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ANÁLISE COMPARADA DA JORNADA ESCOLAR EM PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA

Resumo

O presente artigo tem como objetivo analisar as jornadas escolares de países da União Europeia, sistematizando semelhanças e diferenças entre os sistemas educativos. A análise comparada envolveu quinze países-membros e focalizou as fases descritiva e comparativa do método comparativo clássico. As jornadas escolares são construções sócio-históricas e culturais, o que resulta em políticas ora convergentes, ora divergentes na região. De forma geral, a jornada escolar compulsória dos países europeus é de 5 a 6 horas diárias. No entanto existem muitas especificidades, entre as quais o investimento em políticas que integram atividades curriculares, extracurriculares e tempos socioeducativos supervisionados. Por meio da análise comparada foi possível identificar perspectivas e alternativas à configuração da jornada escolar para melhor responder às demandas e necessidades dos sujeitos da educação.

JORNADA ESCOLAR; SISTEMA EDUCATIVO; UNIÃO EUROPEIA; POLÍTICA EDUCACIONAL

Abstract

This article aims to analyze the school days in European Union countries, systematizing similarities and differences between education systems. The compared analysis involved fifteen member countries and focused on the descriptive and comparative phases of the classical comparative method. School days are socio-historical and cultural constructions, which result in sometimes convergent, sometimes divergent policies in the region. In general, the compulsory school day in European countries is from 5 to 6 hours per day. However, there are many features, including investment in policies that integrate curricular and extracurricular activities, as supervised socio-educational times. Through compared analysis, it was possible to identify perspectives and alternatives to the school day configuration to better answer to the demands and needs of the subjects of education.

SCHOOL DAY; EDUCATION SYSTEM; EUROPEAN UNION; EDUCATIONAL POLICY

Résumé

Cet article vise à analyser la durée de la journée scolaire des pays de l’Union européenne et systematiser les similitudes et les différences entre les systèmes éducatifs. L’analyse comparée a porté sur quinze pays membres et s’est concentrée sur les phases descriptive et comparative de la méthode comparative classique. Les journées scolaires sont des constructions socio-historiques et culturelles, qui entrainent des politiques tantot convergentes, tantot divergentes dans la région. En général, la journée scolaire obligatoire dans les pays européens est de 5 à 6 heures par jour. Cependant, il existe de nombreuses spécificités, notamment l’investissement dans des politiques intégrant les programmes d’études, les activités parascolaires et les périodes socio-éducatives supervisées. Grâce à une analyse comparative, il a été possible d’identifier des perspectives et des alternatives à la configuration de la journée scolaire afin de mieux répondre aux demandes et aux besoins des sujets de l’éducation.

JOURNÉE SCOLAIRE; SYSTÈME EDUCATIF; UNION EUROPÉENNE; POLITIQUE DE L’EDUCATION

Resumen

Este artículo tiene como objetivo analizar las jornadas escolares de países de la Unión Europea, sistematizando similitudes y diferencias entre los sistemas educativos. El análisis comparado involucró a quince países miembros y se centró en las fases descriptiva y comparativa del método comparativo clásico. Las jornadas escolares son construcciones sociohistóricas y culturales, que resultan en políticas a veces convergentes y otras veces divergentes en la región. En general, la jornada escolar obligatoria en los países europeos es de 5 a 6 horas al día. Sin embargo, hay muchas especificidades, entre ellas la inversión en políticas que integran actividades curriculares, extracurriculares y tiempos socioeducativos supervisados. A través del análisis comparado fue posible identificar perspectivas y alternativas a la configuración de la jornada escolar para responder mejor a las demandas y necesidades de los sujetos de la educación.

JORNADA ESCOLAR; SISTEMA EDUCATIVO; UNIÓN EUROPEA; POLÍTICA EDUCATIVA

Os tempos escolares são construções sócio-históricas e culturais e se materializam por meio de diferentes aspectos, entre os quais estão o início e a duração da escolarização obrigatória, a carga horária letiva, o ano letivo, o calendário escolar, a jornada escolar, etc. As transformações históricas, sociais, políticas, econômicas e culturais influenciam na estrutura dos sistemas educativos e, consequentemente, no modo de organização da instituição escolar (ELIAS, 1998ELIAS, Norbert. Sobre o tempo. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1998.; ESCOLANO BENITO, 2000ESCOLANO BENITO, Agustín. Tiempos y espacios para la escuela: ensayos históricos. Madrid: Biblioteca Nova, 2000.; CANÁRIO, 2005CANÁRIO, Rui. O que é a escola? Porto: Porto, 2005.; PARENTE, 2010PARENTE, Claúdia da Mota Darós. A construção dos tempos escolares. Educação em Revista, Belo Horizonte, v. 26, n. 2, p. 135-156, ago. 2010.).

A temática dos tempos escolares ganhou destaque internacional no final do século XX. Nas décadas de 1980 e 1990, respectivamente, foram divulgados dois informes americanos que reverberaram no contexto internacional: o primeiro recomendava a ampliação do tempo do aluno na escola (UNITED STATES OF AMERICA - USA, 1983); o segundo indicava que o tempo ampliado deveria ser utilizado de forma diferenciada e com maior qualidade (USA, 1994).

Pereyra (1992PEREYRA, Miguel Angel. La construcción social del tiempo escolar. Cuadernos de Pedagogía, n. 206, p. 8-12, 1992.) faz referência às mudanças políticas e econômicas que estavam ocorrendo em ordem mundial e que repercutiram nos sistemas educativos, exigindo reformas educacionais para melhor atender às demandas de forma eficiente e eficaz. Nesse contexto, passou-se a defender que mais tempo na escola poderia gerar um maior rendimento, ideia que nunca foi unânime.

