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Mulheres e carreiras gerenciais: a construção da identidade de líder em um ambiente corporativo masculino

Mujeres y carreras directivas: la construcción de la identidad del líder en un entorno corporativo masculino

Resumo

Este artigo analisa ações de reinvindicação (claiming) de liderança exitosas, assim como fatores que viabilizaram a construção social da identidade de líder nas trajetórias de mulheres inseridas em uma empresa de tecnologia, segmento tradicionalmente masculino. Essas questões são investigadas por meio de um estudo de caso qualitativo de perspectiva longitudinal com corte transversal baseado em entrevistas conduzidas com profissionais mulheres que atuaram na organização considerada - ambiente permeado por importantes aspectos relacionais de gênero - realizadas em duas etapas (em 2006 e 2021). A análise revela que as ações de reinvindicação de liderança bem-sucedidas entre essas mulheres derivaram de sua postura predominantemente agêntica, porém dotada de uma orientação colaborativa e coletiva, um atributo de comunalidade. Foram fatores favoráveis para a concessão da liderança (granting) a elas as competências, o estilo de gestão híbrido e o comportamento adaptativo ao ambiente que demonstraram, bem como o suporte/patrocínio obtido de lideranças da empresa.

Palavras-chave:
Gênero; Liderança; Identidade de líder; Tecnologia da informação; Trabalho e gênero

Resumen

Este artículo analiza acciones de reivindicación exitosas (claiming) de liderazgo y factores que permitieron la construcción social de la identidad del líder en las trayectorias de mujeres empleadas en una empresa de tecnología, segmento tradicionalmente masculino. Estas cuestiones se investigan a través de un estudio de caso cualitativo desde una perspectiva longitudinal transversal basado en entrevistas a mujeres profesionales que trabajaron en la compañía ‒ entorno permeado por importantes aspectos relacionales de género ‒ llevadas a cabo en dos etapas (en 2006 y 2021). El análisis revela que las acciones de reivindicación exitosas se originaron de su postura predominantemente agéntica, pero con una orientación colaborativa y colectiva, un atributo comunal. Los factores favorables a la concesión de liderazgo (granting) fueron sus habilidades, su estilo de gestión híbrido, su comportamiento adaptativo al entorno y el apoyo de algunos líderes de la empresa.

Palabras clave:
Género; Liderazgo; Identidad del líder; Tecnología de la información; Trabajo y género

Abstract

This study analyzes successful leadership claiming actions and factors that enabled the social construction of a leader identity in the trajectories of women in a technology company, a traditionally male segment. These subjects are investigated through a qualitative case study, from a longitudinal perspective with cross-section data collection. The study is based on interviews conducted with female professionals who worked in the company - an environment permeated by important gender issues - carried out in two stages (in 2006 and 2021). The analysis reveals that successful leadership claiming actions among these women were derived from their predominantly agentic posture but endowed with a collaborative and collective orientation, an attribute of commonality. Their competence, hybrid management style, adaptive behavior to the environment, and the support/sponsorship obtained from some of the company’s leaders, were favorable factors for granting leadership to these women.

Keywords:
Gender; Leadership; Leader’s identity; Information technology; Work and gender

INTRODUÇÃO

Ainda nos dias de hoje, a menor participação das mulheres em cargos de autoridade nas organizações comparada à dos homens é uma realidade presente em todo o mundo. De acordo com dados publicados em 2021 pelo Fórum Econômico Mundial, essa é uma das principais razões pelas quais se estima que serão necessários 267,6 anos para alcançar a paridade entre homens e mulheres em participação econômica e oportunidade, caso não haja intervenções.

Eagly e Carli (2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.) propõem que o caminho de ascensão ao topo para as mulheres pode ser representado pela metáfora do labirinto, uma vez que ele não é claro, é antes permeado por dificuldades adicionais em relação aos homens, tanto evidentes quanto implícitas; percorrê-lo requer grande habilidade e mesmo sorte. Em ambientes tradicionalmente masculinos, a ascensão minoritária de mulheres a qualquer nível de chefia leva a crer que, neles, as características, atitudes e estratégias individuais por elas adotadas são mais importantes para obterem uma promoção do que em outros contextos que tendem a apresentar políticas menos desiguais. Assim, este estudo se debruça sobre a conquista da liderança por mulheres nesse tipo de conjuntura, especialmente adversa a elas.

De caráter abrangente e escopo integralizado em relação a várias abordagens consolidadas de liderança, DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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) propuseram um modelo explicativo do desenvolvimento de identidades de líder e seguidor em que defendem a existência de um relacionamento caracterizado por interações, nas quais cada parte assume um dos papéis; essas interações teriam o efeito de intensificar e estabilizar tais identidades. Com base nessa ótica relacional e processual, a presente pesquisa investiga as ações exitosas empreendidas por mulheres para reinvidicar a identidade de líder, bem como fatores de influência que conduziram à concessão dessa identidade, por meio de um estudo de caso de perspectiva longitudinal com corte transversal, do qual participaram profissionais mulheres que atuaram em uma empresa do setor tecnológico. As entrevistas foram realizadas em duas fases: em 2006, com dez participantes, quando foram registradas suas percepções acerca das dinâmicas relacionais de gênero no contexto organizacional; e em 2021, com cinco profissionais que assumiram posições de liderança nos níveis tático e intermediário, momento no qual foram analisadas suas trajetórias até alcançarem o reconhecimento como líderes. De modo geral, inserir-se nesses níveis gerenciais costuma representar o trecho inicial do caminho dos indivíduos que alcançam o topo na hierarquia das organizações, por isso é relevante compreender a ascensão de mulheres a eles.

No Brasil, ainda há poucos estudos sobre mulheres na liderança, e a literatura existente tende a se concentrar na pesquisa de executivas (Cavazotte & Oliveira, 2018Cavazotte, F., & Oliveira, L. B. (2018). Na corda bamba: paradoxos da liderança feminina no mundo corporativo. In A. Carvalho Neto, & F. Versiani (Orgs.), Mulheres profissionais: quem é o sexo frágil? Belo Horizonte, MG: Editora PUC-Minas.; Kanan, 2010Kanan, L. A. (2010). Poder e liderança de mulheres nas organizações de trabalho. Organização e Sociedade, 17(53), 243-257. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S1984-92302010000200001
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). No âmbito internacional, diversos trabalhos têm sido realizados no campo de estudos de gênero e liderança, sob várias perspectivas, em especial nos últimos anos (e.g., Badura, Grijalva, Newman, Yan, & Jeon, 2018Badura, K., Grijalva, E., Newman, D. A., Yan, T., & Jeon, G. (2018). Gender and leadership emergence: a meta-analysis and explanatory model. Personnel Psychology. 71(3), 335-367. Recuperado de https://doi.org/10.1111/peps.12266
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; Eagly & Heilman, 2016Eagly, A. H., & Heilman, M. E. (2016). Gender and leadership: introduction to the special issue. The Leadership Quarterly, 27(3), 349-353. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2016.04.002
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; Shen & Joseph, 2021Shen, W., & Joseph, D. (2021). Gender and leadership: a criterion-focused review and research agenda. Human Resource Management Review, 31(2), 100765. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.hrmr.2020.100765
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). No entanto, os estudos se concentraram em compreender o porquê de as mulheres não conseguirem ascender hierarquicamente na mesma proporção que os homens - com ênfase acerca de posições executivas - enquanto permanece obscuro como parte delas ascende em meio às adversidades com as quais convivem, especialmente em segmentos que acirram os estereótipos de gênero a elas dirigidos. Dessa forma, os achados da pesquisa ampliam o conhecimento sobre mulheres e liderança, especialmente em áreas profissionais e em indústrias consideradas bastiões de masculinidade, e podem auxiliar tanto profissionais em busca da liderança como organizações interessadas em promover a igualdade de gênero.

O artigo está organizado da seguinte forma. Na próxima seção, apresentam-se estudos sobre a ascensão hierárquica de mulheres em empresas e o modelo de constituição da identidade de líder proposto por DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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). Em seguida, são descritos os aspectos referentes ao método utilizado, quais sejam: coleta de dados e perfil das participantes; temas abordados na coleta de dados e caracterização da empresa estudada. Finalmente, são analisados o contexto organizacional de gênero no qual as participantes atuavam, as ações de claiming de liderança bem-sucedidas e fatores favoráveis à concessão da liderança às mulheres pesquisadas. O artigo conclui com considerações sobre os resultados da pesquisa perante o conhecimento acumulado no campo.

