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Governança neoliberal em territórios minerários: o investimento social privado na RMBH

Resumo

Este artigo discute uma das expressões da governança neoliberal que, no caso brasileiro, se manifesta, dentre outras formas, a partir do chamado “investimento social privado”. Trata-se de um conjunto de ações, de caráter gerencial, conduzido por empresas e/ou suas fundações na região onde operam suas atividades, e que visa a ampliar sua hegemonia a partir da valorização de suas imagens, ao mesmo tempo que elas despolitizam e subtraem, das sociedades locais, sua capacidade participativa e transformadora. Com base no conceito de hegemonia de Antonio Gramsci e utilizando os relatórios de sustentabilidade disponibilizados nos sites de empresas minerárias que atuam no vetor sudeste da Região Metropolitana de Belo Horizonte, interessa-nos aqui reunir elementos que permitam identificar mais essa particularidade da “governança neoliberal”.

cidades minerárias; investimento social privado; organizações da sociedade civil; Região Metropolitana de Belo Horizonte; governança

Abstract

This paper addresses one of the expressions of neoliberal governance that, in the Brazilian case, manifests itself, among other forms, through the so-called “private social investment”. It is a set of managerial actions conducted by companies and/or their foundations in the region where they operate, aiming to expand their hegemony by improving their image. However, at the same time, this causes depoliticization and decreases the participatory and transformative capacity of the local societies. Based on Antonio Gramsci's concept of hegemony and using sustainability reports available on the websites of mining companies operating in the Southeast vector of the Metropolitan Region of Belo Horizonte, the main goal of this paper is to collect elements that enable to identify this particularity of “neoliberal governance”.

mining cities; private social investment; civil society organizations; Metropolitan Region of Belo Horizonte; governance

Introdução

As reformas liberais que marcaram a economia mundial no último quartel do século XX, comumente nomeadas, na literatura, por neoliberalismo, tiveram especial impacto no Brasil a partir dos anos 1990, facilitadas, em grande medida, pelo Estado democrático que se reorganiza após um longo período de ditadura militar. A abertura política do País, portanto, coincide com um empresariamento do Estado, caracterizado por uma crescente participação do setor privado e de suas formas gerenciais e concorrenciais de administração, constituindo uma associação que aqui nomeamos governança neoliberal. Especialmente o setor extrativista, fortemente favorecido pela demanda de commodities no mercado internacional, assumiu protagonismo nesse modelo de gestão pública no Brasil.

Este artigo tem como propósito discutir uma das expressões dessa governança neoliberal que, no caso brasileiro, tem se realizado a partir do chamado investimento social privado. Segundo Acselrad (2018)ACSELRAD, H. (org.) (2018). Políticas territoriais, empresas e comunidades: o neoextrativismo e a gestão empresarial do “social”. Rio de Janeiro, Garamond. , na perspectiva de garantir eficiência extramuros, o capital privado aposta em um conjunto de discursos e práticas de gestão empresarial do social – práticas de “não mercado”, segundo o autor –, seja a partir das próprias empresas, seja a partir de suas fundações. Essas ações também têm se apoiado em parcerias e transferências de recursos para algumas organizações da sociedade civil (OSCs)1 1 Organização da Sociedade Civil (OSC) é a forma mais recente (lei n. 13.019/2014 e lei n. 13.204/2015) de designar entidades institucionalizadas (com CNPJ) ou de direito privado, sem fins lucrativos e não governamentais ( Lopez, 2018 ). sediadas em cidades onde essas empresas operam. Interessam-nos aqui, especificamente, as práticas adotadas pelas empresas de mineração que atuam em alguns municípios do chamado vetor sudeste da RMBH,2 2 Este recorte inclui os municípios de Brumadinho, Caeté, Itatiaiuçu, Nova Lima, Raposos, Rio Acima e Sabará. conhecidos pelos históricos ciclos de exploração a que têm sido submetidos. Inclui-se, além dos recursos naturais, uma outra modalidade de exploração praticada pelas mineradoras da região com o sentido de um “apaziguamento social” na medida em que pode enfraquecer seu ânimo combativo. Em síntese, "as corporações têm acionado tais microtecnologias de poder para, ao mesmo tempo, evitar rupturas nos fluxos de mercadorias e materiais e legitimar, no plano local, o regime neoliberal que predomina no plano macroeconômico" (ibid., p. 33). Nesse sentido, é objetivo deste trabalho apresentar algumas dessas estratégias utilizadas, bem como reunir elementos que permitam avaliar os ganhos embutidos às empresas nessas aproximações, a fim de responder se é possível identificar nessas ações mais uma expressão do padrão de governança neoliberal.

O termo governança está longe de ser recente. Sua apropriação deu-se em diferentes períodos históricos e correntes de pensamento, o que lhe atribuiu múltiplos significados e diversos usos. Seu uso atual foi recuperado por teóricos liberais para designar um novo léxico político que "visa a substituir as expressões tradicionais da política por expressões [e práticas] gerenciais" ( Deneault, 2018DENEAULT, A. (2018). "As empresas multinacionais: um novo poder soberano inscrito na ordem das coisas". In: ACSELRAD, H. (org.). Políticas territoriais, empresas e comunidades: o neoextrativismo e a gestão empresarial do “social”. Rio de Janeiro, Garamond. , p. 19). Como enfatizam Dardot e Laval (2016)DARDOT, P.; LAVAL, C. (2016). A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo, Boitempo. , as mudanças históricas na concepção e ação do Estado imprimiram um novo vocabulário político. Nesse sentido, o Estado passa a adotar objetivos e metas que visam à eficácia e ao lucro, além de anular o que entendem por gastos inúteis, o que na perspectiva do setor privado inclui, geralmente, as políticas sociais. Para Deneault, o risco de se aplicar a teoria do management à política e à vida pública – discurso da “boa governança” –, dentre outros, é que "não mais se fala de luta social, mas de aceitabilidade social. Não se fala mais de princípio de precaução ou de natureza, mas de desenvolvimento sustentável. [...] Não se denuncia mais a propaganda, fala-se da responsabilidade social das empresas" ( Deneault, 2018, pDENEAULT, A. (2018). "As empresas multinacionais: um novo poder soberano inscrito na ordem das coisas". In: ACSELRAD, H. (org.). Políticas territoriais, empresas e comunidades: o neoextrativismo e a gestão empresarial do “social”. Rio de Janeiro, Garamond. , pp. 19-20).

Este artigo se apoia nas reflexões suscitadas por uma pesquisa realizada nos municípios do vetor sudeste da Região Metropolitana de Belo Horizonte (RMBH), cujas matrizes econômicas estão fortemente apoiadas na atividade minerária e onde foi possível observar um número expressivo de registros de OSCs nas últimas décadas. Esses municípios compõem o chamado Quadrilátero Ferrífero, localizado na região central de Minas Gerais – incluindo parte da região metropolitana ( Figura 1 ), que é uma extensão territorial de onde se extrai grande parte dos recursos minerais hoje no Brasil. Essa inserção determina uma forte influência das atividades mineradoras e, consequentemente, a participação significativa das companhias mineradoras não apenas na economia local, mas também nas relações sociais e políticas.