No contexto europeu, Escolano Benito (2000) faz menção a dois pesquisadores, entre outros, que se dedicaram à temática dos tempos escolares: Wolfgang Mitter, pesquisador alemão que passou a estudar o tema em 1987, analisou inovações nos tempos escolares de onze países (dez países europeus e o Japão); e Marie-Madeleine Compère, pesquisadora francesa que, em 1997, publicou o livro Histoire du temps scolaire en Europe, que reúne estudos de pesquisadores de diversos países.

Há mais duas décadas, Mitter (1992MITTER, Wolfgang. Tiempo escolar y duración de la enseñanza escolar en Alemania: una comparación a nivel europeo. Revista de Educación, n. 298, p. 221-233, 1992.) já destacava que as comparações internacionais entre os tempos escolares dos sistemas educativos são relevantes por vários motivos, entre eles o interesse em saber se há relação entre tempo e aprendizado/rendimento escolar e se a forma como o tempo é distribuído traz consequências para o aprendizado. Por sua vez Compère (2000COMPÈRE, Marie-Madeleine. La Historia del tiempo escolar en Europa. In: BERRIO, Julio Ruiz (ed.). La cultura escolar de Europa: tendencias históricas emergentes. Madrid: Editorial Biblioteca Nueva, 2000. p. 19-41.), ao fazer considerações sobre o exercício comparado entre os sistemas educativos, alerta para o fato de que, em muitos países, a organização dos tempos escolares tem ficado a cargo das administrações regionais e locais, o que acarreta uma acentuação das diferenças entre os países, com consequências para as tipologias do tempo escolar.

No âmbito da European Commission (Comissão Europeia), a Rede Eurydice1 1 A Rede Eurydice é composta por 28 países-membros, além de: Albânia, Bósnia e Herzegovina, Macedônia, Islândia, Liechtenstein, Montenegro, Noruega, Sérvia, Suíça e Turquia. Informações disponíveis em: http://ec.europa.eu/dgs/education_culture/docs/organisation_en.pdf. Acesso em: 25 jul. 2019. tem como objetivo sistematizar e fornecer informações sobre os sistemas educativos dos diferentes países-membros, inclusive de seus vários aspectos temporais.

As informações da Rede Eurydice têm servido de referência para estudos comparados na área da educação. Pereyra (2005PEREYRA, Miguel Angel. A vueltas con la jornada y los tiempos escolares en el comienzo de una nueva época, 2005. Available at: http://www.observatoriodelainfancia.es/oia/esp/documentos_ficha.aspx?id=551. Access on: 30 jun. 2019.
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) apresenta alguns aspectos temporais dos países-membros da União Europeia e, adicionalmente, tece considerações sobre Alemanha e Dinamarca. Lázaro Herrero (2007), após comparar diferentes aspectos temporais dos países-membros, analisou a perspectiva social da jornada escolar de quatro países especificamente: Espanha, França, Itália e Portugal. Kamette (2011) compara os tempos escolares dos seguintes países: França, Alemanha, Inglaterra, País de Gales, Espanha, Itália e Holanda.

No que concerne à configuração da jornada escolar nos diferentes sistemas educativos, foco deste artigo, existem dois movimentos: por um lado, a globalização pauta certas tendências, inclusive induzindo processos de uniformização e padronização no campo da educação (DALE, 2004DALE, Roger. Globalização e educação: demonstrando a existência de uma “cultura educacional mundial comum” ou localizando uma “agenda globalmente estruturada para a educação”?. Educação e Sociedade, Campinas, v. 25, n. 87, p. 423-460, maio/ago. 2004.); por outro, em virtude das especificidades históricas e culturais dos diferentes países, há um movimento de construção de opções e estratégias próprias de cada cenário. Existem, portanto, algumas tendências em relação à jornada escolar em âmbito internacional. No entanto a sua configuração é resultado do processo histórico de cada país. Conforme Escolano Benito (2000, p. 155), “los sistemas educativos han mantenido la estructura y las tradiciones que venían mostrando”, mas há uma tendência à convergência, segundo o autor, “que todavía está lejos [...] de la uniformización”.

Expostas essas considerações iniciais, indaga-se: como os países europeus organizam suas jornadas escolares? Diante desse questionamento, o principal objetivo do artigo é analisar as jornadas escolares de países da União Europeia, apresentando semelhanças e diferenças entre os sistemas educativos.

Neste artigo, ao analisar as jornadas escolares de diferentes países, é possível perceber suas inúmeras possibilidades organizativas. Isso demarca que a jornada é uma construção e, portanto, deve ser continuamente “des/reconstruída” de modo a atender às demandas e às necessidades socioeducativas dos sujeitos da educação em cada contexto histórico.

DELINEAMENTO DA PESQUISA

O artigo apresenta alguns resultados de uma pesquisa2 2 Pesquisa “Modelos e experiências de jornada escolar na União Europeia: contribuições para a análise das políticas de educação integral em tempo integral no Brasil”, realizada na Universidad de Salamanca, Espanha, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). mais ampla que analisou a jornada escolar e as políticas de ampliação da jornada escolar em países-membros da União Europeia. Neste artigo especificamente serão apresentados resultados relativos à configuração da jornada escolar compulsória de quinze países-membros: Alemanha, Áustria, Bélgica, Dinamarca, Escócia, Espanha, Finlândia, França, Holanda, Inglaterra, Irlanda, Irlanda do Norte, Itália, Portugal e Suécia.

A escola, assim como seus muitos aspectos temporais, são construções sociais que se transformam ao longo do tempo. Essas transformações repercutem na organização do currículo escolar obrigatório e, consequentemente, na forma de organização da jornada escolar.

