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Variações temporais na estrutura em fitofisionomias de Cerrado e Floresta Estacional Semidecidual em Curvelo, MG

Temporary variations in the structure in phytophysionomies of Cerrado and Semidecidual State Forest in Curvelo, Minas Gerais state

Resumo

Este estudo teve como objetivo analisar a dinâmica da estrutura de espécies arbóreas e relacionar as mudanças com as condições edáficas em fitofisionomias de cerrado stricto sensu (de 2010 a 2015), cerradão (de 2010 a 2015) e floresta estacional semidecidual (de 2011 a 2015) em Curvelo, Minas Gerais. O inventário florestal considerou amostragens do tipo sistemática em 15 unidades amostrais de 20 × 50 metros no cerrado stricto sensu (CSS), 10 unidades amostrais 20 × 50m no cerradão (CD), CAS ≥ 15,7cm) e 25 unidades amostrais de 10 × 40m na floresta estacional semidecidual (FES - CAP ≥ 15,7 cm). Amostras de solo foram coletadas em todas as unidades amostrais para caracterização química e granulométrica. Nas três fitofisionomias, o número de indivíduos ingressantes foi inferior ao de egressos. No CSS, a área basal no inventário final foi superior à área basal inicial (23,675 - 25,845m2/ha), devido ao incremento expressivo dos sobreviventes. Ocorreram reduções na área basal no CD (19,322 - 17,008 m2/ha) e na FES (28,183 - 28,148 m2/ha), decorrente da alta taxa de mortalidade. Nas três fitofisionomias, a mortalidade foi maior nas primeiras classes diamétricas. De forma lenta, o CSS e CD estão se recuperando pós-distúrbio (fogo), estão surgindo novos indivíduos (recrutas) e crescimento diamétrico dos sobreviventes. Durante o intervalo de 5 anos, não foi possível identificar a recuperação do número de indivíduos, enquanto a FES sem distúrbio do fogo, a perda de indivíduos pela mortalidade e a inclusão de novos indivíduos pelo recrutamento foram mais equilibradas.

Palavras-chave:
Inventário contínuo; Dinâmica florestal; Variáveis edáficas; Fogo

Abstract

This study aimed to analyze the structural dynamics of tree species and to relate changes with edaphic conditions in the phytophysiognomies of cerrado stricto sensu (from 2010 to 2015), cerradão (from 2010 to 2015) and seasonal semideciduous forest (from 2011 to 2015) in Curvelo, state of Minas Gerais, Brazil. Forest inventories involved systematic sampling in 15 sample units (20 × 50m) in cerrado strict sensu (CSS), 10 sample units (20 × 50m) in cerradão (CD; CAS ≥ 15.7 cm) and 25 sample units (10 × 40m) in semideciduous seasonal forest (SSF; CAP ≥ 15.7 cm). Soil samples were collected in all sample units for the chemical and granulometric characterization. The number of individuals entering was lower than the total recruitment in all phytophysiognomies. Basal area in the final inventory of CSS was higher than initial basal area (23.675 - 25.845m2/ha), due to a significant increase in the surviving individuals. There were reductions in the basal area for DC (19.322 - 17.008 m2/ha) and SSF (28.183 - 28.148 m2/ha), due to high mortality rates. The mortality was higher for the first diametric classes in all three phytophysiognomies. Individual recruitment and diametric growth of survivors during post fire disturbance recovery was slow for CSS and CD. The number of individuals recovering during a 5-year interval could not be determined, however, without fire disturbance, the loss of individuals due to mortality and the recruitment of new individuals in FES were more balanced.

Keywords:
Continuous inventory; Forest dynamics; Edaphic variables; Fire

Introdução

Os fragmentos florestais estão sujeitos a diferentes impactos sejam eles naturais ou antrópicos (APPOLINÁRIO; OLIVEIRA-FILHO; GUILHERME, 2005APPOLINÁRIO, V.; OLIVEIRA-FILHO, A. T.; GUILHERME, F. A. G. Tree population and community dynamics in a Brazilian tropical semideciduous forest. Revista Brasileira de Botânica, v. 28 n. 2, p. 347-360, 2005.). A expansão das diferentes culturas agrícolas é uma ameaça constante, pois tem levado à devastação das florestas semideciduais na região do cerrado, restando apenas fragmentos isolados (SILVA; ARAÚJO, 2009SILVA, M. R.; ARAÚJO, G. M. Dinâmica da comunidade arbórea de uma floresta semidecidual em Uberlândia, MG, Brasil. Acta Botanica Brasilica, v. 23, n. 1, p. 49-56, 2009.).

No Bioma Cerrado, além dos desmatamentos para inserção das culturas agrícolas, outro fator de perturbação é o fogo (KLINK; MACHADO, 2005KLINK, C. A.; MACHADO, R. B. Conservation of the Brazilian Cerrado. Conservation Biology, v. 19, p. 707-713, 2005.). No entanto, muitas das espécies representantes das fisionomias do Cerrado são naturalmente adaptadas a esse agente perturbador (HOFFMANN et al., 2012HOFFMANN, W. A. et al. Ecological thresholds at the savanna-forest boundary: how plant traits, resources and fire govern the distribution of tropical biomes. Ecology Letters, v. 15, n. 7, p. 759-768, 2012.).