Figura 1
– Mapa do Quadrilátero Ferrífero com municípios do vetor sudeste da RMBH

Com o intuito de identificar as características daquilo que estamos chamando de expressão da governança neoliberal, foram pesquisados os relatórios de sustentabilidade disponibilizados nos sites das mineradoras que operam na região. Como parte das ações desses grupos, são oferecidos recursos na forma de editais voltados para o atendimento de demandas sociais (esporte, lazer, assistência social) das comunidades locais, a partir da intermediação e do gerenciamento das organizações sociais que atuam na região.

Para tanto, o artigo está organizado em três seções, além desta introdução, que apresenta o tema, e de uma conclusão que sintetiza algumas considerações. A primeira seção discute a governança neoliberal e, para isso, recupera alguns elementos do neoliberalismo, com especial enfoque na adesão da sociedade civil a esse ideário, entendendo que a boa governança neoliberal se sustenta, em grande medida, nessa parceria. Para tal, faz-se um breve histórico da expansão do associativismo no Brasil a partir da década de 1990, com destaque para o crescimento das OSCs. Os dados aqui utilizados são da pesquisa “Mapa das organizações da sociedade civil”, coordenada e organizada pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada ( Lopez, 2018LOPEZ, F. G. (org.) (2018). Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil. Brasília, Ipea. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33432 Acesso em: 20 out 2020.
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
).

Na consolidação desse formato de participação da sociedade civil, foi possível identificar o desenvolvimento de um tipo de associativismo capaz de assimilar uma prática social de expressão neoliberal.

A segunda parte dedica-se a um levantamento preliminar sobre os aspectos que identificam as diretrizes do investimento social privado das empresas minerárias do vetor sudeste da RMBH. Para apresentar essas informações, aqui sistematizadas suscintamente, foi necessário reunir dados divulgados pelas próprias mineradoras em seus sites institucionais e/ou relatórios de sustentabilidade, principais canais de comunicação e fontes de investigação identificados. Também foram consultados jornais on-line, sites da Amig (Associação dos Municípios Mineradores de Minas Gerais) e do Gife (Grupo de Institutos Fundações e Empresas), entre outros. Esse caminho deu visibilidade para o caso da empresa AngloGold Ashanhti, explorado neste artigo a título de exemplo, cujo trabalho de parceria e financiamento a algumas OSCs da área de estudo merece destaque. A escolha por essa empresa adveio das características do seu principal programa de investimento social privado – o “Parcerias Sustentáveis” –, responsável por traçar editais anuais de financiamento de projetos sociais da região na qual a empresa opera, a partir de repasses para algumas OSCs. No caso de Minas Gerais, os municípios em que foram identificadas essas parcerias são: Barão de Cocais, Santa Bárbara e, especificamente na RMBH, Caeté, Nova Lima, Raposos e Sabará. Segundo balanço divulgado3 3 Disponível em: https://issuu.com/anglogoldashantibr/docs/balanco_parcerias_sustentaveis_2019 . Acesso em: 11 nov 2020. pela própria empresa, o programa já apoiou 240 iniciativas nos municípios vizinhos às suas operações, beneficiando diretamente cerca de 27.000 pessoas com um investimento de aproximadamente R$9 milhões.

Na terceira seção, utilizamos a crítica gramsciana para aclarar o entendimento dessas contradições e ambiguidades no interior do campo da sociedade civil. Isto é, as características dessa expansão da democracia de maneira simultânea à difusão dos interesses do grande capital do setor minerário. Encerrando a discussão, as considerações finais sintetizam nossos questionamentos e os riscos dessa face da governança neoliberal, capaz de reduzir ou constranger as respostas da sociedade civil às atividades minerárias consideradas deletérias para o bem comum.

Governança neoliberal – da participação social ao associativismo empresarial

Inicialmente, é importante salientar que o neoliberalismo, mais do que uma reinvenção vigorosa do capitalismo é um sistema normativo que impõe a lógica da concorrência generalizada como conduta, e a empresa como modelo de eficiência a ser adotado pela máquina do Estado e pelos indivíduos, em suas relações tanto internas quanto com o mundo. Em outros termos, produz comportamentos e ordena as relações sociais segundo o padrão empresarial, transformando não apenas o Estado numa esfera submetida a exigências de eficácia e desempenho, mas também os indivíduos em empreendedores e concorrentes entre si ( Dardot e Laval, 2016DARDOT, P.; LAVAL, C. (2016). A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo, Boitempo. ). Aí se encontra, segundo os autores, a grande eficiência desse modelo normativo, ou seja, na sua capacidade de produzir subjetividades que alteram estruturalmente as nossas formas de relacionar com os outros e com nós mesmos, além de justificar as desigualdades expostas pelo próprio modelo econômico e nos desresponsabilizar dos engajamentos em torno das causas coletivas (ibid.).

Nesse sentido, mais do que a associação entre mercado e Estado amplamente discutida pela literatura pertinente, a boa governança neoliberal pressupõe a adesão da sociedade civil. Este não é um movimento recente, longe disso, a sociedade civil é identificada, desde os escritos carcerários de Antonio Gramsci (1926-1937), como um terreno fértil para reprodução e legitimação de ideias e interesses capitalistas.

Na interpretação do neoliberalismo, Theodory, Peck e Brenner (2009) entendem que ele poderá variar em cada localidade e período, considerando a especificidade de características políticas, econômicas, culturais, históricas e geográficas. Esse distanciamento da visão do neoliberalismo como uma entidade ou um corpo de doutrinas acabadas abre espaço para a discussão sobre sua operacionalização e seus efeitos sociais cotidianos e, por isso, suas inovações. Para a análise do caso específico de alguns municípios da RMBH, essa advertência será útil, especialmente para aqueles cuja economia está alicerçada na extração mineral e que serão objeto de discussão em capítulo específico.

Utilizando o mesmo princípio de evitar generalizações e desconhecer o potencial heurístico guardado em determinados conceitos gerais, lembramos que a apropriação do conceito de governança está presente em diferentes correntes de pensamento, o que determina, ao termo, diversos significados e formas de aplicação. Neste artigo, o conceito é compreendido como estruturante do vocabulário neoliberal que sintetiza a ação conjunta entre Estado e capital privado – no âmbito nacional e internacional –, além de instituições, associações, igrejas e representações diversas da sociedade civil, atuando em consonância com os princípios de eficiência, concorrência e produtividade empresariais.

Em escala internacional, por exemplo, foi expressiva a disseminação dos ideais neoliberais conduzida por agências multilaterais, como o Banco Mundial e o Fundo Monetário Internacional (FMI), com significativas implicações, especialmente, para os países periféricos. Dentre elas, podemos dizer que o poder político passou a sofrer interferência direta desses órgãos – uma espécie de credores do Estado – no direcionamento das políticas públicas e econômicas.

