Open-access “Não deixá-los descansar”: perdão e reparação entre mães de vítimas da violência estatal no Rio de Janeiro

“Don’t let them rest”: forgiveness and reparation among mothers of victims of State violence in Rio de Janeiro

Resumo

O artigo acompanha duas mães defensoras de direitos humanos e moradoras de periferias no Rio de Janeiro para discutir os sentidos de reparação que mobilizam no cotidiano desde a perda violenta dos filhos assassinados pela polícia e milícia. Os cuidados com saúde, o lidar com estados de raiva e exaustão, as demandas quanto a precariedade, o sustento material e a preocupação com os filhos ou outras pessoas próximas compõem um modo de subjetividade próprio. Ao mesmo tempo, são tratados pelas políticas de reparação do Estado como demandas que precisam ser atendidas em alguma medida. Os fragmentos etnográficos reunidos aconteceram durante a pandemia de Covid-19, as reflexões não se restringem a esse período.

Palavras-chave
Movimento de Mães e Familiares de Vítimas da Violência Estatal; Reparação; Direitos Humanos; Periferias; Covid-19

Abstract

This article follows the daily journeys of two mothers who defend human rights and live on the outskirts of Rio de Janeiro. It examines the meanings of forgiveness and reparation that they mobilize following the violent loss of their children, who were murdered by police and militia forces. Healthcare practices, coping with states of anger and exhaustion, and the demands of precarity while caring for children and relatives become modes of subjectivity. Simultaneously, these practices transcend the individual sphere and challenge state reparation policies. While the ethnographic fragments analyzed took place during the COVID-19 pandemic, the reflections presented are not restricted to this period.

Keywords
Movement of Mothers and Relatives of Victims of State Violence; Reparation; Human Rights; Peripheries; COVID-19

“Às vezes, a ansiedade estraga tudo” — foi assim que um defensor de direitos humanos, familiar de vítima, sintetizou sua impressão sobre a invasão de uma facção ligada ao tráfico de drogas, no Rio de Janeiro, a um morro perto de onde ele morava. A invasão deu errado porque os “meninos” ficaram ansiosos e subiram antes do horário combinado. Por causa da antecipação — “ansiedade estraga tudo” —, a polícia chegou antes do horário esperado: uma parte do grupo foi presa, outra, executada no alto do morro; a notícia se espalhou, e os outros “bondes” desistiram de entrar como combinaram.

O comentário deste defensor — que chamaremos de Diógenes — sobre a ansiedade estragar tudo fazia alusão a situações vivenciadas nos últimos tempos, no movimento de mães e familiares de vítimas que lutam contra a violência estatal, quando “ansiedade” e “cabeça quente” não ajudavam a resolver nada, pelo contrário, geravam motivos para acusações e novas “tretas”. As “tretas” são interpretadas por vários pesquisadores próximos ao movimento, em geral, como algo negativo, que se desgasta através de brigas por coisas pequenas e desimportantes, o que desvia a energia da missão principal. Qual seria ela? Denunciar a morosidade do judiciário e mobilizar contra a atuação violenta do Estado em favelas e periferias.

As “tretas” são tidas por pesquisadores próximos ao movimento como algo negativo, que desgasta através de brigas por coisas pequenas e desimportantes, desviando a energia da missão principal. Qual seria ela? Denunciar a morosidade do judiciário e mobilizar contra a atuação violenta do Estado em favelas e periferias.

Foi esse mesmo militante quem nos contou, enquanto íamos a uma reunião das mães em Manguinhos, favela situada na Zona Norte do Rio de Janeiro, que “a invenção do pix era mesmo maravilhosa”. A frase me deixou curiosa, eu lhe indaguei o porquê. “Porque a gente estava no enterro de um menino morto em operação nessa mesma comunidade, o IML [Instituto Médico Legal] demorou a chegar com o corpo só para sacanear”. Diógenes explicou ainda que fazem isso quando sabem que o menino é “envolvido”, ou seja, trabalha no tráfico [de drogas]. Os familiares estavam passando mal porque não tinham comido nada, então, com o pix, Diógenes comprou um lanche para todos e relatou: “Aí foi que conseguimos esperar, estava todo mundo com fome”.

É num universo marcado por histórias de mortes, vigilância e controle da polícia, ameaças e reviravoltas dos poderes nos territórios de favelas, marcado também por segredos, “caguetagens” (traições) e alianças4 que se dá a formação de moradores de favelas e periferias como defensores de direitos humanos. Pouco a pouco, esses mesmos moradores são reconhecidos como referência em seus territórios e engajam-se em movimentos políticos que atuam fora da favela, o que gera uma dupla suspeita que recai sobre elas. Isso porque podem ser vistas como “defensoras de bandido” e também como alguém que oferece risco a quem está próximo, já que são ameaçadas de morte no dia a dia, sem que se possa comprová-las, porque as ameaças se dão de maneira sorrateira, como um carro, de repente, “jogado” em sua direção quando você está em uma parada de ônibus; ou quando algum veículo fica na esquina de casa, mas a placa de identificação está coberta e os vidros são opacos porque possuem blackout5.

Para nossa discussão, é fundamental compreender esse cotidiano de suspeição, violência e terror não como uma exceção, mas como constituinte das relações e da própria vida6. Levar em conta outros modos de vida, as éticas particulares (Das, 2020a:4), as epistemologias tecidas em meio aos chamados ilegalismos e relações atravessadas por ceticismo, desconfianças, ameaças, abusos, racismos, discriminações e retaliações torna-se imprescindível. Desse modo, como pano de fundo, pensamos Estado e política nas margens não como ordem democrática incompleta ou falha, tampouco supomos os pobres como alienados políticos (Telles, 2010; Barros, 2014; Jardim; Cortes; Miagusko, 2018; Miagusko, 2016; Hirata, 2018); como sujeitos pentecostais de pouca ou nenhuma agência e as vidas entre o empreendedorismo e a precarização sem capacidade de imaginação ou juízo crítico (Cabanes et al., 2011) (Teixeira, 2014; Rui, 2018; Carriconde, 2019; Cortes, 2014, 2020; Machado, 2014, 2020; Birman, 2020; Santana, 2023; Costa, 2024).

O texto que construímos discutirá como a pesquisa, em conjunto com o ativismo e os saberes que perfazem nossas práticas profissionais de antropóloga e psicólogas, pode contribuir para a luta contra a violência cotidiana que o Estado promove nos territórios pobres. Em especial a violência contra as populações negras e o quanto isso impacta a saúde de mulheres negras e periféricas, mães defensoras de direitos humanos. O que se destacaria como original em termos de clamor público e político, nesse percurso constituído por mortos, carnificinas, medos, perdas, ameaças e adoecimentos?

Diferentes autoras que estudam o tema do movimento de mães e familiares os quais lutam contra a violência estatal, por justiça, memória e reparação, exploraram sua importância como sujeito político e público dos mais genuínos, desde o período pós-ditadura militar (Leite, 2004; Birman; Leite, 2004; Farias, 2007; Araújo, 2007; Vianna; Farias, 2011; Brites; Fonseca, 2013; Vianna, 2015; Rocha, 2018; Ferreira et al., 2019; Almeida, 2019; Eilbaum, 2024; Fernandes, 2024). Corpo, lágrimas, raiva, emoções ou “conhecimento envenenado” de mães e familiares de vítimas que não se deixam disciplinarizar; elas são “mães ingovernáveis”7, expressão de um “irracional” da política que, em três décadas, ocupou a TV aberta, os jornais corporativos e as mídias digitais; apareceu em novelas; ganhou espaços de memória na cidade; foi reconhecida pelo judiciário, por órgãos internacionais de defesa de direitos humanos; transformou-se em tema de livros, teses, dissertações, documentários, peças de teatro e exposições. As falas que não aceitam negociar a dor causada pela morte violenta e abrupta do filho jovem periférico, na maior parte das vezes, pobre, favelado e da cor preta. “Operações policiais que só sabem fazer mais mães chorarem” – como disse Teresa (nome fictício), uma de nossas interlocutoras, comentando uma matéria na TV sobre as chacinas em dois anos da gestão do atual governador do Estado, Cláudio Castro (anos 2021-2022).