A incidência das queimadas contribui para redução da quantidade de indivíduos, isso causa mudanças na estrutura das populações. Segundo Hoffmann et al. (2009HOFFMANN, W. A. et al. Tree top kill, not mortality, governs the dynamics of savana-forest boundairesunder frequent fire in central Brazil. Ecology, v. 90, p. 1326-1337, 2009.), essas mudanças são reflexo tanto da exclusão quanto da incidência das queimadas.

Conforme Chazdon et al. (2007CHAZDON, R. L. et al. Rates of change in tree communities of secundar Neotropical forests following major disturbances. Philosophical Transactions of the Royal Society B-Biological Sciences, v. 362, p. 273-289, 2007.), existe uma complexa interação entre a regeneração natural e os agentes de perturbação. Eventos de perturbação natural (queda e morte de árvores) causam mudanças nas condições de vida, principalmente na disponibilidade de luz e no meio físico. Esses eventos refletem diretamente na densidade, na morte e nos recrutamentos dos indivíduos das diferentes espécies (DELCAMP et al., 2008DELCAMP, M. et al. Can functional classification of tropical trees predict population dynamics after disturbance? Journal of Vegetation Science, v. 19, p. 209-220, 2008.).

Portanto, estudos relacionados a mudanças temporais em populações vegetais são essenciais, pois por meio desses é possível avaliar as mudanças que ocorrem na estrutura das comunidades vegetais ao longo do tempo. Pelo monitoramento em unidades amostrais permanentes, é possível detectar as possíveis mudanças nos processos transformadores dos fragmentos florestais (HIGUCHI et al., 2008HIGUCHI, P. et al. Dinâmica da comunidade arbórea em um fragmento de floresta estacional semidecidual montana em Lavras, Minas Gerais, em diferentes classes de solos. Revista Árvore, v. 32, p. 417-426, 2008.). Esses estudos se baseiam na análise e na interpretação dos dados de recrutamento, mortalidade e aumento ou redução na área basal, com a função de identificar as mudanças estruturais das comunidades (MAGALHÃES et al., 2017MAGALHÃES, J. H. R.et al. Dinâmica do estrato arbóreo em uma floresta estacional semidecidual em Uberlândia, Minas Gerais, Brasil. Iheringia, v. 72, n. 3, p. 394-402, 2017.).

Dessa maneira, objetivou-se neste trabalho analisar a relação das variáveis edáficas na dinâmica estrutural de espécies arbóreas, em distintas fitofisionomias de cerrado e de floresta estacional semidecidual, que ocorreram em um intervalo de cinco anos de medição (2010 e 2015).

Material e métodos

Este estudo foi desenvolvido na fazenda do Moura, localizada em Curvelo, Minas Gerais. A fazenda possui área aproximada de 436 hectares (ha), encontra-se localizada nas coordenadas geográficas 18°49'26.12"S, 44°24'12.69"O e sobre uma altitude média de 715 metros. O clima da região é do tipo Aw tropical - segundo a classificação de Koppen, temperatura média de 28ºC, índice pluviométrico anual de 1200 mm, concentrados no verão (STRAHLER, 2002STRAHLER, A.; STRAHLER, A. N. Physical geography: science and systems of the human 472 environment. 2nd ed. New York: John Wiley e Sons, 2002. 748 p.).

Na propriedade são encontradas três distintas fitofisionomias: cerrado stricto sensu (CSS), cerradão (CD) e floresta estacional semidecidual (FES).

O CSS se encontra nas coordenadas 18°50'7.26"S, 44°23'33.49"O e possui 54 ha de área onde uma estrada percorre o interior do fragmento. O solo é do tipo Latossolo vermelho distrófico (EMBRAPA, 2004EMBRAPA. Mapeamento de solos e aptidão agrícola das terras do Estado de Minas Gerais. Rio de Janeiro: Centro Nacional de Pesquisa de Solos, 2004.). O estrato herbáceo é composto por gramíneas naturais no interior e gramíneas exóticas nas bordas do fragmento.

O CD se encontra nas coordenadas 18°49'56.11"S, 44°23'6.42"O e possui aproximadamente 80,0 ha sobre relevo aplainado e solo classificado como Latossolo vermelho distrófico (EMBRAPA, 2004EMBRAPA. Mapeamento de solos e aptidão agrícola das terras do Estado de Minas Gerais. Rio de Janeiro: Centro Nacional de Pesquisa de Solos, 2004.). Os fragmentos CSS e CD foram atingidos por um incêndio em toda sua extensão após o inventário 2010 (OTONI et al., 2013OTONI, T. J. O. et al. Componente arbóreo, estrutura fitossociológica e relações ambientais em um remanescente de cerradão, em Curvelo - MG. Cerne, v. 19, n. 2, p. 201-211, 2013.) e, posteriormente, não foi registrado novo indício de incêndio.