No Brasil, a recente difusão das reformas neoliberais, também chamada de inflexão ultraliberal,4 4 Ribeiro (2020) compreende inflexão ultraliberal como a dinâmica instaurada no Brasil após o golpe parlamentar e o posterior impeachment de Dilma Rousseff. A inflexão sinaliza a ruptura com um ciclo de organização política e econômica inaugurado a partir da redemocratização, com governos que conciliaram medidas conservadoras e compromissos com os setores populares. A tese central de Ribeiro (ibid.) é a de que o Golpe de 2016 “alterou de maneira radical essa correlação de forças que vinha se constituindo no interior do bloco de poder na direção de um controle mais efetivo por parte das forças conservadoras” (p. 2). tem impactado diretamente não apenas a qualidade de vida nas cidades brasileiras – com o encolhimento das políticas sociais, a desregulamentação de políticas de proteção ambiental e o crescimento do trabalho desprotegido –, mas também no sentido de uma fragilização das organizações classistas e do comprometimento do processo democrático – com a interrupção e o fechamento de diversos espaços de participação da população na discussão das políticas públicas, como é o caso dos conselhos e das conferências de políticas públicas.

Entretanto, apesar desse modelo de governança, seria imprudente negar ou desconhecer que as legislações firmadas no período pós-constituinte (1988), como as Leis Orgânicas da Saúde, da Assistência Social e de Diretrizes Básicas da Educação, assim como os Estatutos da Criança e do Adolescente e das Cidades, tenham trazido importantes avanços no fortalecimento de políticas sociais. Na perspectiva de ampliação da cidadania, mesmo que sem uma nítida ruptura da condição de cidadania regulada ,5 5 Cidadania regulada é um conceito cunhado por Wanderley Guilherme dos Santos que entende o caso brasileiro do desenvolvimento da cidadania “[...] cujas raízes encontram-se, não em um código de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional, e que ademais, tal sistema de estratificação ocupacional é definido por norma legal. Em outras palavras, são cidadãos todos aqueles membros da comunidade que se encontram localizados em qualquer uma das ocupações reconhecidas e definidas em lei” ( Santos, 1979 , p. 75). que atrela essa condição ao status de trabalhador com carteira assinada, a luta pelos direitos registrou importantes realizações, criando novos direitos e incluindo outros atores em pautas já conquistadas. Esses novos marcos legais, que vieram na esteira da Constituição de 1988 e da expansão dos movimentos sociais, contribuíram para uma diversificação e complexificação da participação da sociedade civil, inclusive de forma mais aproximada à administração pública, a partir dos conselhos setoriais, conferências, orçamentos participativos e outros.

Participação social – da reivindicação à parceria

A redemocratização é um marco na construção do arcabouço jurídico-político que trouxe consigo a ampliação e a diversificação do espaço para distintos interesses de classe. A década de 1990, no Brasil, pode ser vista como um período de crescimento da participação social, reiterada pela Constituição Federal de 1988, que consagrou, em seus princípios fundamentais, a participação popular na gestão pública. O envolvimento da sociedade civil no desenho, implementação e controle social das políticas públicas acabou por gerar um deslocamento de boa parte dos grupos anteriormente envolvidos em pautas de caráter mais reivindicatório, inclusive para a composição da gestão pública. No bojo da redemocratização, foram temas como reforma urbana, redemocratização, regularização fundiária, bem como a criação de conselhos setoriais, conferências, orçamentos participativos, que absorveram parte da cidadania ativa na direção de um outro formato mais aproximado com a administração pública.

Além disso, no mesmo período, portanto ainda sob influência do relativo ambiente de confiança e participação gerado pela Constituição de 1988, o governo do presidente Fernando Henrique Cardoso implementou o Plano Diretor da Reforma do Aparelho do Estado (1995),6 6 Regulamentado pela emenda constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998. coordenado pelo então Ministro da Administração Federal e Reforma do Estado, Luiz Carlos Bresser-Pereira. O referido plano deixa evidente a intenção de um enxugamento dos direitos trabalhistas e da previdência social, com perdas significativas para a população em geral, e aponta, de forma explícita, na direção da terceirização das políticas públicas a partir de parcerias com as organizações não estatais (terceiro setor ou organizações da sociedade civil). Segundo Bresser-Pereira (1997)BRESSER-PEREIRA, L. C. (1997). Estratégia e estrutura para um novo Estado. RSP, v. 48, n. 1, pp. 5-25. ,

A reforma provavelmente significará reduzir o Estado, limitar suas funções como produtor de bens e serviços [...], mas implicará, provavelmente, em ampliar suas funções no financiamento de organizações públicas não estatais para a realização de atividades nas quais externalidades ou direitos humanos básicos estejam envolvidos necessitando serem subsidiados. (p. 6; grifos nossos)

Essa intenção de despolitização do Estado, associada a uma desestatização da regulação social, é compatível a uma nova forma de organização política: o Terceiro Setor ( Simões, 2010SIMÕES, C. (2010). Curso de direito do serviço social. São Paulo, Cortez. ). Santos (2001)SANTOS, B. S. (2001). “Para uma reinvenção solidária e participativa do Estado”. In: BRESSER PEREIRA, L. C.; WILHEIM, J.; SOLA, L. (orgs.) Sociedade e estado em transformação. São Paulo, Editora Unesp, pp. 243-271. acrescenta que seria uma forma de organização mais vasta que o Estado – ainda que o mantenha como articulador –, mas capaz de conformar-se como um híbrido que combina elementos estatais e não estatais, nacionais e globais.

Coincidentemente, multiplicaram-se os registros dessas organizações a partir desse período, motivadas também pela precarização das políticas sociais e das organizações classistas, além do crescimento das formas de trabalho desprotegido, tal como mencionado anteriormente. Segundo Lopez (2018LOPEZ, F. G. (org.) (2018). Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil. Brasília, Ipea. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33432 Acesso em: 20 out 2020.
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
, p. 22), em 2015, o total de pessoas ocupadas com vínculos formais nas OSCs no Brasil equivalia a "mais de 30% do que empregava o setor da agricultura, 26% do total empregado na indústria e 26% do total de pessoas empregadas no setor público (incluindo civis e militares)".

A maior parte dessas OSCs, popularmente também conhecidas por organizações não governamentais (ONGs), como pode ser observado no Quadro 1 , foi criada nas décadas de 1990-2000 (24,6%) e de 2000-2010 (33,8%). A partir de 2011, há uma estabilização no número de novos registros, mas, ainda assim, com uma taxa anual de crescimento na casa dos 3% (ibid.), justificado por um contexto de novas legislações que regulamentam a estrutura administrativa e burocrática dessas organizações, bem como o acesso aos financiamentos e fundos públicos.