Na carreira de mãe “normal” para a de mãe de vítima, ocorre um abalo na imagem de controle (Hill-Collins, 2019) fulcral aos modos de dominação da sociedade brasileira: os dois lados da dominação sociedade patriarcal, a qual se sustenta tanto pela desigualdade como pela violência de gênero e raça. Primeiro, a reificação das mães pobres negras como imagem da “mãe preta”, uma mãe boa, forte e capaz de cuidar de todos e todas, que exerce o trabalho doméstico invisível, o cuidado da comunidade e de toda a família nuclear e extensa. Quando se tornam mães de vítima, a consciência do racismo e da desigualdade, a impunidade e conivência do judiciário e de camadas da sociedade com os assassinos — “capitães do mato” (como algumas nomeiam os policiais) do presente — despertam a ira na luta contra as injustiças e esculachos cotidianos, transformando-as em mães negligentes que se tornam criminalizadas como seus filhos, acusadas de serem “mães de bandidos”/”mães de facção”. Elas se tornam personagens incômodas na vida social, queixosas (pela psiquiatria), carregam, no corpo, doenças resultantes da perda abrupta e violenta do filho, do cotidiano de violações incessantes, da impossibilidade de esquecer, da impossibilidade de perdoar.

Um corpo da ferida que não cessa completamente nunca cicatriza próximo ao conhecimento envenenado (Das, 2020) que performatiza o racismo estruturante à sociedade brasileira no passado e no presente. É como se as mães transitassem entre a superfície e o avesso da vida social, ou seja, a partir do assassinato dos filhos, elas passam a vivenciar e saber como funcionam os poderes e o Estado enquanto detentores da violência, sem álibis ou subterfúgios, isto é, verdadeiramente, como eles funcionam nos balcões da burocracia, nos balcões do Estado, reatualizando a desigualdade, a impunidade e a violência, seja pelos prazos indefinidos e em aberto de inquéritos e processos, das audiências adiadas sem justificativa, ou por motivos os mais inacreditáveis, como quando um advogado do réu policial esqueceu a gravata. Além disso, percebemos enunciados e gestos preconceituosos dos agentes da burocracia estatal; tempo de espera excessivo nas repartições e instituições estatais; opacidades, apagamentos e discriminações no decorrer do longo caminho em busca por justiça.

Para esse texto, trabalhamos situações vivenciadas no acompanhamento, durante a pandemia de Covid-19, de duas mães que são defensoras de direitos humanos e participam do movimento de mães e familiares que lutam contra a violência estatal no Rio de Janeiro. Nosso objetivo era refletir sobre como nossos saberes iluministas são interpelados pela vida ordinária atravessada por necropolítica e como urge depreendê-los em conjunto e em tensão com os marcadores de produção de terror, medo, perdas, adoecimento e mortes, inscritos na vida social, cultural e política de favelas e periferias da cidade. Esse trabalho começou a partir de nossa inserção mais intensa como ativistas no movimento de mães e familiares do Rio de Janeiro, mais especialmente, ao propormos uma oficina que chamamos de “saúde” e aconteceu durante um ano (2017), envolvendo atividades corporais/terapêuticas (consciência corporal e teatro do oprimido), assim como eventos culturais (ida a peças de teatro, filmes, performances)8.

Nos anos seguintes à pandemia até o momento, mantivemos o vínculo com as duas interlocutoras deste texto (Teresa e Fernanda), além de acompanharmos a cena, seja como ativistas do movimento, seja como pesquisadoras/e/ou profissionais que lidam com a questão da violência estatal entre camadas pobres e urbanas9.

Mães insubmissas

Com o passar dos anos, devido aos processos se arrastarem por décadas, esse lidar com o avesso da vida social e com a morosidade do Estado tornam-se parte dos modos de subjetivação das mães e é mencionado por elas em diferentes situações. Desde que o filho foi assassinado na sua frente, Fernanda (nome fictício) ampliou a desconfiança sobre a conduta e a moral dos homens e do mundo, incluindo os irmãos que, aos poucos, tornaram-se crentes e querem convencê-la a fazer o mesmo. A língua ferina e os olhos observadores recolhem detalhes da hipocrisia e contradições presentes em um mundo de injustiças. Após a morte do filho e de tudo que enfrentou para condenar os três policiais, essa verve crítica transformou-se em um traço de sua personalidade que sobressai. Por outro lado, desde o assassinato do filho, que aconteceu na porta de casa e ela testemunhou, adquiriu várias doenças: alopécia, depressão e problema no coração (angina ou “coração grande”, como ela nomeia).

Já Teresa fez dos endividamentos e das maneiras de remediá-lo o combustível de seu cotidiano após quase duas décadas do assassinato do filho. Além disso, a observação de que há sempre alguém “comendo o dinheiro” com o sofrimento das mães tornou-se presente, conforme a pauta do movimento de mães ganhou a esfera pública e ONGs de direitos humanos passaram a mediar projetos a respeito. Ao expor essa queixa a apoiadores e militantes conhecidos, a crítica é suavizada pela ideia de que “quem pode ajudar deve mesmo fazê-lo”. O endividamento como modo de expressar que a morte não é uma dívida contabilizável, assim como o esquecimento e o perdão não se encontram em um horizonte possível, mas são parte de uma conta que nunca fecha. Contas que Teresa carrega em sua bolsa e que, embora consiga quitá-las com o passar dos meses, sempre resta alguma, seja o carnê do sepultamento que cobre os gastos do funeral de alguns membros da família [irmãs, ex-marido, filhos] ou o carnê da associação de moradores (cobrado pela milícia e que ela sempre atrasa de pagar).

Como mencionamos, as mães foram reconhecidas como capazes de uma agência e originalidade política — em especial, após a quebra do paradigma do discurso e da representação política em que o corpo e a emoção como “irracional” tornaram-se centrais em termos de comoção, clamor político e público (Butler, 2019). Há algumas décadas, dificilmente os modos de vida de mulheres negras as alçariam à categoria de revolucionárias, mas é extamente essa ideia do feminismo negro que nos mobiliza, a qual vamos explorar ao trazer para a cena nossas duas heroínas, Teresa e Fernanda. Reside nessa junção, a aliança que a pesquisa de cunho etnográfico tem com a resistência das mães e mulheres negras, ao narrar seus modos de vida como experimentações ético-políticas capazes de provocar rachaduras nessas imagens dominantes que, inclusive, são reproduzidas no discurso científico, sobretudo no discurso psi, como o da mulher “agressiva”, “endividada”, “compulsiva”, “hipocondríaca”, “poliqueixosa”, “querelante”, dentre outras.

Nesses anos, acompanhando mães e familiares como apoiadoras e pesquisadoras, participando de reuniões, atos, enterros, audiências, shows, peças de teatro, idas à Defensoria Pública, em consultas médicas e em tarefas do cotidiano, é possível perceber como a luta por justiça e memória não se retringe à esfera do judiciário.

É por meio do manejo das minúcias que mães e familiares imprimem sua indignação e fazem valer a máxima de “nunca deixá-los [os homens do Estado] descansar”. Transformam sua memória visível, fazem de sua presença um incômodo. “A ferida que nunca se fecha completamente” não é apenas uma metáfora. É no dia a dia que o trabalho das mães e familiares por memória e justiça se ancora em múltiplas direções e se torna um repertório a ser acionado e transmitido a quem cruza o caminho delas nas andanças pela cidade, por órgãos ou em ocasiões públicas, quando ocupam as ruas contando sobre os filhos, exigindo justiça, vociferando contra o Estado, praguejando contra quem não passou por isso e reage com indiferença às suas demandas, e é muito pouco provável que viverá essa dor e seus efeitos adoecedores no corpo10.

Em artigo discutindo reparação e memória no período pós-ditadura no Brasil, Cecília Coimbra (2010) assinala a importância das lutas em torno da memória sobre o terror vivenciado no período ganharem voz e esfera pública, apesar da enorme dor envolvida ao falar sobre o tema. Mais do que uma reparação econômica, um “cala boca”, como muitos denunciaram na época das discussões sobre as formas da reparação para quem sobreviveu a esse período, a vocalização pública da tortura e de todas as várias violências e silenciamentos do período era algo fundamental no processo de construção de memória e justiça. Entre mães e familiares, a vocalização e reconhecimento público — o que significa a movimentação incansável para que os assassinatos se tornem casos, sejam investigados e sejam julgados ou para que saiam na mídia sem escamotear informações ou justificando as operações — têm sido também tópicos fundamentais, em especial, porque a condenação pela justiça dos responsáveis pelas mortes é quase uma exceção, embora bastante comemorada11.