Já a FES se encontra nas coordenadas 18°49’21.17”S, 44°23’55.91”O e possui aproximadamente 162 ha, seu estágio sucessional é secundário e se encontra entre as fitofisionomias do CSS e CD e por áreas modificadas pela agricultura. Há histórico de perturbação antrópica, como retirada esporádica de madeira nos últimos quinze anos nas bordas da floresta. Não houve registros de retirada de madeira nas parcelas, sendo registrada apenas queda de árvores causada pelo vento e trilhas de gado no interior da floresta.

Amostragem da vegetação

As fitofisionomias do CSS e CD foram inventariadas no ano de 2010 por Otoni et al. (2013OTONI, T. J. O. et al. Componente arbóreo, estrutura fitossociológica e relações ambientais em um remanescente de cerradão, em Curvelo - MG. Cerne, v. 19, n. 2, p. 201-211, 2013.), onde o autor instalou 15 unidades amostrais permanentes de 20 × 50 m no CSS e 10 unidades amostrais permanentes de 20 × 50 m no CD, distribuídas de maneira sistemática a cada 100 m. Dentro das unidades amostrais, todos os indivíduos com circunferência à altura do solo (CAS) com ≥ 15,7 cm foram identificados e tiveram seus diâmetros mensurados. Indivíduos com caules múltiplos foram mensurados quando a raiz da soma dos quadrados obedeceu ao critério de inclusão CAS ≥ 15,7 cm.

A FES foi inventariada no ano de 2011 por Franco (2012FRANCO, S. A. P. Estrutura e volume de povoamento de um remanescente de floresta estacional semidecidual em curvelo, MG.2012. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, 2012.), onde o autor instalou 25 unidades amostrais permanentes com dimensões de 10 × 40 m distanciadas 30 m entre si. Em cada unidade amostral, os indivíduos vivos com circunferência à altura do peito (CAP) ≥ 15,7 cm foram identificados e tiveram seus diâmetros mensurados. Foram fixadas placas numeradas nos indivíduos que alcançaram o diâmetro estabelecido, para serem monitorados.

A identificação das espécies foi realizada conforme descrito por Franco (2012FRANCO, S. A. P. Estrutura e volume de povoamento de um remanescente de floresta estacional semidecidual em curvelo, MG.2012. Dissertação (Mestrado em Ciência Florestal) - Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri, Diamantina, 2012.) e Otoni et al. (2013OTONI, T. J. O. et al. Componente arbóreo, estrutura fitossociológica e relações ambientais em um remanescente de cerradão, em Curvelo - MG. Cerne, v. 19, n. 2, p. 201-211, 2013.). Assim, foram coletadas exsicatas e posteriormente levadas para a identificação, sendo esta realizada por pesquisas na literatura, por especialistas, ou por comparações com espécimes armazenadas no Herbário Dendrológico Jeanine Felfili (HDJF) da Universidade Federal dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri (UFVJM). A classificação botânica seguiu o sistema APG IV (ANGIOSPERM PHYLOGENY GROUP, 2016ANGIOSPERM PHYLOGENY GROUP IV. An update of the Angiosperm Phylogeny Group classification for the orders and families of flowering plants: APG IV. Botanical Journal of the Linnean Society, v. 181, p. 1-20, 2016.). O nome das espécies foi atualizado usando a Lista de Espécies da Flora do Brasil 2020.

O presente estudo reavaliou as medições dos dois inventários em 2015, utilizando o mesmo critério amostral. Os sobreviventes foram mensurados novamente; os mortos, registrados. Os indivíduos ingressantes (recrutas) foram identificados e tiveram placas fixadas com numeração e coletadas as informações de diâmetro.

Variáveis do solo

Para análise química e granulométrica, foram coletadas cinco amostras compostas de solo (500 gramas) em cada unidade amostral (camada de 0 a 20 cm de profundidade). As análises foram realizadas no Laboratório de Análise de Solos da (UFVJM), conforme o protocolo da EMBRAPA (1997)EMBRAPA. Manual de métodos de análise de solo. 2. ed. Rio de Janeiro,1997..

Variável fogo

Na coleta da variável fogo, foram selecionados 10 indivíduos por unidade amostral do CSS e CD atingidos pelo incêndio. Em seguida, com auxílio de uma trena, foram coletadas as alturas de crestamento dos indivíduos selecionados. Calcularam-se as médias da altura de crestamento por unidade amostral (Metodologia dos próprios autores).

Análise da dinâmica estrutural

Calcularam-se os parâmetros de dinâmica para amostra total, realizados por meio da demografia (contagem) de indivíduos arbóreos e área basal. Foi assumida a soma das áreas seccionais à altura do peito e assumiu-se uma relação circular com o CAS para o CSS, CD e CAP para FES.