EMBASAMENTO TEÓRICO

Mulheres e desafios na ascensão a posições de liderança

Apesar dos avanços acerca do trabalho profissional feminino, a desigualdade na distribuição de cargos de autoridade em relação aos homens se mantém presente. Uma razão de grande relevância para tanto, explicada pela teoria do papel social de Eagly (1987Eagly, A. H. (1987). Sex differences in social behavior: a social-role interpretation. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum.), são as crenças e expectativas amplamente disseminadas na sociedade sobre como homens e mulheres são - os estereótipos de gênero - e sobre como deveriam ser, que, em conjunto, constituem os denominados papéis de gênero (gender roles). De acordo com eles, aos homens são associados atributos de agência, como comando, agressividade, ambição e firmeza. Por sua vez, às mulheres são relacionados traços comunais voltados para o cuidado com o próximo, a exemplo de valores coletivos e atenção aos relacionamentos interpessoais. Atributos agênticos também constituem características prototípicas de líderes na concepção da maioria das pessoas (Koenig, Eagly, Mitchell, & Ristikari, 2011Koenig, A. M., Eagly, A. H., Mitchell, A. A., & Ristikari, T. (2011). Are leader stereotypes masculine? A meta-analysis of three research paradigms.Psychological Bulletin, 137(4), 616-642. Recuperado de https://doi.org/10.1037/a0023557
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), e ser um líder prototípico contribui para receber julgamentos positivos sobre a efetividade da liderança (Giessner, van Knippenberg & Sleebos, 2009Giessner, S. R., van Knippenberg, D. L., & Sleebos, E. D. (2009). License to fail? How leader group prototypicality moderates the effects of leader performance on perceptions of leadership effectiveness (No. ERS-2008-066-ORG). ERIM Report Series Research in Management. Recuperado de https://repub.eur.nl/pub/13626
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).

Conforme a teoria da congruência de papéis de Eagly e Karau (2002Eagly, A. H., & Karau, S. J. (2002). Role congruity theory of prejudice toward female leaders. Psychological Review, 109(3), 573-598. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0033-295X.109.3.573
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), a divergência entre o papel de um líder e o papel de gênero dirigido às mulheres - ambos construções socioculturais - prejudica a ascensão à liderança e a avaliação delas nesse papel, uma vez que podem ter seu potencial para exercê-lo subestimado. Porém, caso elas atendam aos critérios considerados mais compatíveis com o protótipo estabelecido de líder, podem deixar de atender aos preceitos dirigidos a seu gênero e, assim, ver sua aceitação social reduzida, já que tais preceitos têm um caráter normativo (Bourdieu, 2020Bourdieu, P. (2020). A dominação masculina. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.). Nesse sentido, Bourdieu (2020) analisa que a atuação contundente e regular de agentes e instituições ao longo dos séculos mantém a supremacia do poder masculino ao produzir, disseminar e preservar os conceitos de feminilidade e virilidade, assim como revesti-los falaciosamente de um caráter biológico. Dessa forma, as desigualdades observadas na carreira de homens e mulheres podem existir mesmo quando eles possuem atributos idênticos quando são consideradas características pessoais, familiares e de emprego (Frear, Paustian-Underdahl, Heggestad, & Walker, 2018Frear, K., Paustian-Underdahl, S. C., Heggestad, E. D., & Walker, L. S. (2018). Gender and career success: a typology and analysis of dual paradigms. Journal of Organizational Behavior, 40(4), 400-416. Recuperado de https://doi.org/10.1002/job.2338
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).

Diante disso, Eagly e Carli (2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.) defendem que a solução para que uma mulher seja aceita como líder envolve equacionar o chamado double bind, ou seja, equilibrar-se entre as características normalmente associadas a um líder e as esperadas de uma mulher. Com efeito, mulheres que adotam um comportamento híbrido em relação às duas esferas são mais propensas a ser identificadas como líderes. Assim, uma vez que precisam manifestar propriedades mais diversas, alcançar a liderança, para as mulheres, envolve um nível de complexidade maior que para os homens (Schock, Gruber, Scherndl, & Ortner, 2019Schock, A. K., Gruber, F. M., Scherndl, T., & Ortner, T. M. (2019). Tempering agency with communion increases women’s leadership emergence in all women groups: evidence for role congruity theory in a field setting. The Leadership Quartely, 30(2), 189-198. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2018.08.003
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). Além disso, mulheres que atendem concomitantemente aos requisitos de agência e comunais tendem a obter resultados mais favoráveis quanto à capacidade de resiliência e integração identitária, bem como à atuação como líder ante as demais (Zheng, Kark, & Meister, 2018Zheng, W., Kark, R., & Meister, A. L. (2018). Paradox versus dilemma mindset: a theory of how women leaders navigate the tensions between agency and communion. The Leadership Quarterly, 29(5), 584-596. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2018.04.001
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).

De acordo com uma revisão da literatura sobre gênero e emergência de liderança, os homens ainda tendem a se constituir como líderes mais frequentemente que as mulheres, apesar de a desigualdade estar decrescendo. Observou-se também que os traços de agência estavam mais presentes em homens e os comunais, em mulheres (Badura et al., 2018Badura, K., Grijalva, E., Newman, D. A., Yan, T., & Jeon, G. (2018). Gender and leadership emergence: a meta-analysis and explanatory model. Personnel Psychology. 71(3), 335-367. Recuperado de https://doi.org/10.1111/peps.12266
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). Em outra revisão, verificou-se que as mulheres têm menor propensão a agir como líderes se comparadas com os homens, especialmente em relação a comportamentos associados à agência, ainda que tenham o mesmo grau de conhecimento, habilidade e motivação, o que pode ter como causa a crença de que enfrentarão reações negativas com esse comportamento (Shen & Joseph, 2021Shen, W., & Joseph, D. (2021). Gender and leadership: a criterion-focused review and research agenda. Human Resource Management Review, 31(2), 100765. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.hrmr.2020.100765
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).

Para a ascensão na carreira, é importante que as mulheres se atentem ao desenvolvimento de networking com pessoas de todos os níveis hierárquicos, especialmente à obtenção de mentorias formais e informais (Eagly & Carli, 2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.). Desse modo, as profissionais que admitem se valer mais frequentemente de networking tendem a se considerar mais bem-sucedidas, satisfeitas e compensadas (Offermann, Thomas, Lanzo, & Smith, 2020Offermann, L. R., Thomas, K. R., Lanzo, L. A., & Smith, L. N. (2020). Achieving leadership and success: a 28-year follow-up of college women leaders. The Leadership Quarterly, 31(4), 101345. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2019.101345
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). No entanto, as mulheres costumam ter menos acesso a CEOs com maior poder de influência na organização (Collins & Val Singh, 2006Collins, J., & Singh, V. (2006). Exploring gendered leadership: meanings of successful leadership held by chief executives. In D. MacTavish, & K. Miller (Eds.), Women in leadership and management: a European perspective (pp. 11-31). Cheltenham, UK: Edward Elgar.; Ibarra, Carter, & Silva, 2010Ibarra, H., Carter, N. M., & Silva, C. (2010, setembro). Why men still get more promotions than women. Harvard Business Review. Recuperado de https://hbr.org/2010/09/why-men-still-get-more-promotions-than-women
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).

A construção da identidade de líder: ações de reivindicação e concessão

Nesta seção, apresentamos um resumo do modelo de DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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) sobre a constituição da identidade de líder e de seguidor como um processo social. Sob essa perspectiva, reivindicar (claiming) consiste em um indivíduo efetuar ações que afirmem seu papel como líder ou seguidor, enquanto conceder (granting) consiste em um indivíduo efetuar ações que outorguem um desses papéis à outra pessoa. A concessão pode ocorrer tanto como reação a um comportamento inerente à reivindicação quanto pode provocar o primeiro ato dessa natureza. As manifestações de reivindicar e conceder podem ser verbais ou não verbais (conforme se revelem por meio de declarações ou atos), diretas (explícitas) ou indiretas. As últimas tendem a ser mais sutis. Por exemplo, evitar tomar iniciativas é uma atitude consoante a reivindicar o papel de seguidor, e aludir à própria rede de influência a reivindicar o de líder. Sempre que esses comportamentos são correspondentes, eles ratificam e reestimulam um ao outro, de modo a constituir as identidades de líder e de seguidor até formar uma espiral positiva. Se, ao contrário, as manifestações de concessão e reivindicação não atingem reciprocidade, elas tendem a não voltar a ocorrer, de modo a formar uma espiral negativa.