As mães que perdem seus filhos em operações policiais ou pela mão de agentes ligados ao Estado se tornam também reféns de seus corpos, que não aceitam ou esquecem o que aconteceu. Com o tempo, tamanha dor e sofrimento se materializam em doenças que se transformam em um traço dos familiares. Cada qual vive a raiva, a dor e a perspectiva de perdão das formas mais variadas, mas com algumas características em comum. Sustentar a busca por justiça e memória através de um corpo ferido, adoecido, não é, contudo, algo sem dilemas. Por um lado, é preciso negar o caráter de multidão do movimento — e no decorrer da luta isso é elaborado e assumido publicamente — por outro, é preciso sustentar e lutar para que seu filho não se torne “mais um número”, “vire mais um caso”, “caia no esquecimento” (estes são “fantasmas” que se colocam e são verbalizados e os quais tentam afastar). “Desistir de tudo” (desistir da luta), voltar, retomar o fôlego, “morrer” mais um pouco, viver em pedaços, “morrer por dentro”, “perder a vida”, “perder a saúde”, “não ver o tempo passar” etc. — estas são falas repetidas à exaustão pelas mães (ao vivo, em atos públicos, em documentários, ou em conversas particulares).

Viver a vida depois da perda brutal do filho é viver em movimentos pendulares: guardando toda a força que resistiu para buscar justiça, lutar contra o Estado, no outro momento, distanciar-se, sumir das redes, perder celulares, trocar de número, perder senhas, trocar de endereço, sumir por um tempo, cuidar da saúde, viver com os netos, cuidar do outro filho ou de um parente próximo. Mas como se, no cotidiano, esse corpo ferido vive sua luta particular sendo uma luta de multidão?

Formas do cuidado nas periferias por gênero

Antes da pandemia, um grupo que se formou com duas pessoas do movimento e nós três, como “apoiadoras”, passou a acompanhar a complexa situação de uma senhora de 87 anos de quem Teresa cuidava e que dava sinais de processo demencial, com alterações que se intensificaram durante o isolamento na pandemia. Vamos chamá-la de Graça, Teresa (nome fictício) já cuidava dela, levando-a ao médico e havia se tornado sua tutora pouco tempo antes do declínio cognitivo. Mais tarde, com o agravamento do quadro, não teve como evitar sua internação numa clínica de repouso (categoria êmica) situada numa cidade da Baixada Fluminense. Teresa tem também um filho que vive em Seropédica (outra cidade da Baixada) e exige bastante dela, por fazer uso prejudicial de substâncias psicoativas e já haver ter vivido nas ruas por isso.

Ainda no período de isolamento da pandemia, Rivaldo, filho de Graça, faleceu, mas por encontrar-se na casa de repouso, achamos melhor não dar a notícia a ela naquele momento, o que angustiava Teresa, que sentia necessidade de contar sobre a morte de Rivaldo. Desde que Rivaldo morrera, Graça piorou da demência, passou a não falar mais e parou de comer. Em uma ocasião, uma de nós [Elizabeth], psicóloga, acompanhou esses cuidados por videochamadas a pedido de Teresa. Após alguns meses preocupadas com a situação, Teresa, Diógenes, Elizabeth e Adriana foram a Nova Iguaçu, cidade da Baixada Fluminense, para contar-lhe sobre a morte do filho. Não foi uma situação fácil de contornar porque as funcionárias da clínica insistiam para que não se falasse nada com ela. Aliás, até o contato por telefone havia se tornado difícil. Semanas depois de receber a notícia do falecimento do filho, Graça faleceu.

Acompanhamos com aperto no peito a perda progressiva e acelerada de afetos e do gestual que eram a marca de Graça, mesmo por videochamadas ou pelo telefone fixo. Com sua voz animada ou sacana, ela nos contava sobre sua vida de mulher viúva, seus amores e seus lutos, cheia de humor, signo de vitalidade. Teresa, por sua vez, estava constantemente às voltas com sua própria vida de mãe defensora de Direitos Humanos, da vida dos filhos, além de responsável por cuidar de sua vizinha octogenária e quase parente, Graça.

Durante o processo de adoecimento de Graça, outra de nós [Adriana], chegou, algumas vezes, convocada por Teresa, a tentar convencê-la, assim como a Rivaldo, seu filho, a irem ao médico. Também ajudamos na ida ao posto para se vacinar; eram situações delicadas no “tempo do corona”: nem o Serviço de Atendimento Móvel de Urgência (SAMU), nem o médico do posto, com quem Teresa se indispôs, prestaram atendimento devido, ou seja, de retirar Rivaldo recém diagnosticado com tuberculose (que havia emagrecido, tossia muito) da convivência com a mãe, idosa e com a perda cognitiva acelerada.

Teresa levava quentinhas, diariamente, para os dois e comprava garrafas de água mineral, mas da aposentadoria de Graça sobrava quase nada para pagar seu trabalho exaustivo ao longo de quatro meses — e que se estendeu depois, com as visitas ao asilo-clínica, que ficava a 70 quilômetros de distância de sua casa. Rivaldo acabou internado, mas antes disso, Teresa chegou a levá-lo de ambulância do SAMU até uma Unidade de Pronto Atendimento (UPA) igualmente distante de onde morava. Findo o atendimento emergencial, com a prescrição de soro e antibiótico, poucas horas depois, Rivaldo foi liberado. Teresa contou como tinham voltado: pegaram uma van, o motorista deixou Rivaldo no banco da frente, apenas os dois, pediu para ele ficar no canto com a janela aberta; os outros passageiros, inclusive Teresa, vieram nos últimos bancos da van. Era tarde da noite quando atravessaram a passarela da avenida que dá acesso à favela e chegaram a suas respectivas casas. Rivaldo se arrastava, como ela contou, mas, segundo ela, sentindo-se melhor: voltara a praguejar. Entre Teresa e ele havia uma relação de tempos antigos, quando Rivaldo fora casado com uma de suas irmãs. Com Rivaldo, ela andou muito pelas ruas do Centro, frequentando lugares à noite e varando as madrugadas (“antes de entrar para a igreja”).

Com o andar da demência, Graça passou a imaginar que ele e Teresa queriam envenená-la, motivo de haver parado de beber água e comer, o que levou a uma visível piora do seu estado de saúde; ingeria a fruta, por desconfiança, apenas quando lhe ofereciam inteira. Teresa encontrava-se exaurida por não conseguir encaminhar Rivaldo para tratamento médico e pensando como faria com Graça. Rivaldo, por sua vez, queria que Teresa lhe desse a parte da aposentadoria de sua mãe, como esta o fazia (na época, era meio salário-mínimo). Teresa sabia para onde iria o dinheiro: Rivaldo sumiria por algum canto da favela, reencontraria a parceira, faria uma noitada – se isso acontecesse, pensava que seria muito provável que ele não resistisse. Enquanto os dias até o pagamento se alongavam, Rivaldo, em meio às tosses e à magreza que grassava, estava lá, praguejando e difundindo gotículas ameaçadoras em todos que se aproximavam, além de reclamar o dinheiro.

Ainda que com certa estabilidade e integradas ao local onde viviam há muito tempo, uma renda de dois salários cada uma, tanto Teresa como Graça precisavam lidar com os fios tensos que faziam parte da vida. Graça, com um filho fisicamente muito parecido com ela, que mesmo aos sessenta anos ainda encontrava abrigo na mãe e a atormentava, tanto quanto atormentava sua vizinha e tutora informal de Graça, Teresa. A comunicação por celular incluía debates realizados por chamadas de vídeo sobre a situação complicada, embora nem todos os acontecimentos chegassem ao pleno conhecimento dos familiares que viviam em Fortaleza.