Nesses movimentos históricos, passou-se a incorporar na jornada escolar compulsória de alguns países outros tempos e atividades que antes não faziam parte do horário letivo, por exemplo atividades extracurriculares, tempos supervisionados, intervalos para descanso e tempos para refeição. Em outros países esses tempos permanecem fora da jornada compulsória do aluno, podendo ter oferta obrigatória ou facultativa por parte dos sistemas educativos. Neste artigo, o foco está especificamente na jornada escolar compulsória, ainda que cada vez mais estejam sendo formuladas e implementadas políticas de ampliação do tempo do aluno na escola de forma facultativa.

No âmbito da European Commission existem diferenças em relação à escolarização obrigatória, como por exemplo a idade de início e sua duração, o que pode interferir na organização da jornada escolar e no exercício comparativo. Por isso, para fins de comparação na área de educação, utiliza-se o ISCED (International Standard Classification of Education). O artigo focaliza o nível 1 do ISCED (level 1, primary education), ou seja, os primeiros anos de escolarização obrigatória aqui denominados genericamente como “educação primária”, que podem ter duração de 4 a 7 anos (UNESCO, 2012).

Os dados da jornada escolar dos países analisados foram coletados por meio da Rede Eurydice da European Commission (2019). Além disso procedeu-se, de forma complementar, a uma análise de documentos oficiais dos países-membros e à coleta de informações junto aos órgãos dos países investigados.

A análise privilegiou as fases descritiva e comparativa do método comparativo clássico (FERRER JULIÁ, 2002FERRER JULIÁ, Ferran. La educación comparada actual. Barcelona: Ariel, 2002.) e esteve embasada teoricamente no campo de análise de políticas públicas (MULLER; SUREL, 2002MULLER, Pierre; SUREL, Yves. A análise das políticas públicas. Pelotas: Educat, 2002.; YANG, 2015YANG, Rui. Comparações entre políticas. In: BRAY, Mark; ADAMSON, Bob; MASON, Mark (org.). Pesquisa em educação comparada: abordagens e métodos. Brasília: Liber Livro, 2015. p. 319-343.; HOWLETT; RAMESH; PERL, 2013HOWLETT, Michael; RAMESH, Mishra; PERL, Anthony. Política pública: seus ciclos e subsistemas - uma abordagem integradora. Rio de Janeiro: Elsevier, 2013.), já que a jornada escolar é parte da política educativa de cada país e se materializa por meio das ações do Estado expressas, entre outras formas, em seu ordenamento normativo-legal.

ASPECTOS TEMPORAIS DOS SISTEMAS EDUCATIVOS DA UNIÃO EUROPEIA

Comparar aspectos temporais de diferentes países não é uma tarefa fácil. Há muitos tempos escolares e eles estão intrinsecamente relacionados. Existem países que têm uma jornada escolar compulsória maior do que os demais. No entanto é possível que o ano letivo desses países seja mais curto, que as férias sejam maiores ou que a carga horária letiva seja menor. Assim, antes de tratar especificamente da jornada escolar, é importante mencionar, ainda que de maneira breve, alguns outros tempos que estão associados a ela.

Tomando como referência relatórios recentes da European Commission (2018a, 2018b), a escolarização obrigatória na maior parte dos países europeus começa na educação primária, entre 5 e 7 anos de idade, geralmente não antes dos 5 e não depois dos 7 anos. A duração dessa etapa tem entre 4 e 7 anos (nível 1 do ISCED). Em média, a escolarização obrigatória varia entre 8 e 12 anos, incluindo educação primária e secundária.

Em termos de calendário escolar, a grande maioria dos países inicia as aulas em setembro e o final do ano letivo pode variar entre final de maio e meados de julho. O ano letivo tem entre 170 e 190 dias, e as férias de verão variam de 6 a 15 semanas.

No que se refere à carga horária letiva mínima obrigatória, ela está geralmente associada ao número de anos de escolarização obrigatória. Na maioria dos sistemas educativos, a carga horária relativa ao período de escolarização obrigatória é menor do que 7.600 horas (países com 8 ou 9 anos de escolarização obrigatória). Em países com escolarização obrigatória de 10 anos, a carga horária recomendada situa-se entre 7.616 e 9.340 horas. Em países com escolarização obrigatória entre 11 e 12 anos, a carga horária situa-se entre 9.918 e 11.340 horas de ensino. Apesar disso existem exceções, por exemplo a Dinamarca, que tem uma carga horária dentro desse último intervalo, mas apresenta 10 anos de escolarização obrigatória.

No que tange especificamente à educação primária (nível 1 do ISCED), foco deste estudo, os países têm entre 4 e 7 anos de escolarização obrigatória com carga horária de 4.000 horas ou mais.

Quanto às disciplinas na educação primária, a área de Leitura, Escrita e Literatura é a que ocupa a maior parte da carga horária, em média 26% (946 horas); a Matemática ocupa a segunda maior parte da carga horária, em média 18% do total (670 horas).

Esses e outros aspectos demarcam algumas aproximações e diferenças entre os países da União Europeia. São tempos escolares que estão extremamente articulados. Qualquer exercício comparativo precisa considerar essas especificidades.

A EDUCAÇÃO PRIMÁRIA EM PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA: DEFININDO O CENÁRIO COMPARATIVO

Para realizar uma análise da jornada escolar, primeiro serão apresentadas algumas características da educação primária compulsória dos quinze países investigados neste artigo, com ênfase no seu início e na sua duração.

Nos países analisados, a duração da escolarização compulsória varia entre 9 e 12 anos, com prevalência de 10 anos de duração, o que ocorre em sete países.