Quadro 1
– OSCs por faixas do ano de criação no Brasil

Esse período aponta para uma guinada no perfil da participação que, segundo Fontes (2010)FONTES, V. (2010). O Brasil e o capital imperialismo: teoria e história. Rio de Janeiro, EPSJV/Editora UFRJ. , direcionou o associativismo civil para um contexto profissionalizante de atuação. A hipótese da autora ( Fontes, 2006FONTES, V. (2006). Sociedade civil, classes sociais e conversão mercantil-filantrópica. Observatório Social de América Latina. CLACSO. Ano VII, n. 19, pp. 341-350. ; 2010 e 2018), e que aqui se configura como discussão central, é que, no interior da disputa hegemônica no Brasil, há um movimento de conversão das bases do associativismo civil à uma base mercantil-filantrópica, associado a uma certa dinâmica da expansão financeirizada mundial, sob o guarda-chuva da responsabilidade social.

Segundo dados do Ipea ( Lopez, 2018LOPEZ, F. G. (org.) (2018). Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil. Brasília, Ipea. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33432 Acesso em: 20 out 2020.
http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
), o Brasil atingiu, no final de 2016, a marca de 820 mil OSCs com Cadastros Nacionais de Pessoas Jurídicas (CNPJs) ativos no País, como pode ser observado no Gráfico 1 . Desse total, 709 mil (86%) aproximadamente representam associações civis sem fins lucrativos, outras 99 mil (12%) configuram organizações religiosas e 12 mil (2%) são fundações privadas (ibid., p. 21). Segundo o autor, "Os novos dados retratam um setor amplo, com importância econômica no mercado de trabalho, além da conhecida relevância em ações de interesse público" (ibid.). Casimiro (2018)CASIMIRO, F. H. C. (2018). A nova direita: aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo, Expressão Popular. , ao analisar a série histórica dessas organizações civis – de 1996 a 2016 –, constata um aumento em torno de 715 mil novas instituições, o que representa um crescimento de aproximadamente 680%.

Gráfico 1
– OSCs ativas em 2016, por região e década de criação (%)

No final na década de 1980, é promulgada a lei n. 9.637 de 1988 (Brasil, 1988) que institui a primeira forma das organizações sociais de interesse público, em acordo com a perspectiva do referido Plano de Reforma do Estado, e, na sequência, o chamado terceiro setor será regulado também pela lei n. 9.790/1999 e pelo decreto legislativo n. 3.100/1999, culminando com o novo marco regulatório dado pela lei n. 13.019/2014.

Esse conjunto de leis e ações acaba por influenciar o segmento do terceiro setor de modo a gerar efeitos ambíguos e contraditórios. Se, por um lado, traduz os anseios da sociedade civil organizada no sentido de um maior rigor e transparência no repasse desses recursos, por outro, sinaliza como oportunidade para o ideário neoliberal no sentido de imprimir, também à participação social, o caráter empresarial que já alcançara a esfera pública. Em síntese, impulsionadas no período de redemocratização no Brasil, as estratégias do modelo empresarial de governança predominam e alcançam todos os setores – privado, público e associativo.

Associativismo empresarial

Um marco para o seguimento desse modelo de associativismo empresarial foi a constituição do Grupo de Institutos, Fundações e Empresas (Gife) em 1995, organização composta por grandes empresários mobilizados pelos pressupostos da responsabilidade social ou investimento social privado e que se autodeclaram como sendo sem fins lucrativos. O grupo conta com 160 associados7 7 Na lista de associados, ao lado de fundações empresariais brasileiras (que inclui grandes bancos privados, empresas mineradoras e da construção civil), figuram também grande quantidade de entidades estrangeiras, como as fundações Bunge, Cargill, Nestlé Brasil, Nokia, Volkswagen, os institutos Coca-Cola Brasil, HSBC Solidariedade, Renault, Wal-Mart, além da participação direta de empresas como Monsanto e Microsoft, dentre outras. Disponível em: https://gife.org.br/quem-somos-gife/ . Acesso em: 15 maio 2021. que, somados, investem por volta de R$2,9 bilhões por ano na área social, operando projetos próprios ou viabilizando de terceiros. O exemplo do Gife, no Brasil, assinala uma característica que vai se tornando um padrão no setor, ou seja, uma concentração de fundações que se autodeclaram sem fins lucrativos e que se apresentam como sociedade civil, mas todas com origem em grupos da iniciativa privada.

Com o discurso de responsabilidade social empresarial (RSE), suas ações demonstram convergir para a legitimação desse princípio como diretriz estratégica de uso dos recursos privados, alinhando a perspectiva do respectivo negócio a uma dimensão pública, a partir de ações sociais. O discurso adotado, entretanto, emprega termos típicos do mercado, tais como “capacidade de assumir riscos” e “promover inovação”, além de procurar distanciar-se, segundo o Gife, de práticas de ações assistencialistas. Suas ações prescrevem orientar-se por meio da “1) preocupação com planejamento, monitoramento e avaliação dos projetos; 2) estratégia voltada para resultados sustentáveis de impacto e transformação social; 3) envolvimento da comunidade no desenvolvimento da ação”.8 8 Disponível em: https://gife.org.br/investimento-social-privado . Acesso em: 15 maio 2021.

Esse discurso, além de alinhado à linguagem da governança neoliberal, sinaliza um grande interesse no sentido de construção, fortalecimento e divulgação da imagem dessas empresas. Em seus textos institucionais, é comum ver suas ações apresentadas como investimento, e os atores sociais chamados de investidores sociais.

O investimento social possui instrumentos poderosos ligados à mobilização dos recursos da sociedade e do capital privado. Como investidores sociais , devemos ser capazes de incorporar a dimensão pública na gestão de recursos privados. Estruturas de governança fortes e a ampliação da transparência são vetores fundamentais para assegurar o devido equilíbrio entre os interesses público e privado e um diálogo aberto e efetivo com grupos sociais. (Disponível em: https://gife.org.br/quem-somos-gife/; grifos nossos)

Atualmente há cerca de 20 empresas de mineração9 9 Multinacionais: AngloGold Ashanti; ArcelorMittal; CSN Mineração S.A.; Jaguar Mining Inc.; Mineração Usiminas S.A.; Vale S.A.; Vallourec Mineração. Nacionais: Cefar; Comisa; Ferrous Resources do Brasil; Grupo AVG; Grupo MBL; Herculano Mineração; London Mining Brasil; Mineral do Brasil; Mineração Boa Vista; Mineração Serra Azul; Minerita - Minérios Itaúna Ltda; Tamisa Mineração; Vórtice Mineral. atuando em sete municípios que compõem o que aqui denominamos vetor sudeste da RMBH e cujos PIBs estão majoritariamente ancorados nessa atividade econômica. Dessas mineradoras, apenas 12 têm site institucional e/ou relatórios de sustentabilidade disponibilizados on-line , o que nos obrigou a reduzir o recorte de análise para esse universo, abaixo sintetizado.

Foi possível constatar semelhanças nos discursos institucionais das 12 empresas analisadas: (1) sustentabilidade , presente em todas elas; (2) segurança , presente em 9 empresas; e (3) responsabilidade social, vista em 7 empresas. Outros aspectos, como ética, liderança, qualidade e saúde , por exemplo, são também mencionados.

