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A idealização da “pessoa comum” e o discurso nacionalista no Japão

The idealization of “ordinary people” and nationalist discourse in Japan

La idealización de la “persona común” y discursos nacionalistas en Japón

Resumo:

Este artigo propõe um estudo sobre a intensificação de discursos nacionalistas na sociedade japonesa a partir da década de 1990. Uma visão influente tende a ver esse fenômeno como reação ao ambiente de crise econômica na sociedade japonesa desde os anos de 1990. O objetivo deste trabalho é repensar essa interpretação, ressaltando que o discurso nacionalista atual tem uma lógica que pode ser compreendida mais adequadamente se levarmos em consideração não apenas a crise recente, mas a posição dessa crise no contexto mais amplo das transformações ocorridas ao longo do período posterior à Segunda Guerra Mundial. Através de um diálogo com alguns dos principais teóricos japoneses atuais, este trabalho irá propor uma interpretação em que o nacionalismo surge não como mera reação a uma situação pontual, mas como um processo mais longo e complexo de formação, apropriação e ressignificação de discursos bastante diversos e mesmo contraditórios.

Palavras-chave:
Nacionalismo; Revisionismo; Japão; Ásia

Abstract:

This paper investigates the intensification of nationalist discourses in Japanese society since the 1990s. One influential interpretation of this process sees it as a reaction to the economic crisis in Japanese society beginning in the 1990s. The aim of this article is to reevaluate this interpretation, stressing that the current nationalist discourse can actually be better understood if we consider not only the recent crisis, but also how this crisis is part of the wider context of profound transformations that Japan has faced after World War II. By analyzing the works of major Japanese social thinkers, this paper elaborates an interpretation in which nationalism emerges not simply as a reaction to a single event, but rather as a longer and more complex process, in which different and even contradictory discourses are formed, appropriated and reinterpreted.

Keywords:
Nationalism; Revisionism; Japan; Asia

Resumen:

Este artículo analiza la intensificación de discursos nacionalistas en la sociedad japonesa a partir de la década de 1990. Una interpretación influyente tiende a ver este fenómeno como reacción al ambiente de crisis económica en la sociedad japonesa desde los años 1990. El objetivo de este trabajo es repensar esta interpretación, resaltando que el discurso nacionalista actual tiene una lógica que puede ser comprendida más adecuadamente si tomamos en consideración no sólo la crisis reciente, sino la posición de esta crisis en el contexto más amplio de las transformaciones ocurridas a lo largo del período posterior a la Segunda Guerra Mundial. A través de un diálogo con algunos de los principales teóricos japoneses actuales, este trabajo propondrá una interpretación en la que el nacionalismo surge no como mera reacción a una situación puntual, sino como un proceso más largo y complejo de formación, apropiación y resignificación de discursos diversos e contradictorios.

Palabras clave:
Nacionalismo; Revisionismo; Japón; Asia

Introdução

Uma questão que tem marcado a sociedade japonesa nas últimas décadas é a difusão de discursos nacionalistas. Embora o fortalecimento do nacionalismo pareça constituir um fenômeno generalizado em tempos recentes, especialmente tendo em vista o recrudescimento da hostilidade contra imigrantes e estrangeiros na Europa e nos Estados Unidos (Gusterson 2017Gusterson, Hugh. 2017. From Brexit to Trump: anthropology and the rise of nationalist populism. American Ethnologist 44 (2): 209-217. https://doi.org/10.1111/amet.12469.
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), é também verdade que o caso japonês traz particularidades que merecem atenção. Primeiro, porque os discursos nacionalistas mostram forte crescimento já desde a década de 1990, quando predominavam ainda no cenário internacional discursos de apologia à globalização (Oda 2014Oda, Ernani. 2014. Discursos nacionalistas no Japão contemporâneo. In O Japão no caleidoscópio, organizado por Ronan Alves Pereira e Tae Suzuki, 175-197. Campinas: Pontes.). Em segundo lugar, porque o conteúdo desse nacionalismo tende a tratar de temas diferentes. A principal questão levantada por esses discursos não é tanto a defesa da nação contra estrangeiros ou imigrantes, mas a ideia de que aquilo que realmente importa para a nação japonesa é uma profunda reavaliação de sua própria história.

O que marca o nacionalismo japonês recente é uma narrativa revisionista segundo a qual a história de sucesso que se costuma atribuir ao Japão após a Segunda Guerra Mundial, com seu impressionante crescimento econômico, esconderia no fundo uma grande crise cultural. Isso porque, após a guerra, os países ocidentais e os próprios intelectuais japoneses teriam exagerado as atrocidades cometidas pelos militares até o fim do conflito, compelindo a população japonesa a renegar o passado e a tradição do Japão. Com isso, os japoneses teriam sido condicionados a ver apenas crimes e violência em sua história, adotando uma visão “masoquista” (jigyaku-teki) que teria perdurado até os dias de hoje. Dentro desse raciocínio, a realização plena da identidade japonesa só seria possível através da reabilitação do passado japonês2 2 Nihonjin no Rekishi Kyôkasho Henshû Iinkai (ed.). 2009. Nihonjin no Rekishi Kyôkasho. Tokyo: Jiyusha. (Nishio 1999Nishio, Kanji. 1999. Kokumin no rekishi. Tokyo: Sankei Shimbunsha.).

Esse revisionismo histórico característico do nacionalismo japonês atual se manifesta, por exemplo, em associações dedicadas à criação de novos livros didáticos de história que minimizam atos de violência cometidos pelos militares japoneses contra outros povos asiáticos, como a exploração de escravas sexuais (tanto de origem asiática como europeia), ou o massacre de civis em Nanking, na China, em 1937. O mesmo revisionismo tem motivado movimentos pelo reconhecimento público de símbolos polêmicos como o santuário xintoísta Yasukuni, dedicado a honrar os mortos em combate pelo Japão, mas muito criticado por prestar homenagem a líderes militares condenados como criminosos de guerra pelo Tribunal de Tóquio (1946-1948).3 3 Para uma visão geral, ver Oda (2014).

É certo que a mentalidade masoquista sugerida pelo nacionalismo recente não encontra apoio na historiografia (Dower 1999Dower, John W. 1999. Embracing defeat: Japan in the wake of World War II. New York: W. W. Norton.; Oguma 2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha.; Yoshida 1995Yoshida, Yutaka. 1995. Nihonjin no sensôkan. Tokyo: Iwanami.), que sugere um processo muito mais complexo e ambivalente. Mas independentemente de seus problemas fatuais, trata-se de um fenômeno importante, dado o seu grande impacto, principalmente a partir da década de 1990. Embora demandas revisionistas desse tipo existam no Japão há muito mais tempo, até esse período elas eram mais comuns em setores específicos: políticos assumidamente conservadores ou grupos radicais de direita (uyoku), muitos deles conhecidos por defender o culto ao imperador e uma xenofobia explícita. A partir dos anos de 1990, porém, esse revisionismo se tornou mais difuso, sendo inclusive adotado por pessoas francamente hostis a esses grupos mais radicais (Oguma e Ueno 2003Oguma, Eiji e Yoko Ueno. 2003. “Iyashi” no nashonarizumu. Tokyo: Keio Gijuku Daikaku Shuppankai.; Ohsawa 2011Ohsawa, Masachi. 2011. Kindai Nihon no nashonarizumu. Tokyo: Kodansha.).