A escolarização compulsória, na maioria dos países, tem início na educação primária. No entanto, em alguns países, inicia-se na educação infantil, a exemplo de Áustria, Finlândia e Suécia.

A entrada na educação primária dos países analisados ocorre entre 4 e 7 anos de idade. O ingresso aos 4 anos é compulsório na Irlanda do Norte, enquanto na Irlanda e na Holanda é facultativo. Dos quinze países investigados: nove estabelecem a idade inicial da educação primária compulsória aos 6 anos de idade; três, aos 5 anos; e, em dois países, aos 7 anos.

A duração da primeira etapa da escolarização obrigatória varia entre 4 e 10 anos. Tal variação ocorre em função de alguns países (Dinamarca, Finlândia, Portugal e Suécia) terem uma estrutura que integra os níveis 1 e 2 do ISCED. Inicialmente, optou-se por evidenciar a estrutura original de cada país. No entanto, mais adiante, na análise da jornada escolar, o artigo focalizará apenas os primeiros anos de escolarização obrigatória (nível 1 do ISCED).

Conforme o Quadro 1, na maior parte da Alemanha, a educação compulsória tem duração de 9 anos.3 3 Em alguns lugares, incluindo Berlim, a educação compulsória dura 10 anos. As diferenças existentes decorrem do federalismo alemão, já que cada unidade federativa (Land) tem autonomia para definições no âmbito da educação. Geralmente a educação primária (Grundschule) compreende a idade de 6 a 10 anos, com 4 anos de duração.

A escolarização obrigatória na Áustria ocorre dos 5 aos 15 anos de idade, iniciando-se na educação infantil. A educação primária (Volksschule) compreende 4 anos de escolarização, dos 6 aos 10 anos de idade.

Na Bélgica,4 4 Considerando informações relativas às três comunidades linguísticas do país: comunidade flamenga, comunidade francesa e comunidade germanófona. a escolarização obrigatória vai dos 6 aos 18 anos de idade, compreendendo a educação primária (Lager onderwijs/École primaire/Primarschule), com 6 anos de duração (dos 6 aos 12 anos), e a educação secundária.

A faixa etária obrigatória para frequentar a escola na Dinamarca é dos 6 aos 16 anos. O país tem uma estrutura integrada (Folkeskole) com 10 anos de escolarização que compreende os níveis 1 e 2 do ISCED.

QUADRO 1
EDUCAÇÃO PRIMÁRIA EM PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA (2019)

A educação compulsória na Escócia abrange a idade de 5 a 16 anos. A educação primária (Primary education), especificamente, compreende 7 anos de escolarização, dos 5 aos 12 anos.

Na Espanha, a escolarização obrigatória abrange a idade de 6 a 16 anos, com 10 anos de duração. Engloba a educação primária (6 anos de duração) e o ensino secundário inferior (4 anos de duração).

Na Finlândia, a escolarização compulsória tem início ainda na educação infantil, aos 6 anos de idade. O país tem uma estrutura integrada (Perusopetus/Grundläggande utbildning5 5 Em finlandês e sueco, respectivamente, as línguas oficiais do país. ) com 9 anos de escolarização e início aos 7 anos de idade (níveis 1 e 2 do ISCED).

Na França, a escolarização obrigatória ocorre dos 6 aos 16 anos (10 anos de duração). A educação primária (École elémentaire) compreende 5 anos, dos 6 aos 11 anos.

A escolarização obrigatória na Holanda ocorre dos 5 aos 16 anos de idade.6 6 Educação compulsória dos 5 aos 16. Dos 16 aos 18 anos, os alunos são obrigados a ter uma qualificação básica. A educação primária (Primair onderwijs) consiste em 8 anos de duração, já que as crianças podem iniciar aos 4 anos, ainda que não seja compulsória, o que ocorrerá dos 5 aos 12 anos de idade (7 anos de duração, nível 1 do ISCED).

Na Inglaterra, a educação compulsória vai dos 5 aos 16 anos de idade (11 anos de duração). A educação primária (Primary education) compreende 6 anos de escolarização (5 aos 11 anos).

A faixa etária obrigatória para frequentar a escola na Irlanda é de 6 a 16 anos (duração de 10 anos). As escolas primárias atendem crianças de 4 a 12 anos. No entanto apenas 6 anos são compulsórios, dos 6 aos 12 anos (nível 1 do ISCED).

Na Irlanda do Norte, a educação compulsória se estende dos 4 aos 16 anos (duração de 12 anos). A educação primária geralmente atende crianças entre 4 e 11 anos de idade e tem 7 anos de duração.

Na Itália, a escolarização obrigatória tem a duração de 10 anos. A educação primária (Scuola primaria) é destinada a crianças na faixa etária de 6 a 11 anos, com 5 de duração.

Em Portugal, a escolarização obrigatória tem 12 anos de duração (6 aos 18 anos) e é composta pelo ensino básico (9 anos de duração, níveis 1 e 2 do ISCED) e pelo ensino secundário (3 anos).

Na Suécia, a escolarização obrigatória vai dos 6 aos 16 anos de idade (10 anos de duração), com início na educação infantil. O país tem uma estrutura (Grundskola) que agrega os níveis 1 e 2 do ISCED, com início aos 7 anos de idade e duração de 9 anos.

O Quadro 1 mostra que há algumas convergências entre os quinze países analisados, com destaque para o fato de que a grande maioria inicia a escolarização obrigatória na educação primária, aos 6 anos de idade. No entanto existem muitas outras especificidades, a exemplo da duração da escolarização obrigatória e da duração da educação primária. Essas diferenças repercutem na distribuição da carga horária de cada etapa da escolarização obrigatória e das disciplinas que compõem o currículo escolar, o que precisa ser considerado diante de outros elementos temporais relativos à jornada escolar.