Entre os fatores que impactam a estabilidade da correspondência das reivindicações e concessões está o grau de notoriedade, de nitidez e de certeza com que são expressas no âmbito organizacional. Quanto mais essas características estiverem presentes, tanto maior será a probabilidade de respostas compatíveis, dado que diminuem os riscos - instrumentais, interpessoais e de imagem - associados à não correspondência. Outro fator de influência é a existência de uma trajetória anterior de reivindicações e concessões correspondentes, o que gera uma tendência a sua repetição, principalmente se não acontecerem alterações conjunturais significativas.

O modelo explica ainda como comportamentos de reivindicar e conceder o papel de líder ou de seguidor se relacionam com os níveis que compõem as identidades de liderança. DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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) propõem que a identidade de um líder ou de um seguidor é constituída por três níveis em conjunto: internalização individual; reconhecimento relacional e endosso coletivo. O primeiro se refere à condição na qual a pessoa assimila, na definição que apresenta de si mesma, a identidade de líder ou de seguidor e compreende a elaboração de particularidades relacionadas com cada papel. Outro fator para a formação da identidade de líder e de seguidor é que a outra parte de uma relação assim o reconheça, o que se configura quando essa assume a identidade alternativa, disposição denominada reconhecimento relacional. Esse é imprescindível para o surgimento de líderes e seguidores, ou seja, sem que ocorra, os outros fatores não serão suficientes para que assim se configure. O endosso coletivo reestimula a organização dessas identidades de modo a colaborar para sua solidez à medida que ocorre.

O modelo proposto por DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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) se alinha aos estudos recentes de liderança que a entendem como um processo social de influência, apresentando uma visão integrativa do campo. Contudo, precisa ser desenvolvido no sentido de aprofundar como o processo ocorre concernente a grupos minoritários, nesse caso, as mulheres - com frequência, enquadradas socialmente em um papel de gênero (Eagly, 1987Eagly, A. H. (1987). Sex differences in social behavior: a social-role interpretation. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum.) que limita suas oportunidades acerca do alcance da liderança.

MÉTODO

Coleta de dados e perfil das participantes

A pesquisa se configura como um estudo de caso qualitativo de perspectiva longitudinal com corte transversal (Vieira, 2004Vieira, M. M. F. (2004). Introdução à pesquisa qualitativa em administração: questões teóricas e epistemológicas. In M. M. F. Vieira, & D. M. Zouain(Org.), Pesquisa qualitativa em administração. Rio de Janeiro, RJ: Editora FGV.). Os dados foram obtidos, principalmente, por meio de entrevistas semiestruturadas com mulheres de diversas áreas profissionais, sobre suas experiências ao trabalharem em uma empresa de um setor tradicionalmente masculino, nesse estudo referida como Alfa. A primeira etapa da pesquisa foi efetuada em 2006 com dez mulheres (cujos cargos estão elencados no Quadro 1), que eram, naquele momento, funcionárias da empresa, além do gerente de Recursos Humanos da época. Foram empregadas, ainda, consulta a documentos internos da organização - referentes ao Plano de Cargos e Salários, à avaliação de desempenho e ao organograma - bem como observação não participante. Essa etapa buscou conhecer o panorama organizacional referente a questões de gênero e o quanto as dinâmicas relacionais representavam barreiras importantes para a constituição da liderança de mulheres na empresa. A seleção das profissionais teve como critérios a atuação em distintos setores da organização e que parte delas fosse ocupante de cargos de chefia e parte não, a fim de obter diversas perspectivas, em diferentes estágios de carreira. O contato com as participantes se estabeleceu por meio do gerente de RH. Essas entrevistas foram conduzidas no próprio espaço físico da Alfa, individualmente e em ambiente privativo.

Quadro 1
Cargos das participantes na primeira etapa

Em 2021, foram entrevistadas cinco mulheres, todas ex-funcionárias da Alfa; duas delas também foram entrevistadas em 2006. Nessa etapa, pretendeu-se analisar suas carreiras em relação ao processo de construção da identidade de líder (DeRue & Ashford, 2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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). Com esse intuito, a escolha teve como requisito mulheres que se constituíram como líderes durante suas trajetórias na empresa Alfa. Além disso, buscou-se contatar aquelas que atuaram em diferentes áreas ou setores da organização, novamente no intuito de analisar panoramas diversos e apresentar possíveis diferenças relativas a esse processo, particularmente entre áreas de staff e de linha, conforme indicado em outro estudo (e.g., Lyness & Heilman, 2006Lyness, K. S., & Heilman, M. E. (2006). When fit is fundamental: performance evaluations and promotions of upper-level female and male managers.Journal of Applied Psychology, 91(4), 777-785. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0021-9010.91.4.777
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). O perfil das participantes pode ser observado no Quadro 2.

Quadro 2
Perfil das participantes na segunda etapa

As entrevistas nessa segunda fase ocorreram por videochamada e individualmente. As entrevistadas foram encontradas e contatadas com base nos dados obtidos na primeira etapa da pesquisa, diretamente por uma rede social de busca de empregos, por indicação de outra participante ou de ex-funcionária com perfil na mesma rede social mencionada.

Os dados nas duas fases foram todos gravados em áudio, com duração de, em média, uma hora por entrevista, e transcritos.

Temas abordados na coleta de dados

Nas duas etapas de entrevistas, foi adotado um roteiro semiestruturado que abordou os seguintes temas: 1) perspectivas e dificuldades percebidas de ascensão hierárquica e 2) características da liderança concedida (quando aplicável).

Em 2021, além das questões anteriores, também foi abordado o seguinte tópico: ações de reivindicação exitosas e fatores favoráveis que levaram ao reconhecimento da liderança.

Caracterização da empresa

A Alfa é uma empresa privada pertencente ao setor tecnológico, que oferece produtos e serviços de telecomunicação para o mercado corporativo. Entre 2006 e 2021, diversificou sua atuação, com a inclusão de órgãos governamentais, e expandiu sua abrangência, que era então nacional, para a América Latina, além de apresentar um grande crescimento, quando alterou seu porte de médio para grande. Contudo, em virtude de diversas crises, voltou ao seu tamanho anterior nos dias atuais.

Em relação à proporção dos cargos de chefia ocupados por mulheres na empresa, em 2006, havia apenas duas profissionais mulheres em cargos de gerência (8% do total) e nenhuma em cargos executivos. Em 2011, a maior posição ocupada por mulheres na empresa ainda era em nível intermediário, como assessoras (9% do total) e gerentes (8% do total); no nível tático, 27% dos supervisores eram do sexo feminino. Entre os cargos técnicos, não havia mulher alguma no mais alto nível, o de “especialista”; nos outros níveis, apenas 13% dos engenheiros, 31% dos analistas e 15% dos técnicos eram do sexo feminino. Na segunda etapa da pesquisa, as participantes relataram que, até a saída delas da empresa, nunca uma mulher havia alçado o quadro executivo e somente quatro mulheres ocuparam posições de gerência em diferentes momentos ao longo de todo o tempo em que atuaram na organização. Atualmente, de todos os cargos de chefia na empresa, 23,81% são ocupados por mulheres, e nenhuma delas ocupa posições executivas. Esses dados indicam, portanto, uma situação estável referente a mulheres em cargos de comando na empresa no período entre as duas etapas da pesquisa.

Análise

Em seguida, apresenta-se a análise dos resultados da pesquisa empreendida na seguinte sequência: 1) contexto organizacional de gênero na empresa e 2) ações de claiming de liderança exitosas e fatores favoráveis à concessão.

O caso Alfa: uma empresa avessa a mulheres líderes

A primeira etapa da pesquisa proporcionou a observação de que havia na Alfa questões significativas de gênero, que ensejavam implicações para o processo de constituição da identidade de líder das mulheres na empresa. Em síntese, essas questões se referiam às políticas de promoção e salarial; à organização do trabalho; à avaliação de desempenho e à cultura organizacional.