Isto sugere que esses princípios, em especial a tríade sustentabilidade, segurança e responsabilidade social, tenham sido internalizados na prática das empresas como um recurso de legitimação e, em última instância, de sua hegemonia. A responsabilidade social é apresentada, de maneira geral, como uma preocupação das empresas com as comunidades locais, e suas ações são viabilizadas a partir de recursos próprios, doações ou via leis de incentivo fiscal, em diversas áreas.

A sustentabilidade apresenta-se como um elemento que sobressai na maioria dos sites e relatórios. Sua visibilidade se dá por meio de informações sobre a adoção de medidas de educação ambiental e investimentos sociais que visam garantir o desenvolvimento social e a preservação dos recursos naturais. As empresas ressaltam, com clareza, seu papel primordial no escopo de atuação, o que pode ser, em grande medida, entendido pela visibilidade internacional do conceito de sustentabilidade.

A segurança , de modo geral, aparece como essencial nas operações das empresas visando ao bem-estar dos funcionários através da adoção de medidas de prevenção de acidentes de trabalho, por exemplo, ou de medidas relacionadas à saúde dos indivíduos.

Desse universo de empresas, 810 10 AngloGold Ashanti; ArcelorMittal; CSN Mineração S.A.; Jaguar Mining Inc.; Mineração Usiminas S.A.; Vale S.A.; Vallourec Mineração; Vórtice Mineral. são multinacionais e estão inseridas no Pacto Global da ONU,11 11 Disponível em: https://pactoglobal.org.br/no-brasil . Acesso em: 2 jun 2021. iniciativa voluntária lançada em 2000 e voltada para o setor empresarial. No Brasil, essas empresas se organizam através da Rede Brasil do Pacto Global, que preside o Conselho das Redes Locais na América Latina e tem sede em Nova York. Entre seus objetivos, encontra-se “alavancar o potencial da comunidade empresarial como agente de transformação também é garantir a competitividade dos negócios na economia mundial e a inclusão de lideranças em fóruns decisórios globais de referência".12 12 Disponível em: https://pactoglobal.org.br/no-brasil . Acesso em: 2 jun 2021. Isto é, as ações de responsabilidade social não são apenas indissociáveis das atividades econômicas, mas apresentam-se como vantagem e ganho no mercado financeiro.

Quadro 2
– Diretrizes e princípios recorrentes entre as mineradoras

Nesse mesmo sentido, a Bolsa de Valores de São Paulo, atual B3, comprova que as ações de empresas que compõem o Índice de Sustentabilidade Empresarial – ISE, o qual mede o desempenho corporativo de acordo com os critérios de sustentabilidade, contribuem para maior confiabilidade dessas empresas, melhorando sua performance no mercado financeiro em relação às demais. Segundo o portal da Bolsa de Valores de SP,

O objetivo do ISE B3 é ser o indicador do desempenho médio das cotações dos ativos de empresas selecionadas pelo seu reconhecido comprometimento com a sustentabilidade empresarial. Apoiando os investidores na tomada de decisão de investimento e induzindo as empresas a adotarem as melhores práticas de sustentabilidade, uma vez que as práticas ESG (Ambiental, Social e de Governança Corporativa, na sigla em inglês) contribuem para a perenidade dos negócios.13 13 Disponível em: http://www.b3.com.br/pt_br/market-data-e-indices/indices/indices-de-sustentabilidade/indice-de-sustentabilidade-empresarial-ise.htm . Acesso em: 17 maio 2021.

Esses índices funcionam a partir de um ranking das empresas que se enquadram nos critérios de sustentabilidade estabelecidos pelo mercado financeiro e inclui uma avaliação das ações de responsabilidade social empresarial (RSE), cuidados ambientais e transparência financeira. Para isso, as empresas precisam publicar suas ações no balanço social ou relatório de sustentabilidade, a fim de dar transparência às atividades corporativas. Em sua pesquisa sobre a relação entre RSE, ISE e valorização de ativos das empresas, Joseph et al. (2018)JOSEPH, G. et al. (2018). Responsabilidade social corporativa e índices de sustentabilidade: um estudo dos ativos tangíveis e intangíveis à luz da visão baseada em recursos. Revista de Gestão Social e Ambiental. São Paulo, v. 12, n. 1, pp. 73-88. indicam que há uma associação entre “a participação nos índices de sustentabilidade e melhorias em todas as categorias de ativos tangíveis [financeiros, organizacionais, físicos, tecnológicos] e intangíveis [inovações, recursos humanos, reputação]” (p. 74).

Nos meandros da luta pela hegemonia travada entre sociedade civil, Estado e empresas, novas formas de disputa vão sendo criadas e antigas estratégias metamorfoseadas, de forma a produzir um ambiente de linguagem híbrida, construída à beira do caminho. É nesse contexto de busca pela hegemonia que as práticas e as culturas vão de adaptando no espaço permitido pela jovem democracia brasileira. Assim, longe de serem consideradas práticas de solidariedade espontâneas, desinteressadas e ancoradas em projetos políticos de transformação social radical, a RSE e as parcerias com organizações sociais locais parecem compor um cenário mais amplo, articulado ao mercado financeiro, em que as empresas são duplamente favorecidas (financeiramente e em relação a sua imagem) ao incorporarem em suas práticas a questão social.

O caso da AngloGold Ashanti

Para compreender de que maneira os interesses privados do mercado se condensam hegemonicamente às causas tidas como coletivas e como a matriz discursiva neoliberal é traduzida nessas aproximações, tomemos como exemplo uma dessas empresas mineradoras – AngloGold Ashanti . A empresa, com sede administrativa no município de Nova Lima (MG), também acumula atividades extrativas nos municípios próximos – Sabará (MG) e Santa Bárbara (MG).

Sua presença na região remete à exploração do ouro em Minas Gerais, que data do século XVII. Com a independência do Brasil em 1822, a exploração mineral é aberta ao capital estrangeiro e, em 1834, a região onde hoje se encontram os municípios de Raposos e Nova Lima recebe a Saint John Del Rey Mining Company, empresa inglesa de mineração de ouro, que atua ali até 1957. Nesse mesmo ano, passam a incorporar acionistas brasileiros e, em 1960, é criada a Mineração Morro Velho. Em 1974, a empresa associa-se à sul-africana Anglo American Corporation, formando a AngloGold e, em 2004, funde-se com a Ashanti Goldfields, dando origem ao atual conglomerado AngloGold Ashanti ( Couto e Costa, 2003COUTO, E.; COSTA, A. (2003). Trajetória histórica da empresa mineração Morro Velho. In: V CONGRESSO BRASILEIRO DE HISTÓRIA ECONÔMICA. Anais... São Paulo, Associação Brasileira de Pesquisadores em História Econômica. ).