JORNADA ESCOLAR: DEFINIÇÕES E CLASSIFICAÇÕES

A jornada escolar (school day) tem sido alvo de políticas educativas recentes em diferentes países, ou seja, ela está na agenda político-educacional em âmbito internacional.

É possível sistematizar quatro fatores que vêm sustentando as discussões sobre a jornada escolar na atualidade, assim como impulsionando a formulação e a implementação de políticas públicas na área. Primeiro destacam-se as demandas relativas a ações socioeducativas para a conciliação entre jornada escolar e jornada laboral das famílias (PEREYRA, 2005PEREYRA, Miguel Angel. A vueltas con la jornada y los tiempos escolares en el comienzo de una nueva época, 2005. Available at: http://www.observatoriodelainfancia.es/oia/esp/documentos_ficha.aspx?id=551. Access on: 30 jun. 2019.
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). O aumento de mulheres no mercado de trabalho, por exemplo, é uma das causas do crescimento dessa demanda. Em segundo lugar, há o crescimento da preocupação com o tempo ocioso do aluno após a escola, ou seja, têm sido demandadas ações que promovam maior segurança às crianças e aos adolescentes em seus tempos livres, com supervisão de adultos, o que reflete na função social da escola. Um terceiro aspecto refere-se às possibilidades de ampliação das oportunidades educativas por meio de atividades que, tradicionalmente, o currículo escolar não tem enfatizado. Em quarto lugar está a preocupação em torno da eficiência dos sistemas educativos, com a exigência de que o tempo que o aluno passa na escola - financiado com recursos públicos - possa ser devidamente avaliado, medido e quantificado por meio de resultados em avaliações de rendimento escolar.

Esses e outros aspectos trazem à tona questões e proposições relativas à jornada escolar, ao tempo que o aluno permanece na escola, sob a sua supervisão no âmbito do sistema educativo ou em articulação com outras instituições públicas e privadas.

A jornada escolar, assim como todos os tempos escolares, produz movimentos históricos; é resultado das políticas e ações em andamento nos diferentes sistemas educativos que, por sua vez, estão embasadas em diversos argumentos sociais, políticos, pedagógicos e/ou culturais.

As jornadas escolares vigentes em distintos países não são as mesmas de tempos atrás e podem sofrer alterações futuramente. Esses movimentos indicam a importância da realização contínua de análises das jornadas escolares em diferentes países e até mesmo dentro de seu próprio espaço geográfico.

Devido à sua complexidade, a configuração da jornada escolar não pode ser compreendida apenas por meio do tempo que o aluno passa diariamente na escola. Na análise da jornada escolar é recorrente que se faça menção apenas à carga horária diária do aluno. Com razão esse é o elemento central da jornada escolar. No entanto a aproximação com as diretrizes e práticas dos sistemas educativos de diferentes países evidencia que tempos diários iguais resultam em diferentes formas de organização da jornada escolar.

Em muitos países, vêm ocorrendo alterações relativas ao tempo que o aluno passa na escola. Contudo é preciso destacar que nem sempre a chamada jornada escolar ampliada (extended school day) refere-se a tempos compulsórios (compulsory education). Ou seja, na análise da jornada escolar de cada país é preciso identificar, em primeiro lugar, quais tempos são compulsórios e quais são facultativos. A pesquisa que originou este artigo focaliza esses dois elementos (school day e extended school day). Porém, neste artigo, os dados dizem respeito apenas à jornada escolar compulsória.

Pesquisadores espanhóis costumam classificar a jornada escolar em dois tipos básicos: jornada partida e jornada contínua (PEREYRA, 2005PEREYRA, Miguel Angel. A vueltas con la jornada y los tiempos escolares en el comienzo de una nueva época, 2005. Available at: http://www.observatoriodelainfancia.es/oia/esp/documentos_ficha.aspx?id=551. Access on: 30 jun. 2019.
http://www.observatoriodelainfancia.es/o...
; LÁZARO HERRERO, 2007LÁZARO HERRERO, Luján. La perspectiva social de la jornada escolar en la Unión Europea: estudio comparado en Italia, Francia, Portugal y España. 2007. Tese (Doctorado en Educación) - Universidad de Salamanca, Salamanca, 2007.). A jornada partida seria aquela em que a jornada escolar compulsória é dividida em dois períodos (manhã e tarde) com um intervalo para o almoço. É justamente por causa dessa pausa (que divide as atividades compulsórias em dois momentos) que esse tipo de jornada é denominada partida. Durante muito tempo esse tipo de jornada vigorou na maior parte dos países europeus.

No entanto, nas últimas décadas, alguns países têm investido numa jornada mais compacta. Não significa uma jornada escolar mais curta, mas sim a eliminação de longas pausas ou a sua diminuição. Assim alguns países concentram a jornada escolar em apenas um período, geralmente na parte da manhã (às vezes, atingindo algumas horas do período da tarde). São países que têm uma jornada contínua, ou seja, sem interrupção da jornada escolar compulsória.

Existem ainda países nos quais é possível ter os dois tipos de jornada escolar (partida e contínua), comumente denominada jornada mixta ou combinada.

No entanto a jornada escolar compulsória passou por movimentos que impõem alguns limites à classificação exposta ou, no mínimo, exigem a constante reclassificação dos países, o cuidado na definição dos termos e a consideração de novos elementos que estão sendo introduzidos na jornada escolar. Isso porque o almoço é parte da jornada escolar compulsória em alguns países. Nesse caso, apesar do almoço dividir a jornada escolar em dois momentos, é um período que está integrado ao currículo e, portanto, é compulsório.