Vários teóricos sociais4 4 Nye, Joseph. 2012. Japan's nationalism is a sign of weakness. Financial Times, acessado em 5 jan. 2018, http://www.ft.com/intl/cms/s/0/c6b307ae-3890-11e2-981c-00144feabdc0.html. (Takahara 2010Takahara, Motoaki. 2010. Teema-betsu kenkyû dôkô: nashonarizumu. Shakaigaku Hyôron 61 (2): 206-215. https://doi.org/10.4057/jsr.61.206.
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; Yoda 2006Yoda, Tomiko. 2006. A roadmap to millennial Japan. In Japan after Japan, organizado por Harry Harootunian e Tomiko Yoda, 16-53. Durham: Duke University Press. https://doi.org/10.1215/9780822388609-002
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) interpretam a disseminação recente desse nacionalismo como uma forma de reação diante do relativo declínio do Japão a partir da década de 1990. Nessa época, a sociedade japonesa passou a enfrentar sérias dificuldades tanto do ponto de vista interno – com a prolongada estagnação econômica desde o estouro da enorme bolha financeira em 1992 –, como do ponto de vista externo, com o fortalecimento de países vizinhos como China e Coreia do Sul. O nacionalismo japonês e a sua resistência em ceder às críticas dos demais países do Leste Asiático seriam, portanto, uma busca por conforto frente à “ansiedade” ou à “fraqueza” causadas pela instabilidade da posição japonesa no contexto econômico e geopolítico das últimas décadas.5 5 Vale ressaltar que interpretações semelhantes podem ser encontradas para outros exemplos de nacionalismos recentes. Arjun Appadurai (2006), por exemplo, aplica um mecanismo semelhante aos movimentos étnicos e nacionalistas atualmente em curso na Índia e nos Balcãs. Esses também seriam, segundo ele, uma reação à “ansiedade” provocada pela dificuldade que estes países enfrentam para se adaptar às mudanças no mundo contemporâneo.

É certamente inegável que o nacionalismo atual está condicionado pelas transformações e crises recentes da sociedade japonesa. No entanto, a maioria das interpretações propostas até agora tende a negligenciar aspectos importantes. Em primeiro lugar, conceitos como “ansiedade” são extremamente obscuros e não oferecem explicações sobre quais as relações sociais concretas em jogo. Além disso, a tese sugere que o fortalecimento atual do nacionalismo japonês teria um caráter imediatista e ad hoc, como se antes da década de 1990 imperasse uma atmosfera de harmonia e então, uma vez iniciada a crise, os discursos nacionalistas surgissem por uma questão de conveniência política.

Como argumentarei em seguida, no entanto, o conteúdo do nacionalismo atual está diretamente ligado a discursos e práticas de períodos anteriores. Por isso, e sem negar a sua novidade, creio que ele pode ser também compreendido como o desdobramento de um processo histórico mais amplo. Meu objetivo neste artigo é articular uma interpretação do nacionalismo japonês atual que leve em consideração esse contexto histórico mais abrangente e que com isso permita identificar de maneira mais concreta as relações sociais em questão.

Duas limitações deste artigo, no entanto, devem ser mencionadas. Em primeiro lugar, não irei discutir normativamente sobre o mérito ideológico dos debates políticos concretos em que os discursos nacionalistas costumam aparecer, como a questão dos livros didáticos, do Santuário Yasukuni ou da repercussão do Julgamento de Tóquio. Meu objetivo neste artigo não é avaliar esses discursos, mas analisar as suas condições de difusão. Mesmo assumindo, como mencionado acima, que a tese revisionista da mentalidade masoquista não se sustenta, isso não implica tomar partido de uma posição específica com relação a esses temas controversos, já que eles podem ser – e de fato são – debatidos independentemente do apelo à ideia de revisionismo, e permanecem ainda uma questão em aberto (Higurashi 2008Higurashi, Yoshinobu. 2008. Tôkyô saiban. Tokyo: Kodansha.; Kimura 2014Kimura, Kan. 2014. Nikkan rekishi ninshiki mondai to wa nanika. Kyoto: Minerva.; Takenaka 2015Takenaka, Akiko. 2015. Yasukuni shrine: history, memory, and Japan's unending postwar. Honolulu: University of Hawai'i Press. https://doi.org/10.1515/9780824856939
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).

Em segundo lugar, este trabalho irá se concentrar no contexto interno japonês, não analisando o cenário mais amplo do Leste Asiático, nem a recepção dos discursos nacionalistas em outros países. Trata-se, sem dúvida, de uma limitação bastante séria, uma vez que as reações em países como China e Coreia do Sul – que também têm produzido seus nacionalismos – vêm afetando diretamente os discursos no Japão (McGregor 2017Mcgregor, Richard. 2017. Asia's reckoning: China, Japan, and the fate of U.S. power in the Pacific century. New York: Penguin.; Oda 2018Oda, Ernani. 2018. Condições estruturais do nacionalismo japonês recente. Lua Nova: Revista de Cultura e Política 103:11-38. https://doi.org/10.1590/0102-01038/103.
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; Oros 2008Oros, Andrew L. 2008. Normalizing Japan: politics, identity, and the evolution of security practice. Stanford: Stanford University Press. https://doi.org/10.1515/9780804778503
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; Soeya 2011Soeya, Yoshihide. 2011. A “normal” middle power: interpreting changes in Japanese security policy in the 1990s and after. In Japan as a “normal country”? organizado por Yoshihide Soeya, Masayuki Tadokoro e David. A. Welch, 72-97. Toronto: University of Toronto Press.). Mas, por outro lado, creio que o estudo dos desenvolvimentos internos proposto aqui é, enquanto ponto de partida, ainda assim relevante, e pode contribuir para estudos mais abrangentes sobre as consequências do nacionalismo japonês em nível regional e mesmo global.

A nação enquanto pessoas “comuns”

O primeiro passo é analisar mais detidamente o conteúdo do discurso do nacionalismo japonês atual em seus próprios termos e delinear melhor sua estrutura. Como mencionei anteriormente, esse nacionalismo se manifesta principalmente através de diversas formas de revisionismo histórico que procuram reabilitar o passado japonês. Mas cabe aqui perguntar: quem teria criado uma imagem negativa desse passado em primeiro lugar, a ponto de ser necessário um processo de reabilitação? Em outras palavras, contra quem os nacionalistas estão se opondo?

