Dimensões e regimes da regulação na Rede de Atenção às Urgências e Emergências: um jogo de disputas entre o interesse público e o privado

Tofani, Luís Fernando Nogueira; Rebequi, Andressa; Guimarães, Cristian Fabiano; Furtado, Lumena Almeida Castro; Andreazza, Rosemarie; Chioro, Arthur

doi:10.1590/0102-311XPT161222

Luís Fernando Nogueira Tofani

contribuiu com a concepção do projeto

análise

interpretação dos dados

redação

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0002-1092-2450

Andressa Rebequi

contribuiu com a análise

interpretação dos dados

revisão do artigo

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0002-5913-7656

Cristian Fabiano Guimarães

contribuiu com a análise

interpretação dos dados

revisão do artigo

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0003-3101-634X

Lumena Almeida Castro Furtado

contribuiu com a análise

interpretação dos dados

revisão do artigo

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0001-7897-9739

Rosemarie Andreazza

contribuiu com a análise

interpretação dos dados

revisão do artigo

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0002-3332-2183

Arthur Chioro

contribuiu com a concepção do projeto

análise

interpretação dos dados

redação

aprovou a versão final a ser publicada

sendo responsável por todos os aspectos do trabalho na garantia da exatidão e integridade de qualquer parte da obra

Universidade Federal de São Paulo, São Paulo, Brasil.

https://orcid.org/0000-0001-7184-2342

Correspondência
L. F. N. Tofani Universidade Federal de São Paulo. Rua Botucatu 740, São Paulo, SP 04023-062, Brasil. luis.tofani@gmail.com

Informações adicionais

ORCID: Luís Fernando Nogueira Tofani (0000-0002-1092-2450); Andressa Rebequi (0000-0002-5913-7656); Cristian Fabiano Guimarães (0000-0003-3101-634X); Lumena Almeida Castro Furtado (0000-0001-7897-9739); Rosemarie Andreazza (0000-0002-3332-2183); Arthur Chioro (0000-0001-7184-2342).

CARACTERÍSTICAS	REGIÃO METROPOLITANA DE CAMPINAS (SÃO PAULO)	REGIÃO PLANALTO (RIO GRANDE DO SUL)
População	3.231.033 habitantes	414.138 habitantes
Número de municípios	20	28
Área (km²)	3.792km²	7.814km²
Município sede	Campinas	Passo Fundo
Densidade demográfica (habitantes/km²)	852,06	52,88
PIB per capita/ano (R$)	48.332,79	31.915,00
Capacidade instalada em saúde
UBS	307	128
UPA	29	6
Hospitais	55	15
SAMU	3 municípios cobertos	28 municípios cobertos
Cobertura de APS	57,65%	84,71%