Na literatura internacional, existe outro tipo de classificação da jornada escolar: jornada parcial (meia jornada ou half-day school) e jornada integral (jornada completa ou all-day school/full-time school). A jornada parcial pode ser conceituada como aquela na qual há concentração da jornada escolar compulsória em apenas um período (manhã ou tarde), ou seja, meio dia/meio período/meia jornada (half-day). Por isso o conceito de jornada parcial tem certa proximidade com o conceito de jornada contínua citado anteriormente. No entanto jornada contínua não é sinônimo de jornada parcial. Em vários países latino-americanos, a exemplo do Brasil, a jornada parcial é necessária em função da existência dos turnos escolares, medida utilizada para a duplicação ou triplicação de vagas na escola - situação que não ocorre nos quinze países investigados.7 7 A legislação portuguesa faz menção à possibilidade de existência de turnos no caso de necessidade de vagas.

A jornada integral pode ser conceituada como aquela na qual o aluno fica na escola o dia inteiro/dia completo de forma compulsória. Nesse período, geralmente, estão incluídas atividades curriculares, extracurriculares, refeições e pausas para descanso. Muitas vezes confunde-se jornada integral com jornada partida. Isso porque ambas ocorrem em dois períodos: manhã e tarde. Embora em muitos países europeus os alunos fiquem na escola nos períodos da manhã e da tarde, respectivamente, não significa que fiquem integralmente na escola. Em alguns deles, a pausa para o almoço, por exemplo, permite que o aluno vá até sua casa para almoçar. Nesse caso a pausa entre um período e outro não é compulsória e, portanto, a jornada do aluno não deve ser denominada jornada integral. São poucos os países europeus que oferecem jornada integral, ou seja, que tornam compulsória a presença do aluno na escola por períodos extensos, entre sete e oito horas por dia.

Para a tradução da expressão jornada integral, no contexto europeu, tem sido utilizado o termo all-day school. O termo full-time school tem sido empregado no contexto latino-americano como tradução de educação em tempo integral e educación a tiempo completo. Com base na Rede Eurydice, o termo full-time education tem significado distinto de all-day school. A expressão full-time education está relacionada a um tempo especificamente destinado à escolarização obrigatória. Por isso part-time education refere-se ao momento da escolarização no qual o aluno já pode conciliar tempo de estudo com tempo de trabalho. O termo full-time education, quando traduzido para a língua portuguesa (de Portugal) transforma-se em educação a tempo inteiro e não deve ser interpretado como sinônimo de jornada integral.

JORNADAS ESCOLARES EM PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA

Para a análise da jornada escolar compulsória serão considerados os seguintes elementos temporais: semana letiva, carga horária semanal e carga horária diária. No que se refere à carga horária diária também serão destacados os horários de entrada e saída da escola, bem como o horário relativo ao almoço dos alunos, tendo em vista que, em alguns países, esses tempos são compulsórios.

Espera-se que o exercício comparativo demonstre não apenas semelhanças e diferenças entre os países, mas sobretudo evidencie as muitas possibilidades e alternativas temporais.

SEMANA LETIVA

Os quinze países investigados têm jornada semanal entre quatro e seis dias letivos, com prevalência da jornada semanal de cinco dias, de segunda a sexta-feira. Dos quinze países, doze têm jornada semanal exclusiva de cinco dias. Embora Bélgica e Holanda também tenham jornada semanal de cinco dias, esses países apresentam algumas especificidades: nas escolas belgas a quarta-feira à tarde é livre; na Holanda, as escolas têm ampla autonomia para esse tipo de definição e, geralmente, também têm as tardes de quarta-feira livres.

Na França, é possível encontrar escolas com quatro ou cinco dias letivos por semana. A legislação atual faz referência à oferta de nove períodos (meio dia) de, no máximo, 3 horas e meia. Geralmente às quartas-feiras os alunos têm aulas apenas na parte da manhã. Apesar disso, em 2017, 43% das escolas funcionavam com oito períodos, em geral com a quarta-feira livre.

Alemanha e Itália são os dois países cujas escolas podem ter aulas entre cinco e seis dias por semana. No caso da Alemanha, as definições sobre a organização escolar ocorrem no âmbito de cada estado da federação. Na maioria dos estados federados alemães, a semana letiva é de cinco dias, porém é possível uma semana letiva de seis dias em alguns estados, com dois sábados por mês sem aulas. No caso da Itália, as escolas têm ampla autonomia para definir a semana letiva. Assim é possível ter diferentes modelos de organização da jornada escolar semanal, com cinco dias, de segunda a sexta-feira, ou com seis dias, de segunda-feira a sábado.

CARGA HORÁRIA SEMANAL

Há muitas especificidades nos sistemas educativos analisados no que se refere à carga horária semanal. Em alguns países, há normas gerais relativas a cada uma das etapas de ensino ou à carga horária anual, deixando que as escolas definam a carga horária semanal e diária, o que pode acarretar diferentes possibilidades de organização da jornada escolar. Em outros países, há normas específicas quanto à quantidade de horas diárias, aos tempos específicos destinados aos determinados componentes curriculares, aos tempos destinados a pausas e à alimentação escolar.