Em princípio, o mais óbvio seria apontar para um inimigo externo: os Estados Unidos. Com a derrota japonesa na Segunda Guerra Mundial, os EUA lideraram a ocupação do Japão pelas forças aliadas entre 1945 e 1952, e as autoridades norte-americanas de fato intervinham nas escolas e nos meios de comunicação para enfatizar que a ação militar japonesa antes do fim da guerra havia sido ilegítima. Essa tendência culminou com a abolição das forças militares japonesas pela Constituição de 1946 e com o tratado de segurança celebrado entre os dois países em 1951, que confirmou que a defesa do território japonês caberia aos militares norte-americanos e às suas bases militares sediadas na região (Dower 1999Dower, John W. 1999. Embracing defeat: Japan in the wake of World War II. New York: W. W. Norton.).

No entanto, é importante observar que, embora haja de fato hostilidade ao legado da ocupação norte-americana, o principal alvo de crítica dos discursos nacionalistas atuais não está tanto nos EUA, mas sim no próprio Japão, mais especificamente nos intelectuais japoneses do pós-guerra, incluindo aqui professores universitários como o conhecido cientista político Masao Maruyama (1914-1996), ou jornalistas ligados ao Asahi Shimbun, um jornal tradicionalmente de tendência mais crítica ao governo (Oguma 2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 14-17; Oguma e Ueno 2003Oguma, Eiji e Yoko Ueno. 2003. “Iyashi” no nashonarizumu. Tokyo: Keio Gijuku Daikaku Shuppankai., 137-138). Com o discurso de reformar a sociedade japonesa e construir uma “democracia do pós-guerra” (sengo minshushugi), esses intelectuais teriam consolidado aquela visão masoquista mencionada acima (Nishio 1999Nishio, Kanji. 1999. Kokumin no rekishi. Tokyo: Sankei Shimbunsha.).

Essa tendência de relativizar o papel negativo dos EUA e criticar os intelectuais japoneses da “democracia do pós-guerra” é possível em grande parte porque o discurso nacionalista atual costuma identificar uma mudança na postura norte-americana do pós-guerra: as forças de ocupação podiam estar determinadas no começo a enfraquecer o Japão, mas, a partir de 1950, com o início da Guerra da Coreia e a intensificação da Guerra Fria, os próprios EUA mudaram a sua política e passaram a incentivar uma nova militarização japonesa, a fim de garantir um aliado na Ásia contra o comunismo (Kuroki 2013Kuroki, Maiko. 2013. Nationalism in Japan's contemporary foreign policy. Tese em Relações Internacionais, London School of Economics and Political Science, London.). Para muitos nacionalistas de hoje, isso poderia ter ajudado a restaurar a autonomia e a influência internacional do Japão, mas os intelectuais japoneses da época, bem como a parte dominante da elite política e econômica, resistiram.

O alvo do discurso nacionalista atual é, portanto, um adversário interno. Mas se esses intelectuais japoneses são vistos como adversários, quem seriam afinal os próprios nacionalistas? Que tipos de atores e grupos estariam por trás dos apelos por revisionismo e pela restauração do orgulho nacional? Examinando o discurso desses nacionalistas em seus próprios termos, a resposta é, ao mesmo tempo, trivial e sugestiva: os nacionalistas costumam se apresentar como pessoas “comuns” – o termo em japonês é futsû (Oguma e Ueno 2003Oguma, Eiji e Yoko Ueno. 2003. “Iyashi” no nashonarizumu. Tokyo: Keio Gijuku Daikaku Shuppankai., 69; Kitada 2005Kitada, Akihiro. 2005. Warau Nihon no “nashonarizumu”. Tokyo: NHK Books., 17). Enquanto a visão “masoquista” inaugurada pelos intelectuais da “democracia do pós-guerra” teria em sua origem uma elite privilegiada e confortável de professores universitários, romancistas, poetas e jornalistas isolados das reais preocupações do povo, o nacionalismo atual seria uma ideologia voltada a resgatar e defender justamente o interesse das pessoas comuns, os verdadeiros representantes da nação. Isso porque as pessoas comuns não estariam preocupadas com grandes temas abstratos como pacifismo ou militarismo, e sim com os vínculos emocionais concretos que os unem a suas famílias e a seus ancestrais, muitos deles combatentes na Segunda Guerra Mundial que as pessoas comuns gostariam de lembrar e honrar, mas supostamente não poderiam porque teriam aprendido nas escolas do pós-guerra que os militares japoneses não devem ser celebrados.

Evidentemente, falar apenas em pessoas comuns esclarece pouco, pois mantém obscuro qual o critério do que seria “comum”. Mas, apesar de trivial nesse sentido, a ideia de pessoa comum é ainda assim sugestiva, pois ajuda a definir melhor a estrutura do argumento: o revisionismo histórico do nacionalismo atual não apenas defende a resistência contra um adversário interno, a saber, os intelectuais japoneses da “democracia do pós-guerra”, como também articula essa resistência em termos de uma oposição entre elite (os intelectuais do pós-guerra) e povo (as pessoas comuns).6 6 Tanto a ênfase na luta contra um inimigo interno na construção da nação, como a articulação dessa luta como uma disputa política entre povo e elite são, obviamente, aspectos bastante comuns na teoria do nacionalismo. No entanto, convém destacar que esses aspectos tendem a receber mais atenção nas teorias clássicas (Hayes 1931; Kohn 1944; Kedourie 1960) do que nas mais recentes, as quais, como sugere Greenfeld (1992), costumam se interessar mais pelo processo de formação da nação através do contraste cultural com outras nações, ou seja, em oposição a um adversário externo.

Delinear mais explicitamente essa estrutura do discurso é importante porque, como veremos nas próximas seções, a ideia de uma luta das pessoas comuns contra a elite intelectual da “democracia do pós-guerra” não é nova; pelo contrário, ela sempre acompanhou as atividades desses intelectuais, desde o período imediatamente posterior ao fim da Segunda Guerra Mundial. Essa é justamente uma das razões por que é insuficiente ver o nacionalismo japonês atual como mera reação ad hoc à crise dos anos de 1990. A estrutura de seu discurso está enraizada num processo mais amplo.

Por outro lado, é certo que essa estrutura discursiva básica deu conteúdos diversos aos conceitos de “pessoa comum” e de “elite”, e, além disso, nem sempre esteve vinculada a apelos por revisionismo histórico ou mesmo a discursos nacionalistas. Portanto, para compreender a formação do discurso nacionalista contemporâneo e os sujeitos que tendem a adotá-lo – apresentando-se como pessoas comuns – é necessário primeiro investigar não apenas o contexto imediato dos últimos anos, mas a dinâmica pela qual essa estrutura discursiva tem perdurado e ao mesmo tempo se transformado na sociedade japonesa do pós-guerra até culminar em sua manifestação atual.

A elite intelectual da “democracia do pós-guerra” e seus críticos

Tendo em vista a sua importância enquanto adversários putativos do nacionalismo atual, é necessário começar por um exame, ainda que breve, da posição dos chamados intelectuais da “democracia do pós-guerra”, bem como a repercussão de suas ideias.