Por meio do modelo exponencial proposto por Sheil, Jennings e Savill (2000SHEIL, D.; JENNINGS, S.; SAVILL, P. Long-term permanent plot observations of vegetation dynamics in Budongo, a Ugandan rain forest. Journal of Tropical Ecology, v. 16, n. 6, p. 765-800, 2000.), assim foram, portanto, calculadas as taxas médias anuais dos mortos (M) e recrutas (R), baseando na quantidade de indivíduos, e as médias anuais de perda (P) e ganho (G) de área basal. Por esse modelo, foram assumidas mudanças do tamanho da população por espaço de tempo com proporção constante ao tamanho inicial da população. Para isso, foram usadas as seguintes equações, onde:

M = 1 - N 0 - m / N 0 1 t x 100

R = [ 1 - ( 1 - r / N f ] 1 t x 100

P = { 1 - [ A B 0 - A B m A B d / A B 0 ] 1 t } x 100

G = { 1 - [ 1 - A B r + A B g / A B f ] 1 t } x 100

Em que:

  • N0 e Nf  = número de indivíduos, inventário inicial e final, respectivamente
  • t  = tempo entre inventário inicial e final
  • AB0 e ABf  = áreas basais dos indivíduos nos dois inventários, respectivamente
  • ABm e ABr  = área basal dos mortos e ingressantes, respectivamente
  • ABd - ABg  = área basal do decremento e incremento

A partir das médias das taxas dos mortos, recrutas, perda e ganho, obtiveram-se as taxas de rotatividade (turnover) em número de indivíduos (TN) e área basal (TAB). Isso foi para expressar a mudança global, conforme Korning e Balslev (1994KORNING, J.; BALSLEV, H. Growth and mortality of trees in Amazonian tropical rain forest in Ecuador. Journal of Vegetation Science, v. 4, n. 1, p. 77-86, 1994.) e Oliveira-Filho, Mello e Scolforo (1997)OLIVEIRA-FILHO, A. T.; MELLO, J. M.; SCOLFORO, J. R. S. Efeitos de perturbações e bordas passadas na estrutura e dinâmica da comunidade arbórea dentro de um fragmento de floresta tropical semidecídua no sudeste do Brasil durante um período de cinco anos (1987-1992). PlantEcology, v. 131, n. 1, p. 45-66, 1997..

T N = ( M + R ) / 2

T A B = P + G / 2

Em que:

  • M  = taxa anual dos indivíduos mortos
  • R  = taxa anual dos indivíduos recrutas
  • P e G  = taxa de perda e ganho respectivamente

Foram também calculadas as taxas de mudanças líquidas realizadas conforme Korning e Balslev (1994KORNING, J.; BALSLEV, H. Growth and mortality of trees in Amazonian tropical rain forest in Ecuador. Journal of Vegetation Science, v. 4, n. 1, p. 77-86, 1994.), para área basal (ChAB) e para número de árvores (ChN).

C h A B = [ A B f / A B 0 1 / t - 1 ] x 100

C h n = [ ( N f / N 0 ) 1 / t - 1 ] x 100

Em que:

  • t  = tempo entre o inventário inicial e final, respectivamente
  • N0 e Nf  = número de indivíduos inventário inicial e final, respectivamente
  • AB0 e ABf  = áreas basais dos indivíduos primeiro e segundo inventário

Mudanças nas classes diamétricas

Conforme estudos de dinâmica florestal realizados por Appolinário, Oliveira-Filho e Guilherme (2005APPOLINÁRIO, V.; OLIVEIRA-FILHO, A. T.; GUILHERME, F. A. G. Tree population and community dynamics in a Brazilian tropical semideciduous forest. Revista Brasileira de Botânica, v. 28 n. 2, p. 347-360, 2005.), na dinâmica dos indivíduos por classes diamétricas, empregaram-se intervalos de classes crescentes, para diminuir o forte decréscimo dos indivíduos nas maiores classes de diâmetros.

Para interpretação das mudanças por classe de diâmetro, foram contados os indivíduos que permaneceram na classe, mortos, recrutas, imigração (ingrowth) e emigração (outgrowth) na classe. A imigração e emigração podem ser progressivas ou regressivas (LIEBERMAN et al., 1985LIEBERMAN, D. et al. Mortality patterns and stand turnover rates in a wet tropical forest in Costa Rica. Journal of Ecology, v. 73, n. 5, p. 915-924, 1985.). Mediante comparações entre contagens de Poisson, foram assim calculadas as diferenças entre número de ingressos (recrutas + imigrantes) e indivíduos egressos (mortos + emigrantes) para cada classe de diâmetro por fitofisionomia.

Processamento dos dados

As correlações de Pearson foram empregadas usando combinações entre as variáveis de dinâmica incluindo área basal dos mortos, recrutas e incremento, sendo estas correlacionadas com as variáveis edáficas e variável fogo para o CSS e CD. As análises de correlação foram realizadas por meio do software BioEstat 5.3 (AYRES et al., 2007AYRES, M. et al. BioEstat 5.3: aplicações estatísticas nas áreas das Ciências Biomédicas. Belém: Sociedade Civil Mamirauá, 2007. 324 p.).

Resultados e discussão

No decorrer de cinco anos, foi registrado o decréscimo de 184 indivíduos e de uma espécie (62) no CSS. Nesse mesmo período, o CD apresentou a diminuição de 810 indivíduos, 10 espécies, quatro famílias e incremento de uma nova espécie. Por fim, a FES houve a diminuição de 82 indivíduos arbóreos, três espécies e (uma família), mas com o saldo de duas novas espécies (Tabela 1).

