemente entre 500 e 1000 °C), quando a ligação hidráulica não mais atua devido ao processo de desidratação e a sinterização não é ainda suficiente para desenvolver ligação cerâmica. A faixa de temperatura exata na qual ocorre deterioração da resistência não é absoluta, mas pode depender de vários fatores tais como o tipo e proporção dos hidratos, da temperatura de cura, e da taxa de aquecimento [1].

Na prática, altas temperaturas (500-600 °C) podem ser necessárias para a completa decomposição dos hidratos uma vez que o aquecimento aumenta a pressão do vapor de água, particularmente dentro dos poros fechados, diminuindo o processo de desidratação. Embora hidratos decompostos possam começar a reagir com agregados de alumina a temperaturas próximas a 900 °C, sinterização significativa entre cristalitos de aluminato de cálcio e cristais de aluminas vizinhas apenas ocorre acima de 1100 °C [1].

Os processos de hidratação, endurecimento e comportamento de queima de cimentos em concretos refratários são afetados pela presença de aditivos dispersantes os quais reagem com o cimento [1, 5-7]. Dessa forma, o presente trabalho avalia as propriedades de concretos refratários (resistência e porosidade) preparados com cimentos comerciais em função do tipo de aditivo dispersante utilizado quando queimados em diferentes temperaturas. Além disso, foi avaliada a influência dos aditivos sobre o comportamento termomecânico dos concretos uma vez que os materiais refratários são geralmente utilizados sob carga em elevadas temperaturas.

MATERIAIS E MÉTODOS

Foram desenvolvidas duas composições de concretos refratários formuladas segundo o modelo de distribuição de partículas de Andreasen [8], com coeficiente (q) 0,21 e contendo 6%-p dos ligantes CA14M (Almatis, US) e Secar 71 (Kerneos, França). Aluminas eletrofundidas brancas com variação de tamanho de partículas na faixa de 4750 - 11 μm foram usadas como agregado (69%-p), enquanto a matriz foi constituída pelas aluminas calcinadas A 17NE (22%-p) e CT3000SG (3%-p). Como aditivos dispersantes foram avaliados os seguintes compostos: ácido cítrico anidro (Labsynth, 99,5% pureza) e os polímeros da família do poliglicol, fornecidos pela Bayer, Alemanha (CD e CS). Os teores de aditivos e de água necessários para a preparação de cada composição foram previamente determinados [9] e são apresentados na Tabela I.

A mistura das matérias-primas foi realizada em um reômetro para concretos [10] sob rotação constante (44 rpm).

A adição do teor de água definido para cada tipo de composição foi realizada em etapas para garantir a efetiva mistura dos sistemas otimizando a fluidez [11]. Após mistura a seco durante 60 segundos visando a quebra dos aglomerados e conseqüente homogeneização de seus componentes, adicionou-se 75% do total de água suficiente para a "virada do concreto", a qual pode ser definida como o momento no qual o concreto passa a se comportar como um meio contínuo. Ao alcançar o ponto de virada, o restante da água foi adicionado e a rotação foi mantida até a completa mistura do sistema. Em seguida, as composições foram moldadas na forma de cilindros de 40mm x 40 mm. Posteriormente, tais amostras foram curadas na temperatura de 50 °C numa câmara climatizada Vötsch 2020, em ambiente saturado (umidade relativa ≅100%) durante 72 h.

Para os ensaios de resistência mecânica e porosidade aparente as amostras foram secas (a 110 °C durante 3 dias) sendo submetidas posteriormente a tratamento térmico. As temperaturas de queima foram 200, 400, 600, 800 e 1000 °C com taxa de aquecimento de 1 °C/min com patamar de 5 h. Os ensaios de resistência mecânica por compressão diametral (ASTM C 496-90) foram realizados utilizando-se uma máquina de ensaios universal MTS 810 e uma taxa de aplicação de carga de 42 N/s. A tensão de ruptura foi calculada a partir da equação abaixo:

onde σR é a tensão de ruptura (MPa), Pmax é a força de ruptura (N), L é a altura (m) e D o diâmetro da amostra (m). Neste tipo de ensaio, as amostras são submetidas a forças de compressão diametral, gerando solicitações de tração no interior da amostra. A propagação da trinca ocorre na direção vertical visto que as tensões de tração principal atuam perpendicularmente a força aplicada. Este teste foi selecionado para avaliar a resistência mecânica das amostras por proporcionar uma situação semelhante a que ocorre na etapa de secagem, quando os concretos refratários são submetidos à pressurização de vapor, isto é, a solicitação interna por tração.