As políticas de promoção da empresa eram, na prática, assistemáticas, não transparentes e controladas por líderes de topo, que privilegiavam a ascensão dos homens. Adriana, supervisora de RH, declara: “Ainda hoje, a gente percebe que há diferença, sim [sobre gênero e política de promoções]”. Priscila, funcionária do mesmo setor, relata: “Eu não conheço muito da política de promoção porque é uma coisa que é mais escondida, eles não mostram pra gente […] É uma empresa machista, então, eles valorizam mais os homens [...], dão mais oportunidades a eles”. Heloísa também é categórica, como diversas outras entrevistadas: “Eu sei que o sexo é importante para a Alfa nesse sentido. O sexo faz a diferença”.

A tônica dos depoimentos revela que a parcialidade quanto ao gênero se estendia à política salarial, como no relato de Marina, que, ao ser perguntada se acredita que os homens recebem mais que as mulheres mesmo ocupando o mesmo cargo, é veemente: “Com certeza! Por quê? Por comparações, comparações bem claras”. Priscila afirma: “Tem o piso salarial, mas eles têm mais benefícios também para o homem que exerce o mesmo cargo”. Esse é outro importante aspecto identificado pela pesquisa que leva ao julgamento de que o trabalho delas era dominado e menos reconhecido que o dos homens.

Outra questão relevante era a notória predominância de homens na empresa, exceto em setores administrativos, além do setor de helpdesk, que demandava baixa qualificação e onde havia somente mulheres. Questionado a respeito dessa organização do trabalho, o gerente de RH denotou uma predisposição da gestão da empresa para que assim fosse: “Na área técnica, a gente percebe que existe um pouco mais de dificuldade (da mulher) em relação ao homem”, ele disse. Além disso, a empresa havia definido expressamente a designação prioritária de engenheiros para posições de comando, conforme documento interno consultado, o que era outro fator de restrição à parte das entrevistadas que não eram engenheiras. O próprio gerente de RH era um engenheiro, sem formação na área que gerenciava. De modo que Ana e Jéssica - inseridas em áreas técnicas fora da engenharia - declaram haver pouca ou nenhuma chance de promoção em seus setores. Jéssica afirma: “Eu acho que é complicado ter ascensão no setor em que trabalho aqui na Alfa”.

Essa situação era agravada pelo fato de praticamente não existir possibilidade de movimentação horizontal para as entrevistadas, o que impedia que elas obtivessem novas experiências e aprendizados importantes para uma ascensão. Elas enfatizaram a falta de expectativas de carreira na Alfa e vislumbravam ou já sentiam os efeitos da estagnação, exceto uma engenheira e uma gerente de compras e logística (inserida em um nível hierárquico superior às demais).

Mesmo que tu quisesses adquirir outros conhecimentos em outras áreas, isso eu acho muito difícil aqui […], então, te limita àquele quadrado e te desmotiva [...], tu não tens a possibilidade de mostrar o teu potencial porque, muitas vezes, tu não podes sair daquilo para que te contrataram (Suzana).

O feedback que recebiam representava também um importante aspecto da falta de incentivo ao crescimento profissional em suas rotinas de trabalho. Sem críticas que as levassem a buscar aprimoramento, nem elogios que as encorajassem a desenvolver novos objetivos, a avaliação de desempenho tinha o papel de manter as coisas como estavam. Como Priscila comenta:

Acho que não tem reconhecimento que eu falo. Não é muito cobrado também, não te dá aquela empolgação, né? de tu quereres melhorar… fica sempre naquela rotina ali e (para eles) está sempre muito bom. Mas, tu também não tens um elogio (Priscila).

Suzana também reforça essa percepção: “Se tu fizeres bem-feito aquilo para que te contrataram, a empresa está satisfeita. Isso que é triste”. As mulheres tendem a receber mais feedbacks paternalistas, que não levam ao desenvolvimento da liderança; essa tendência é maior em ambientes cujas culturas privilegiam os homens e onde há maior discrepância de poder entre os sexos (Bear, Cushenbery, London, & Sherman, 2017Bear, J. B., Cushenbery, L., London, M., & Sherman, G. D. (2017). Performance feedback, power retention, and the gender gap in leadership. The Leadership Quarterly, 28(6), 721-740. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2017.02.003
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).

O caminho para ascender em uma empresa na qual são claramente minoria e estão superexpostas, na interpretação das entrevistadas, era consideravelmente mais desafiador. Júlia, que se tornou chefe em uma área ocupacional majoritariamente masculina (desenvolvimento de software), relata sua visão a respeito:

Sabe aquela história de que a mulher tem que trabalhar em dobro para ter a sua competência vista? Eu acho que isso é verdade. […] e você não pode errar. Pelo menos, você deve se cercar de um máximo de requisitos para não errar. Você tem que ter toda a cautela para não errar. Mas, a partir do momento em que a empresa consegue ver a sua competência, consegue ver o seu esforço, eu acho que daí a empresa não deixa de apoiar e de promover porque é mulher. A minha chefe é uma mulher, e o meu trabalho é acompanhado bem de perto. Ela é bastante exigente com tudo, e é com tudo mesmo, com todas as atividades. Por isso que eu digo: a administração feminina é mais minuciosa (Júlia).

Júlia reflete sobre a dificuldade de as mulheres serem promovidas, bem como sua preocupação extrema em não cometer erros e demonstrar um padrão de desempenho excepcional, mesmo após alcançar posição de chefia. Essa conduta, pelo que descreve, é seguida por sua superior, uma gerente da área. Tais observações estão alinhadas com estudos que indicam que as mulheres, para ser promovidas, precisam apresentar um desempenho superior ao dos homens (Hryniewicz & Vianna, 2018Hryniewicz, L. G. C., & Vianna, M. A. (2018). Mulheres em posição de liderança: obstáculos e expectativas de gênero em cargos gerenciais. Cadernos EBAPE.BR, 16(3), 331-344. Recuperado de https://doi.org/10.1590/1679-395174876
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; Lyness & Heilman, 2006Lyness, K. S., & Heilman, M. E. (2006). When fit is fundamental: performance evaluations and promotions of upper-level female and male managers.Journal of Applied Psychology, 91(4), 777-785. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0021-9010.91.4.777
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), no presente caso, por causa do estigma de incompetência atribuído a elas.

O contexto desfavorável às mulheres também se revelava por meio de situações informais, nas quais elas percebiam preconceitos e mesmo atitudes abusivas, como no exemplo abaixo:

Eu não gostei da festa de final de ano da empresa, à qual parece que as pessoas iam com a intenção de cantar as mulheres que lá estavam e que eram todas funcionárias. Então, as pessoas se achavam no direito de te beijar, te abraçar, sem nunca terem te visto (Suzana).

Essa cena ocorrida em um evento institucional, mesmo que comemorativo, transparece a imagem sexualizada e que menospreza o status profissional delas, implícita na cultura da empresa. Eventos sociais frequentemente exercem o papel de reafirmar regimes desiguais de gênero em uma organização (Ortlieb & Sieben, 2019Ortlieb, R., & Sieben, B. (2019). Balls, barbecues and boxing: contesting gender regimes at organizational e4rsocial events. Organization Studies, 40(1), 115-133. Recuperado de https://doi.org/10.1177/0170840617736941
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). Cabe observar que, quando vistas com interesse sexual, o reconhecimento das mulheres como líder é dificultado. (Meister, Sinclair, & Jehn, 2017Meister, A., Sinclair, A., & Jehn, K. A. (2017). Identities under scrutiny: how women leaders navigate feeling misidentified at work. The Leadership Quarterly, 28(5), 672-690. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2017.01.009
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).

Diante do exposto, conclui-se que havia uma conjuntura organizacional desfavorável para que as mulheres buscassem a liderança na Alfa.

Ações de claiming de liderança exitosas e fatores favoráveis à concessão

Nesta seção, abordam-se as ações bem-sucedidas de reivindicação de liderança empreendidas pelas profissionais e os fatores favoráveis que levaram ao reconhecimento delas como líderes. De forma geral, esses comportamentos parecem ser beneficiados pela convergência de fatores individuais e situacionais.

Competências, agência e role-shaping

Elisa obteve uma posição de liderança técnica de modo informal, em função, principalmente, de ser a profissional mais antiga no setor em que atuava. Contribuiu, para isso, ela ter tido experiências diversificadas no seu campo de atuação, bem como ter assumido atividades que integravam a engenharia com áreas de gestão.