Tabela 1
Mudanças estruturais em diferentes fitofisionomias: Cerrado stricto sensu = CSS, Cerradão = CD e Floresta Estacional Semidecidual = FES, localizados na Fazenda do Moura em Curvelo, Minas Gerais
Table 1
Structural changes in different phytophysiognomies: Cerrado stricto sensu = CSS, Cerradão = CD and Semideciduous Seasonal Forest = FES, located at ‘Fazenda do Moura’ in Curvelo, Minas Gerais state

Conforme a Tabela 1, houve maior redução de indivíduos na comunidade do CD em relação ao CSS e à FES. Houve maior quantidade de recrutas no CSS e menor no CD e na FES. A maior taxa de mortalidade foi no CD em relação ao CSS e à FES. A taxa de mudança foi maior no CD em relação às outras duas fitofisionomias, e a área basal aumentou apenas no CSS, diminuiu no CD e na FES.

Os eventos de fogo e vento ocorridos após o inventário inicial podem ter ocasionado a maior mortalidade de indivíduos nas fitofisionomias de CSS e CD em relação à FES. No entanto, a quantidade de indivíduos mortos no CSS foi inferior à encontrada por Almeida et al. (2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.). Os autores perceberam que a quantidade de indivíduos decresceu com a ocorrência das queimadas em relação aos locais protegidos do fogo, que ocorreu aumento do número de indivíduos (SILVA NETO et al., 2017SILVA NETO, A. et al. Dinâmica da comunidade arbórea em um fragmento de cerrado Sensu Stricto em Minas Gerais, Brasil. Scientia Forestalis, v. 45, n. 113, p. 21-29, 2017.).

A taxa de mortos no CSS foi 2,13% ano-1. Esse valor está dentro do intervalo encontrado em estudos de dinâmica no cerrado, porém tal valor foi inferior aos resultados encontrados por Sato, Gardo e Miranda (1998SATO, M. N.; GARDA, A. A.; MIRANDA, H. S. Fire effects in the mortality rate of woody vegetation in Central Brazil. In: INTERNATIONAL CONFERENCE ON FOREST FIRES RESEARCH, 3., 1998, Coimbra. Proceedings […]. Coimbra: 1998. p. 1777-1784. ), que constataram taxas de mortalidade que variaram entre 6,4% e 13%.

No CSS a rapidez dos processos dinâmicos em número de árvores obtida pela taxa de rotatividade foi de 1,13% ano-1. A exclusão dos indivíduos decorrente da mortalidade refletiu na área basal final a perda foi de 1,587 m2/ha, no entanto foi a menor entre as fitofisionomias estudadas. Almeida et al. (2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.) afirmaram que o incremento em área basal tende a aumentar sem os distúrbios do fogo no Cerrado.

No CSS o incremento dos sobreviventes junto com os recrutas 3,715 m2/ha-1 0,463 m2/ha-1 contribuiu para que a área basal final fosse superior a inicial 23,675 - 25,845 m2/ha. O decremento foi -0,422 m2/ha-1, no entanto a taxa de aumento em área basal foi superior à taxa de perda, isso resultou em mudança líquida positiva. A morte dos indivíduos alterou a estrutura do CSS, no entanto recebeu novos indivíduos recrutados 163, assim a diferença entre a taxa de mortos e recrutas foi de 1% ano-1.

A redução de indivíduos foi mais alta no CD com 904 indivíduos mortos, isso contribuiu para elevar a taxa de mortalidade 8,84% ano-1. Foram inclusos 94 indivíduos pelo recrutamento, a rotatividade foi de 5,01% ano-1 (Tabela 1). No entanto, o CD demonstrou ser resiliente, pois surgiram novos indivíduos que não foram amostrados neste inventário pelo critério de inclusão e provavelmente deverão ser incluídos na próxima remedição. Foi observado que o CD produz muita matéria morta e, em uma possível ocorrência de incêndio, pode aumentar a quantidade de indivíduos mortos, por isso deve ser protegido do fogo.

As informações na Tabela 1 mostram que a perda de indivíduos no CD resultou na redução de 4,863 m2/ha na área basal final. Nos dois inventários, a área basal foi de 19,322 - 17,008 m2/ha, respectivamente, no entanto essa diferença não foi mais acentuada, porque os sobreviventes aumentaram significativamente seus diâmetros 4,063 m2/ha-1, os recrutas somaram 0,284 m2/ha-1 de área basal, o decremento foi de -0,202 m2/ha-1. Ivanauskas, Monteiro e Rodrigues (2003IVANAUSKAS, N. M.; MONTEIRO, R.; RODRIGUES, R. R. Alterations following a fire in a Forest community of Alto Rio Xingu (Mato Grosso, Brazil). Forest Ecology and Management, v. 184, p. 239-250, 2003.) afirmam que de fato os sobreviventes são favorecidos pela adição de nutrientes acelerados pelo fogo, que aumenta o processo de lixiviação dos minerais da camada de serapilheira, ou seja, após um incêndio, há um aumento na concentração de nutrientes no solo. O crescimento dos sobreviventes compensou a perda de área basal dos mortos, possivelmente a abertura da vegetação, resultado da mortalidade, tenha favorecido o crescimento dos sobreviventes.