A porosidade aparente (P.A.) dos concretos foi obtida pelo método de imersão de Archimedes, utilizando querosene como líquido de imersão (norma ASTM C830).

Adicionalmente, o comportamento termomecânico dos sistemas avaliados foi analisado por meio de ensaios de refratariedade sob carga e fluência (norma ASTM C832-89). Para realizar o ensaio de refratariedade sob carga (RUL) foi utilizado um equipamento Netzsch RUL 421E. A análise foi realizada em amostras cilíndricas com um furo central de 12,4 mm. Estas foram curadas durante 72 h e calcinadas a 600 °C por 5 h (taxa de aquecimento 2,5 °C/min). O ensaio foi efetuado a uma taxa de 5 °C/min até a temperatura de 1500 °C, sob carga compressiva de 0,2 MPa. Tal ensaio visa analisar a deformação que a amostra está sujeita com o aumento de temperatura [12, 13].

Amostras também foram curadas durante 72 h, calcinadas a 600 °C por 5 h (taxa de aquecimento 2,5 °C/min) e queimadas a 1500 °C por 24 h (taxa de aquecimento 2 °C/min). Após esta etapa de preparação, as amostras foram submetidas a ensaios de porosidade aparente e de fluência. O ensaio de fluência foi realizado a uma taxa de 5 °C/min até 1450 °C, com patamar de 48 h nessa temperatura (carga compressiva de 0,2 MPa), utilizando o mesmo equipamento dos ensaios de RUL.

Amostras dos aditivos utilizados também foram queimadas a 900 °C por 5 h e submetidas a ensaios de difração de raios X a fim de identificar as fases.

RESULTADOS E DISCUSSÃO

Os resultados quanto à resistência mecânica de concretos preparados na presença de diferentes aditivos em função da temperatura de queima são apresentados na Fig. 1. Na presença dos aditivos AC e CD os corpos apresentaram valores de resistência mecânica próximas, enquanto o aditivo CS resultou em valores superiores, independente da temperatura de queima para ambos os ligantes avaliados.


A resistência mecânica de concretos na faixa de temperatura avaliada é principalmente determinada pela desidratação das fases formadas (hidratos) a partir do processo de hidratação dos ligantes. Quando esses hidratos são aquecidos ocorre a saída da água combinada. O hidrato CAH10 (CaO.Al2O3.10H2O) e a alumina gel perdem sua água de cristalização em baixas temperaturas (100-130 °C). O C2AH8 (2CaO.Al2O3.8H2O) apresenta decomposição na faixa de temperatura entre 170-195 °C. Já o C3AH6 (3CaO.Al2O3.6H2O) forma durante o processo de desidratação um composto metaestável (C3AH1,5) após perda de 4,5 moles de água de cristalização (300-360 °C). O restante (1,5 moles) é liberado na forma de vapor de água a aproximadamente 450 °C. Durante a decomposição do AH3 (210-300 °C) uma parte pode se converter em boemita (AH). A decomposição do AH ocorre entre 530 e 550 °C [14]. Entretanto, a formação desses tipos de hidratos é dependente, entre outros fatores, da temperatura de cura e do teor de água disponível. O hidrato CAH10 é o produto majoritário quando a cura é realizada em baixas temperaturas (5-10 °C) e com teor suficiente de água. O hidrato C2AH8 forma-se em temperaturas entre 22 e 35 °C. Já o C3AH6 é o hidrato formado principalmente em temperaturas acima de 35 °C ou na presença de teores reduzidos de água. O composto AH3 (Al2O3.3H2O) forma-se em toda a faixa de temperatura e teores de água.

Pesquisa anterior mostrou que o teor de água disponível é determinante do tipo de hidrato formado [15]. Por meio de ensaios de secagem (análise termogravimétrica) puderam ser determinadas as temperaturas correspondentes à perda de água dos hidratos para os cimentos usados neste estudo (Fig. 2).