Todos os dias, imaginávamos — Teresa e as irmãs de Teresa, nós e outros militantes próximos — que algo mais trágico ou fatal poderia acontecer, não havia como perdurar, mas perdurava. Dias e mais dias de busca e desenrolos nem sempre fáceis com a assistente social, o enfermeiro, os médicos, o gerente, todos do posto, os familiares, as várias idas à UPA, as irmãs e militantes que ajudavam Teresa, todos se esforçando para encontrar uma saída. Constantemente a pergunta “O que pode um corpo?”, de Gilles Deleuze, ganhava a inflexão interpeladora dos trópicos: “O que mais pode um corpo?”. E, sim, são corpos negros, os fios da exaustão e do cuidado explorados ao máximo, a subjetividade nascida para servir e cultivada —“louvando”, “pedindo”— para afastar as provas com que o “Mal” a desafiava dia após dia.

Cada uma de nós dialogava com Teresa em meio a um sentimento de temor e impotência/fracasso: estávamos em plena pandemia; Teresa exposta a essas situações, com diabetes e mais de 60 anos. Primeiro, a situação da demora no atendimento da mãe e do filho, a despeito de todos os esforços de Teresa; depois, a condição de saúde de Graça, que, na clínica, a cada novo dia mostrava-se mais frágil e embotada, talvez em decorrência do efeito de psicotrópicos.

Enquanto matutávamos com Teresa sobre possíveis estratégias para que o SAMU levasse mãe e filho para o hospital, conferimos que, nas duas vezes em que isso aconteceu, ambos foram e voltaram no mesmo dia. É certo que responderam positivamente e melhoraram o estado de saúde, mas, pouco tempo depois, voltaram a não se sentir bem. Graça, cada vez mais desconfiada, o que dificultava a aceitação dos remédios. Na segunda situação, quando foi para a clínica, a própria Teresa comentava que Graça estava sempre desanimada, sem reagir; todavia, nunca se esquecia de perguntar do filho. Nessa fase, Teresa inventou que ele estava no hospital (o que foi verdade) fazendo tratamento do pulmão. Nós nos perguntávamos se não haveria outra clínica melhor para onde Graça pudesse ser transferida, mas era pouco provável que outro local fosse diferente do lugar onde ela estava, uma das várias clínicas existentes em Seropédica, região cidade em que pulsa um mercado de instituições asilares para idosos de camadas pobres, com preços mensais que variavam de um a um e meio salário mínimo. Os responsáveis precisavam levar alimentos extras, remédios, roupas de cama, material de higiene pessoal; próximo da clínica/asilo se acessava a UPA que Teresa avaliou como boa, quando ela própria buscou atendimento. Como contou Teresa: “Havia remédios inclusive que não tinham no postinho” 12.

Em meio à situação dramática e de ameaça a Teresa, bem como pela omissão dos netos de Graça diante do quadro da avó, Teresa foi, aos poucos, deixando de lado a situação, enquanto novos problemas surgiram relacionados à Graça e ao filho. O trabalho de Teresa aumentou muito diante dos cuidados que a clínica demandava. Por outro lado, as notícias de vizinhos e moradores da favela que morriam de Covid-19 não paravam de chegar, uma conhecida dela e das irmãs havia tentado suicídio tomando chumbinho. “Ela tinha casa e emprego, como é que pode isso acontecer?”. Esse fato abriu a possibilidade de que Teresa narrasse como o suicídio é presente nas histórias de sua família, começando por sua mãe, que tentou se jogar da janela de casa e sobreviveu porque o fio que prendia seu pescoço rompera. A mãe sobreviveu, mas ficou sem o movimento das pernas. Anos depois, houve o suicídio de uma sobrinha, sem que se pudesse imaginar, junto com o alcoolismo de uma irmã e a drogadição de um irmão. Assim, os cuidados com os sobrinhos órfãos, foram distribuídos para cada irmã, e os laços familiares se estreitaram entre elas, que vivem próximas, na mesma comunidade.

O trabalho do cuidado com Graça envolvia a preocupação de Teresa em garantir que Rivaldo ou a mulher com quem ele passava alguns períodos, ambos usuários, não cometessem nenhuma violência contra a mãe, já que, em meio a crises de abstinência, pegavam uma parte do dinheiro da idosa. Após retornar para a casa de sua mãe, com o corpo esgotado e precisando de dias de descanso para reviver, o estado de saúde de Rivaldo tornou-se mais grave, e a liberação da mesada da mãe para o uso dele passou a ser questionada por Teresa. Se Rivaldo passasse mais dias usando drogas, seu corpo não aguentaria. Então, Teresa criou estratégias para adiar a transferência da parcela, inventando que o dinheiro não havia saído, que algo tinha dado errado com o cartão de Graça. Por fim, acabou dando a ele a parte do dinheiro que era de costume, Rivaldo saiu dois dias e retornou para casa. As visitas da equipe do SAMU nada conseguiram resolver, como reclamava Teresa, visitas que deram muito trabalho de garantir até que, por fim, saiu a vaga em um hospital na Ilha do Governador, onde, um mês depois, Rivaldo faleceu.

Na crise da narrativa de um mundo com uma pandemia nunca vivenciada na história do planeta, a incerteza sobre o coronavírus, as formas de contraí-lo e de se preservar dele, abalaram o conhecimento sobre a existência, o mundo, as relações e interações. Mas é também em momentos como estes que a vida reage: “As grandes emergências e as crises nos mostram o quanto nossos recursos vitais são superiores àquilo que supúnhamos” e, ainda, “A ação vai buscar sua energia na região obscura onde nossa potência de agir ultrapassa aquilo que sabemos dela” (Lapoujade, 2017:87).

Quanto à nossa interlocutora, Teresa, os endividamentos, o sofrimento e desorientação que marcaram sua vida após o assassinato do filho, mais as ameaças por parte da milícia que perduram até hoje, não findaram sua enorme vitalidade e, tampouco, seu apetite. Esses dois traços não dizem respeito a ela ser forte ou algo do tipo, como tantas vezes as mães do movimento aparecem representadas (como “guerreiras”, “brabas”), mas mostram a capacidade desenvolvida de manejar recursos e uma acuidade sobre os mundos e as pessoas com os quais precisa interagir, seja na lida em defesa dos direitos humanos, seja no dia a dia, para quitar suas contas e se proteger de ataques da milícia.

Trabalho sobre as minúcias

O fragmento abaixo recobre os deslocamentos de uma outra interlocutora de pesquisa e engajamento que chamaremos de Fernanda, moradora da área metropolitana do Rio de Janeiro, integrante do movimento de mães e familiares que lutam contra a violência estatal no Rio de Janeiro.

Foi furando o isolamento, mas sempre dizendo que não saía de casa, que Fernanda (nome fictício) não parou de circular pelo bairro no qual ela passou a morar quando foi incluída no Programa de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PPDDH)13. O programa pagava os custos relacionados à locação de imóvel em um endereço que precisava ser distante de sua casa, a outra metade do dinheiro cobria despesas pessoais. Eram meses do início da pandemia quando ela foi chamada pelo programa. A pergunta que alguns militantes e apoiadores do movimento passamos a fazer se orientou na seguinte direção: como Fernanda aguentaria ficar sozinha em um apartamento, sem poder circular ou participar de eventos relacionados ao movimento de mães e familiares, ficar longe do filho e dos irmãos com quem mantêm um convívio intenso e próximo? Vivendo com o dinheiro de uma bolsa família e da ajuda de parentes. Essa questão, porém, não se colocava para Fernanda. Ela trouxe os pertences que, nas semanas seguintes, dobraram em número e em tamanho.

Morando na região central da cidade do Rio de Janeiro, Fernanda arrumou, nos primeiros dias, discussão com um feirante, pensou em dar queixa na delegacia, só não o fez porque repetimos à exaustão — militantes e apoiadores — que era tempo de pandemia e seria preciso evitar lugares com grande fluxo de pessoas, pois o contágio andava alto. Fernanda replicou, insinuando que desejávamos o mal para ela (ou seja, que ela pegaria covid-19). Nesse período, por conta desse episódio, nossas conversas não se desenvolveram muito. Na outra semana, descobriu algo que se tornou recorrente em sua temporada longe de casa: brocas, cupins e outros restos que ela suspeitava usados em “trabalhos de macumba”. Quis devolver o apartamento, conversa dali, conversa daqui, o programa de proteção agendou uma dedetização, o que gerou uma nova crise alérgica e fez com que Fernanda precisasse usar a UPA do bairro.