O primeiro ponto a ressaltar é uma questão que foi especialmente enfatizada pelo historiador Eiji Oguma (2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 67): embora o discurso nacionalista atual retrate os intelectuais da “democracia do pós-guerra” como uma elite distante do povo, esses intelectuais apresentavam-se em seu discurso como representantes do ponto de vista das classes mais baixas, exaltando, portanto, também um ideal de pessoa comum.7 7 Oguma (2002, 773) argumenta ainda que a própria popularização da expressão futsû (comum) para indicar uma proximidade com as massas deve-se originalmente a um dos intelectuais da “democracia do pós-guerra”, o escritor Makoto Oda (1932-2007). Os nacionalistas atuais têm razão quando dizem que os intelectuais da “democracia do pós-guerra” eram críticos com relação ao Japão e enfatizavam muitos de seus aspectos negativos, mas essas críticas eram dirigidas aos altos cargos do governo, à cúpula militar e aos grandes empresários. Seria essa elite a responsável pelo autoritarismo, o militarismo e o imperialismo no Japão até o fim da Segunda Guerra Mundial. Com a derrota em 1945, abria-se o caminho para que o povo assumisse o poder, e isso incluía também soldados e militares, ao menos aqueles oriundos das camadas populares, que, ao contrário do que o nacionalismo atual tende a sugerir, jamais foram seriamente criticados pelos intelectuais do pós-guerra. Estes os viam basicamente como meras vítimas das classes dominantes.

No entanto, como adiantei anteriormente, os ideais dos intelectuais da “democracia do pós-guerra” foram desde cedo alvo de uma oposição que, analogamente ao discurso nacionalista atual, passou a retratar esses intelectuais como uma elite distante dos interesses das verdadeiras pessoas comuns. Isso pode ser visto de maneira especialmente significativa em 1960, durante as intensas e violentas disputas travadas em torno do tratado de segurança celebrado naquele ano entre Japão e EUA, que confirmava e consolidava o apoio do governo japonês à presença e à intervenção norte-americana na Ásia através da manutenção de bases militares. Foi o período em que os ideais dos intelectuais tiveram o seu momento de maior impacto efetivo sobre a vida social japonesa, mas também quando enfrentaram oposição tanto física como discursiva.8 8 Sobre este período, ver Ishikawa (1995) e Oguma (2002, 499).

A celebração desse tratado foi um dos momentos decisivos do pós-guerra japonês. Desde a década de 1950, o Japão era governado pelo Partido Liberal Democrático (a partir de agora referido como PLD), e alguns de seus principais líderes desejavam reverter o processo de desmilitarização promovido pela Constituição de 1946. Embora contasse, como vimos, com o apoio dos EUA, que desde a Guerra da Coreia pressionavam por uma participação militar japonesa mais ativa na Guerra Fria, o PLD não dispunha da maioria parlamentar necessária para alterar a constituição, de modo que entre 1958 e 1960 o então primeiro-ministro Nobusuke Kishi passou a se concentrar em outra opção: a formação de um novo tratado de segurança com os EUA que ao menos assegurasse uma posição militar mais estável e equitativa do Japão no bloco capitalista.

O acordo ainda precisava ser ratificado pelo parlamento, mas recebeu fortes críticas dos intelectuais da “democracia do pós-guerra” e dos setores influenciados por eles, que defendiam o fim das bases militares dos EUA, e em alguns casos até mesmo um alinhamento maior com os países do bloco socialista. Esse movimento contrário ao tratado intensificou-se cada vez mais, especialmente porque Kishi passou a reprimir mais intensamente as manifestações, causando revolta em setores mais amplos da população. Como resultado, centenas de milhares de pessoas tomaram as ruas em protesto, gerando uma mobilização sem precedentes que ampliou radicalmente a base de apoio da “democracia do pós-guerra”.

No entanto, Kishi e o PLD conseguiram, mesmo assim, impor a ratificação do tratado. O que vale ressaltar aqui é que, além de reprimir as manifestações, Kishi e o PLD articularam também uma oposição discursiva que, ao invés de negar simplesmente os apelos dos manifestantes e dos intelectuais pela defesa da pessoa comum contra as elites, procurou apropriar-se desse discurso, sugerindo, porém, que era o PLD que estava do lado da pessoa comum, enquanto os manifestantes e os intelectuais críticos do governo seriam na realidade uma espécie de elite.

Em entrevistas à imprensa, Kishi insistia, por exemplo, que os manifestantes não passavam de uma minoria. Prova disso seria que os cinemas e os estádios de beisebol continuavam cheios e ocupados, ou seja, a verdadeira maioria das pessoas não estaria engajada nos protestos. Além disso, numa expressão que se tornou famosa, Kishi afirmava que queria ouvir as “vozes sem voz” (koe naki koe). Os manifestantes eram, segundo ele, as “vozes com voz” (koe aru koe), ou seja, um grupo pequeno, mas ao mesmo tempo privilegiado, de intelectuais que manipulavam os jornais e demais meios de comunicação para impor suas opiniões.9 9 Ver Asashi Shimbun, edições de 28 de maio de 1960 e de 17 de junho de 1960. A verdadeira voz do povo, do cidadão médio, seria aquela da imensa maioria que supostamente o apoiava em silêncio e que se interessava mais por filmes e esportes do que por ativismo político. Kishi e o PLD seriam, segundo esse raciocínio, os legítimos porta-vozes desse tipo de pessoa comum.10 10 É importante enfatizar que, embora a repressão fosse de fato o principal instrumento do PLD, o discurso sobre as “vozes sem voz” era muito mais do que mero cinismo retórico, e os próprios manifestantes levaram a sério a expressão de Kishi, a ponto de, em um novo ato de apropriação, passar a usá-la para referir-se a eles mesmos. Formou-se inclusive entre os manifestantes um grupo que se denominou “grupo das vozes sem voz” (koe naki koe no kai), reforçando assim a disputa simbólica sobre quem seria o legítimo representante dessas vozes (Oguma 2002, 522).

Dois pontos merecem ser destacados. Primeiro, podemos ver que Kishi prenuncia aquele estilo de crítica adotado pelos nacionalistas atuais, em que os intelectuais da “democracia do pós-guerra” são retratados como uma elite apartada dos interesses reais da pessoa comum. E, novamente de modo semelhante ao nacionalismo contemporâneo, associa a rejeição desses intelectuais à necessidade de revisionismo, incorporado nesse caso na tentativa de restaurar, através do tratado com os EUA, o prestígio e a posição militar do Japão, enfraquecida desde o fim da Segunda Guerra.

Por outro lado, e isso é fundamental, a imagem específica que Kishi usou para caracterizar as pessoas comuns e as suas “vozes sem voz” – ou seja, pessoas pouco interessadas em política e mais preocupadas com entretenimento e consumo –, é algo que não corresponde ao modo como o discurso nacionalista articula hoje a sua noção de pessoa comum, já que o revisionismo dos nacionalistas atualmente tem uma clara orientação de combatividade e engajamento político. Há, portanto, uma relação de continuidade e ruptura entre as “vozes sem voz” de Kishi e o nacionalismo contemporâneo.