A mediação da relação sociedade e empresas, expressão da governança neoliberal, não se restringe a práticas sociais limitadas. Ao contrário, ela abre um amplo espectro capaz de capturar a vida ativa dos territórios minerários. No edital do programa de 2019, são elegíveis organizações da sociedade civil (OSCs), ou, mais especificamente, “pessoas jurídicas de direito privado, sem fins lucrativos e cooperativas legalmente constituídas” nas seguintes áreas: a) cultura, turismo, gastronomia: inclui desenvolvimento de produtos locais e artesanais para atender ao mercado e ao setor turístico; b) associativismo e cooperativismo: inclui a estruturação de empreendimentos sociais de caráter produtivo com ênfase em setores como o de comércio e serviços, que propiciem a inserção das pessoas na cadeia produtiva de trabalho; c) soluções sustentáveis: inclui empreendimentos sociais que promovam soluções ambientalmente sustentáveis que beneficiem a coletividade, como economia de energia elétrica e água. Essas soluções devem priorizar a existência de um empreendimento social, com potencial para ter autossustentação financeira.

Visando ao autofinanciamento futuro, o programa mantém uma espécie de coach ou mentoria, um suporte técnico para as instituições beneficiadas para que “o projeto desenvolva fontes de receita próprias visando à autossustentação financeira, aproximando-se de um modelo de negócio social”.14 14 Disponível em: https://issuu.com/anglogoldashantibr/docs/balanco_parcerias_sustentaveis_2019 . Acesso em: 11 nov 2020. A intenção é melhorar o desempenho das instituições parceiras, pois a conversão dos projetos das OSCs em negócios sociais é definida pela própria AngloGold Ashanti como sua principal missão, além de estabelecer como objetivo “solucionar algum problema social e/ou ambiental. São autossustentáveis financeiramente e reinvestem o lucro no próprio negócio para aumentar o seu impacto” (ibid.).

Chamamos a atenção para alguns aspectos críticos em relação à iniciativa da AngloGold Ashanti de apoio financeiro às OSCs: 1) é possível observar um direcionamento mercantil forte do edital a partir da defesa de um modelo empresarial e de um discurso empreendedor na gestão dos recursos dos projetos como condição ao financiamento; 2) a perspectiva de mentoria e suporte para tornar o projeto social empreendedor ou de negócio social estimula a criação de um novo senso comum em torno do associativismo local, para o qual a perspectiva empreendedora é um exemplo a ser seguido.15 15 Como senso comum, entende-se aqui uma espécie de cimento que liga e cria consensos sobre a maneira de compreender, agir e julgar a vida social. Poderia ser quase sinônimo de ideologia no sentido que é compartilhado pelo grupo, abarca a vida social e, por ser muito familiar, nem sempre será visível para quem compartilha. Acreditamos que a disseminação desse senso comum contribuiria para minorar os impactos negativos ambientais da atuação da empresa na região e, ao mesmo tempo, legitimar suas práticas; 3) como pode ser observado no balanço do Programa Parcerias Sustentáveis, os projetos giram em torno de pautas e atividades locais, não convergem com temáticas mais substantivas como aquelas relacionadas à questão social ou à contradição capital e trabalho, mas, ao mesmo tempo conseguem dialogar diretamente com a temática de reconhecimento (empreendedorismo para mulheres e causas étnico-raciais).

É nesse cenário que adquire força um formato de participação de algumas organizações da sociedade civil na composição da boa governança neoliberal. Caracterizadas por uma atuação orientada pelo modelo adotado pelas empresas de capital privado – a chamada filantropia empresarial ou, como se autonomeiam, investimento social privado –, esse formato ganha espaço em diversas associações que precisam se mostrar eficientes para acessar os recursos disponíveis e, principalmente, nas fundações originadas nas próprias empresas.

A sociedade civil como um terreno em disputa: os aparelhos privados de hegemonia

No bojo da variada recriação do associativismo, reinterpretado com novos matizes e eventualmente com novos significados, os aparelhos privados de hegemonia, entendidos como parte do Estado ampliado, trazem particularidades do mundo empresarial para as organizações civis. O modelo de sociabilidade empresarial e a gestão de características empreendedora e competitiva condensam-se à imagem de solidariedade, parceria com a comunidade e/ou sustentabilidade, numa mensagem aparentemente contraditória, mas para Dardot e Laval (2016)DARDOT, P.; LAVAL, C. (2016). A nova razão do mundo: ensaio sobre a sociedade neoliberal. São Paulo, Boitempo. , portadora de uma estratégia de captura da nossa subjetividade.

O crescimento e a diversificação do aparelho associativo podem ser interpretados como um movimento contraditório também por Fontes (2010FONTES, V. (2010). O Brasil e o capital imperialismo: teoria e história. Rio de Janeiro, EPSJV/Editora UFRJ. e 2018) e Casimiro (2018)CASIMIRO, F. H. C. (2018). A nova direita: aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo, Expressão Popular. . Os autores encontram na perspectiva gramsciana a explicação para essa ambiguidade: de um lado, o aparelho associativo é entendido como expansão da democracia e, portanto, conquista das classes trabalhadoras; de outro, é entendido como possibilidade de fortalecimento simultâneo das trincheiras do capitalismo. Em outras palavras, esses aparelhos não estariam livres da disseminação e da defesa dos interesses e da ideologia liberal e burguesa.

Os autores mencionados, Fontes (2018)FONTES, V. (2018). Gramsci, Estado e sociedade civil: anjos, demônios ou lutas de classes? Revista Outubro, n. 31. e Casimiro (2018)CASIMIRO, F. H. C. (2018). A nova direita: aparelhos de ação política e ideológica no Brasil contemporâneo. São Paulo, Expressão Popular. , reconhecem a “arte da associação”, para usar o termo cunhado por Tocqueville, como uma força vital da democracia e da justiça social. Contudo, também a colocam sob suspeita de facilitar a dominação de classe enquanto facilitadora de certos consensos no território de atuação das empresas. A interpretação das contradições da expansão do associativismo na democracia brasileira contemporânea sustenta-se na hipótese de a sociedade civil organizada ser, também, um terreno fértil para legitimação dos interesses do capital privado.

Os escritos carcerários de Gramsci (2019)GRAMSCI, A. (2019). Cadernos do Cárcere - volume 3. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. trazem uma poderosa contribuição para interpretação da dinâmica da reprodução do capital a partir de uma percepção ampliada de Estado que abrange as disputas políticas no interior da sociedade civil. Isto é, a sociedade civil não deve ser interpretada como uma mera oposição ao Estado, ou como descreve a concepção liberal, um espaço de liberdade de indivíduos. Além disso, o Estado não deve ser concebido como o único espaço do poder político e de dominação.

A própria noção, em voga há algum tempo, da sociedade civil como sinônimo de terceiro setor e de organização não governamental sugere-nos uma imagem de neutralidade em relação ao mercado e aos governos ou a uma esfera privada de interesse público, motivada por certo tipo de altruísmo benevolente. O caso da AngloGold, aqui apresentado, demonstra que algumas formas de parceria entre sociedade civil e esfera privada nada têm de apolíticas, pelo contrário, fazem parte de uma disputa pela hegemonia do território.

