Acessibilidade / Reportar erro

Envolvimento da pessoa com doença renal crônica em seus cuidados: revisão integrativa

Resumo

A doença renal crônica (DRC) acarreta ao indivíduo uma sobrecarga de cuidados indispensáveis ao alcance das metas terapêuticas e qualidade de vida. O controle nutricional, o regime medicamentoso e as terapias de substituição renal são exemplos que requerem participação ativa. Assim, foi realizada revisão integrativa de artigos científicos para identificar os que versam sobre envolvimento e participação do paciente em seus cuidados na DRC. Os descritores “Chronic kidney disease”; “Self-Care” and “Patient Participation” foram aplicados nas bases CINHAL, Bireme e Medline. Selecionamos 21 publicações entre 2012 e 2016. A entrevista semiestruturada destacou-se como método de coleta de dados, com a aplicação da análise temática fenomenológica. Conforme a predominância do assunto tratado, os manuscritos foram alocados em quatro eixos temáticos: Manejo da doença renal e seu tratamento; Envolvimento na tomada de decisão; Plano avançado de cuidados; e, Diálise peritoneal domiciliar. Verificamos que abordagens envolvendo pessoas transplantadas ou nos primeiros estágios da doença são pouco explorados com a aplicação do método qualitativo e, ainda, consideramos que pessoas com DRC devem ser instigadas no envolvimento ativo de seus próprios cuidados, necessitando de conhecimento, motivação e suporte dos profissionais de saúde.

Doença renal crônica; Autocuidado; Participação do paciente

Abstract

The treatment of chronic kidney disease (CKD) places a major burden on patients and their families. Interventions such as nutritional management, medication regimen, and renal replacement therapies require active patient participation. An integrative literature review was carried out to identify articles on the engagement and participation of people with CKD in their care. The Medical Subject Headings (MeSH) “Kidney Failure, Chronic”, “Self Care”, and “Patient Participation” were used to conduct a search on the following databases: Cumulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), the U.S. National Library of Medicine® (Medline/PubMed), Biblioteca Virtual em Saúde (Bireme). A total of 21 articles published between 2012 and 2016 were selected. The most commonly used data collection and analysis techniques were semi-structured interviews and phenomenological thematic analysis, respectively. The articles were categorized into the following thematic groups: illness management and treatment; involvement in the decision-making process; advanced care plan; and home peritoneal dialysis. We found that there is a lack of qualitative research in certain areas, namely kidney transplant recipients and people with initial stages of CKD. People with CKD should be encouraged to actively engage in their own care, which in turn requires the knowledge, motivation and support of health professionals.

Chronic renal disease; Self-care; Patient participation

Introdução

As doenças crônicas complexas, entre as quais a Doença Renal Crônica (DRC), têm se destacado mundialmente como um problema de saúde pública11. White SL, Chadban SJ, Jan S, Chapman JR, Cass A. How can we achieve global equity in provision of renal replacement therapy? Bull World Health Organ 2008; 86(3):229-237.,22. Couser WG, Remuzzi G, Mendis S, Tonelli M. The contribution of chronic kidney disease to the global burden of major noncommunicable diseases. Kidney Int 2011; 80(12):1258-1270.. A resposta dos sistemas de saúde frente a essa situação é apontada com modelos de cuidados que priorizam a mudança comportamental, a adoção de estilos de vida considerados saudáveis e a aderência aos regimes terapêuticos propostos33. Lawn S, McMillan J, Pulvirenti M. Chronic condition self-management: Expectations of responsibility. Patient Educ Couns. 2011; 84(2).,44. Welch JL, Johnson M, Zimmerman L, Russell CL, Perkins SM, Decker BS. Self-Management Interventions in Stages 1 to 4 Chronic Kidney Disease: An Integrative Review. West J Nurs Res 2015; 37(5):652-678.. A sobrecarga de orientações sobre esses diversos aspectos aos doentes e seus cuidadores é tema abrangente de inquietações que impulsionam a investigação científica na área55. Havas K, Bonner A, Douglas C. Self-management support for people with chronic kidney disease: Patient perspectives. J Ren Care 2016; 42(1):7-14..