Ana passou a incorporar diversas novas funções de assessoria à gerência informalmente. Ela atribui ao seu comportamento voltado para iniciativas - atributo agêntico - o fato de ter alcançado mais responsabilidades:

Algumas coisas eu fui abraçando e outras eu fui designada […]; eu sempre fui muito independente e, mesmo tendo uma gerência (a que era subordinada), sempre fui muito proativa e estava um passo à frente. Então, acho que isso ajudou bastante para assumir algumas coisas (Ana).

As demais entrevistadas tiveram como ponto de partida do desenvolvimento de suas identidades como líderes a iniciativa de promover modificações relevantes de gestão sem terem assumido um cargo de chefia e sem uma orientação ou mesmo permissão expressa para tanto. O comportamento era oriundo da identificação prévia delas de uma lacuna organizacional importante, a qual se sentiam aptas a preencher. Para Laura e Ângela, esse fator parece estar associado à qualificação obtida como trainee em outras empresas, nas quais estavam inseridas nas mesmas áreas e, para a primeira, também em um curso de mestrado. Sobre esse momento, Laura comenta: “[um chefe de outro setor] até falava para mim: ‘Laura, age como se fosse e depois vai ser coordenadora’. [...] Eu disse: ‘É verdade’”.

Ângela, que ingressou como estagiária do gerente comercial nacional da empresa, participava de algumas reuniões com o superior e logo percebeu, com sua experiência no setor bancário, a ausência de algumas práticas e procedimentos. Então, sugeria a implantação deles por meio de propostas já bem elaboradas e com a demonstração dos resultados que obteriam, como, no exemplo abaixo, sobre controle de desempenho. Dessa forma, com sua orientação empreendedora, ela obteve, diversas vezes, o aval para implementar tais práticas e procedimentos, até que conseguiu incluir na estrutura da Alfa um setor de planejamento estratégico comercial, no qual foi enquadrada formalmente como supervisora.

Eu comecei a perguntar para ele como ele sabia qual foi o vendedor que vendeu mais ou o gerente regional que vendia mais. E ele olhava para mim e falava que não tinha essa informação. Aí, eu comecei a entrar no sistema da empresa e comecei a tabular [...] um dia, apresentei para ele [o relatório resultante] (Ângela).

Fernanda tomava atitudes de liderança informal diante dos problemas de gestão que identificava em sua rotina e do entendimento de que as atividades eram feitas de modo inadequado, sob uma perspectiva fragmentada e em uma organização global precária. Assim, estruturava processos e fluxos de trabalho com ênfase na determinação de prazos e eficiência para cumpri-los. Gradativamente, Fernanda passou a ser requisitada pelos clientes e por outras áreas da empresa.

As pessoas passaram a me envolver nas coisas, principalmente quando envolvia cliente, o planejamento de alguma coisa ou quando exigia alguma força-tarefa; e daí acabou sendo natural de ir para gestão […] os clientes queriam que eu estivesse junto, queriam que eu participasse porque eu organizava as coisas, eu dava prazos para as coisas e as coisas se realizavam. Eu acho que foi mais por isso, porque veio isso de fora, de outras áreas: área comercial, área de suporte ao cliente e dos próprios clientes (Fernanda).

Os diferenciais de gestão da engenheira que traziam resultados bem-sucedidos desencadearam a concessão da liderança por outros setores e até por clientes da empresa. É interessante observar que o reconhecimento externo ao segmento em que atuava viabilizou sua ascensão formal; as barreiras internas de sua área - predominantemente masculina - foram “dribladas” dessa forma. Esse exemplo reitera o conceito de labirinto (Eagly & Carli, 2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.), acerca da trajetória não óbvia que as mulheres precisam atravessar para alcançar a ascensão.

Laura identificou a necessidade e propôs a implementação de um modelo de gestão na área de marketing com um enfoque estratégico e integrativo, ao contrário do que vigorava. Ela relata que as reuniões em que apresentava o orçamento do setor e o submetia à aprovação foram decisivas para que ela se estabelecesse como líder. Nesses contextos, preocupava-se em especificar objetivamente o impacto de cada atividade no alcance dos propósitos pretendidos. Sobre isso, ela declara: “Quando eu cheguei à Alfa, tinha um arcabouço tanto de conhecimento quanto de liderança de pessoas, de ter muito foco em resultado, isso eles traziam com bastante ênfase [...]; eu também tinha muita clareza de objetivos”. Dessa forma, ela convencia os superiores da pertinência do planejamento e obtinha, como menciona, “cada vez mais autonomia para desenvolver as coisas dentro dessa visão mais estratégica”.

Destaca-se que Laura, Fernanda e Ângela trouxeram importantes inovações que favoreciam a eficácia da empresa. Outro ponto importante é que elas negociaram o papel que deveriam exercer na organização, utilizando uma estratégia pautada em modificações estruturais e de práticas organizacionais denominada shaping; essa estratégia pode tornar mais aceitáveis os claims de mulheres por liderança (Bowles, Thomason, & Bear, 2019Bowles, H. R., Thomason, B., & Bear, J. B. (2019). Reconceptualizing what and how women negotiate for carrer advancement. Academy of Management Journal, 62(6), 1645-1671. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amj.2017.1497
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), como se observa no presente caso. Ademais, defendiam suas propostas de modo objetivo, sistemático e claro, bem como demonstravam um perfil de atuação condizente com certos valores culturais da Alfa, como o pragmatismo e a ênfase nos resultados financeiros.

Nota-se que as competências dessas mulheres (conhecimentos e experiências) são a base dos primeiros movimentos de claiming que executaram, mas o impulso central se dá por meio de suas notáveis posturas agênticas. Ao perceberem oportunidades e deficiências organizacionais, elas tomaram iniciativa para conceber aprimoramentos efetivos pelo domínio da situação (aspecto condicionado pelas competências), bem como tiveram a disposição para assumir riscos inerentes à liderança informal e à orientação empreendedora. Além disso, foram assertivas em suas propostas, por meio de uma argumentação objetiva e técnica alinhada com valores culturais da Alfa.

Estilo de gestão híbrido e comportamentos adaptativos

Concernente aos estilos de gestão, destaca-se o uso da delegação de atividades realizada por Laura, a fim de conciliar o desenvolvimento da área de comunicação interna na empresa com a prioridade da gestão superior que era a comunicação corporativa. Laura considera que obteve, ainda, outros benefícios para que se consolidasse como líder com essa prática de gestão: ter uma visão global mais acurada dos projetos e evitar sobrecarga de trabalho, bem como alcançar a adesão e a capacitação dos subordinados, conforme declara: “As pessoas da minha equipe comentavam que eu desenvolvia pessoas”.

Embora se trate de uma prática que possui atributos de agência e comunais, as mulheres em cargos de gestão tendem a delegar atividades em menor proporção que os homens, por relacionarem a prática a uma conduta de agência e a elementos pejorativos, bem como experimentam mais frequentemente sentimento de culpa quando o fazem (Akinola, Martin, & Phillips, 2018Akinola, M., Martin, A. E., & Phillips, K. (2018). To delegate or not to delegate: gender differences in affective associations and behavioral responses to delegation. Academy of Management Journal, 61(4), 1467-1491. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amj.2016.0662
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). A relevância desse recurso é constatada diante dos benefícios que pode promover no depoimento de Laura, que demonstra uma visão positiva e híbrida do assunto.

Salienta-se ainda como Ana manejou sua divergência com o modelo de liderança predominante na Alfa. Ela percebe que o estilo de liderança muitas vezes demandado pela cultura e dinâmica organizacional - centralizador - era diferente do que preferia assumir. Essa questão aparentemente não afetou seu reconhecimento como líder, uma vez que ela se adaptava e revertia os estilos de liderança conforme a situação que se apresentava, o que denota uma postura pragmática relativa à agência.

A empresa te cobra um posicionamento, principalmente quando tu trabalhas em produção, quando trabalhas com prazos curtos. Então, às vezes, tu precisas de uma liderança mais firme e não tão participativa [….], então, tinha que estar sempre vendo ali qual [estilo de liderança] que tu irias aplicar para não criar problema (Ana).