É preciso abrir um parêntese para dizer que as idas a equipamentos de saúde — e é ela mesma quem menciona — passaram a ser constantes desde o assassinato do filho. É também nas consultas que Fernanda repete a história de André ter sido morto na frente dela. Um dos policiais encontra-se foragido, mudou de nome, circula com a milícia e, ainda, segundo uma conhecida que mora no sul fluminense, foi reconhecido em uma igreja, onde se dizia pastor. A notícia fez com que Fernanda traçasse diversos planos de pegar um ônibus e ir até a igreja fotografar o foragido para denunciá-lo. Essa “sede por justiça” e “para que o assassinato não seja esquecido” faz com que Fernanda esteja, de modo frequente, demandando à equipe do programa de proteção sobre seus tratamentos de saúde, queixas que se materializam no corpo, sintomas, doenças que reaparecem e que ela repete nem saber que existiam quando trabalhava como caixa de mercado, até que a morte de André aconteceu.

Com a dedetização, Fernanda precisou ficar alguns dias em algum hotel pago pelo dinheiro extra do programa, dinheiro que poderia ser utilizado em casos de urgência. Nesse período, como se desentendeu com a equipe estadual, ela passou a tratar com a equipe federal, a “Federal”, como ela chama. Ficar na “Federal”, porém, diminuía a eficácia da proteção, porque a representante estava sediada em Brasília. Caso uma situação de ameaça ou risco se apresentasse repentinamente, a “Federal” teria que recontatar a estadual para esta agir.

Uma de nós [Adriana] foi, então, com Fernanda procurar um hotel próximo ao apartamento que receberia a dedetização. As refeições e diárias seriam cobertas por essa verba extra. Ela visitou um quarto de que não gostou, viu outro de que gostou, em seguida queria ver outros. Nervosa com a situação, Adriana tentou demovê-la da ideia, lembrando que havia uma pandemia em curso e o hotel estava sendo usado por trabalhadores da saúde que viviam ali sem ver a família, o governo tinha fechado um número de vagas exclusivamente para eles/elas. Dias depois quando ela voltou ao apartamento foi notável que já tinha estabelecido proximidade com os funcionários da portaria. A capacidade de comunicação e interação com o entorno são qualidades marcantes de Fernanda. Insistíamos que era preciso se proteger, dávamos notícias de pessoas próximas que ficaram doentes. Essa estratégia, entretanto, em nada modificou suas saídas pelo bairro.

De volta ao apartamento, Fernanda teve uma nova crise alérgica, e, devido a isso, decidiu cancelar o contrato temporário e procurar um hotel no bairro. Como era uma situação urgente, havia uma diária que o programa dispôs e que não era muito alta; o quarto que conseguiu foi em um hotel no mesmo bairro, o “Hotel Poeira”, como ela o rebatizou. Na mesma semana, Fernanda foi mais uma vez à UPA. Do “Hotel Poeira”, partiu para outro apartamento que alugou por dois meses e do qual saiu se queixando novamente dos cheiros, do cupim e seus pós. O medo de “trancar a garganta à noite”, os inchaços, as vermelhidões, a alopécia (queda de cabelo que conta ter desenvolvido após o assassinato de André) eram descritos e repetidos com detalhes para as equipes estadual e federal. E havia as desconfianças. Desconfiou que a proteção arquitetara aquilo tudo para que ela desistisse do programa, mas ela não desistiria.

A cada retomada de fôlego, novas demandas sobre seus tratamentos de saúde e de um lugar melhor eram direcionadas à equipe, que titubeava muitas vezes perguntando para apoiadores do movimento sobre como agir com Fernanda, ou de que conversássemos com ela que o programa era limitado. Também soubemos por essas ligações dos atrasos no pagamento e da falta de recursos pelas quais o próprio programa passava. Estávamos no mandato de Wilson Witzel, governador conhecido por defender a atuação violenta da polícia em favelas14.

No fim das contas, Fernanda pegou seus pertences, que continuavam a aumentar de número, e correu para casas de familiares e amigos, sendo desse modo que prosseguiu na proteção. O programa não se opôs às nossas considerações sobre o fato de que era mesmo muito complicado Fernanda permanecer sozinha em uma situação dessas de pandemia: longe do filho, de irmãos e irmãs, sem as atividades do movimento de mães e a convivência com as pessoas de sua intimidade.

Nesse périplo, ela aproveitava para se queixar do programa estadual de proteção com a equipe da “Federal”, descobrindo que havia uma verba extra disponível caso alguma urgência ou situação de ameaça se colocasse. Foi por esse extra que ela reatualizou sua indignação e imprimiu um sentido de reparação ainda maior ao programa de proteção (Eilbaum; Medeiros, 2018; Kolker et al., 2018; Lacerda, 2020). Nesse período, ela voltou a imaginar os passos do policial foragido, reafirmando seu corpo que adoeceu no correr dos anos após a morte de André, com o pó, os cupins e brocas que estão em toda a parte e ameaçam “trancar sua garganta”. Ao final, o diagnóstico que recebeu, em uma das idas à UPA, já na pandemia, repete: “Stress-Emocional-Respiratório”. Se o abreviarmos ao modo de sigla, como no jargão médico do DSM [Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais], torna-se SER, o que singulariza e reverbera ainda mais sua condição e história. Expressões e elaboração de sua indignação, de recusa por uma conciliação com o Estado: seja pelo questionamento das regras do programa que, por causa de sua especificidade, não pode ser muito rígido; seja porque exige itens que, a princípio, não cabem nele, e isso é algo que a equipe alerta e repete à Fernanda e às apoiadoras; por fim, a afirmação das dores que o corpo adquiriu e que não se cansa de “jogar na cara deles”. Os adoecimentos do período são transferidos por ela a um problema do programa; afinal, entre as responsabilidades da equipe, está o encaminhamento da defensora de direitos humanos a tratamentos médicos, o que inclui a marcação das consultas e o acesso a medicamentos.

Entre o intervalo das queixas e quereres, quando as alergias diminuem, “hiberna” por longos períodos de sono durante o dia, a voz sai baixa e suave. Ela observa os seus afins com atenção desmedida, tece considerações críticas sobre a vida alheia — familiares, vizinhos, mães e familiares do movimento —, as formas desiguais do mundo, os interesses que movem as pessoas, os militantes e a equipe de proteção. Nesse período, compra presentes para si e para os outros, deixa de lado “eles” (a equipe de proteção, os agentes da polícia, da segurança e da Justiça), marca médicos, pensa sobre a alimentação, comenta a respeito da terapia, revê fotos que está sempre tirando, revê fotos do filho que leva na bolsa ou no celular, repete histórias com André, revê documentos da Defensoria Pública Federal, Estadual e da Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (CIDH/OEA), faz planos e, por fim, prepara novas indagações insurgentes direcionadas ao Estado e seus agentes, afinal, de sua parte, enquanto ela viver, “eles nunca irão descansar”.

Nas tantas demandas à “proteção”, há aquelas avaliadas por eles como indevidas, como, por um remédio para a queda de cabelo, como se estas estivessem sendo endereçadas de maneira errônea à equipe, cuja psicóloga (tivemos acesso ao relatório justificando o desligamento de Fernanda do programa) escreveu que ela estaria sendo desligada por uma certa “confusão” no endereçamento das demandas, parecendo não saber os objetivos do programa, insistindo para que lhe comprassem remédio para a queda de cabelo! Parece-nos, contudo, que a confusão é da psicóloga, em não perceber que um programa de proteção do Estado possa ser legitimamente objeto de demandas mais amplas incluídas como reparação por familiares de vítimas.

Ora, uma das principais demandas de Fernanda relacionadas à reparação é com relação à saúde, e ela sempre repete que, antes da perda do filho, não tinha uma doença sequer. E dentre as demandas de saúde, uma é a mais importante e a mais tenazmente reivindicada: a alopécia. Já tivemos a iniciativa de fazer uma vaquinha, certa época, para conseguir comprar os medicamentos receitados por uma clínica popular, tamanha a sua insistência. É de se notar que, como já foi explorado na literatura, o Estado aparece generificado e mesmo personalizado no masculino e que o cabelo é uma parte do corpo que podemos relacionar a certo “feminino”. Uma parte que pode ser cortada, mas que nossa interlocutora prefere usar comprido. Se, no universo das representações conservadoras sobre gênero, o cabelo longo entre mulheres é reconhecido como signo de beleza e sensualidade, por outro lado, com Fernanda, podemos pensá-lo como fios e emaranhados aos quais podemos querer “nos agarrar”. Descendo do universo simbólico para a vida material concreta, enfrentar a alopécia significa um tratamento demorado e com remédios de custo alto. O que corrobora a estratégia política de “não deixar barato” e de incomodar para que a morte do filho não caia no esquecimento.