Essa tensão é compreendida por Gramsci sem dissociação brusca entre aquilo que chamou de sociedade política e o que definiu como sociedade civil . Ao contrário, para ele há uma relação orgânica entre as duas dimensões, enfeixada pelo conceito de hegemonia, uma interpretação mais refinada para compreender os elementos de dominação de classe. A sociedade política, segundo o autor, pode ser entendida pelo Estado no seu sentido restrito, ou seja, o aparelho governamental encarregado da administração direta e do exercício legal da coerção sobre aqueles que não consentem nem ativa, nem passivamente ( Gramsci, 2019GRAMSCI, A. (2019). Cadernos do Cárcere - volume 3. Rio de Janeiro, Civilização Brasileira. ). De modo sintético e do ponto de vista analítico, a sociedade civil, por sua vez, é um campo amplo de análise, constituída por uma diversidade de organizações civis (sindicatos, associações, igrejas, etc.), terreno em que as classes se organizam e defendem seus interesses na disputa para conservar ou conquistar determinada hegemonia (ibid.).

No que diz respeito ao conceito de hegemonia, tal como interpreta Bianchi (2018)BIANCHI, A. (2018). O laboratório de Gramsci: filosofia, história e política. Porto Alegre, Zouk. , entende-se como sendo o exercício da capacidade de direção e de liderança política e econômica. Opõe-se, portanto, à mera dominação, na qual uma das frações simplesmente impõe seus projetos econômico-corporativos às demais frações e classes sociais, sem levar em conta os projetos de interesses destas. Assim, o poder privado, para dominar, teria que se apresentar como defensor de interesses coletivos. Deve apresentar-se como expressão de toda a sociedade, eventualmente “incorporando reivindicações e interesses de grupos subalternos, subtraindo-os de sua lógica própria e enquadrando-os na ordem vigente” (ibid., p. 155). A aparência de universalidade exige que sejam absorvidas demandas das classes populares de forma que os interesses privados permaneçam encobertos.

Não sendo, pois, a hegemonia simplesmente a imposição de certos interesses, mas a promoção e reorganização dos vários benefícios para melhor servir aos objetivos a que visam, Hall, Lumley e Mclennan (1980)HALL, S.; LUMLEY, B.; McLENNAN, G. (1980). “Política e Ideologia: Gramsci”. In: CENTRE FOR CONTEMPORAY CULTURAL STUDIES (org.). Da ideologia. Rio de Janeiro, Zahar. chamam a atenção para um aspecto da luta hegemônica capitalista que é a despolitização das lutas sociais, com a finalidade de evitar a compreensão do caráter de classe dos interesses em pugna. Essa despolitização é um efeito possível da relação entre as organizações civis e empresas, característica da governança neoliberal, capaz de deslocar pautas e reivindicações e torná-las práticas sociais empresariais sem o efeito transformador esperado pela sociedade civil.

Nessa perspectiva, podemos interpretar algumas das associações da sociedade civil como meios difusores de cultura de massas e reprodutores de ideologias, e que se utilizam das formas jurídicas convencionais postas pelo marco legal do Estado, mecanismo definido como aparelhos privados de hegemonia (APHs). Sua atualidade interpretativa permite-nos analisar as formas pelas quais as classes se organizam não apenas num único aparelho, mas em variadas formas. Esses aparelho s podem funcionar como importantes peças de articulação do consenso e de organização de anuência espontânea que podem ser conseguidas, por exemplo, ao fazer concessões de interesses políticos, ideológicos e econômicos, em determinado grau que não afete seus interesses essenciais ou de longo prazo.

A governança neoliberal estaria adquirindo novas expressões em seu estágio mais recente, ao reconhecer o valor da representação na forma de associacionismo ou da arte da associação. Contudo, esse reconhecimento introduz, em sua prática, valores próprios do neoliberalismo. Fraser (2020)FRASER, N. (2020). O velho está morrendo e o novo não pode nascer. São Paulo, Autonomia Literária. alerta para as sutilezas desse modelo econômico ser mais sofisticado ao articular uma “política econômica regressiva, pró-negócios, com uma política progressista de reconhecimento, valorizando a representatividade, mas ressignificando igualdade como sinônimo de meritocracia” (ibid., p. 18).

Existiria uma faixa interpretativa, ainda pouco explorada, para entender o movimento de construção hegemônica do neoliberalismo que é sua capacidade de acoplar-se a diferentes projetos de reconhecimento (questões étnico-raciais e de gênero, por exemplo). Nas organizações da sociedade civil, seria possível observar não apenas apassivamento de algumas lutas sociais, mas também um direcionamento de valores, linguagens, costumes morais e de um novo senso comum. E estariam, em grande medida, organizadas e pautadas por demandas de agências multilaterais e agenciadas por organizações civis associadas às empresas do grande capital.

Considerações finais

Considerando os efeitos da ideologia neoliberal sobre o atual padrão de governança, as experiências nos ambientes minerários apontam indícios de aproximação entre as empresas mineradoras do vetor sudeste da RMBH e a sociedade civil organizada sob a forma de investimento social privado. Ainda que os dados, como apresentados no Quadro 1 , indiquem um número crescente das OSCs, restam ainda dúvidas sobre os impactos dessa expansão no âmbito das possibilidades da formação de uma cidadania ativa. Ao que parece, o campo das OSCs é um terreno no qual os mais distintos interesses se expressam – das lutas anticapitalistas aos recentes empreendedorismos neoliberais. No espectro do Quadrilátero Ferrífero, encontram-se desde as fundações e associações que trabalham com recursos das empresas minerárias, como também OSCs que atuam a partir de temas relacionados ao meio ambiente, economia solidária, gênero e raça – em pautas que variam entre ações despolitizadas e outras de caráter mais contestatórios. Em síntese, há representações da sociedade civil atuando de diversas formas, mas chama a atenção essa configuração particular que abre espaço para parcerias com o capital privado. Seus novos formatos são capazes de reduzir ou alterar as tradicionais rotas de contestação desses grupos. Como estratégia de aproximação mais recorrente, o investimento social privado tem se mostrado como uma forma efetiva de qualificar a imagem das empresas e legitimá-las perante as comunidades e as organizações da sociedade civil, além de auferir ganhos financeiros.

No caso da rede associativa em torno das empresas mineradoras da RMBH, especialmente nos municípios que exploraram no passado ou ainda mantêm atividades de extração, essas parcerias sugerem um outro ciclo de domínio/dependência a partir do investimento social privado, estratégico na defesa corporativa das empresas. Os aparelhos privados de hegemonia são investimentos que, além de facilitarem situações lucrativas, também parecem criar uma cultura, um senso comum, de valores compartilhados para além da simples absorção da linguagem neoliberal. Possuem um papel nas formas de organização de sociabilidade e na conexão da base econômica e do Estado. Esta seria, pois, uma das características da dominação do neoliberalismo, especificamente no setor minerário exportador de commodities: sujeito às flutuações no mercado internacional, aferidor de importantes lucros e com papel relevante na economia de Minas Gerais e do Brasil.