Tomando como base a ocorrência da formação dos principais tipos de hidratos, quando são comparadas as curvas de secagem pode-se observar que à medida que foi necessário um maior teor de água na preparação do concreto (AC > CD > CS) ocorreu a formação preferencial do hidrato C2AH8, dado ao pico de desidratação característico em torno de 200 °C.

O menor consumo de água na presença de CS é decorrente da sua alta eficiência com relação à dispersão das partículas da matriz e principalmente dos ligantes. Isso acarretou em uma maior formação do hidrato C3AH6 na temperatura de cura utilizada (50 °C), como indicado pelo aumento da altura do pico na faixa de 300-360 °C. A formação predominante deste tipo de hidrato pode explicar a superior resistência mecânica obtida na presença de CS. Por se tratar de hidratos com menor teor de água, verifica-se uma menor perda de massa durante a queima resultando em menor porosidade e maior resistência mecânica, quando comparado aos demais aditivos com menores teores de C3AH6.

Considerando a formação de C3AH6 na presença de CS era esperado aumento da porosidade do material e conseqüente queda de resistência mecânica quando a queima foi realizada a partir de 400 °C. Entretanto, os resultados de resistência mecânica (Fig. 1) bem como os de porosidade aparente (Fig. 3) indicaram um efeito oposto. Os resultados na presença de CS indicaram que a queima favoreceu a formação de algum outro tipo de hidrato mais estável termicamente e responsável pela maior resistência mecânica, embora a porosidade aumente com a temperatura de queima.


A formação de fases como AH3 é particularmente favorecida pela precipitação do C3AH6 uma vez que há mais alumina disponível para a formação deste composto [16]. O AH3 aparece freqüentemente como um gel e devido a sua alta capacidade de preencher vazios interparticulares pode ser correlacionada ao desenvolvimento de resistência mecânica. A formação preferencial do C3AH6 quando na presença de CS pode justificar a maior formação de AH3 e a maior resistência mecânica obtida quando comparada aos demais aditivos. Assim sendo, a decomposição de uma maior quantidade de AH3 (210-300 °C) pode justificar a superior formação de AH que constitui uma fase mais estável termicamente. A formação dessa fase justifica a maior resistência mecânica verificada na faixa de temperatura de 400-600 °C na presença de CA14M. A decomposição completa da fase AH pode justificar a queda de resistência mecânica quando a queima foi realizada em 800 °C. A presença de uma superior quantidade da fase AH na presença de CS foi comprovada nos ensaios de secagem (Fig. 2) por meio do pico de desidratação acima de 500 °C.

Ainda na Fig. 2 é possível observar que a decomposição completa da fase AH quando na presença de Secar 71 ocorreu numa temperatura um pouco inferior quando comparado à presença de CA14M. Isso acarretou na queda de resistência mecânica já para uma temperatura de queima de 600 °C. Os resultados de porosidade aparente também mostraram um aumento mais significativo entre as temperaturas de queima de 400 e 600 °C quando na presença de Secar 71 (Fig. 3). Neste contexto, cabe ressaltar que aditivos normalmente empregados na composição de concretos refratários não atuam somente na dispersão das partículas da matriz e ligante. Seu efeito quanto a redução do teor de água no concreto influencia no tipo de hidrato formado. Conseqüentemente, o tipo de hidrato formado é determinante das propriedades dos materiais como resistência mecânica e porosidade em temperaturas intermediárias.

Uma vez que os concretos refratários são geralmente utilizados sob carga em elevadas temperaturas, torna-se também importante sua análise nessas condições. O comportamento termomecânico dos sistemas avaliados foi analisado por meio de ensaios de refratariedade sob carga e fluência, apresentados nas Figs. 4 e 5, respectivamente.



O ensaio de refratariedade sob carga é usado para medir a temperatura na qual o corpo se deforma sob tensão. Já a medida da deformação do corpo em função do tempo de exposição a uma carga e temperatura constantes, é realizada por meio de ensaios de fluência [12, 13, 17].