Tempos depois, ela teve uma consulta com uma enfermeira na Clínica da Família, a qual esperávamos que desse prioridade a um check up cardiológico, pois Fernanda é hipertensa, tem colesterol alto, já fez cateterismo e sente falta de ar e cansaço. Porém, não foi o que ocorreu, ela retornou animada, dizendo que a enfermeira fizera um exame físico, auscultara seu coração e fez encaminhamentos médicos, mas o que ela parecia ter mais gostado foi que a enfermeira a ouviu e, principalmente, levou a sério sua queixa sobre a queda de cabelo, incluindo a história da perda do filho e reconheceu sua legitimidade, pedindo que ela voltasse para conversar com a assistente social, pois, sim, “eles” teriam de pagar o seu medicamento referente à alopécia.

Fernanda nos mostra, a todo o momento, como pode ser ilusória a visão de que ela é uma pessoa dependente e tutelada: tutela produzida pelo próprio programa de proteção que a teria tornado “ultra-dependente” — como avaliou uma psicóloga, crítica ao Programa de Proteção. Nós pensamos em outros termos: Fernanda faz usos singulares das políticas de reparação, para ela (e para outras mães que perderam filhos mortos pela polícia ou milícia) não há reconciliação possível sobre o monopólio e a legitimidade do uso da violência pelo Estado. Expor esse inaceitável não nos parece pouco em termos políticos e sociais, em especial, porque carecemos de políticas e espaços públicos de memória dedicados a tratar dos autoritarismos, violências e dos episódios de terror do passado e mais recente.

Em termos psíquicos, nossas observações reverberam as ideias de pensadores da psicanálise contemporânea, como D. W. Winnicott, médico do serviço público inglês que se debruçou sobre questões do desenvolvimento humano (era pediatra), sobre o acompanhamento de crianças consideradas “antissociais”, que viviam em abrigos durante a Segunda Guerra, e atendia também a pacientes adultos. Alguns destes desafiavam a clínica médica, eram pacientes queixosos e vagavam de médico em médico, em busca de solução. No dizer do médico húngaro Michael Balint, teórico próximo à Winnicott, estes constituiriam um grupo de doentes chamados de “envelope (prontuário) gordo”, com exames abundantes e notas acumuladas, excessivas visitas ao consultório e com um “costume irritante de mudar frequentemente de médico” (Balint, 1975:221) Essa perspectiva teórica vem ajudando, desde então, a modificar a visão sobre esse grupamento de pacientes “difíceis”, pois, talvez, eles estivessem fazendo usos singulares dos serviços médicos, usos estes que, apesar de desconcertantes, tinham, dentro do universo das necessidades emocionais de uma determinada pessoa, sua razão de ser.

Podemos pensar, por exemplo, na experiência de Fernanda, que se, por um lado, nos exaspera quando parece não dar seguimento a um determinado tratamento, por outro, reiteradamente nos mostra que, a cada vez que procura um atendimento com um novo médico ou serviço de saúde, tem a oportunidade de narrar novamente e/ou reencenar a história do assassinato do filho, que, aliás, acabou de ser morto dentro de um hospital. Repetição que pode ser uma forma de “não deixar cair no esquecimento”, como também uma elaboração pela fala ou por meio de algum sintoma corporal, em uma linguagem freudiana, ou de “vinculação de algum aspecto da psique a alguma parte do corpo”, em uma linguagem winnicottiana (Winnicott, 1990:144). Na verdade, deparamo-nos não com um empobrecimento, frequentemente presente nas dores e traumas mais intensos, quando a pessoa só pensa no alívio da dor, mas em uma riqueza de modos de dar passagem a isso tudo (Pacheco, 2012; Ribeiro, 2016). No caso de Fernanda, recordamo-nos de uma ida ao hospital Souza Aguiar, onde, ao falar de certa dor no braço que poderia ser um sintoma de uma doença cardíaca, contou para a médica como observara o braço do filho sofrendo espasmos, ao ser alvejado em sua frente.

Muitas doenças dermatológicas, dentre elas a alopécia, entram nessa categoria como doenças que reconhecidamente têm fatores psicológicos envolvidos. Para Winnicott, tais doenças teriam relação com um processo descrito por ele como uma busca de integração entre a psique e o soma, algo que não está, de modo nenhum, garantido e que pode ser perdido em determinados momentos da vida. Então, ao contrário de certa visão que teria nesses doentes um quê a mais de resistência ao tratamento, porque seriam incapazes de se expressar verbalmente e se expressariam através da doença somática incurável pelo tratamento médico, enxerga-se aqui a tendência positiva de expressar a vinculação psique e corpo.

Em Explorações Psicanalíticas, Winnicott (2018) interpreta o sonho de uma paciente que tinha uma doença de pele e sonhou que gritava. Essa paciente, segundo ele, havia sofrido algum grau de privação quando bebê e acabara por perder a esperança em ser provida de cuidados. “O grito que ela está procurando é o último grito pouco antes da esperança ser abandonada” (2018:117, tradução nossa)15. Ou seja, não bastaria à paciente poder gritar durante a sessão de análise, seria preciso mais: seria preciso, com o tempo, por meio da relação de cuidado estabelecida com o terapeuta, recobrar a esperança de ser ouvida. Mais adiante, elabora: “O não-gritar é em si mesmo uma negação ou um apagamento das mais importantes coisas as quais ligam a psique e o soma; ou seja, o chorar, o gritar, o esgoelar-se, o protesto furioso” (2018:117)16. Winnicott identifica algo dessa esperança em ser ouvido, na doença psicossomática, bem como nos meninos ingleses que quebravam as vidraças e praticavam pequenos delitos. E o quanto de raiva, além da tristeza, não está envolvido nessa luta, em uma sociedade mouca aos gritos das mães negras que têm seus filhos assassinados pelo Estado Brasileiro?

Conclusão

Sobre Fernanda, evitamos heroificar sua coragem e luta contra o esquecimento, pelo contrário, insistimos que ela precisava se proteger do Coronavírus, buscar tratamento para as alergias e, igualmente necessário, investir em alternativas de fazer com que “eles [o Estado]” nunca descansem. Nesse caso, investir em algo diferente do que faz hoje, quando alterna entre períodos de “hibernação” e se sente exaurida, com os estados de exasperação, revolta e explosão. Nestes, imagina que a “garganta pode trancar”, o que justifica que ela não pode dormir sozinha. Em artigo publicado anteriormente (Fernandes, 2020), trabalhamos uma situação com essa mesma interlocutora: passamos uma tarde às voltas para comprar um par de óculos multifocal, fazia um calor escaldante no Rio de Janeiro, andávamos pelo Centro, e Fernanda danou a gostar de armações que não cabiam no orçamento que arrecadamos, com algum trabalho, por vaquinha (outra) entre pessoas que a conheciam e/ou apoiavam o movimento de mães e familiares.

Uma das modalidades que nos parece relevante na atividade como apoiadora é a disponibilidade de escuta e de acompanhamento em atividades cotidianas, resolvendo pendências do dia a dia ou problemas do mesmo tipo. Um amigo que é sociólogo e apoiador da rede de mães e familiares há muito anos faz sempre a crítica de não nos tornarmos “babá do movimento” — o que interpretamos que estaríamos infantilizando ou tendo uma atitude assistencialista com nossas interlocutores. Entendemos esse ponto de vista, mas também entendemos ser imprescindível o cultivo de uma plasticidade seja como pesquisador/as, seja como aliadas na luta de mães e familiares em reabitar o mundo. Isso tudo tem muito pouco glamour, pelo contrário, envolve perrengues e precariedades. O que significa dar atenção aos pequenos gestos cotidianos (Das, 2023) como: entrar em inúmeras óticas para achar uma armação de óculos que seja do agrado (ou não encontrar nenhuma e o périplo continuará por outros dias); entrar em várias farmácias até achar um preço mais em conta para um determinado remédio; pagar uma quentinha porque podem ficar um dia inteiro sem comer e passam mal frequentemente por isso; ir até o posto de saúde novamente porque perdeu a consulta que reclamou tanto; matutar estratégias para pegar o policial condenado pela morte do filho, que está foragido e uma parente o reconheceu; por fim, receber muitas ligações de uma só vez, retornar o telefonema preocupada, descobrir que não havia nada de extraordinário, pelo contrário.