No caso das mineradoras que atuam na RMBH, percebe-se que há um beneficiamento dessas empresas por meio de maior presença de suas respectivas fundações, iniciativas de investimento social privado e parcerias com as OSCs, operando com mais legitimidade no território em que estão instaladas. Porém, não se trata de um efeito automático, mas de um jogo de posições de múltiplas camadas que atuam de maneira gradual. Estas se expressam a partir de editais elaborados pelas empresas para financiamento de projetos coordenados por OSCs, patrocínio de eventos culturais e esportivos, parcerias entre as empresas e prefeituras locais, bem como de ações das empresas diretamente nas comunidades. Outra hipótese a ser considerada é o constrangimento do desenvolvimento do associativismo local na direção de uma possível luta contra expressões mais substantivas, especialmente contra os efeitos deletérios do extrativismo minerário.

Dito isso, cabe evidenciar que, ao contrário do que se propaga simplificadamente, os argumentos referentes à hegemonia não são meramente culturais, embora a cultura as incorpore de maneira consistente. Essa hegemonia remete também às diversas lutas constantes intra e entreclasses sociais, e, se essas lutas atingem algum grau de estabilidade, esta se faz, em grande medida, pela despolitização ou pelo silêncio dos dominados. O equilíbrio atingido nunca é absolutamente estável, ele sempre conterá algum dinamismo.

A reformulação do papel do Estado brasileiro, ao se democratizar, trouxe consigo novas formas de configuração e fortalecimento de sua hegemonia, construindo consensos através da materialização de políticas e no âmbito das lutas simbólicas. A organização empresarial pôde se utilizar do novo marco legal das organizações da sociedade civil capturando e ressignificando os problemas sociais e suas soluções, no caso das cidades minerárias. Nesse sentido, cabe-nos avaliar, como reflexão final, os limites e possibilidades de se construir um novo e mais persuasivo senso comum, ou uma contra-hegemonia por parte dos setores não empresariais, trabalhadores e população afetada pela mineração. Isto é, o fortalecimento de um outro lado que não o do capital minerário, uma rede de associações autônomas ancoradas no entendimento da diferença e especificidade dos interesses de uns e de outros.

Nota de agradecimento

Este artigo é um desdobramento de parte da pesquisa “Governança e Associativismo na Região Metropolitana de Belo Horizonte”, desenvolvida no âmbito do Laboratório de Estudos Urbanos e Metropolitanos da Escola de Arquitetura da Universidade Federal de Minas Gerais. As autoras e autor agradecem as contribuições de toda equipe de pesquisadores, especialmente Renata Salles e Viviane Fernandes, pela elaboração das tabelas e gráfico, e Gabriel da Cruz pela elaboração do mapa.

Referências

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  • THEODORE, N.; PECK, J.; BRENNER, N. (2009). Urbanismo neoliberal: la ciudady el imperio de los mercados. Temas Sociales, n. 85. Santiago/Chile.

Notas

  • 1
    Organização da Sociedade Civil (OSC) é a forma mais recente (lei n. 13.019/2014 e lei n. 13.204/2015) de designar entidades institucionalizadas (com CNPJ) ou de direito privado, sem fins lucrativos e não governamentais ( Lopez, 2018LOPEZ, F. G. (org.) (2018). Perfil das organizações da sociedade civil no Brasil. Brasília, Ipea. Disponível em: http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_content&view=article&id=33432 Acesso em: 20 out 2020.
    http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?...
    ).
  • 2
    Este recorte inclui os municípios de Brumadinho, Caeté, Itatiaiuçu, Nova Lima, Raposos, Rio Acima e Sabará.
  • 3
  • 4
    Ribeiro (2020)RIBEIRO, L. C. Q. (2020). As metrópoles e o direito à cidade na inflexão ultraliberal da ordem urbana brasileira. Texto para discussão. Rio de Janeiro, Observatório das Metrópoles. compreende inflexão ultraliberal como a dinâmica instaurada no Brasil após o golpe parlamentar e o posterior impeachment de Dilma Rousseff. A inflexão sinaliza a ruptura com um ciclo de organização política e econômica inaugurado a partir da redemocratização, com governos que conciliaram medidas conservadoras e compromissos com os setores populares. A tese central de Ribeiro (ibid.) é a de que o Golpe de 2016 “alterou de maneira radical essa correlação de forças que vinha se constituindo no interior do bloco de poder na direção de um controle mais efetivo por parte das forças conservadoras” (p. 2).
  • 5
    Cidadania regulada é um conceito cunhado por Wanderley Guilherme dos Santos que entende o caso brasileiro do desenvolvimento da cidadania “[...] cujas raízes encontram-se, não em um código de valores políticos, mas em um sistema de estratificação ocupacional, e que ademais, tal sistema de estratificação ocupacional é definido por norma legal. Em outras palavras, são cidadãos todos aqueles membros da comunidade que se encontram localizados em qualquer uma das ocupações reconhecidas e definidas em lei” ( Santos, 1979SANTOS, W. G. (1979). Cidadania e justiça: a política social na ordem brasileira. Rio de Janeiro, Campus. , p. 75).
  • 6
    Regulamentado pela emenda constitucional n. 19, de 4 de junho de 1998.
  • 7
    Na lista de associados, ao lado de fundações empresariais brasileiras (que inclui grandes bancos privados, empresas mineradoras e da construção civil), figuram também grande quantidade de entidades estrangeiras, como as fundações Bunge, Cargill, Nestlé Brasil, Nokia, Volkswagen, os institutos Coca-Cola Brasil, HSBC Solidariedade, Renault, Wal-Mart, além da participação direta de empresas como Monsanto e Microsoft, dentre outras. Disponível em: https://gife.org.br/quem-somos-gife/ . Acesso em: 15 maio 2021.
  • 8
    Disponível em: https://gife.org.br/investimento-social-privado . Acesso em: 15 maio 2021.
  • 9
    Multinacionais: AngloGold Ashanti; ArcelorMittal; CSN Mineração S.A.; Jaguar Mining Inc.; Mineração Usiminas S.A.; Vale S.A.; Vallourec Mineração. Nacionais: Cefar; Comisa; Ferrous Resources do Brasil; Grupo AVG; Grupo MBL; Herculano Mineração; London Mining Brasil; Mineral do Brasil; Mineração Boa Vista; Mineração Serra Azul; Minerita - Minérios Itaúna Ltda; Tamisa Mineração; Vórtice Mineral.
  • 10
    AngloGold Ashanti; ArcelorMittal; CSN Mineração S.A.; Jaguar Mining Inc.; Mineração Usiminas S.A.; Vale S.A.; Vallourec Mineração; Vórtice Mineral.
  • 11
    Disponível em: https://pactoglobal.org.br/no-brasil . Acesso em: 2 jun 2021.
  • 12
    Disponível em: https://pactoglobal.org.br/no-brasil . Acesso em: 2 jun 2021.
  • 13
  • 14
  • 15
    Como senso comum, entende-se aqui uma espécie de cimento que liga e cria consensos sobre a maneira de compreender, agir e julgar a vida social. Poderia ser quase sinônimo de ideologia no sentido que é compartilhado pelo grupo, abarca a vida social e, por ser muito familiar, nem sempre será visível para quem compartilha.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    04 Maio 2022
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2022

Histórico

  • Recebido
    19 Ago 2021
  • Aceito
    27 Set 2021
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