A DRC implica em restrições alimentares, polifarmárcia e dependência de acompanhamento especializado, seja ambulatorialmente em seus estágios iniciais, seja na terapia renal substitutiva: hemodiálise, diálise peritoneal e transplante renal44. Welch JL, Johnson M, Zimmerman L, Russell CL, Perkins SM, Decker BS. Self-Management Interventions in Stages 1 to 4 Chronic Kidney Disease: An Integrative Review. West J Nurs Res 2015; 37(5):652-678.. Com a progressão da doença renal as pessoas podem experienciar um declínio em seu estado de saúde geral, incluindo suas funções físicas e psicossociais66. Clark-Cutaia MN, Ren D, Hoffman LA, Burke LE, Sevick MA. Adherence to hemodialysis dietary sodium recommendations: influence of patient characteristics, self-efficacy, and perceived barriers. J Ren Nutr 2014; 24(2):92-99..

O comportamento do indivíduo tem grande influência no sucesso terapêutico e no alcance das metas dos planos de cuidados. Diversos fatores determinam ou influenciam o desempenho das pessoas frente aos cuidados necessários, entre eles, a motivação, a informação, o suporte sociofamiliar e o apoio da equipe de saúde e dos serviços que têm papel fundamental para melhorar o conhecimento, as ferramentas de enfrentamento e adaptação, e construir a autoconfiança66. Clark-Cutaia MN, Ren D, Hoffman LA, Burke LE, Sevick MA. Adherence to hemodialysis dietary sodium recommendations: influence of patient characteristics, self-efficacy, and perceived barriers. J Ren Nutr 2014; 24(2):92-99.,77. Johnson ML, Zimmerman L, Welch JL, Hertzog M, Pozehl B, Plumb T. Patient activation with knowledge, self-management and confidence in chronic kidney disease. J Ren Care 2016; 42(1):15-22..

O entendimento sobre como esses elementos impactam e se interconectam na promoção de um tratamento adequado, refletido muitas vezes no melhor seguimento terapêutico possível, pode ser operacionalizado com a aplicação de instrumentos psicométricos de mensuração da autoeficácia, engajamento, motivação, aderência, conhecimentos, ativação, entre outros88. Morton RL, Snelling P, Webster AC, Rose J, Masterson R, Johnson DW, Howard K. Dialysis Modality Preference of Patients With CKD and Family Caregivers: A Discrete-Choice Study. Am J Kidney Dis 2012; 60(1):102-111.,99. Kim GJ, Je NK, Kim DS, Lee S. Adherence with renal dosing recommendations in outpatients undergoing haemodialysis. J Clin Pharm Ther 2016; 41(1):26-33..

Quanto aos métodos de pesquisas na temática, a abordagem qualitativa permite ao investigador aprofundar-se no conhecimento sob o ponto de vista das pessoas que convivem e experienciam a doença renal crônica respaldando estratégias fortalecedoras da ativação dos indivíduos nos cuidados de saúde.

Assim, a questão norteadora dessa investigação foi: quais aspectos mais prevalentes em estudos de cunho qualitativo sobre envolvimento e participação do renal crônico em seus próprios cuidados focados na DRC?

Sob a influência do cuidado centrado no paciente1010. Epstein RM, Street RL. Epstein 2011, The value of patient-centered care. Patient Educ Couns 2007; 68(2):179-185. e seus preceitos cuja participação efetiva deste na tomada de decisões acerca de seus cuidados torna-se preponderante é que se pretendeu levantar na literatura os estudos científicos de delineamento qualitativo que versavam sobre aspectos do envolvimento e participação do doente renal crônico em seu tratamento.

Métodos

Nesta revisão integrativa da literatura seguimos as etapas de elaboração da questão norteadora; estabelecimento dos critérios de inclusão e exclusão da busca na literatura; definição das informações a serem extraídas dos estudos selecionados; avaliação dos estudos incluídos; interpretação dos resultados e apresentação da revisão1111. Mendes KDS, Silveira RCDCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Context - Enferm 2008;17(4):758-764..

A estratégia de busca composta pelos termos Mesh “Kidney Failure, Chronic”, “Self Care” e “Patient Participation” foi aplicada nas bases eletrônicas Cummulative Index to Nursing and Allied Health Literature (CINAHL), USA National Library of Medicine (Medline/PubMed) e Biblioteca Virtual em Saúde (Bireme) durante o mês de fevereiro de 2017. Foram identificadas 2.647 referências, das quais 28 se enquadravam nos critérios de inclusão a partir da leitura do título e resumo.