Na FES, a estrutura variou pouco no período avaliado, a taxa de recrutamento foi inferior à taxa de mortalidade. Em uma unidade amostral, ocorreu queda de indivíduos provocada naturalmente pelo vento. Nessa unidade amostral, a metade dos indivíduos morreu, isso contribuiu para elevar a taxa de mortalidade. Observou-se também que nessa unidade referida, o surgimento de novos recrutas que não alcançaram o diâmetro mínimo estabelecido neste inventário.

Segundo Machado e Oliveira-Filho (2010MACHADO, E. L. M.; OLIVEIRA-FILHO, A. T. Os padrões espaciais da dinâmica da comunidade arbórea são detectáveis em um fragmento pequeno (4 ha) e perturbado da Mata Atlântica brasileira. Acta Botanica Brasilica, v. 24, n. 1, p. 250-261, 2010.), quando se reduz a densidade também se diminui a competição, o que é compensado pelo ganho diamétrico dos sobreviventes. No entanto, a perda dos indivíduos interferiu pouco na área basal: no primeiro inventário foi 28,183 m2/ha e ela diminuiu para 28,148 m2/ha no segundo inventário. Resultados parecidos foram encontrados por Machado e Oliveira-Filho (2010)MACHADO, E. L. M.; OLIVEIRA-FILHO, A. T. Os padrões espaciais da dinâmica da comunidade arbórea são detectáveis em um fragmento pequeno (4 ha) e perturbado da Mata Atlântica brasileira. Acta Botanica Brasilica, v. 24, n. 1, p. 250-261, 2010. e por Mews et al. (2011MEWS, H. A. et al. Dinâmica da comunidade lenhosa de cerrado típico na região nordeste do estado de Mato Grosso, Brasil. Biota Neotropica, v. 11, n. 1, p. 73-82, 2011.) em Floresta Estacional Semidecidual, com o mesmo intervalo de tempo empregado neste estudo. Já os resultados encontrados por Figueiredo et al. (2013FIGUEIREDO, L. T. M. et al. Alterações florísticas em uma floresta estacional semidecidual no município de viçosa - MG entre 1994 e 2008. Floresta, v. 43, n. 2, p. 169-180, 2013.) mostram que, no primeiro inventário área basal 26,15 m2/ha foi inferior a 27,51m2/ha encontradas no segundo inventário.

Já a mudança líquida sofreu uma leve redução, no entanto foi compensada pelos recrutas e incremento dos sobreviventes. Segundo Machado e Oliveira Filho (2010MACHADO, E. L. M.; OLIVEIRA-FILHO, A. T. Os padrões espaciais da dinâmica da comunidade arbórea são detectáveis em um fragmento pequeno (4 ha) e perturbado da Mata Atlântica brasileira. Acta Botanica Brasilica, v. 24, n. 1, p. 250-261, 2010.), a redução de indivíduos também pode ser interpretada como parte do processo de competição entre eles ou do próprio ciclo de vida.

A Tabela 2 mostra que as modificações foram mais intensas nas classes diamétricas iniciais (5 - 10 e 10 - 20cm), seja pela mortalidade ou pelas mudanças para classes posteriores. Mesmo utilizando intervalos de classes crescentes, a distribuição diamétrica apresentou-se na forma do J-invertido nos dois inventários, indicando o surgimento de recrutas.

Os resultados indicam que os indivíduos nos primeiros intervalos de classes mostraram ser menos resistentes ao impacto do fogo e possivelmente à competição, mudanças tanto pelo crescimento para outras classes como pela mortalidade foram maiores nos primeiros intervalos de classes. Isso indica a dificuldade do surgimento e estabelecimento dos recrutas, que pode estar surgindo de maneira lenta. Ribeiro et al. (2012RIBEIRO, M. N. et al. Fogo e dinâmica da comunidade lenhosa em cerrado sentido restrito, Barra do Garças, Mato Grosso. Acta Botanica Brasilica, v. 26, n. 1. p. 203-217, 2012.) também notaram mudanças semelhantes nos primeiros intervalos de classes após a passagem de fogo.

No intervalo da primeira classe (5 a 10 cm) os egressos (emigrantes + mortos) foram superiores aos ingressantes (imigrantes + recrutas). Separadamente, os eventos migratórios (imigrantes + emigração), foram mais intensos no CSS, seguido pelo CD e pela FES, (Tabela 2).

Tabela 2
Mudanças estruturais em fitofisionomias de Cerrado stricto sensu (CSS), Cerradão (CD) e Floresta estacional semidecidual (FES)
Table 2
Structural changes in Cerrado stricto sensu (CSS), Cerradão (CD) and Semidecidual seasonal forest (FES)

O padrão de distribuição diamétrica neste estudo é comum de comunidades consideradas autorregenerativas, como citadas por Lopes, Vale e Shiavini (2009LOPES, S. F.; VALE, V. S.; SHIAVINI, I. Efeito de queimadas sobre a estrutura e composição da comunidade vegetal lenhosa do cerrado sentido restrito em Caldas Novas, GO. Revista Árvore, v. 33, n. 4, p. 695-704, 2009.), em que grande parte dos indivíduos está distribuída nos primeiros intervalos de classes, conforme resultados encontrados por Mews et al. (2011MEWS, H. A. et al. Dinâmica da comunidade lenhosa de cerrado típico na região nordeste do estado de Mato Grosso, Brasil. Biota Neotropica, v. 11, n. 1, p. 73-82, 2011.) e Almeida et al. (2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.).