Mas para podermos entender melhor qual é, afinal, a concepção adotada pelos nacionalistas atuais e como foi possível chegar a ela a partir das ideias contidas no discurso de Kishi, é necessário antes examinar como a estrutura desse discurso, bem como as condições da sociedade japonesa, se transformou nas décadas seguintes. A concepção atual é justamente um desenvolvimento desse processo.

O consumo como critério da pessoa “comum”

Se em 1960 as ideias de Kishi sobre as “vozes sem voz” ainda eram secundárias, nos anos seguintes ela passou a assumir um papel cada vez mais central na oposição aos ideais dos intelectuais da “democracia do pós-guerra”. Mais do que isso, o seu apelo tornou-se forte o bastante para, de fato, ajudar a enfraquecer e, finalmente, sobrepujar esses ideais. O termo em si foi logo abandonado, mas a noção por trás das “vozes sem voz” – ou seja, de que os verdadeiros interesses da pessoa comum não estão em ideais políticos, mas no consumo – ganhou proeminência cada vez maior.

Isso esteve relacionado com o redirecionamento das prioridades do PLD nesse período, que, sob a liderança do primeiro-ministro Hayato Ikeda, deixou de insistir em questões político-militares e passou a se concentrar em um projeto de fortalecimento econômico que eventualmente conduziria o Japão à posição de segunda maior economia capitalista do mundo (Kano 1995Kano, Masanao. 1995. 1970-90 nendai no Nihon: keizai taikoku. In Iwanami Kôza Nihon Tsûshi, organiado por Naohiro Asao, Yoshihiko Amino, Susumu Ishii, Masanao Kano, Shohachi Hayakawa e Yoshio Yasumaru, 1-74. v. 21. Tokyo: Iwanami.). Um dos pontos centrais nessa nova orientação do PLD foi o papel cada vez mais ativo e abrangente exercido pela figura da empresa japonesa, cuja importância não apenas econômica, mas principalmente simbólica – enquanto incorporação da própria nação – passou a se tornar cada vez maior. Durante as décadas de 1960 e 1970, as empresas japonesas adquiriram uma imagem idealizada, em que apareciam como o principal responsável pelo notável sucesso da economia japonesa. Os seus administradores eram vistos como visionários, e mesmo os funcionários comuns eram invejados por seus altos salários e a sua estabilidade, graças ao sistema de contratação vitalícia adotado pelas grandes companhias. Alguns analistas falam em kaisha-shugi – uma ideologia da empresa, ou “empresismo” – como uma das características do cenário cultural japonês dessa época (Yasumaru 1995Yasumaru, Yoshio. 1995. Gendai no Nihon shisô jôkyô. In Iwanami Kôza Nihon Tsûshi, organizado por Naohiro Asao, Yoshihiko Amino, Susumu Ishii, Masanao Kano, Shohachi Hayakawa e Yoshio Yasumaru, 291-336. v. 21. Tokyo: Iwanami.; Takahara 2005Takahara, Motoaki. 2005. Nihonteki datsukôgyôka to jakunen rôdôryoku no ryûdôka. Shakaigaku Hyôron 56 (3): 760-776. https://doi.org/10.4057/jsr.56.760.
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).

É importante ressaltar que embora seus principais aliados fossem o governo e o PLD, a ideologia em torno da empresa enfatizava o vínculo que ela mantinha com a população em geral – a pessoa comum –, enfatizando que os benefícios do crescimento econômico alcançavam a todos. Além disso, as conquistas das empresas japonesas eram interpretadas como resultado do modo como elas incorporavam em sua administração virtudes supostamente típicas das tradições populares japonesas como um todo, como disciplina, respeito à hierarquia etc. (Harootunian 1993Harootunian, Harry. 1993. America's Japan, Japan's Japan. In Japan in the world, organizado por Harry Harootunian e Masao Miyoshi, 186-221. Durham: Duke University Press.; Ochiai 2005Ochiai, Emiko. 2005. The ie (family) in global perspective. In A companion to the Anthropology of Japan, organizado por Jennifer Robertson, 355-379. London: Blackwell. https://doi.org/10.1002/9780470996966.ch22
https://doi.org/10.1002/9780470996966.ch...
; Yoshino 1992Yoshino, Kosaku. 1992. Cultural nationalism in contemporary Japan. London: Routledge,).

Mas talvez o aspecto mais significativo dessa popularização da imagem da empresa tenha sido a mudança no perfil mais geral do tipo de empresa que passou a ganhar visibilidade na sociedade japonesa durante essa época. Nos primeiros anos do pós-guerra, eram as empresas da indústria pesada e de ramos ligados à indústria agrária que se destacavam. Entre meados da década de 1960 e começo da década de 1970, por outro lado, foram empresas produtoras de bens de consumo duráveis, como Toyota, Nissan, Hitachi e Matsushita (Panasonic), que assumiram a liderança (Nakamura 1995Nakamura, Masanori. 1995. 1950-60 nendai no Nihon. In Iwanami Kôza Nihon Tsûshi editado por Naohiro Asao; Yoshihiko Amino; Susumu Ishii; Masanao Kano; Shohachi Hayakawa e Yoshio Yasumaru, 1-67. v. 20. Tokyo: Iwanami.; Takahara 2005Takahara, Motoaki. 2005. Nihonteki datsukôgyôka to jakunen rôdôryoku no ryûdôka. Shakaigaku Hyôron 56 (3): 760-776. https://doi.org/10.4057/jsr.56.760.
https://doi.org/10.4057/jsr.56.760...
). Com isso, a imagem da empresa tornou-se mais próxima e até mesmo íntima do grande público. Ao invés de metais pesados, produtos químicos e matérias-primas, as empresas estavam agora associadas a utensílios voltados para a vida cotidiana: carros, televisores, geladeiras etc., produtos com os quais as pessoas passaram a estabelecer inclusive um forte vínculo afetivo.

Nesse novo contexto, a ideia de que o verdadeiro interesse da pessoa comum está no consumo, tal como havia sido sugerida pelo discurso sobre as “vozes sem voz”, encontrou um ambiente mais propício para se difundir, e os antigos apelos da “democracia do pós-guerra” por participação política, liberdade, revolução ou pacifismo perderam muito de sua influência. Isso não apenas entre as massas recentemente incorporadas à sociedade de consumo e entusiasmadas com as promessas das empresas, mas também naquelas esferas onde os velhos ideais tradicionalmente gozavam de maior força: os sindicatos e as universidades.