Para inclusão dos artigos na amostra final foram considerados os seguintes critérios: estudos primários de natureza metodológica qualitativa, disponíveis na íntegra eletronicamente, nos idiomas inglês, português ou espanhol, publicadas entre janeiro de 2012 a dezembro de 2016, envolvendo participantes com DRC em quaisquer de seus estágios e que apresentassem aspectos diretos de seu envolvimento e participação nos cuidados requeridos frente à DRC.

Estudos fora do escopo temático pretendido foram excluídos, assim como relatos de experiências, cartas ao editor, revisões, comunicações livres, descrição de programas, estudos mistos com predomínio da abordagem quantitativa. Após a leitura integral dos artigos selecionados, verificamos que sete não atendiam aos critérios de inclusão previamente estabelecidos, resultando em vinte e uma publicações na análise final.

A delimitação de estudos qualitativos deu-se diante da capacidade dessa metodologia de desvendar as percepções, os sentimentos e as experiências das pessoas com DRC sobre seu envolvimento e participação em seus próprios cuidados, caracterizando esta proposta em um contexto de análise metodológica de um tópico particular e relevante à prática clínica. A pesquisa qualitativa, segundo Minayo1212. Minayo MCDS. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Cien Saude Colet 2012; 17(3):621-626., por meio de seu percurso analítico e sistemático tem o sentido de tornar possível a objetivação de um tipo de conhecimento que tem como matéria prima opiniões, crenças, valores, representações, relações e ações humanas e sociais sob a perspectiva dos atores em intersubjetividade.

Na captação dos dados relevantes para caracterizar os estudos selecionados utilizamos um roteiro de elaboração própria incluindo o título do artigo, ano e periódico de publicação, método de análise dos dados coletados, objetivo proposto, participantes envolvidos, quantidade e gênero dos mesmos, intervenção realizada para a coleta dos dados qualitativos e principais resultados apresentados. O conteúdo deste manuscrito foi apresentado parcialmente em evento internacional1313. Almeida O, Santos W, Rehem T, Medeiros M. Envolvimento e participação da pessoa com doença renal crônica em seus cuidados: uma revisão sob a perspectiva qualitativa. In: Atas do 6° Congresso Ibero-americano em Investigação Qualitativa e 2° Simpósio Internacional de Investigação Qualitativa; 2017; Salamanca: Espanha. p. 742-752..

Resultados

Dentre os artigos elencados, os anos de 2014 e 2016 foram os que apresentaram mais publicações, seis em cada ano apontado. Quatro continentes contribuiram nos estudos: Europa, América, Oceania e Ásia, com predomínio das publicações norte-americanas, seguidas pelas canadenses. Os periódicos especializados em nefrologia foram dominantes, com destaque ao Journal of Clinical Nursing com quatro publicações.

A Enfermagem foi área que mais se dedicou ao estudo e publicação de assuntos relativos ao envolvimento e participação do paciente em seus cuidados tratando-se da DRC. Os principais cenários das pesquisas foram clínicas de hemodiálise ou centros de diálise e ambulatórios especializados em nefrologia.

A entrevista semiestruturada foi o método de coleta dos dados qualitativos em 81% dos estudos, ainda foram utilizadas as ferramentas de grupo focal, observação não participante e entrevista motivacional. Quanto ao método de tratamento dos dados, foi utilizada com maior frequência a análise temática com abordagem fenomenológica.

Os softwares para organização de dados/análise qualitativa, em especial o NVivo®, foram referidos em oito estudos denotando a difusão desse recurso tecnológico no suporte ao desenvolvimento das pesquisas qualitativas.

Houve uma diversidade de temas explorados nas pesquisas, entretanto, no conjunto analisado, os agrupamos em quatro grupos temáticos distintos os quais se referem ao envolvimento e à participação da pessoa em seus próprios cuidados, quer sejam: Manejo da doença e seu tratamento; Envolvimento no processo de tomada de decisão; Plano de Cuidados Avançados (PAC) e Diálise peritoneal domiciliar (DPD).

Verificamos que elementos essenciais que permeiam a vida das pessoas com DRC, em especial as que se encontram em diálise, como o manejo da sede e do peso corporal, a gestão dos sintomas e do tratamento medicamentoso, incluindo a participação na escolha do acesso vascular foram temas explorados.