Essa plasticidade, ao acompanhar mães e familiares, não passa ao largo de nossos próprios estados de exaustão e frustação em meio a demandas que são, muitas vezes, de ordem insolúvel. Com o tempo percebemos que essas performances encenam sentidos concernentes à própria reparação, a qual, assim, podemos escutar como impossibilidade. Como nos disse uma mãe que é militante há muitos anos: “A gente sabe que não somos fáceis, ninguém aguenta a gente por muito tempo”. É preciso, porém, alargar a interpretação que as toma como “incivilizadas”, “irracionais”; a nosso ver, não se trata simplesmente de conseguir os óculos, o remédio, a quentinha, acompanhar nas audiências, ser solidária em determinadas ocasiões etc., mas, por meio dessas tarefas testar até onde chega nosso “estar junto”; ao mesmo tempo em que encenam, em primeiro plano, os abismos de classe, as desigualdades de gênero e raça que marcam as relações no país.

Quais as possibilidades de compor com Fernanda para que, em meio à prontidão por justiça que a exaure — e causa seu “estado de Stress-Emocional-Respiratório” —, produzam-se distanciamentos, espaço de coisas possíveis, territórios existenciais (Guattari, 1992)? Tais estados de distanciamentos e territórios existenciais funcionam, boa parte das vezes, como pausa na revolta, retomada de fôlego, mobilizando um repertório específico: seja pelo riso bufônico, em algumas ocasiões, grotesco; seja pelas “tretas”, “fofocas”, falatórios, disputas, “ciúmes” em torno do maior ou menor protagonismo de uma ou outra mãe ou familiar. Esses estados e territórios são, em geral, desvalorizados por ativistas e agentes públicos engajados na construção de políticas de reparação ou na luta por direitos humanos, assim como, são julgados secundários em pesquisas nas áreas de saúde, saúde mental, sociologia e antropologia (com exceções).

Para nós, pesquisadoras/profissionais desse campo, mantém-se a pergunta sobre o que, nessa “guerra pandêmica”, permanece afirmação de vida? Teresa e Fernanda, assim como Graça, sugerem pistas. Diante da situação dramática e congelada entre mãe e filho (Graça e Rivaldo), as acusações subliminares informavam essa relação desde sempre e foram presentes e intensificadas durante a pandemia, com o adoecimento de ambos. Aprendemos ao acompanhar Teresa nessa experiência de cuidado, como desconfiança e vínculo podem se apresentar de maneira íntima e entrelaçada até o findar da vida. Assim como pudemos refletir sobre sua continuidade na favela em que o mesmo bando miliciano responsável pela morte do filho continua soberano. Ao mesmo tempo, é ali que todos a conhecem, onde ela e as irmãs participaram, por anos, de uma Assembleia de Deus, que seus pais chegaram há mais de cinquenta anos, quando o lugar começava a ser habitado e os barracos eram ainda de tábua.

E é por isso que os conselhos para ela deixar a favela, algo repetido por nós — ativistas ou agentes da defensoria preocupados, quando escutam seus relatos — não prosperam, pois os laços de pertencimento garantem-lhe alguma proteção e reconhecimento no território (atualizados quando se tornou cuidadora de Graça, por exemplo). Ao mesmo tempo, esse intervalo desde a morte do filho fez com que Teresa constituísse um olhar vigilante e acurado sobre o que acontece na favela, sobre as práticas da milícia, e isso parece alimentar sua sede por justiça, sua reparação particular. De modo mais concreto, a sede de que um dia eles caiam, ou seja, segundo o horizonte de possíveis: que sejam presos, mortos ou a facção que havia ali antes retorne e os expulse.

Fernanda, por sua vez, foi alvo de reclamações da psicóloga da equipe porque se recusou a carregar seus pertences, sempre em número maior, do “Hotel Poeira”, explicando que o médico da UPA recomendara que ela não pegasse peso ou mexesse em mobília para evitar nova crise alérgica ou tontura. Em sua sede por justiça, contra o esquecimento, Fernanda mostrava com as dores e adoecimentos do corpo, o que repetia em diferentes momentos, que o que acontecera “não tinha dinheiro que pagasse” e, o que havia prometido ao filho, de que enquanto estivesse viva “não deixaria eles descansarem” (esse ‘eles’ inclui os agentes que a atendem pelo PPDDH). Mas as acusações de Fernanda existiriam apenas em negativo, como uma ação reativa, com ausência de agência? Estará Fernanda presa para sempre à roda do sofrimento e da raiva, consequência da violência estatal? Atrelada eternamente ao diagnóstico de “Stress-emocional-respiratório” (SER), às alergias da poeira, brocas e cupins ou outras mais?

Na época do isolamento social, ela trouxe a pergunta inquietante ao presente e para muitos de nós: “Será que algum dia isso [o Coronavírus] vai passar?”. Na sequência, ela se vacinou, passou a morar com parentes, fez reparos na casa onde ficou seu outro filho, teve novas crises alérgicas, por fim, mas não menos importante, fez planos para quando a pandemia acabasse, o que incluía novas tramas cotidianas, analisadas por ela em suas minúcias, de maneira a “não dar refresco” ao Estado e suas personificações – instituições, órgãos, agentes e políticas. Mais recentemente, vociferou contra organizações sociais que “vivem do sofrimento das mães”. “O nariz vai crescer tanto que não vai conseguir nem passar numa porta ou na janela de casa”.

No intervalo dos planos e vociferações começou a trocar mensagens com um rapaz que mora em Dubai, em tradução por aplicativo e, no meio de almoço com ela no centro da cidade, Fernanda me mostrou o rosto do affair, um moço de olhos caídos, e ela mesma completou: “Gostei dele porque tem um olhar de desamparado”. Enquanto finalizávamos o texto, recebeu o telefonema do Agente Comunitário de Saúde (ACS) informando que a consulta com o médico alergologista finalmente saíra pelo Sistema Nacional de Regulação do SUS responsável por marcar consultas, exames e cirurgias (SISREG).

Teresa foi com um neto de Graça pegar a televisão que havia ficado na casa de repouso. Quando chegou ao local, debulhou-se em lágrimas e “perdeu o controle de si” [nas palavras dela]. Já em casa, queria saber por que tinha sentido aquilo tudo? A pergunta, creio, tinha uma conotação relacionada à feitiçaria ou algo do gênero, envolvendo esse neto (“que só pensava em tomar para si as coisas da avó”) e a própria morte (de sua perspectiva, “de uma hora para a outra”) da vizinha e amiga.

Cuidar dos seus nas minúcias e nas ameaças que nunca findam, não aceitar as mortes injustas, viver de “tretas”, opor-se ao esquecimento, ao perdão e à reparação, repetindo isso publicamente e em episódios da vida cotidiana: não seriam esses os apontamentos originais, a reparação e o perdão mais justos (Pollak, 1989; Ricoeur, 2007) que mães e familiares inscrevem como expressão legítima da vida social e da política?