No primeiro intervalo de classe, a mortalidade ficou acima dos valores esperados. Além disso, houve passagens de indivíduos para classes diamétricas superiores. Resultados semelhantes foram encontrados por Almeida et al. (2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.). A chegada de novos indivíduos (recrutas + imigrantes) vindos de outras classes foi maior no segundo intervalo de classe.

Nas maiores classes, as mudanças foram menos acentuadas. No CD e no CSS, os resultados revelam que os indivíduos maiores foram mais resistentes aos distúrbios. Segundo Hoffmann et al. (2012HOFFMANN, W. A. et al. Ecological thresholds at the savanna-forest boundary: how plant traits, resources and fire govern the distribution of tropical biomes. Ecology Letters, v. 15, n. 7, p. 759-768, 2012.), indivíduos maiores têm mais possibilidades de sobreviver aos distúrbios.

Pela contagem de Poisson, as mudanças dos indivíduos entre as classes diamétricas mostraram que, nos três primeiros intervalos de classes, as mudanças foram significativas, tanto no CD quanto no CSS. Na maior classe, as mudanças foram menos intensas, enquanto na FES as mudanças foram maiores no primeiro e terceiro intervalo de classe e não significativa na segunda e quarta classe, respectivamente. As mudanças foram mais pronunciadas na primeira classe. Provavelmente, a competição é maior entre os indivíduos menores, isso provoca mortalidade entre eles, enquanto os sobreviventes são favorecidos pelo aumento de espaço e disponibilidade de nutrientes, e com o tempo ganham biomassa e mudam para os intervalos de classes maiores. À medida que aumentaram os diâmetros, diminuiu a mortalidade, como observado por Mews et al. (2011MEWS, H. A. et al. Dinâmica da comunidade lenhosa de cerrado típico na região nordeste do estado de Mato Grosso, Brasil. Biota Neotropica, v. 11, n. 1, p. 73-82, 2011.).

Já o número de indivíduos ingressantes (emigrantes) foi superior ao de egressos no segundo intervalo de classe no CSS. Alguns estudos mostram que as fitofisionomias de Cerrado protegido das queimadas podem favorecer o adensamento da vegetação (RIBEIRO et al., 2012RIBEIRO, M. N. et al. Fogo e dinâmica da comunidade lenhosa em cerrado sentido restrito, Barra do Garças, Mato Grosso. Acta Botanica Brasilica, v. 26, n. 1. p. 203-217, 2012.; ALMEIDA et al., 2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.), à medida que reduziu a frequência das queimadas surgiram indivíduos de espécies menos resistentes ao fogo. Portanto, as altas taxas de mortalidade são decorrentes das espécies menos resistentes ao fogo, como, por exemplo, Roupala montana, Styrax ferrugineus e Myrsine guianensis (ALMEIDA et al., 2014ALMEIDA, R. F. et al. Mudanças florísticas e estruturais no cerrado sensu stricto ao longo de 27 anos (1985-2012) na Fazenda Água Limpa, Brasília, DF. Rodriguésia, v. 65, n. 1, p. 1-19, 2014.; RIOS et al., 2018RIOS, M. N. S. et al. Mudanças pós-fogo na florística e estrutura da vegetação arbóreo arbustiva de um cerrado sentido restrito em Planaltina - DF. Ciência Florestal, v. 28, n. 2, p. 469-482, 2018.). Segundo Pivello et al. (2011PIVELLO, V. R. The use of fire in the Cerrado and Amazonian rainforests of Brazil: past and present. Fire ecology, v. 7, n. 1, p. 24-39, 2011.), as queimadas periódicas são importantes para manutenção estrutural da paisagem, função, composição e integridade ecológica do Cerrado. O aumento da frequência das queimadas torna o ambiente mais instável (VASCONCELOS; ARAÚJO; BRUNA, 2014VASCONCELOS, P. B.; ARAÚJO, G. M.; BRUNA, E. M. The role of roadsides in conserving Cerrado plant diversity. Biodiversity and Conservation, v. 23, n. 12, p. 3035-3050, 2014.).

Quando feita a análise de correlação de Pearson das variáveis de dinâmica, no CSS as correlações entre indivíduos recrutas e variáveis do solo foram todas não significativas, o mesmo aconteceu entre indivíduos mortos e variáveis do solo. As correlações entre variáveis do solo e área basal dos recrutas e mortos também foram não significativas. Apenas crescimento em área basal correlacionou significativamente, tendo correlações positivas com alumínio, acidez potencial, capacidade de troca de cátions a pH 7,0 e argila, porém negativas com saturação por bases e Silte (Tabela 3).