No Quadro 1 apresentamos as algumas das variáveis extraídas dos estudos selecionados com destaque aos principais resultados de cada um.

Quadro 1
Síntese descritiva dos estudos incluídos, n = 21. Brasília, 2017.

No conjunto dos principais resultados extraídos dos artigos evidenciamos a complexidade da DRC ressaltando as implicações para o indivíduo, as quais permeiam todos os contextos de sua vida como hábitos alimentares, uso de medicações, declínio de suas funções e capacidades físicas, surgimento de sitomatologias específicas, entre elas a dor, e as limitações psicossociais requerendo o desenvolvimento de estratégias individuais de adaptação e enfrentamento.

Discussão

No primeiro grupo, Manejo da doença e seu tratamento, incluímos artigos que versavam sobre aspectos relacionados diretamente ao controle da doença e do tratamento dialítico, tais como sintomas, medicação, terapia renal substitutiva (TRS), exercícios físicos, aderência e outros. Assim, foi revelado que o manejo da sede e da fome pelos pacientes em hemodiálise é um fardo inerente a esse tratamento gerando respostas emocionais diversas em cada pessoa, sendo as estratégias de gestão pessoal desses sintomas uma combinação de elementos comportamentais e cognitivos1414. Yu J, Ng HJ, Nandakumar M, Griva K. The management of food cravings and thirst in hemodialysis patients: A qualitative study. J Heal Psychol 2016; 21(2):217-227..

Quanto aos sintomas mais incômodos apontados também por pessoas em hemodiálise crônica, destacaram-se a fadiga, caimbras, prurido e depressão, e como mecanismos de enfrentamento dos mesmos, essas pessoas destacaram como importantes, o apoio da equipe de cuidados e atitudes individuais de autocontrole1515. Cox KJ, Parshall MB, Hernandez SHA, Parvez SZ, Unruh ML. Symptoms among patients receiving in-center hemodialysis: A qualitative study. Hemodial Int 2016; 21(4):524-533..

A autogestão da terapêutica medicamentosa foi explorada em um dos estudos1616. Parker WM, Ferreira K, Vernon L, Cardone KE. The delicate balance of keeping it all together: Using social capital to manage multiple medications for patients on dialysis. Res Soc Adm Pharm 2016; 13(4):738-745. desvelando que sob a perspectiva de indivíduos em hemodiálise a polifarmárcia e a rotina semanal de três sessões de hemodiálise, necessária ao tratamento, são barreiras para a aderência à medicação prescrita, e que familiares e cuidadores são relevantes no seguimento correto do regime medicamentoso.

A realização de exercícios físicos durante a sessão de hemodiálise, segundo os próprios pacientes, depende do apoio da equipe e do serviço de diálise, e é considerado menos relevante diante do processo intradialítico, sendo essa percepção uma barreira para a sua implementação1616. Parker WM, Ferreira K, Vernon L, Cardone KE. The delicate balance of keeping it all together: Using social capital to manage multiple medications for patients on dialysis. Res Soc Adm Pharm 2016; 13(4):738-745..

A aderência ao tratamento foi apresentada apenas em um manuscrito1717. Thompson S, Tonelli M, Klarenbach S, Molzahn A. A Qualitative Study to Explore Patient and Staff Perceptions of Intradialytic Exercise. Clin J Am Soc Nephrol 2016; 11(6):1024-1033. entre pacientes em TRS na modalidade hemodiálise. Os pesquisadores identificaram que o apoio da família e de outros pacientes, a percepção de risco e a rotina conferida pelo tratamento funcionam como facilitadores à aderência, enquanto que as barreiras enunciadas foram esquecimento, tempo dispendido ao tratamento, compreensão limitada sobre controle dietético, medicamentos e falhas de comunicação. Esses achados reforçam conceitos chaves a serem implementados nos programas de cuidados às pessoas renais em hemodiálise: o envolvimento de familiares e cuidadores, a comunicação efetiva e a confiança no suporte oferecido pelos profissionais de saúde, são alguns exemplos.