Estereótipos de gênero estão na raiz do entendimento de que há comportamentos “masculinos” e “femininos” (Bourdieu, 2020Bourdieu, P. (2020). A dominação masculina. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.; Eagly, 1987Eagly, A. H. (1987). Sex differences in social behavior: a social-role interpretation. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum.) e atribuem a mulheres e homens expectativas sobre características e condutas compatíveis com os seus papéis tradicionais, respectivamente, donas de casa e provedores (Eagly, Wood, & Diekman, 2000Eagly, A. H., Wood, W., & Diekman, A. B. (2000). Social role theory of sex differences and similarities: a current appraisal. In T. Eckes, & H. M. Trautner (Eds.), The developmental social psychology of gender (pp. 123-174). Mahwah, NJ: Erlbaum.). No protótipo de líder, ou no conjunto de atributos típicos desse papel conforme o entendimento das pessoas em geral, predominam comportamentos associados à masculinidade (Koenig et al., 2011Koenig, A. M., Eagly, A. H., Mitchell, A. A., & Ristikari, T. (2011). Are leader stereotypes masculine? A meta-analysis of three research paradigms.Psychological Bulletin, 137(4), 616-642. Recuperado de https://doi.org/10.1037/a0023557
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). Em resposta a essas crenças e à observação dos comportamentos do grupo social detentor do poder no contexto da empresa, as entrevistadas buscam suprimir certos atributos associados à feminilidade e incorporar o modelo masculino predominante, a exemplo do que apontam outros estudos (Bruschini & Puppin, 2004Bruschini, M. C. A., & Puppin, A. B. (2004). Trabalho de mulheres executivas no Brasil no final do século XX. Cadernos de Pesquisa, 34(121), 105-138. Recuperado de https://doi.org/10.1590/S0100-15742004000100006
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; Lombardi, 2006Lombardi, M. R. (2006). Engenheira e gerente; desafios enfrentados por mulheres em posições de comando na área tecnológica. Revista Tecnologia e Sociedade, 2(3), 63-86. Recuperado de https://doi.org/10.3895/rts.v2n3.2485
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; Meister et al., 2017Meister, A., Sinclair, A., & Jehn, K. A. (2017). Identities under scrutiny: how women leaders navigate feeling misidentified at work. The Leadership Quarterly, 28(5), 672-690. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2017.01.009
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). Assim, o comportamento de Ana se desvencilhava do estereótipo feminino no ambiente operacional majoritariamente masculino em que atuava, como comenta: “Eu nunca fui frágil! [...] se tivesse que levantar carga, eu levantava, não tinha essas ‘frescurites’ como algumas mulheres”. Nesses setores, a noção de virilidade é associada à força física e ao destemor, enquanto a de feminilidade, à fragilidade (Barreto, 2006Barreto, M. M. S. (2006). Violência, saúde e trabalho: uma jornada de humilhações. São Paulo, SP: EDUC.; Hirata & Kergoat, 2002Hirata, H., & Kergoat, D. (2002). Relações sociais de sexo e psicopatologia do trabalho. In H. Hirata(Org.), Nova divisão sexual do trabalho: um olhar voltado para a empresa e a sociedade (pp. 233-271). São Paulo, SP: Boitempo Editorial.).

Além de fatores agênticos e comunais, os estereótipos de gênero que afetam a mulher na liderança também englobam fatores emocionais. Desse modo, as mulheres são vistas como incapazes de controlar suas emoções e evitar que elas influenciem significativamente seus atos e entendimentos, enquanto os homens são tidos como mais racionais e pragmáticos, logo, como líderes, mais adequados (Brescoll, 2016Brescoll, V. L. (2016). Leading with their hearts? How gender stereotypes of emotion lead to biased evaluations of female leaders. The Leadership Quarterly, 27(3), 415-428. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2016.02.005
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).

Laura se dava conta de que havia uma “adaptação ao ambiente” espontânea em sua conduta e na de outras mulheres. Nesse sentido, procurava restringir a expressão de suas emoções, sendo menos “efusiva” e mais “sóbria”, logo, mais condizente com a imagem de líder e de masculinidade ligada ao controle emocional (Brescoll, 2016Brescoll, V. L. (2016). Leading with their hearts? How gender stereotypes of emotion lead to biased evaluations of female leaders. The Leadership Quarterly, 27(3), 415-428. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2016.02.005
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).

Em alguns momentos, a gente percebe que em volta só tem homens; você fica… você percebe, nossa, só tem eu de mulher […]. Naturalmente, a gente acaba, quando está num ambiente muito masculinizado, sendo menos efusiva na forma de se comunicar. A gente acaba ficando um pouco mais sóbria porque os homens são mais assim. Então, a gente vai tendo uma adaptação ao ambiente. Você acaba se comportando mais parecido com a maioria (Laura).

De acordo com os estereótipos de gênero, a feminilidade é associada à submissão, à afabilidade, enquanto a virilidade está ligada à agressividade, ao comando (Bourdieu, 2020Bourdieu, P. (2020). A dominação masculina. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.; Eagly, 1987Eagly, A. H. (1987). Sex differences in social behavior: a social-role interpretation. Hillsdale, NJ: Lawrence Erlbaum.). Ao se relacionar com outras pessoas da empresa, Ângela mantinha uma postura mais próxima dos atributos de masculinidade, o que a defendia de condutas hostis e mesmo as prevenia; eventualmente, também viabilizava o seu comando em certas situações.

Os homens tinham até medo de mim […] tu ouves piadinhas […] “não contrata mulher porque mulher engravida!”, “porque ela está de TPM”. […]. Se falasse diretamente isso, diretamente alguma coisa que eu não gostasse, na mesma hora, na hora, ia tomar […]. Eu sempre fui uma mulher muito dura, meio grossa, até. Eu colocava cada um no seu lugar […]. Eu tinha resistência durante alguns processos […] para fazer auditoria dos escritórios, tive problema a ponto de chegar e falar: “o negócio é o seguinte, ou tu me respondes ou eu vou ligar para o diretor ou o vice-presidente!” […]. Era uma auditoria com homens e para homens […], mas fizeram todos. Eu tenho certeza de que, se eu fosse homem, nessa hora, eles não iriam me tratar daquela forma (Ângela).

Expressar emoções relacionadas com o poder, como a raiva, parece ser importante para a afirmação como líder, mas, para as mulheres, pode ser prejudicial, por serem contraesteriotípicas. Na liderança, gerenciar, de maneira adequada, a expressão de emoções, tanto a intesidade quanto o tipo, é particularmente desafiador para as mulheres, pois se demonstrarem emoções esperadas em um líder, podem ser rejeitadas ao contrariarem seu papel de gênero, assim como a manifestação de qualquer nível de emoção pode reforçar o estereótipo de serem emotivas em excesso para exercer a liderança (Brescoll, 2016Brescoll, V. L. (2016). Leading with their hearts? How gender stereotypes of emotion lead to biased evaluations of female leaders. The Leadership Quarterly, 27(3), 415-428. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2016.02.005
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). No presente estudo, observamos que a adoção de comportamentos similares à masculinidade nesse aspecto parece ter viabilizado o reconhecimento das entrevistadas como líderes.

Suporte/patrocínio de lideranças

Um fator influente para o reconhecimento da liderança de Laura, Ângela e Ana foi ter o suporte ou patrocínio das chefias imediatas para que desenvolvessem suas propostas. No caso das duas primeiras, esse apoio foi de grande relevância para que elas obtivessem uma ascensão formal. Laura diz sobre isso:

O meu gerente, desde o começo, ele já viu, já deu respaldo para aquilo que eu estava fazendo, para o trabalho que eu estava fazendo e que era de muita qualidade. […] Desde o início, ele foi atrás para que a atualização [o reenquadramento formal] fosse feita da maneira apropriada […] Ele sempre confiou completamente em mim.

Sobre sua relação com o chefe, Ângela avalia: “Eu tinha uma sintonia bem legal com ele. Era o meu “paizão” dentro da empresa”. Salienta-se que o superior exercia grande influência na organização e assumiu, após certo tempo, um cargo de direção, para o qual Ângela passou a se reportar diretamente; uma situação bastante propícia para que pudesse desenvolver e manter sua liderança na empresa.