Os sindicatos, por exemplo, passaram a agir de maneira cada vez menos assertiva em suas demandas, especialmente a partir da década de 1960 (Nakamura 1995Nakamura, Masanori. 1995. 1950-60 nendai no Nihon. In Iwanami Kôza Nihon Tsûshi editado por Naohiro Asao; Yoshihiko Amino; Susumu Ishii; Masanao Kano; Shohachi Hayakawa e Yoshio Yasumaru, 1-67. v. 20. Tokyo: Iwanami.). Mesmo a universidade, o ambiente natural dos antigos ideais, tornou-se cada vez mais crítica aos intelectuais da “democracia do pós-guerra”. Principalmente a partir do final da década de 1960, muitos estudantes e professores mais jovens passaram a criticar o que eles viam como hipocrisia nos velhos discursos. Segundo eles, os antigos intelectuais constituíam, ainda que inconscientemente, uma elite privilegiada que não havia conseguido se comunicar com os grupos realmente oprimidos. Muitos jovens começaram, por exemplo, a questionar o modo como aqueles intelectuais, a despeito de suas críticas ao militarismo do pré-guerra, eram tolerantes, como vimos, com os soldados dos níveis hierarquicamente mais baixos, que eram tratados como meras vítimas de um governo autoritário. Para os estudantes das décadas de 1960-70, no entanto, por mais que estivessem apenas cumprindo ordens, esses soldados eram também responsáveis pela opressão exercida pelo Japão na Ásia. Os intelectuais da “democracia do pós-guerra”, a despeito de suas críticas ao militarismo, eram atacados por negligenciar esse aspecto, concentrando-se apenas no sofrimento dos japoneses e esquecendo-se das vítimas do colonialismo japonês em outros países (Oguma 2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 586).11 11 Ver também Ueno (2004).

Tendo em vista esse conjunto de mudanças na dinâmica das empresas, dos sindicatos e das universidades, Akihiro Kitada (2005)Kitada, Akihiro. 2005. Warau Nihon no “nashonarizumu”. Tokyo: NHK Books. descreve como durante a década de 1970 grandes parcelas dos jovens e estudantes passaram a desconfiar da validade das antigas disputas ideológicas ou políticas de modo geral. Ele argumenta que, como alternativa, passou-se a vislumbrar um ideal de inclusão absoluta, em que não houvesse conflito nem violência, e todos pudessem participar em condições de igualdade, como pessoas comuns. A esfera que poderia reunir e conciliar a todos dessa forma seria o consumo, pois, segundo esse raciocínio, o mercado dos bens de consumo não discriminaria nem excluiria ninguém: qualquer desejo seria legítimo e mereceria ser satisfeito.

Entre as décadas de 1960 e 1980 houve, portanto, um fortalecimento, nos mais diversos setores, do discurso de apologia do consumo como locus privilegiado dos verdadeiros interesses da população, em oposição a um elitismo intelectual da “democracia do pós-guerra”. Mas qual a relação entre essa mudança e o nacionalismo atual, que, como mencionei acima, surge um pouco mais tarde, a partir dos anos de 1990? Por um lado, há novamente uma relação de continuidade, uma vez que o discurso de crítica às elites intelectuais do pós-guerra e de defesa das pessoas comuns, que havia sido prenunciado por Kishi, também está presente na retórica dos nacionalistas hoje. Por outro lado, há ainda claramente uma dissonância entre o revisionismo combativo e engajado dos nacionalistas de hoje e a apologia do consumo, que procura justamente evitar disputas políticas e ideológicas de modo geral. É preciso, portanto, examinar como e em que condições sociais o discurso atual mais uma vez herda e, ao mesmo tempo, reconstrói discursos anteriores.

Revisionismo e reformas

Recapitulando o desenvolvimento esboçado até aqui, a noção de pessoa comum, inicialmente usada pelos próprios intelectuais da “democracia do pós-guerra” para indicar as classes trabalhadoras em oposição à elite política e econômica, foi mais tarde apropriada pelo PLD e pelas empresas e gradualmente esvaziada de sua conotação política e contestadora. A pessoa comum passou a ser, com isso, um consumidor alheio às utopias dos antigos intelectuais, estes agora retratados como a elite a ser combatida. Durante o período de crescimento econômico, a força dessa concepção de pessoa comum baseada no consumo acabou se difundindo para além do PLD e das empresas, atingindo setores cada vez mais amplos do público em geral.

Com esse contexto em mente, podemos retomar a questão do nacionalismo dos anos de 1990. Estamos agora em melhor posição para discutir quem passa a se apresentar como representante das pessoas comuns a partir desse período, e como as mudanças no sentido dessa noção levaram a demandas mais combativas por renovação do orgulho nacional e revisionismo histórico.

O primeiro fator a ser considerado na formação dos sujeitos do discurso nacionalista e de sua nova concepção de pessoa comum é o papel catalisador da crise econômica deflagrada na década de 1990, e nesse ponto as teorias que tentam explicar o nacionalismo atual como reação à “ansiedade” provocada por essa crise, embora insuficientes, levantam um ponto sem dúvida relevante.

O que se deve destacar é que a crise econômica criou um contexto em que o ideal de pessoa comum enquanto consumidor precisou ser repensado. Isso, em grande parte, porque a crise restringiu a própria capacidade de consumo das pessoas, além de incentivar uma mudança de atitude e de valores, muito mais frugal quando comparada ao consumismo dos anos 1980 (Haghirian 2011Haghirian, Parissa. 2011. The historical development of Japanese consumerism. In Japanese Consumer Dynamics, organizado por Parissa Haghirian, 3-17. Basingstoke: Palgrave Macmillan. https://doi.org/10.1057/9780230302228_1
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). Além disso, a figura da empresa, um dos pilares da ideologia do consumo, sofreu mudanças profundas com a crise, tanto do ponto de vista material como simbólico. A mítica em torno das virtudes esotéricas dos administradores japoneses se desfez: se até a década de 1980 o modelo empresarial japonês era visto como exemplo a ser seguido, ele passaria posteriormente a ser usado como exemplo de tradicionalismo e ineficiência, ou seja, como lição sobre o que não fazer na área empresarial (Ichii, Hattori, e Michael 2012Ichii, Shigeki; Susumu Hattori e David Michael. 2012. How to win in emerging markets: lessons from Japan. Harvard Business Review 90 (5): 126-30.).

É preciso ressaltar ainda que tão importante quanto a crise econômica foi a crise política que afetou o Japão praticamente na mesma época e, que em termos concretos, manifestou-se no fim da hegemonia de quase quarenta anos do PLD em 1993. O estopim foi uma série de escândalos de corrupção no final da década de 1980 envolvendo muitos dos líderes do partido, que se beneficiaram de suas posições no governo para favorecer empresas e aliados em troca de ganhos pessoais. Nos anos seguintes, houve um enorme declínio na imagem do partido, e em 1993 o PLD perdeu as eleições para uma aliança entre diversos novos partidos de oposição. A aliança entre o PLD e o empresariado, que no passado havia ajudado a promover o crescimento econômico e o acesso ao consumo, ganhava agora uma conotação oposta e negativa. Foi um período de grande instabilidade, em que novos partidos se formavam e se dissolviam, mantendo diversas desavenças entre si. É certo que o PLD voltou ao poder já em 1994, mas em um cenário bastante diferente: ao invés de governar sozinho, o PLD passou a necessitar de alianças para manter a maioria no parlamento. Além disso, e de forma mais importante, as antigas lideranças do partido saíram extremamente enfraquecidas (Curtis 1999Curtis, Gerald L. 1999. The logic of Japanese politics. New York: Columbia University Press.; Nakakita 2012Nakakita, Koji. 2012. Gendai Nihon no seitô demokurashii. Tokyo: Iwanami.).