Estudo3535. Morris RL, Kennedy A, Sanders C. Evolving “self”-management: exploring the role of social network typologies on individual long-term condition management. Heal Expect an Int J public Particip Heal care Heal policy 2016; 19(5):1044-1061. sobre o envolvimento de pessoas com condições crônicas no autocuidado também apontou a família, os serviços de saúde e os profissionais cuidadores como influenciadores nos mecanismos que favorecem o cuidar de si. Fundamentamos nesses achados, a necessidade de desenvolvermos relações interpessoais com mais confiança e compromisso entre pacientes, familiares/cuidadores e profissionais de saúde promovendo automia e corresponsabilidade frente ao tratamento proposto.

O conjunto temático sobre o Envolvimento no processo de tomada de decisão indicou que no envolvimento do paciente na escolha sobre o tipo de TRS1919. Lopez-Vargas PA, Tong A, Phoon RKS, Chadban SJ, Shen Y, Craig JC. Knowledge deficit of patients with stage 1-4 CKD: a focus group study. Nephrol 2014; 19(4):234-243. é necessário a simplificação de conceitos e conhecimentos técnicos complexos a fim de subsidiar a escolha do paciente sobre o tipo de TRS que lhe convém. Outra publicação2020. Williams A, Manias E. Exploring motivation and confidence in taking prescribed medicines in coexisting diseases: a qualitative study. J Clin Nurs 2014; 23(3-4):471-481. também investigou o processo de escolha em relação ao tipo de acesso vascular para hemodiálise identificando que as pessoas com cateter o preferiam por medo das punções inerentes à fístula arteriovenosa, por influência de experiências anteriores e por considerarem um acesso melhor de se gerenciar. Tal percepção contraria as recomendações clínicas para a confecção precoce de uma fístula.

O empoderamento do paciente, sob sua própria perspectiva, foi influenciado pela confiança e participação na tomada de decisões, bem como o processo de aprendizagem. Enquanto que a falta de comunicação e a indiferença dos profissionais de saúde eram representativos do não empoderamento2626. Nygårdh A, Malm D, Wikby K, Ahlström G. The experience of empowerment in the patient-staff encounter: the patient’s perspective. J Clin Nurs 2012; 21(5-6):897-904..

As barreiras estruturais ao empoderamento dos pacientes devem ser identificadas de forma que mecanismos a sua superação sejam parte explícitas do processo. Atenção deve ser dada às forças estruturais que afetam as condições de saúde e as habilidades de um indivíduo em cuidar de si3636. Pulvirenti M, Mcmillan J, Lawn S. Empowerment, patient centred care and self-management. Heal Expect 2014; 17(3):303-310.. Prover elementos que dão suporte à tomada de decisões quanto aos cuidados disponíveis é uma responsabilidade dos serviços de saúde ao efetivar o envolvimento e o empoderamento do paciente.

Sobre o Plano de Cuidados Avançados, esse assunto foi tratado em duas publicações3131. Armistead N, Bova-Collis R. Advance care planning: The patient perspective. Nephrol News Issues 2016; 30(11):32-34.,3232. Goff SL, Eneanya ND, Feinberg R, Germain MJ, Marr L, Berzoff J, Cohen LM, Unruh M. Advance care planning: a qualitative study of dialysis patients and families. Clin J Am Soc Nephrol 2015; 10(3):390-400., em uma delas os autores identificaram temas emergentes para o envolvimento das pessoas em PAC como experiências prévias com esse tipo de planejamento específico de cuidados, influenciadores da percepção individual sobre o PAC e, ainda, trouxeram recomendações para a discussão do PAC entre a equipe a partir das percepções dos próprios pacientes envolvidos. No segundo artigo, foi analisada a experiência de três pessoas que participaram na construção de seus próprios planos avançados de cuidados elucidando as barreiras para a sua efetivação, como crenças e o apoio de familiares.

Os elementos identificados como barreiras pessoais à implementação do PAC devem ser contextualizados de forma particular entre as equipes que promovem esse tipo de assistência. Apesar de comum, a singularidade e a subjetividade da vivência situacional ressaltam a necessidade de um manejo personalizado desses elementos requerendo habilidades específicas dos membros da equipe de saúde. Nesse sentido, conhecer a visão dos pacientes e experiências vividas em PAC contribuem para o aprimoramento desse emergente foco assistencial.

Nesse sentido, a discussão do assunto e o amadurecimento de questões bioéticas que envolvem a implementação do PAC pela equipe de saúde nos parece um primeiro passo rumo ao desenvolvimento dessas práticas.