Tabela 3
Correlação entre: (a) o número de indivíduos (recrutas e mortos), (b) área basal dos (recrutas, mortos e incremento) com as variáveis ambientais e do fogo
Table 3
Correlation between: (a) number of individuals (recruits and dead), (b) basal area of (Recruits, dead and increment) with environmental and fire variables

No CD, as correlações entre indivíduos recrutas, mortos e variáveis do solo foram todas não significativas (Tabela 3). A área basal dos indivíduos recrutas foi positivamente correlacionada com magnésio, enquanto a área basal dos indivíduos mortos se correlacionou positivamente com acidez de potencial, capacidade de troca de cátions a pH 7,0 e argila. Já a saturação por bases e silte foi negativamente correlacionada (Tabela 3).

Na FES, o fósforo foi positivamente correlacionado com indivíduos recrutas e não se correlacionou com indivíduos mortos. Já a área basal dos recrutas foi positivamente correlacionada com fósforo e o crescimento em área basal foi positivamente correlacionado com silte e negativamente com acidez potencial e argila (Tabela 3).

As informações contidas na Tabela 3 mostram que, mesmo com altos valores de acidez comuns em ambientes de Cerrado, ocorreram mudanças nas fitofisionomias CSS e CD. Nos sítios mais empobrecidos, as mudanças foram mais intensas, seja pelo crescimento diamétrico (incremento) no CSS ou pela mortalidade no CD, isto é, nessas fitofisionomias, o crescimento diamétrico e a mortalidade de indivíduos são independentes da fertilidade do solo, enquanto na FES, ambiente com maior fertilidade e baixa acidez em relação ao CSS e CD, do ponto de vista matemático, o fósforo teve correlação positiva tanto na área basal quanto no número dos indivíduos recrutas (Tabela 3).

Por meio da análise de correlação, o fogo não se correlacionou com as mudanças estruturais do ponto de vista matemático, pode ser que o espaço entre os inventários (5 anos) no CSS e CD tenha sido suficiente para os indivíduos se recuperarem ou porque a estatística empregada não teve a sensibilidade para diagnosticar o efeito do fogo, uma vez que o fogo afeta mais a regeneração natural e indivíduos menores. Portanto, o intervalo de observação não foi satisfatório, possivelmente, em uma análise feita em intervalos menores (pós-incêndio), esses resultados poderiam indicar correlação entre o fogo e a mortalidade.

Portanto, a ocorrência de incêndios pode provocar a morte dos indivíduos a curto prazo, de forma gradativa, ou até a recuperação destes, isso depende da intensidade, do grau dos danos provocados pelo fogo, da resistência adquirida ao longo do tempo e da idade fisiológica de cada indivíduo, por isso é importante estudos com intervalos menores. Pedroni (2001PEDRONI, F. Aspectos da estrutura e dinâmica da comunidade arbórea na Mata Atlântica e planície e encosta em Ubatuba, SP.2001. Tese (Doutorado em Biologia Vegetal) - Universidade Estadual de Campinas, Campinas, 2001.) notou que, se o intervalo entre os inventários for grande, maior será a dificuldade na interpretação dos possíveis fatores causadores da mortalidade.

Por isso, é importante a continuidade dos inventários, como se manterá as fitofisionomias em uma possível ocorrência ou ausência dos distúrbios. Essas informações são fundamentais para que se possa inferir sobre ações de conservação.

Conclusão

Os resultados mostram que ocorreram mudanças na estrutura das três fitofisionomias, a mortalidade foi superior ao recrutamento, à redução do número de indivíduos e à área basal. As mudanças foram maiores nas fitofisionomias CSS e CD atingidas pelo fogo, isso pela alta taxa de mortalidade. Na FES, as mudanças foram equilibradas entre saída e inclusão de novos indivíduos (recrutas), possivelmente reflexo do avanço sucessional. No CSS e no CD, os indivíduos das primeiras classes diamétricas demonstraram ser mais sensíveis à ocorrência do incêndio, houve alta taxa de mortalidade. Na FES, a perda de indivíduos foi mais equilibrada entre as classes diamétricas. Mesmo com a perda de indivíduos, a área basal no segundo inventário foi maior no CSS, em relação ao CD. Na FES, a área basal praticamente se manteve em relação ao primeiro inventário. Mesmo com altos valores de acidez comum em ambientes de Cerrado, as correlações foram positivas para incremento diamétrico dos indivíduos sobreviventes no CSS e para mortalidade no CD. Por fim, na FES, nos sítios mais férteis em relação ao CSS e CD, ocorreu aumento na área basal e no número de indivíduos. O CSS e CD estão se recuperando após distúrbio (fogo), com surgimento de novos indivíduos (recrutas) e crescimento diamétrico dos sobreviventes, porém o intervalo de 5 anos não foi suficiente para recuperação do número de indivíduos, enquanto na FES, sem distúrbio do fogo, a saída e a entrada de indivíduos foram mais equilibradas.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    26 Out 2020
  • Data do Fascículo
    Jul-Sep 2020

Histórico

  • Recebido
    19 Jun 2018
  • Aceito
    04 Maio 2020
  • Publicado
    01 Set 2020
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