Nesse contexto, a noção de que o consumo constituiria uma esfera de inclusão total, em que todos poderiam prosperar acima de divisões políticas e ideológicas, tornou-se cada vez mais difícil de sustentar. Com a crise econômica e a crise política, fortaleceu-se novamente a noção de que a pessoa comum precisa tomar uma atitude mais ativa e mesmo engajada, a fim de se opor a certas elites privilegiadas, agora associadas a imagens de empresários ineficientes e políticos corruptos. Mas o que substituiria o ideal de consumo na mobilização da pessoa comum a partir desse período?

Alguns autores (Kitada 2005Kitada, Akihiro. 2005. Warau Nihon no “nashonarizumu”. Tokyo: NHK Books.; Oguma e Ueno 2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha.; Ohsawa 2011Ohsawa, Masachi. 2011. Kindai Nihon no nashonarizumu. Tokyo: Kodansha.) indicam que uma alternativa nesse sentido foi justamente o discurso revisionista de reabilitação do passado japonês e de crítica ao legado dos “intelectuais do pós-guerra”, cuja falta de orgulho nacional teria envenenado os valores das gerações posteriores, cada vez mais individualistas e materialistas.

Como foi mencionado acima, esse tipo de manifestação não é necessariamente algo novo, mas esses autores argumentam que sua maior difusão e visibilidade a partir dos anos 1990 foi uma resposta à instabilidade social do período. No fundo, o revisionismo e sua celebração de um passado idealizado seria uma forma de resistência e revolta por parte daqueles que foram afetados pela crise (Kitada 2005Kitada, Akihiro. 2005. Warau Nihon no “nashonarizumu”. Tokyo: NHK Books.).

No entanto, pesquisas empíricas vêm levantando algumas dúvidas quanto a essa interpretação, sugerindo que o revisionismo tem se popularizado mais entre setores relativamente prósperos da sociedade japonesa, onde os efeitos da crise tendem a ser menores (Tanabe 2011Tanabe, Shunsuke. 2011. Gaikokujin e no manazashi to seiji ishiki. Tokyo: Keiso Shobo.). Outros estudos enfatizam ainda que muitos daqueles que atualmente apoiam o revisionismo são na realidade simpatizantes do PLD (Higuchi 2014Higuchi, Naoto. 2014. Nihongata haigaishugi: zaitokukai, gaikokujin sanseiken, higashi Ajia chiseigaku. Nagoya: Nagoya Daigaku Shuppankai.), ou seja, apoiam um partido extremamente tradicional que é em grande medida responsável pela crise atual. Nesse sentido, o revisionismo pareceria mais próximo da elite do que da pessoa comum.

Isso não significa, porém, que o revisionismo não esteja sendo utilizado também como parte de um discurso de mobilização da pessoa comum contra a elite. Mas sugere que a dinâmica desse discurso tende a ser mais complexa do que uma mera reação emocional de pessoas afetadas pela crise da década de 1990. De fato, um ponto central aqui é que o revisionismo não foi a única ideologia que surgiu nesse período como alternativa à celebração do consumo nas décadas anteriores. Houve também outras propostas com as quais o revisionismo acabou interagindo, criando um emaranhado discursivo por vezes paradoxal.

A principal dessas propostas no campo político partiu justamente de dentro do próprio PLD. Ao invés de deslocar o foco para o passado e para os intelectuais da “democracia do pós-guerra”, alguns de seus membros passaram a reconhecer a posição elitista do partido e a sua estrutura corrupta, oferecendo como alternativa um programa de reformas que em tese aproximaria a classe política da pessoa comum. Em primeiro lugar, seria necessário centralizar tanto a estrutura do partido como a estrutura do próprio governo, pois somente com um líder forte seria possível controlar a influência de interesses de grupos privilegiados sobre a condução da política. Em segundo lugar, seria necessário realizar reformas neoliberais de desregulamentação da economia e privatizações, a fim de eliminar paternalismos e protecionismos que beneficiariam apenas alguns poucos setores tradicionais e ultrapassados. Essas duas medidas ajudariam a tornar o Japão uma sociedade mais forte e competitiva tanto interna como externamente, eliminando os privilégios das elites.12 12 Para esse argumento, ver Ozawa (1993).

Esse tipo de programa político e econômico traz uma série de consequências sociais que vem sendo amplamente questionadas, mas o que importa apontar aqui é que ele de fato propõe uma imagem de pessoa comum bastante diferente da do revisionismo. Em vez de ser idealizado, o passado tende aqui a ser depreciado, pois os grandes males do Japão seriam resultado justamente da tradicional cumplicidade herdada entre a classe política e a classe empresarial. A pessoa comum é aquela que não se beneficia dos privilégios dos empresários e de ligações com a cúpula do estado (Komiya 2016Komiya, Shutaro. 2016. Datsu “sengo Nihon” no nashonarizumu. Tokyo: Daisanshokan.).

No entanto, apesar dessas diferenças, é significativo que as duas correntes – revisionismo e reformismo neoliberal – acabaram se unindo, ainda que de maneira problemática e ambígua (Bix 2013Bix, Herbert P. 2013. Japan under neonationalist, neoliberal rule: moving toward an abyss? Asia-Pacific Journal 15 (2): 1-15.). Um grande motivo para isso foi que, para conseguir promover as suas propostas, os políticos reformistas do PLD não podiam contar com as facções tradicionalmente mais fortes do partido, que eram criticadas de maneira direta. Eles passaram então a se aproximar de facções minoritárias, e elas muitas vezes adotavam também discursos revisionistas. Essas facções, mesmo tendo muitas vezes reservas em relação às reformas, acabaram aproveitando a oportunidade para ganhar mais espaço e influência. O caso do ex-primeiro ministro Junichiro Koizumi é o exemplo mais marcante desse processo. O seu governo (2001-2006) foi caracterizado tanto por centralização política e reformas neoliberais (desregulamentação e privatizações) como por aproximação com o revisionismo, devido a sua insistência em visitar o santuário Yasukuni. E essa tendência vem sendo em grande parte mantida nas últimas décadas (Nakakita 2014Nakakita, Koji. 2014. Jimintô seiji no henyô. Tokyo: NHK Books.; Nakano 2015Nakano, Koichi. 2015. Ukeika suru Nihon seiji. Tokyo: Iwanami.).

Com isso, verifica-se uma espécie de fusão daquelas duas imagens diferentes da pessoa comum propostas pelo revisionismo e pelo reformismo. A pessoa comum aparece como aquela que luta contra os privilégios de políticos corruptos e empresários tradicionais ineficientes, bem como aquela que defende o passado japonês contra intelectuais e jornalistas que ameaçam o orgulho nacional. Isso ajuda a entender, por um lado, a dificuldade que a literatura vem encontrando em identificar mais precisamente quem são aqueles que apoiam o revisionismo, se os mais prósperos ou os mais afetados pela crise. Uma vez que reformismo e revisionismo se encontram muitas vezes unidos, fica difícil saber se um grupo – como, por exemplo, o dos mais prósperos – apoia figuras revisionistas por causa de seu revisionismo ou por causa de sua aliança com grupos reformistas.