Por fim, dois estudos exploraram a experiência da pessoa sobre a Diálise Peritoneal Domiciliar3333. Sadala MLA, Bruzos GAS, Pereira ER, Bucuvic EM. Patients’ experiences of peritoneal dialysis at home: a phenomenological approach. Rev Lat Am Enferm 2012; 20(1):68-75.,3434. Baillie J, Lankshear A. Patient and family perspectives on peritoneal dialysis at home: findings from an ethnographic study. J Clin Nurs 2015; 24(1-2):222-234., em ambos um tema em comum foi desvelado: o confronto com a dependência da diálise frente à falência renal terminal. Entretanto, a diálise domiciliar significou a apreensão de novos saberes e práticas com o aumento da responsabilidade, proporcionou melhores práticas de autocuidado e automonitoramento, embora permeada por angústia e percepção de dependência dos cuidados de familiares e profissionais de saúde.

Esses estudos, ao revelarem a percepção dos pacientes sobre essa terapia, contribuem na sensibilização da equipe no sentido de focar em aspectos sociais e emocionais durante todo o processo de iniciação, manutenção e saída do paciente do programa de terapia domiciliar. Para além das técnicas e procedimentos inerentes a esse tipo de intervenção, os fatores apontados, na inadequação do autocuidado, muitas vezes determinam o fracasso do tratamento.

Quanto ao método delimitado nesta pesquisa, o delinemento qualitativo possibilitou tornar conhecimento científico a vivência das pessoas que experienciam a DRC sob vários enfoques importantes quanto ao controle de sua doença. Desse modo, essa metodologia deve ser estimulada nas pesquisas em nefrologia ampliando sua aplicação em outros contextos e grupos de pessoas a exemplo dos estágios iniciais da DRC. Nesse sentido, destacamos a identificação de apenas um único estudo qualitativo com pessoas em estágio 1 ao 4 da DRC1919. Lopez-Vargas PA, Tong A, Phoon RKS, Chadban SJ, Shen Y, Craig JC. Knowledge deficit of patients with stage 1-4 CKD: a focus group study. Nephrol 2014; 19(4):234-243. que apontou as necessidades sentidas por essas pessoas sobre conhecimento e incertezas quanto ao futuro.

A complexidade da DRC deve ser reconhecida para além da fisiopatologia e tratamento multiprofissional, como revelado por este estudo, ela envolve aspectos intersubjetivos de motivação e confiança que requerem da equipe assistencial uma postura de parceria no proccesso de autogerenciamento da condição.

Considerações finais

A perspectiva do doente renal é uma importante referência para a gestão dos serviços de saúde, na construção de protocolos operacionais padrão da equipe multiprofissional, nas recomendações e nos consensos de especialidades. Dessa forma, a abordagem qualitativa mostrou-se método de pesquisa eficiente na captação dos sentidos subjetivos das representações individuais e grupais sobre o envolvimento das pessoas com DRC em seus cuidados, até mesmo diante de barreiras culturais como a deficiente literácia sanitária.

A pesquisa qualitativa permite-nos aprofundar o reconhecimento de uma realidade sob um enfoque ímpar avançando nas possibilidades e estratégias de efetivação do envolvimento e participação da pessoa as quais, em parceria com os serviços e a equipe assistencial, poderão assumir um papel de corresponsabilidade por sua saúde e a de seus pares.

Esse levantamento proporcionou identificar lacunas de pesquisas sobre o tema, como e quais métodos de pesquisa qualitativa foram aplicados, além de elucidar em quais contextos, na perspectiva dos pesquisadores, os renais crônicos estão sendo ou podem ser envolvidos em seus próprios cuidados.

Verificamos espaços inexplorados com a aplicação do método qualitativo de pesquisa em variados contextos da DRC, nomeadamente em transplantados renais e estágios iniciais da doença quando relacionada à comorbidades para além do diabetes ou da hipertensão.

Apesar da complexidade do tratamento da DRC e importância do envolvimento dos doentes e familiares, percebemos o quão é limitada sua participação efetiva, assim, é preciso superarmos as barreiras que impedem o engajamento em seus próprios cuidados necessitando de conhecimento, motivação e suporte dos profissionais de saúde.