Assim, quanto à carga horária semanal, alguns países definem a quantidade de horas semanais e outros estabelecem a quantidade de aulas semanais, sendo que o tempo de cada aula pode variar entre 45 e 60 minutos.8 8 Em função disso o artigo fará uso do termo horas/aula, indistintamente, ainda que se saiba da variação dos tempos de aula. Entre os países pesquisados há uma variação de um mínimo de 15 horas/aula até 40 horas/aula, considerando inclusive as variações em função da idade dos alunos, etapa de escolarização, diferenças regionais e políticas de ampliação da jornada escolar (extended school day). Apesar dessas variações, de forma geral, a carga horária semanal é, em média, de 25 horas/aula em muitos países. A Irlanda do Norte apresenta a menor carga horária semanal, com o mínimo de 15 horas/aula semanais aos estudantes de até 8 anos de idade e o mínimo de 22,5 horas/aula nos anos subsequentes.

Assim como ocorre na Irlanda do Norte, há outros países em que, nos anos iniciais de escolarização obrigatória, há menos horas/aula semanais, ampliando-se nos anos subsequentes de escolarização. Na Finlândia, nos dois primeiros anos de escolarização, oferece-se o montante de 19 horas/aula semanais e 25 horas/aula semanais no 5º e 6º anos. Em Portugal, são oferecidas 22,5 horas/aula nos dois primeiros anos de escolarização e 27 horas/aula nos 3º e 4º anos. Na Dinamarca, a depender do ano de escolarização, há variação entre 30 e 33 horas/aula semanais.

Em outros países há variação da carga horária semanal em função da coexistência interna de diferentes possibilidades organizativas, algumas preestabelecidas em âmbito nacional e outras estabelecidas pelas administrações locais, ou decorrentes da autonomia das escolas. É o que ocorre em três países: Alemanha, Áustria e Itália. Na Alemanha, além de escolas com uma carga horária mínima semanal entre 20 e 29 horas/aula, existem escolas que oferecem all-day school, ou seja, oferta de jornada escolar com carga horária ampliada atingindo os dois períodos, manhã e tarde. A legislação do país faz referência a um mínimo de três dias da semana, quando e onde houver esse tipo de oferta. A pesquisa identificou regiões com escolas que oferecem uma jornada escolar de até 36 horas semanais, geralmente com as tardes de sexta-feira livres, embora existam muitas variações no país.

Na Áustria, além da possibilidade de uma carga horária letiva semanal entre 20 e 25 horas/aulas, o país também vem investindo em all-day school, podendo resultar numa carga horária semanal de até 40 horas.

Por último, deve-se mencionar o caso da Itália. Existem quatro estruturas curriculares básicas em termos de carga horária semanal: 24 horas, 27 horas, 30 horas e 40 horas. O país, desde a década de 1970, passou a oferecer, em uma parte de seu sistema educativo, a chamada scuola a tempo pieno, com carga horária semanal de 40 horas.

CARGA HORÁRIA DIÁRIA

A análise das jornadas escolares dos sistemas educativos mostrou que existem variações importantes no tempo diário dos alunos entre os países investigados, assim como diferenças dentro de um mesmo país. Por isso, nesse exercício comparativo, ora são feitas generalizações - ainda que se tenha ciência das diversidades internas -, ora são apresentadas especificidades.

De forma geral a média de horas diária nos quinze países investigados é de 5 a 6 horas. A Irlanda do Norte é o país com menor carga horária diária: mínimo de 3 horas aos alunos de até 8 anos de idade. Alemanha, Áustria e Itália são os países com até 8 horas diárias. Isso ocorre porque esses países incorporam no tempo diário do aluno outros tipos de atividades que passaram a ser compulsórias a uma parte dos alunos do sistema educativo, como atividades extracurriculares e tempos socioeducativos supervisionados. Esses tipos de atividades também existem nos demais países, no entanto não são compulsórias nem mesmo a uma parcela do alunado.

Em relação ao horário de entrada e saída da escola, o início da jornada escolar compulsória geralmente ocorre entre 8 e 9 horas da manhã. Embora existam variações, a Alemanha é o país no qual a entrada na escola ocorre mais cedo, às 7h30. No que se refere à saída, a variação entre os países é muito maior em função das diferenças relativas à carga horária diária e às pausas para intervalos e alimentação.

Em relação ao intervalo para alimentação, nos quinze países analisados é possível ter uma pausa que pode variar entre 30 minutos e 2 horas de duração. Esse período pode ser ou não parte da jornada escolar compulsória, o que indicará se o aluno deve ou não permanecer na escola para realizar suas refeições. Entre os países analisados existem as seguintes opções: 1) o aluno pode ir para casa almoçar e retornar para o período vespertino; 2) o aluno pode alimentar-se nas dependências da própria escola com a refeição que trouxe de casa; 3) o aluno pode receber alimentação escolar gratuita no refeitório da própria escola; 4) o aluno pode pagar pelo serviço de alimentação oferecido compulsoriamente pela escola/Estado (com ou sem subvenção); 5) o aluno pode comprar alimentos em cantinas/lanchonetes existentes na escola.

Em muitos países há mais de uma possibilidade entre as opções elencadas. A título de exemplo, na Espanha, nas escolas com jornada partida, os alunos podem ir para casa almoçar ou podem, previamente, inscrever-se nos serviços de comedor escolar. É um serviço que deve ser pago pelas famílias, mas que pode ter subvenção estatal. No entanto, no caso espanhol, assim como em muitos outros, o horário do almoço não é contabilizado como parte da jornada escolar e, por isso, não é compulsório.

Já em alguns países a pausa para alimentação escolar está integrada à jornada escolar compulsória, a exemplo de Finlândia e Suécia. Além de tempo compulsório, nos dois países, a alimentação escolar é gratuita.