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  • WINNICOTT, Donald Woods. Psycho-Analytic Explorations. New York: Routledge, 2018.
  • WINNICOTT, Donald Woods. Natureza humana. Rio de Janeiro: Imago, 1990.
  • 4
    São comuns os “forjamentos”, quando a polícia “planta” [implanta] flagrantes nas vítimas, incutindo os chamados “kit bandidos”, em geral, uma arma, alguma pequena porção de drogas, um radinho, etc.
  • 5
    Alguns casos de assassinatos de mães e familiares ameaçados são relembrados pelas interlocutoras e servem de alerta a quem chega ao movimento, como o de Edimea, mãe de Acari, alvejada quando saía de um presídio, ocasião em que teria descoberto informações sobre as vítimas da chacina. A morte de Marielle Franco, bastante próxima ao movimento de mães e familiares de vítimas. Há também os casos de mães assassinadas que não saíram na mídia, como o assassinato pelas costas de uma delas, em uma escola na favela da Maré, quando buscava informações sobre a morte do filho. Outro caso é a prisão de Vera dos Santos, em 2009 (três anos após os “Crimes de Maio”): conforme denunciado pelas Mães de Maio, a polícia implantou drogas no tanque de lavar de Vera, o que resultou em flagrante. Já nossa interlocutora, Fernanda, sofreu ameaças e um atentado: certa vez teve a porta de seu pequeno negócio de venda de açaí metralhada, mas ela estava em outro cômodo. Outro relato mencionado refere-se aos dois irmãos de Josenildo dos Santos, uma das vítimas da Chacina da Coroa, ambos sofreram perseguições, por exemplo, em uma ocasião, um deles, que era taxista, teve o carro prensado por outro veículo, o que resultou em acidente (sem feridos). Para mais informações: https://wikifavelas.com.br/index.php/Chacina_de_Acari_-_26_de_julho_de_1990; https://www.uol.com.br/universa/noticias/redacao/2018/05/13/morre-fundadora-da-maes-de-maio-que-teve-filha-gravida-e-o-genro-mortos.; https://www.brasildefato.com.br/2023/11/22/caso-josenildo-apos-14-anos-irmao-de-lanterneiro-relata-alivio-com-condenacao-de-policiais-no-rj). Acesso em: 5 fev. 2025.
  • 6
    Nesse sentido seguimos a ideia de “sociabilidade violenta” presente no volume organizado por Machado da Silva, Vida sob cerco (2008) com a observação de que a categoria “sociabilidade violenta” não se restringe a favelas ou periferias, embora esse ordenamento marque as relações e as vidas nos territórios periféricos. Para pensar características comuns desse ordenamento e as diferenças nas margens em cidades como Rio e São Paulo, ver Leite e Birman (2018).
  • 7
  • 8
    Duas de nós [Adriana e Mariana] atuaram de 2016-2022 como apoiadoras (ver nota 9) do grupo Rede de comunidades e movimentos contra a violência. Elizabeth facilitou um grupo de saúde que funcionou durante o ano de 2019 e contava com encontros regulares entre mães e familiares de vítimas da violência estatal e autoras. Elizabeth prestou também atendimento psicoterápico online à Graça, antes e durante a pandemia, Adriana acompanhou Fernanda e Teresa como apoiadora (categoria êmica, ver nota 6) e pesquisadora da UERJ em projeto sobre o adoecimento das mães e familiares, financiado pela FAPERJ[8]. Mariana foi psicóloga do SUS, em um município da periferia do Rio de Janeiro e prestou atendimento psicoterápico a familiares de vítimas na sala da Rede, em projeto financiado por edital durante um ano e, depois, de forma autônoma, até se desligar do grupo.
  • 9
    Tem sido recorrente a relação dos coletivos de mães e familiares com pesquisadoras/es da universidade. No grupo Rede de comunidades e movimentos contra violência, um dos primeiros grupos no Rio de Janeiro a se constituir para denunciar a violência estatal, existe a categoria apoiador(a) usada para pesquisadores/as que fazem parte do coletivo. Os apoiadores/as, em alguns momentos, não têm poder de voto e decisão, mas podem redigir projetos, petições, documentos, textos, além de convidar mães e familiares para falar em simpósios, participar de pesquisas ou de aulas na universidade. Sobre o protagonismo da Rede de comunidades e favelas contra violência na primeira década do movimento de mães e familiares, ver Farias e Vianna (2020).
  • 10
    A morte de mães (por doenças que se intensificam de repente ou por depressão) causa sempre muita comoção nas outras mães, em familiares e ativistas do movimento. Com isso, demandas por saúde por parte dos coletivos foram ganhando mais espaço, o que tem resultado na construção de políticas e de projetos em andamento como: uma política nacional para atendimento a vítimas da violência estatal, projeto construído pelas Mães de Maio e CAAF/UNIFESP; uma unidade de atendimento a vítimas foi inaugurada em Nova Iguaçu, cidade da Baixada Fluminense,em 2021; em 2024, um projeto de reparação psicossocial foi anunciado pelo governo Lula e implementado em conjunto com coletivos do país e, no Rio de Janeiro, uma rede coordenada pelo NAPAVE (Núcleo de Atendimento Psicossocial a vítimas da Violência Estatal)que, há anos, atende mães e familiares em parceria com o Instituto de Estudos da Religião [ISER]) propôs mapear os equipamentos do SUS da cidade e da região metropolitana, bem como produzir formações sobre violência estatal e racismo aos profissionais de saúde e da assistência a partir das mães que perderam filhos mortos pela polícia ou milícia. Teresa participa da RAAVE e Fernanda é atendida pelo NAPAVE. Sobre tais políticas e projetos ver as matérias:https://ponte.org/familiares-de-vitimas-de-violencia-estatal-terao-atendimento-multidisciplinar-em-sp-rj-ba-ce-e-mg; https://www.novaiguacu.rj.gov.br/semas/2021/12/10/nova-iguacu-lanca-projeto-de-acolhimento-a-vitimas-de-violencia-e-seus-familiares);https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/09/maes-de-vitimas-da-violencia-policial-se-tornam-pesquisadoras-em-projeto-na-ufrj.shtml. Acesso em: 07 fev. 2025.
  • 11
  • 12
    O postinho é um Posto de Saúde, equipamento do Sistema Único de Saúde (SUS) acessado com assiduidade por Teresa e irmãs, situado na favela onde vivem desde que nasceram, onde funcionam equipamentos públicos de qualidade.
  • 13
    O Programa de Proteção a Defensores de Direitos Humanos (PPDDH) é parte da Política Nacional de Proteção aos Defensores de Direitos Humanos (PNPDDH) aprovada por decreto em 2007. O PPDDH é responsável pela assistência a defensores de direitos humanos, comunicadores e ambientalistas, promovendo proteção a todos os incluídos no programa, sendo executado por meio de convênios, firmados voluntariamente entre a União e os Estados. Até 2024, onze estados (Rio de Janeiro incluso) eram responsáveis pela gestão técnica e política dos Programas Estaduais. Os programas contam com apoio financeiro do MDHC, sendo a execução técnica responsabilidade de organizações da sociedade civil, selecionadas em chamada pública pelas secretarias estaduais de Direitos humanos. Informações reunidas em: https://www.gov.br/mdh/pt-br/navegue-por-temas/pessoas-ameacadas-de-morte/acoes-e-programas/programa-de-protecao-aos-defensores-de-direitos-humanos-comunicadores-e-ambientalistas-ppddh - acesso em: 6 de fev. 2025.
  • 14
    O programa estadual do Rio de Janeiro tem passado por incertezas e precarização desde o final do governo Luís Fernando Pezão, em 2018, depois com Wilson Witzel (2019-2021). Com Cláudio Castro (desde 2020) o programa foi descadastrado e os casos federalizados (o que significa, em geral, maior dificuldade e lentidão para atender as urgências dos defensores ameaçados). Sobre tais reveses ver: https://g1.globo.com/rj/rio-de-janeiro/noticia/programa-de-protecao-a-pessoas-ameacadas-pelo-crime-no-rj-nao-recebe-verba-do-estado-ha-5-anos.ghtml https://www.andes.org.br/conteudos/noticia/entidades-denunciam-tentativa-de-desmonte-do-programa-de-protecao-de-defensoras-es-de-direitos-humanos-do-rJ1; https://www1.folha.uol.com.br/cotidiano/2024/10/programa-que-protege-familiares-de-marielle-franco-sofre-crise-no-rj.shtml. Acesso em: 10 fev. 2025.
  • 15
    “(…) the scream that she is looking for is the last scream just before hope was abandoned”.
  • 16
    “(...) the not-screaming is in itself a negation or a blotting out of one of the very important things which link the psyche and the soma; that is to say crying, screaming, yelling, angry protest”.
  • Editoras/r responsáveis pelo processo de avaliação:
    Natália Corazza Padovani
    Julian Simões
    Luciana Camargo Bueno

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    06 Out 2025
  • Data do Fascículo
    Ago 2025

Histórico

  • Recebido
    11 Set 2023
  • Aceito
    05 Fev 2025
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