Referências

  • 1
    White SL, Chadban SJ, Jan S, Chapman JR, Cass A. How can we achieve global equity in provision of renal replacement therapy? Bull World Health Organ 2008; 86(3):229-237.
  • 2
    Couser WG, Remuzzi G, Mendis S, Tonelli M. The contribution of chronic kidney disease to the global burden of major noncommunicable diseases. Kidney Int 2011; 80(12):1258-1270.
  • 3
    Lawn S, McMillan J, Pulvirenti M. Chronic condition self-management: Expectations of responsibility. Patient Educ Couns 2011; 84(2).
  • 4
    Welch JL, Johnson M, Zimmerman L, Russell CL, Perkins SM, Decker BS. Self-Management Interventions in Stages 1 to 4 Chronic Kidney Disease: An Integrative Review. West J Nurs Res 2015; 37(5):652-678.
  • 5
    Havas K, Bonner A, Douglas C. Self-management support for people with chronic kidney disease: Patient perspectives. J Ren Care 2016; 42(1):7-14.
  • 6
    Clark-Cutaia MN, Ren D, Hoffman LA, Burke LE, Sevick MA. Adherence to hemodialysis dietary sodium recommendations: influence of patient characteristics, self-efficacy, and perceived barriers. J Ren Nutr 2014; 24(2):92-99.
  • 7
    Johnson ML, Zimmerman L, Welch JL, Hertzog M, Pozehl B, Plumb T. Patient activation with knowledge, self-management and confidence in chronic kidney disease. J Ren Care 2016; 42(1):15-22.
  • 8
    Morton RL, Snelling P, Webster AC, Rose J, Masterson R, Johnson DW, Howard K. Dialysis Modality Preference of Patients With CKD and Family Caregivers: A Discrete-Choice Study. Am J Kidney Dis 2012; 60(1):102-111.
  • 9
    Kim GJ, Je NK, Kim DS, Lee S. Adherence with renal dosing recommendations in outpatients undergoing haemodialysis. J Clin Pharm Ther 2016; 41(1):26-33.
  • 10
    Epstein RM, Street RL. Epstein 2011, The value of patient-centered care. Patient Educ Couns 2007; 68(2):179-185.
  • 11
    Mendes KDS, Silveira RCDCP, Galvão CM. Revisão integrativa: método de pesquisa para a incorporação de evidências na saúde e na enfermagem. Texto Context - Enferm 2008;17(4):758-764.
  • 12
    Minayo MCDS. Análise qualitativa: teoria, passos e fidedignidade. Cien Saude Colet 2012; 17(3):621-626.
  • 13
    Almeida O, Santos W, Rehem T, Medeiros M. Envolvimento e participação da pessoa com doença renal crônica em seus cuidados: uma revisão sob a perspectiva qualitativa. In: Atas do 6° Congresso Ibero-americano em Investigação Qualitativa e 2° Simpósio Internacional de Investigação Qualitativa; 2017; Salamanca: Espanha. p. 742-752.
  • 14
    Yu J, Ng HJ, Nandakumar M, Griva K. The management of food cravings and thirst in hemodialysis patients: A qualitative study. J Heal Psychol 2016; 21(2):217-227.
  • 15
    Cox KJ, Parshall MB, Hernandez SHA, Parvez SZ, Unruh ML. Symptoms among patients receiving in-center hemodialysis: A qualitative study. Hemodial Int 2016; 21(4):524-533.
  • 16
    Parker WM, Ferreira K, Vernon L, Cardone KE. The delicate balance of keeping it all together: Using social capital to manage multiple medications for patients on dialysis. Res Soc Adm Pharm 2016; 13(4):738-745.
  • 17
    Thompson S, Tonelli M, Klarenbach S, Molzahn A. A Qualitative Study to Explore Patient and Staff Perceptions of Intradialytic Exercise. Clin J Am Soc Nephrol 2016; 11(6):1024-1033.
  • 18
    Griva K, Ng HJ, Loei J, Mooppil N, McBain H, Newman SP. Managing treatment for end-stage renal disease--a qualitative study exploring cultural perspectives on facilitators and barriers to treatment adherence. Psychol Health 2013; 28(1):13-29.
  • 19
    Lopez-Vargas PA, Tong A, Phoon RKS, Chadban SJ, Shen Y, Craig JC. Knowledge deficit of patients with stage 1-4 CKD: a focus group study. Nephrol 2014; 19(4):234-243.