Por outro lado, é importante ressaltar que essa fusão permanece problemática e ambígua (Komiya 2016Komiya, Shutaro. 2016. Datsu “sengo Nihon” no nashonarizumu. Tokyo: Daisanshokan.), pois muitos defensores do revisionismo criticam fortemente as reformas neoliberais. O recente debate sobre a maior aceitação de trabalhadores estrangeiros no Japão é um exemplo dessas dificuldades. Em 2018, foram estabelecidas medidas nesse sentido pelo primeiro ministro, Shinzo Abe, que tem forte apoio de grupos revisionistas, tendo inclusive visitado o Yasukuni em 2013. A entrada de mais trabalhadores estrangeiros vem sendo uma forte demanda do meio empresarial, dada a falta de mão de obra devido ao envelhecimento da população e às baixíssimas taxas de fecundidade nas últimas décadas. Essa liberalização da migração, porém, vem sendo duramente criticadas por vozes ligadas ao nacionalismo e ao revisionismo, que têm grande receio de um aumento da presença estrangeira no Japão (Milly 2018Milly, Deborah. 2018. Abe's choice for Japan: thriving migration without immigration. Georgetown Journal of Asian Affairs 4 (1): 20-28.).

Conclusão

Neste trabalho, procurei repensar as interpretações que retratam o discurso nacionalista japonês contemporâneo como uma espécie de reação ad hoc dos japoneses em geral ao ambiente de ansiedade e instabilidade inaugurado a partir da década de 1990. Sem negar a importância dessas transformações recentes, sugeri que a estrutura especificamente revisionista do discurso nacionalista atual retoma temas, conceitos e narrativas mais antigos, que remontam ao contexto do fim da Segunda Guerra Mundial, em especial a idealização da pessoa “comum” e o debate em torno da “democracia do pós-guerra”. Mas, ao mesmo tempo, ela propõe uma concepção nova de pessoa comum, incorporando discursos reformistas e neoliberais, que, no entanto, nem sempre são compatíveis com o revisionismo nacionalista.

Assim, analisando alguns aspectos especialmente importantes do Japão no pós-guerra, argumentei que o nacionalismo atual se insere num processo mais longo e complexo. Incluir o nacionalismo contemporâneo neste quadro de referência mais amplo permite identificar melhor quais os processos sociais que levam ao desenvolvimento desse tipo de discurso. Evidentemente, trata-se apenas de um esboço, e muitos de seus elementos exigem estudos mais aprofundados. No entanto, creio que, enquanto ponto de partida, este esboço e os processos históricos mais abrangentes em que ele se baseia podem oferecer recursos para uma reflexão mais precisa sobre o nacionalismo japonês contemporâneo.

  • 2
    Nihonjin no Rekishi Kyôkasho Henshû Iinkai (ed.). 2009. Nihonjin no Rekishi Kyôkasho. Tokyo: Jiyusha.
  • 3
    Para uma visão geral, ver Oda (2014)Oda, Ernani. 2014. Discursos nacionalistas no Japão contemporâneo. In O Japão no caleidoscópio, organizado por Ronan Alves Pereira e Tae Suzuki, 175-197. Campinas: Pontes..
  • 4
    Nye, Joseph. 2012. Japan's nationalism is a sign of weakness. Financial Times, acessado em 5 jan. 2018, http://www.ft.com/intl/cms/s/0/c6b307ae-3890-11e2-981c-00144feabdc0.html.
  • 5
    Vale ressaltar que interpretações semelhantes podem ser encontradas para outros exemplos de nacionalismos recentes. Arjun Appadurai (2006)Appadurai, Arjun. 2006. Fear of small numbers. Durham: Duke University Press. https://doi.org/10.1215/9780822387541
    https://doi.org/10.1215/9780822387541...
    , por exemplo, aplica um mecanismo semelhante aos movimentos étnicos e nacionalistas atualmente em curso na Índia e nos Balcãs. Esses também seriam, segundo ele, uma reação à “ansiedade” provocada pela dificuldade que estes países enfrentam para se adaptar às mudanças no mundo contemporâneo.
  • 6
    Tanto a ênfase na luta contra um inimigo interno na construção da nação, como a articulação dessa luta como uma disputa política entre povo e elite são, obviamente, aspectos bastante comuns na teoria do nacionalismo. No entanto, convém destacar que esses aspectos tendem a receber mais atenção nas teorias clássicas (Hayes 1931Hayes, Carlton J. H. 1931. The historical evolution of modern nationalism. New York: Macmillan.; Kohn 1944Kohn, Hans. 1944. The idea of nationalism. New York: Macmillan.; Kedourie 1960Kedourie, Elie. 1960. Nationalism. Londres: Hutschinson.) do que nas mais recentes, as quais, como sugere Greenfeld (1992)Greenfeld, Liah. Nationalism. 1992. Cambridge: Harvard University Press., costumam se interessar mais pelo processo de formação da nação através do contraste cultural com outras nações, ou seja, em oposição a um adversário externo.
  • 7
    Oguma (2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 773) argumenta ainda que a própria popularização da expressão futsû (comum) para indicar uma proximidade com as massas deve-se originalmente a um dos intelectuais da “democracia do pós-guerra”, o escritor Makoto Oda (1932-2007).
  • 8
    Sobre este período, ver Ishikawa (1995)Ishikawa, Masumi. 1995. Sengo seijishi. Tokyo: Iwanami. e Oguma (2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 499).
  • 9
    Ver Asashi Shimbun, edições de 28 de maio de 1960 e de 17 de junho de 1960.
  • 10
    É importante enfatizar que, embora a repressão fosse de fato o principal instrumento do PLD, o discurso sobre as “vozes sem voz” era muito mais do que mero cinismo retórico, e os próprios manifestantes levaram a sério a expressão de Kishi, a ponto de, em um novo ato de apropriação, passar a usá-la para referir-se a eles mesmos. Formou-se inclusive entre os manifestantes um grupo que se denominou “grupo das vozes sem voz” (koe naki koe no kai), reforçando assim a disputa simbólica sobre quem seria o legítimo representante dessas vozes (Oguma 2002Oguma, Eiji. 2002. Minshu to aikoku. Tokyo: Shin'yosha., 522).
  • 11
    Ver também Ueno (2004)Ueno, Chizuko. 2004. Nationalism and gender. Melbourne: Trans Pacific Press..
  • 12
    Para esse argumento, ver Ozawa (1993)Ozawa, Ichiro. 1993. Nihon kaizô keikaku. Tokyo: Kodansha..

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    Sep-Dec 2020

Histórico

  • Recebido
    23 Abr 2019
  • Aceito
    31 Out 2019
  • Publicado
    23 Dez 2020
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