Fernanda não pôde contar com uma postura proativa do seu chefe imediato para que fosse reconhecida formalmente no cargo que exercia, e exigiu a mudança, assumindo uma postura agêntica: “Foi uma cobrança ao meu gestor direto”. Entretanto, tinha um relacionamento bom com ele em outros aspectos: “Quando eu pedia as coisas para ele, ele se movia e fazia”, o que pode ter possibilitado sua trajetória. Outrossim, ela acredita que a demora de quatro anos para a primeira ascensão hierárquica foi importante para ser aceita e bem-sucedida como líder nos cargos de gestão que assumiu, pois o acúmulo de aprendizado e experiência técnica adquirido no período possibilitou que alcançasse excelência em seu desempenho, como mostra o trecho abaixo. Novamente, constata-se que a mulher precisa demonstrar um desempenho notoriamente superior à média para ascender (Eagly & Carli, 2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.).

Eu já era gestora. A gente estava com um problema técnico com um cliente e o meu diretor disse: “Vou te mandar os meus dois melhores funcionários, meus dois melhores recursos para resolver o problema”. Daí, fui eu e um colega meu. Então, isso foi uma coisa que me deixou feliz: ser considerada um dos melhores recursos da empresa (Fernanda).

Nesse comentário de Fernanda, identifica-se mais uma demonstração visível, clara e crível de granting (concessão) de liderança por parte de superiores - como já mencionado sobre as reuniões em que Laura participava. Tal concessão foi baseada na confiança nas competências de ambas perante membros do topo hierárquico. Comportamentos provisórios de concessão como esses estimulam a continuidade de comportamentos de claiming (reinvidicação) recíprocos (DeRue & Ashford, 2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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).

Em dois anos, Fernanda foi promovida novamente após certo tempo de atuação informal no novo cargo. Ao longo de sua trajetória, expandiu sua atuação: da gestão de dois produtos e do comando de em torno de dez subordinados na primeira chefia, tornou-se responsável por 12 produtos - alguns críticos para o desempenho organizacional - e pela coordenação de mais de 40 engenheiros. Para isso, foi importante que Fernanda alcançasse certo prestígio na empresa e o reconhecimento de pessoas influentes, as quais intercederam, em diversos momentos, para que ela ampliasse a abrangência e o poder de decisão de suas atribuições. O suporte e o patrocínio de lideranças formais e informais foram fatores que contribuíram para a progressão de suas funções, como se observa no trecho a seguir.

Eu tinha o respeito de algumas pessoas que eram influenciadoras lá dentro da empresa. Talvez eu tenha conseguido ascender tanto, subir tanto e ter tantos produtos exatamente por causa disso, porque tinha outras pessoas que falavam isso, que a pessoa mais adequada era eu (Fernanda).

Na trajetória de Laura, o relacionamento com membros de outros setores da empresa também foi relevante para a sua liderança. Ela almejava uma integração maior do Setor de Comunicação, em que estava inserida, com o restante da Alfa sob uma gestão sistêmica, de modo que promovia o engajamento ao objetivo com persuasão junto a sua equipe e aos gestores de várias áreas, além de concretizar parcerias.

Eu comecei a envolvê-los [os membros de outros setores] desde o início do processo; aí, eles se sentiram muito mais incluídos […] porque, na minha visão, transformar essas relações não era só para trazer benefícios para o marketing, era para trazer benefícios para a empresa como um todo […] o ganho foi coletivo. […] Eu trouxe essa visão [para os subordinados]: […] “O nosso valor vai estar em quanto mais a gente der suporte para as outras áreas […] assim a gente vai se fortalecer” (Laura).

A busca pela integração com outras áreas e a demonstração de uma postura voltada a interesses coletivos foram importantes não somente para que ela alcançasse o objetivo organizacional, mas também para o exercício de sua liderança. “Eu me sentia muito realizada profissionalmente porque tinha uma autonomia muito grande”. Assim, observamos a relevância do networking para a ascensão feminina, em consonância com autores já citados. Para Fernanda e Laura, a coordenação de pessoas externas aos seus setores favoreceu esse aspecto.

Sublinha-se que, embora em uma empresa tipicamente masculina, estar inserida em um setor compatível com estereótipos de gênero contribuiu para a ascensão de Laura, em função de ter minimizado a resistência dos superiores e de não estar como minoria naquele ambiente específico, apesar de o gerente e o vice-presidente da área serem homens e engenheiros. Nesse sentido, as avaliações de desempenho de mulheres que atuam em áreas de linha tendem a ser piores que nas de staff, em função da incompatibilidade maior percebida entre os estereótipos dirigidos a elas e as exigências dos cargos (Lyness & Heilman, 2006Lyness, K. S., & Heilman, M. E. (2006). When fit is fundamental: performance evaluations and promotions of upper-level female and male managers.Journal of Applied Psychology, 91(4), 777-785. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0021-9010.91.4.777
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).

O próprio vice-presidente sempre via valor em ter homens e mulheres na área de marketing […] Sempre fez, inclusive, comentários de quanto as mulheres tinham sensibilidade para perceber coisas que eles não tinham […] apesar de a maioria da empresa ser formada por homens [...] No Departamento de Marketing como um todo, a gente tinha um equilíbrio (Laura).

Dessa forma, fatores de discriminação podem ser menos evidentes, como observamos no comentário de Laura: “Eu sinceramente nunca senti nenhuma dificuldade em interagir com eles e ser respeitada ou ter a confiança deles por ser mulher em nenhum momento”. Características tipicamente atribuídas a mulheres têm sido valorizadas em discursos organizacionais, mas desde que elas estejam inseridas em setores consoantes o arquétipo feminino e abaixo do topo hierárquico (Calás & Smircich, 2007Calás, M. B., & Smircich, L. (2007). Do ponto de vista da mulher: abordagens feministas em estudos organizacionais. In S. R. Clegg, C. Hardy, & W. Nord. (Orgs.), Handbook de estudos organizacionais (Vol. 1, Cap. 10, pp. 273-331). São Paulo, SP: Atlas .).

DISCUSSÃO E CONSIDERAÇÕES FINAIS

Conforme o modelo de DeRue e Ashford (2010DeRue, D. S., & Ashford, S. J. (2010). Who will lead and who will follow? A social process of leadership identity construction in organizations. The Academy of Management Review, 35(4), 627-647. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amr.35.4.zok627
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), o processo de construção da identidade de líder se desenvolve por meio de interações sociais. Essas interações não ocorrem de forma neutra; elas sofrem a influência dos estereótipos e dos preceitos normativos de gênero. Dessa forma, as mulheres enfrentam maiores dificuldades e desafios para obter a concessão da liderança - especialmente em segmentos organizacionais majoritariamente masculinos (Eagly & Karau, 2002Eagly, A. H., & Karau, S. J. (2002). Role congruity theory of prejudice toward female leaders. Psychological Review, 109(3), 573-598. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0033-295X.109.3.573
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). Nesse sentido, a primeira etapa da pesquisa apresenta um panorama organizacional marcado por grandes adversidades impostas às mulheres na empresa estudada e indica que o percurso rumo à concessão da liderança era bem mais complexo e menos explícito para elas do que para os homens.

Ao se analisarem as trajetórias das profissionais que chegaram à liderança no contexto apresentado, conclui-se que elas terem assumido atributos e comportamentos predominantemente considerados de agência, como assertividade, iniciativa, disposição de assumir riscos, objetividade e domínio da situação, foi fundamental para deflagrar o processo que levou à concessão da liderança. Essas observações vão de encontro a proposições no campo de que a demonstração do comportamento de agência teria uma correspondência com a ascensão a cargos de gestão menos evidente para mulheres (Frear et al., 2018Frear, K., Paustian-Underdahl, S. C., Heggestad, E. D., & Walker, L. S. (2018). Gender and career success: a typology and analysis of dual paradigms. Journal of Organizational Behavior, 40(4), 400-416. Recuperado de https://doi.org/10.1002/job.2338
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) e de que um alto nível de agência prejudicaria as chances de as mulheres ascenderem como líderes (Eagly & Karau, 2002Eagly, A. H., & Karau, S. J. (2002). Role congruity theory of prejudice toward female leaders. Psychological Review, 109(3), 573-598. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0033-295X.109.3.573
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; Schock et al., 2019Schock, A. K., Gruber, F. M., Scherndl, T., & Ortner, T. M. (2019). Tempering agency with communion increases women’s leadership emergence in all women groups: evidence for role congruity theory in a field setting. The Leadership Quartely, 30(2), 189-198. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2018.08.003
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).