  • 20
    Williams A, Manias E. Exploring motivation and confidence in taking prescribed medicines in coexisting diseases: a qualitative study. J Clin Nurs 2014; 23(3-4):471-481.
  • 21
    Lindberg M, Bӓckstrӧm-Andersson H, Lindstrӧm R, Lindberg M. Dry weight from the haemodialysis patient perspective. Ren Soc Australas J 2013; 9(2):68-73.
  • 22
    Torchi TS, Araújo STC, Monteiro Moreira AG, Oliveira Koeppe GB, Santos BTU. Clinical conditions and health care demand behavior of chronic renal patients. Acta Paul Enferm 2014; 27(6):585-590.
  • 23
    Karamanidou C, Weinman J, Horne R. A qualitative study of treatment burden among haemodialysis recipients. J Health Psychol 2014; 19(4):556-569.
  • 24
    Horigan AE, Schneider SM, Docherty S, Barroso J. The experience and self-management of fatigue in patients on hemodialysis. Nephrol Nurs J 2013; 40(2):113-122;
  • 25
    Aasen EM, Kvangarsnes M, Heggen K. Perceptions of patient participation amongst elderly patients with end-stage renal disease in a dialysis unit. Scand J Caring Sci 2012; 26(1):61-69.
  • 26
    Nygårdh A, Malm D, Wikby K, Ahlström G. The experience of empowerment in the patient-staff encounter: the patient’s perspective. J Clin Nurs 2012; 21(5-6):897-904.
  • 27
    Ameling JM, Auguste P, Ephraim PL, Lewis-Boyer L, DePasquale N, Greer RC, Crews DC, Powe NR, Rabb H, Boulware LE. Development of a decision aid to inform patients’ and families’ renal replacement therapy selection decisions. BMC Med Inf Decis Mak 2012; 12:140.
  • 28
    Murray MA, Thomas A, Wald R, Marticorena R, Donnelly sandra, Jeffs L. Are you sure about your vascular access? Exploring factors inluencing vascular access decisions with chronic hemodialysis patients and their nurses. CANNT J 2016; 26(2):21-28.
  • 29
    Erlang AS, Nielsen IH, Hansen HOB, Finderup J. Patients experiences of involvement in choice of dialysis mode. J Ren Care 2015; 41(4):260-267.
  • 30
    Harwood L, Clark AM. Dialysis modality decision-making for older adults with chronic kidney disease. J Clin Nurs 2014; 23(23/24):3378-3390.
  • 31
    Armistead N, Bova-Collis R. Advance care planning: The patient perspective. Nephrol News Issues 2016; 30(11):32-34.
  • 32
    Goff SL, Eneanya ND, Feinberg R, Germain MJ, Marr L, Berzoff J, Cohen LM, Unruh M. Advance care planning: a qualitative study of dialysis patients and families. Clin J Am Soc Nephrol 2015; 10(3):390-400.
  • 33
    Sadala MLA, Bruzos GAS, Pereira ER, Bucuvic EM. Patients’ experiences of peritoneal dialysis at home: a phenomenological approach. Rev Lat Am Enferm 2012; 20(1):68-75.
  • 34
    Baillie J, Lankshear A. Patient and family perspectives on peritoneal dialysis at home: findings from an ethnographic study. J Clin Nurs 2015; 24(1-2):222-234.
  • 35
    Morris RL, Kennedy A, Sanders C. Evolving “self”-management: exploring the role of social network typologies on individual long-term condition management. Heal Expect an Int J public Particip Heal care Heal policy 2016; 19(5):1044-1061.
  • 36
    Pulvirenti M, Mcmillan J, Lawn S. Empowerment, patient centred care and self-management. Heal Expect 2014; 17(3):303-310.

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    30 Maio 2019
  • Data do Fascículo
    Maio 2019

Histórico

  • Recebido
    02 Abr 2018
  • Revisado
    22 Out 2018
  • Aceito
    19 Fev 2019
ABRASCO - Associação Brasileira de Saúde Coletiva Av. Brasil, 4036 - sala 700 Manguinhos, 21040-361 Rio de Janeiro RJ - Brazil, Tel.: +55 21 3882-9153 / 3882-9151 - Rio de Janeiro - RJ - Brazil
E-mail: cienciasaudecoletiva@fiocruz.br