No que se refere aos três países com experiências all-day school, algumas características podem ser destacadas. No caso da Alemanha, existe a escola com jornada parcial, que pode ter entre 4 a 6 horas diárias, e que, historicamente, em algumas regiões do país, eram complementadas por ações socioeducativas promovidas por instituições denominadas Hort. Desde o início dos anos 2000, o país passou a implementar ações de ampliação do tempo escolar (extended school day). Entre essas ações está a oferta de all-day school. Existem três tipos básicos de oferta de all-day school no país, oferecidas de forma compulsória ou facultativa ao aluno. Quando compulsória, o aluno é obrigado a permanecer na escola e a participar tanto das atividades curriculares, como dos tempos destinados às atividades extracurriculares e à alimentação escolar. Entre as muitas possibilidades organizativas, é possível que o aluno fique na escola das 8 às 16 horas, ou seja, 8 horas diárias, incluindo uma hora de almoço. No entanto não é comum a oferta de 8 horas todos os dias da semana. Geralmente a tarde de sexta-feira é livre.

Na Áustria também existem escolas com jornada parcial de no mínimo 4 horas e escolas com jornada integral que chegam a 8 horas diárias, além de outras possibilidades de ampliação do tempo do aluno na escola de forma facultativa, a depender dos interesses e necessidades familiares.

Na Itália, país pioneiro na oferta de all-day school entre os países investigados, as quatro possibilidades de carga horária semanal resultam em vários formatos organizativos e numa carga horária diária que varia entre 5 e 8 horas.

Conforme já mencionado, a carga horária compulsória diária de 8 horas nos três países com all-day school não ocorre de forma generalizada, ou seja, existe apenas em parte das escolas que conformam o sistema educativo de cada um dos três países.

O Quadro 2 sintetiza algumas características gerais dos quinze países em termos de diretrizes da jornada escolar compulsória. Dadas as especificidades e variações que podem existir no contexto de cada país, foram estabelecidas aproximações e generalizações.

QUADRO 2
JORNADA ESCOLAR COMPULSÓRIA EM PAÍSES DA UNIÃO EUROPEIA (2019)

CONSIDERAÇÕES FINAIS

O presente artigo teve como objetivo analisar as jornadas escolares de países da União Europeia, sistematizando semelhanças e diferenças entre os sistemas educativos.

O estudo da jornada escolar de quinze países mostrou que existem inúmeras alternativas e possibilidades de organização da jornada escolar compulsória, resultado de construções sócio-históricas e culturais. Por isso sua análise não deve restringir-se apenas à carga horária diária e, sempre que possível, deve relacionar-se a outros elementos temporais, alguns deles expostos neste artigo.

Em síntese, na maioria dos países investigados, a escolarização obrigatória varia entre 9 e 12 anos, com prevalência de 10 anos de duração. No âmbito da educação primária, a semana letiva tem entre quatro e seis dias, com preponderância de cinco dias. A carga horária semanal tem grande variação e depende da idade, da etapa de escolarização, da duração de cada aula e de políticas de ampliação da jornada escolar. Não obstante em muitos países vigora uma jornada semanal de 25 horas, em média. O início das aulas costuma ocorrer entre as 8 e 9 horas da manhã e, em termos de carga horária diária, de forma geral, os países oferecem entre 5 e 6 horas/aula compulsórias; embora alguns países, de forma concomitante, tenham configurações da jornada escolar compulsória que chegam a 8 horas/aula diárias.

Para além do recorte deste artigo, deve-se destacar que a análise comparada centrada apenas nos âmbitos da denominada jornada escolar compulsória dá evidências de que existem alguns limites em não considerá-la de forma conjunta aos atuais movimentos que vêm ampliando seus contornos. Todos os sistemas educativos estão empreendendo distintas políticas (extended school day policies) e produzindo inúmeras inovações nos tempos escolares com vistas a atender demandas específicas, o que vem ampliando o tempo que o aluno passa na escola, na maioria dos casos, de forma facultativa, por meio de ações socioeducativas supervisionadas. No entanto são políticas que não mais se restringem aos âmbitos da escolarização obrigatória e que vêm resultando em articulações junto a outros setores da sociedade. São ações embasadas em argumentos de equidade e atreladas aos interesses e necessidades dos alunos e de suas famílias.

Nesse cenário, do ponto de vista da educação comparada, a “des/reconstrução” da jornada escolar propicia um espaço fértil para novos estudos e sugere a revisão de conceitos e classificações que tragam à tona diferentes modos, olhares e proposições em termos de políticas públicas no contexto internacional.

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  • 1
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  • 2
    Pesquisa “Modelos e experiências de jornada escolar na União Europeia: contribuições para a análise das políticas de educação integral em tempo integral no Brasil”, realizada na Universidad de Salamanca, Espanha, com financiamento da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp).
  • 3
    Em alguns lugares, incluindo Berlim, a educação compulsória dura 10 anos. As diferenças existentes decorrem do federalismo alemão, já que cada unidade federativa (Land) tem autonomia para definições no âmbito da educação.
  • 4
    Considerando informações relativas às três comunidades linguísticas do país: comunidade flamenga, comunidade francesa e comunidade germanófona.
  • 5
    Em finlandês e sueco, respectivamente, as línguas oficiais do país.
  • 6
    Educação compulsória dos 5 aos 16. Dos 16 aos 18 anos, os alunos são obrigados a ter uma qualificação básica.
  • 7
    A legislação portuguesa faz menção à possibilidade de existência de turnos no caso de necessidade de vagas.
  • 8
    Em função disso o artigo fará uso do termo horas/aula, indistintamente, ainda que se saiba da variação dos tempos de aula.
  • 9
    Existem escolas em que há aulas compulsórias à tarde em alguns dias da semana.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    11 Maio 2020
  • Data do Fascículo
    Jan-Mar 2020

Histórico

  • Recebido
    14 Ago 2019
  • Aceito
    22 Out 2019
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