Os resultados obtidos também indicaram uma influência do tipo de aditivo dispersante usado na preparação dos concretos. As curvas de deformação em função da temperatura mostram a ocorrência de expansão próxima de 1100 °C na presença do aditivo CS, sendo esta mais acentuada quando utilizado o ligante Secar 71. De acordo com a literatura [1], entre 1000 e 1200 °C, a alumina reage com a fase CA formando CA2 com morfologia globular e grosseira. A formação preferencial dessa fase na presença do aditivo CS pode ser explicada pelo maior teor de alumina livre presente resultante da desidratação do AH (boemita), a qual se forma preferencialmente em corpos preparados na presença desse aditivo. Já a expansão detectada próxima a 1500 °C se deve a formação da fase CA6 (CaO.6Al2O3). Em temperaturas superiores a 1300 °C, o CA2 reage com alumina para formar partículas aciculares de CA6. Essa morfologia das partículas provavelmente é responsável pela ligação física da microestrutura melhorando a resistência à alta temperatura [1]. Entretanto, o comportamento de fluência dos sistemas avaliados mostrou que o concreto preparado na presença de CS apresentou uma maior deformação com o tempo (menor resistência à fluência) quando comparado aos concretos preparados na presença dos demais aditivos. Já que a fluência é sensível à porosidade [12], esta propriedade foi avaliada para materiais quando submetidos ao mesmo tratamento dos corpos utilizados nos ensaios de fluência. Como apresentado na Fig. 5, os corpos apresentaram valores de porosidade bastante próximos sendo que os corpos preparados com CS apresentaram os menores valores, o que não justificaria sua maior deformação com o tempo em alta temperatura. Dessa forma, como a fluência também é influenciada pela formação de fase vítrea foi investigada a possível existência de fases no aditivo CS, as quais poderiam provocar a formação de fase líquida em alta temperatura. De fato, quando realizados ensaios de difração de raios X em amostras dos aditivos CD e CS após queima a 900 °C (Fig. 6), pode-se identificar a formação da fase CaSiO3 para o aditivo CS. Como o diagrama de fases do sistema Al2O3-SiO2-CaO prevê a formação de fase líquida acima 1300 °C, esta pode ter contribuído para a sinterização do material (menor porosidade) mas, por outro lado, promovido a formação de fases indesejáveis (maior deformação). A formação de uma maior quantidade da fase C12A7, que possui baixa refratariedade, também pode ser uma possível causa que merece estudos adicionais. A maior formação de CA2 à aproximadamente 1200 °C, pode deixar disponível uma quantidade superior de CaO que induziria a formação de C12A7.


Por fim, com este trabalho pode-se verificar que o aditivo utilizado na dispersão da matriz do concreto influencia até mesmo suas propriedades em alta temperatura.

CONCLUSÃO

O efeito da atuação do dispersante é um dos fatores que determina o tipo de hidrato formado, que por sua vez influencia as propriedades de concretos.

O aditivo CS se destaca como um eficiente dispersante, promovendo a redução no consumo de água. Isso acarreta na formação preferencial dos hidratos C3AH6 disponibilizando mais alumina para a formação de AH3. O tratamento térmico contribui para a formação de AH a partir da decomposição do AH3. Este tipo de hidrato mais estável termicamente contribui para o ganho de resistência mecânica em temperaturas intermediárias.

A formação preferencial de AH na presença do aditivo CS também influencia o comportamento termomecânico do concreto em alta temperatura, acarretando na superior formação das fases CA2 e CA6, responsáveis pela expansão à 1100 e 1500 °C, respectivamente. Entretanto, na presença desse aditivo o concreto apresenta uma menor resistência à fluência devido à presença de silicatos responsáveis pela formação de fase vítrea ou pela adicional formação de C12A7.

AGRADECIMENTOS

À Almatis e Kerneos pelo fornecimento das matérias-primas e à FAPESP e ao CNPq pelo suporte financeiro. Os agradecimentos também são dirigidos ao Dr. Rafael Salomão pelas discussões.

(Rec. 20/02/2008, Ac. 30/05/2008)

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    12 Maio 2009
  • Data do Fascículo
    Mar 2009

Histórico

  • Aceito
    30 Maio 2008
  • Recebido
    20 Fev 2008
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