Nesse sentido, Eagly e Carli (2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.) acreditam que em ambientes predominantemente masculinos, as mulheres deveriam priorizar o comportamento de agência, mas, paralelamente, demonstrar atributos comunais na medida em que não sejam vistas como fracas. Porém, os depoimentos sugerem que o que determina a constituição da liderança de mulheres nesses contextos é o predomínio do comportamento agêntico associado a atributos comunais que assumam uma orientação colaborativa e coletiva. Assumir esse tipo de conduta tida como menos ameaçadora, assim como o estilo de gestão híbrido, foi favorável para o reconhecimento da liderança das entrevistadas (Meister et al., 2017Meister, A., Sinclair, A., & Jehn, K. A. (2017). Identities under scrutiny: how women leaders navigate feeling misidentified at work. The Leadership Quarterly, 28(5), 672-690. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2017.01.009
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) ao amenizar a divergência entre os papéis de líder e de gênero (Bourdieu, 2020Bourdieu, P. (2020). A dominação masculina. Rio de Janeiro, RJ: Bertrand Brasil.; Eagly & Karau, 2002Eagly, A. H., & Karau, S. J. (2002). Role congruity theory of prejudice toward female leaders. Psychological Review, 109(3), 573-598. Recuperado de https://doi.org/10.1037/0033-295X.109.3.573
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). Portanto, ao menos para as mulheres em um segmento majoritariamente masculino, as observações do estudo contrariam a conclusão de que o comportamento de agência tem um impacto positivo e o comunal negativo em relação à emergência da liderança, e que isso determinaria o hiato entre homens e mulheres nessa questão (Badura et al., 2018Badura, K., Grijalva, E., Newman, D. A., Yan, T., & Jeon, G. (2018). Gender and leadership emergence: a meta-analysis and explanatory model. Personnel Psychology. 71(3), 335-367. Recuperado de https://doi.org/10.1111/peps.12266
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).

Em linha com as análises do presente estudo, outra pesquisa, também realizada com engenheiros da área de tecnologia (Guillén, Mayo, & Karelaia, 2018Guillén, L., Mayo, M., & Karelaia, N. (2018). Appearing self-confident and getting credit for it: why it may be easier for men than women to gain influence at work. Human Resource Management, 57(4), 839-854. Recuperado de https://doi.org/10.1002/hrm.21857
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), verificou que um atributo específico de agência - a autoconfiança - favoreceu diretamente o ganho de influência pelos homens na organização, enquanto, para as mulheres, esse resultado dependia de uma orientação em prol do coletivo.

Cabe observar que modelos explicativos que assumem que homens são mais agênticos e mulheres mais comunais (Badura et al., 2018Badura, K., Grijalva, E., Newman, D. A., Yan, T., & Jeon, G. (2018). Gender and leadership emergence: a meta-analysis and explanatory model. Personnel Psychology. 71(3), 335-367. Recuperado de https://doi.org/10.1111/peps.12266
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) reforçam a naturalização de estereótipos de gênero e contribuem para perpetuar a disparidade quanto à ocupação de posições de poder entre homens e mulheres. Ressalta-se, ainda, que o presente estudo aborda o assunto sob uma perspectiva individualmente adaptativa a uma condição cuja origem envolve dimensões muito mais amplas. Tal condição não será sanada sem o questionamento de toda a estrutura manifesta nas mais diversas esferas de nossa sociedade que sustenta a desigualdade de oportunidades entre homens e mulheres. Salienta-se que o desenvolvimento de uma identidade coletiva entre as mulheres é necessário para o desmantelamento dessa estrutura; o trabalho por si só não é suficiente para libertá-las, haja vista que o trabalho feminino foi constante ao longo da história, assim como a opressão sobre elas (Beauvoir, 1980Beauvoir, S. (1980). O segundo sexo. Rio de Janeiro, RJ: Nova Fronteira.). No campo dos estudos organizacionais, esse assunto é mais diretamente tratado pela teoria crítica e pela abordagem pós-modernista (Alvesson & Deetz, 2001Alvesson, M., & Deetz, S. (2001). Teoria crítica e abordagem pós-modernista para estudos organizacionais. In R. S. Clegg, C. Hardy, & W. Nord (Orgs.), Handbook de estudos organizacionais: reflexões e novas direções (v. 1, pp. 132-145). São Paulo, SP: Atlas.).

Como limitações do estudo, em função da passagem de tempo e da natureza retrospectiva dos relatos da segunda etapa, é possível que tenham ocorrido esquecimentos de eventos e outros aspectos relevantes para o propósito da pesquisa. Estudos futuros sobre o tema devem incluir superiores, pares e subordinados, a fim de abranger a perspectiva de quem concede a liderança. Particularmente nos segmentos de ciência, tecnologia, engenharia e matemática, nos quais a representação feminina ainda é reduzida, novas pesquisas devem aprofundar o conhecimento sobre as barreiras e condicionantes da construção social da identidade de líder para mulheres, tanto da perspectiva de mulheres e seus comportamentos de reinvindicação quanto de homens e aspectos que restringem a concessão dessa identidade às mulheres que atuam nesses setores.

Ao mesmo tempo em que é exigido das mulheres profissionais conciliar, de alguma maneira, os estilos de agência e comunal para obter a concessão da liderança (Eagly & Carli, 2007Eagly, A. H., & Carli, L. L. (2007). Through the labyrinth: the truth about how women become leaders. Boston, MA: Harvard Business School Publishing Corporation.; Zheng et al., 2018Zheng, W., Kark, R., & Meister, A. L. (2018). Paradox versus dilemma mindset: a theory of how women leaders navigate the tensions between agency and communion. The Leadership Quarterly, 29(5), 584-596. Recuperado de https://doi.org/10.1016/j.leaqua.2018.04.001
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), como ocorreu com as entrevistadas, é possível que o agir agêntico delas tenha que se destacar não apenas na forma, mas também em frequência e intensidade com relação ao dos homens, para que seja enxergado e reconhecido como tal. Do mesmo modo, para que possam superar as barreiras da discriminação quanto à sua capacidade de desempenhar o papel de líder, pode ser que as mulheres precisem apresentar resultados gerenciais em um nível mais elevado e distintivo do que os homens. Recomenda-se que esse tema seja aprofundado em novos estudos com fins comparativos.

Cabe salientar que as entrevistadas que ascenderam formalmente no presente caso adotaram a estratégia de roleshaping, ao visarem resultados globais inovadores e relevantes. Essa estratégia requer a participação de outros agentes e a formação de alianças de apoio (Bowles et al., 2019Bowles, H. R., Thomason, B., & Bear, J. B. (2019). Reconceptualizing what and how women negotiate for carrer advancement. Academy of Management Journal, 62(6), 1645-1671. Recuperado de https://doi.org/10.5465/amj.2017.1497
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). Foi por meio dela que ocorreu a formação de suporte e patrocínio de lideranças, um fator relevante de ascensão para ambos os sexos, mas consideravelmente menos acessível às mulheres, conforme estudos sobre networking (e.g., Collins & Val Singh, 2006Collins, J., & Singh, V. (2006). Exploring gendered leadership: meanings of successful leadership held by chief executives. In D. MacTavish, & K. Miller (Eds.), Women in leadership and management: a European perspective (pp. 11-31). Cheltenham, UK: Edward Elgar.; Ibarra et al., 2010Ibarra, H., Carter, N. M., & Silva, C. (2010, setembro). Why men still get more promotions than women. Harvard Business Review. Recuperado de https://hbr.org/2010/09/why-men-still-get-more-promotions-than-women
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). Assim, foi por meio do estabelecimento de uma estratégia complexa e desafiadora que as entrevistadas desenvolveram networking e se beneficiaram com ele. É possível que, para as mulheres em um ambiente predominantemente masculino, alcançar networking de modo que ele impulsione sua ascensão requeira esforços mais audaciosos que para os homens. Sugere-se que essas e outras questões sejam investigadas em pesquisas futuras com enfoque comparativo.

AGRADECIMENTOS

A segunda autora agradece o apoio recebido do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPQ) - Bolsa de pesquisa 303871/2021-0(produtividade em pesquisa).

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    22 Set 2023
  • Data do Fascículo
    2023

Histórico

  • Recebido
    20 Jun 2022
  • Aceito
    18 Nov 2022
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