FASES	CODIFICAÇÃO	ENTREVISTADO
Fase 1: gestores de saúde
Região Metropolitana de Campinas	GEC1	Gestora Estadual Regional
	GEC2	Gestora Estadual Regional
	GEC3	Gestora Estadual Regional
	GEC4	Gestora Estadual Regional
	GMC1	Gestor Municipal de Saúde
	GMC2	Gestora Municipal de Saúde
	GMC3	Gestora Municipal de Saúde
Região Planalto	GEP1	Gestora Estadual Regional
	GEP2	Gestora Estadual Regional
	GMP1	Gestor Municipal de Saúde
	GMP2	Gestor Municipal de Saúde
	GMP3	Gestor Municipal de Saúde
	GMP4	Gestor Municipal de Saúde
	GMP5	Gestor Municipal de Saúde
	GMP6	Gestor Municipal de Saúde
	GMP7	Gestor Municipal de Saúde
Fase 2: usuários do SUS
Município com população menor que 5 mil habitantes	UD1	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UD2	Usuário da Linha de Cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio
	UD3	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
Município com população entre 5-50 mil habitantes	UM1	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UM2	Usuário da Linha de Cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio
	UM3	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
Município com população entre 50-150 mil habitantes	UI1	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UI2	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UI3	Usuário da Linha de Cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio
	UI4	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
	UI5	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
Município com população entre 150-200 mil habitantes	UP1	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UP2	Usuário da Linha de Cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio
	UP3	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
Município com população maior que 200 mil habitantes	UH1	Usuário da Linha de Cuidado do Trauma
	UH2	Usuário da Linha de Cuidado do Acidente Vascular Cerebral
	UH3	Usuário da Linha de Cuidado do Infarto Agudo do Miocárdio
Fase 3: gerentes de serviços de saúde
Município com população menor que 5 mil habitantes	GD1	Diretor geral de hospital filantrópico
Município com população entre 5-50 mil habitantes	GM1	Responsável técnica de UBS
	GM2	Responsável técnica de UBS
	GM3	Responsável técnico de base do SAMU
	GM4	Diretor administrativo de hospital filantrópico
Município com população entre 50-150 mil habitantes	GP1	Responsável técnico de UBS
	GP2	Responsável técnica de base do SAMU
	GP3	Diretor administrativo de hospital filantrópico
	GP4	Coordenador de Urgência e Emergência de hospital filantrópico
	GP5	Coordenador de Emergência de hospital filantrópico
	GP6	Diretor geral de hospital filantrópico
Município com população entre 150-200 mil habitantes	GS1	Gerente de UBS
	GS2	Gerente de Serviço de Atenção Domiciliar
	GS3	Responsável Técnica por Hospital Filantrópico
Município com população entre 200-500 mil habitantes	GH1	Gerente de UBS
	GH2	Gerente de UPA
	GH3	Coordenador de SAMU regional
Município com população maior que 500 mil habitantes	GC1	Coordenadora de UBS
	GC2	Diretor de SAMU
	GC3	Coordenador de SAMU
	GC4	Coordenador administrativo de UPA
	GC5	Gerente de UPA
	GC6	Diretor de Pronto-Socorro de hospital municipal
	GC7	Responsável técnica pelo Serviço de Internação Domiciliar
Serviços sob gestão estadual na Região Metropolitana de Campinas	GE1	Coordenadora da Unidade de Emergência de hospital universitário estadual
	GE2	Coordenador de Urgência de hospital regional estadual
	GE3	Coordenadora da Central de Regulação Regional de Urgências
Serviço sob gestão estadual na Região Planalto	GE4	Gerente de Planejamento Regional (regulação)

DIMENSÃO	RELATO DOS ENTREVISTADOS	ANÁLISE SÍNTESE DOS RESULTADOS
Sistêmica	“Então na verdade a RUE é um programa que foi adaptado. Ele já existia de uma forma ou de outra mesmo antes das políticas, sempre teve a emergência em todo o local. E a gente foi adaptando-as nas portarias” (GMP5) “Na realidade, o que mais estimulou nós gestores foi que na época a gente tinha uma portaria que falava das ações integradas, urgência, emergência e tinha custeio junto. A gente nunca tinha isso muito junto” (GMC3) “O SAMU a gente só tinha estruturado em três municípios. A ideia era ter um SAMU metropolitano. Essa sempre foi a ideia da região. Já fizemos uns 3 projetos, mas esbarra no financiamento. O estado não participa” (GEC4) “A trombólise foi uma coisa que veio muito forte (...) a gente conseguiu trazer a trombólise pré-hospitalar, que vem funcionando brilhantemente” (GC6)	A normatização da RUE, apesar dos avanços produzidos, apresenta limitações no campo da prática. A regulação sistêmica é identificada como insuficiente e limitada. Não se conta efetivamente com um sistema de regulação governamental integrado e robusto, que permita tomar decisões quanto ao acesso, monitorar e avaliar os serviços contratados pelo SUS. A comunicação entre os diferentes pontos de atenção existentes no território é precária e burocrática e a RUE se organiza por uma dinâmica de acesso espontânea que privilegia o hospital. A regulação pelo SAMU ameaça o status quo, pois tem potencial para desorganizar os mecanismos informais instituídos. Isso pode explicar, de certa forma, o não investimento estadual em favorecimento aos interesses dos hospitais, sobretudo privados. Os fluxos da regulação são produzidos no limite entre o interesse público e o privado.
Assistencial	“O sucesso dessas redes é investir na regulação e na gestão, na contratualização” (GEC3) “A gente observa que essa discussão das redes fortaleceu alguns gestores para conversar com seu prestador: está vendo, é uma política, a contratualização, o recurso vem para você atender regionalmente, vai ser regulado” (GEC4) “Ele vinha, conversava com o grupo condutor, fazia os questionamentos, monitorava a rede, ia em cada hospital, via se tem os leitos, se tem protocolos, se estão sendo regulados. Você tem toda uma estrutura, tirava recursos” (GEC4) “Eu tenho 40 leitos de retaguarda (...) é separado na contratualização (...) eu recebo uma planilha todos os dias da ocupação destes leitos” (GMC2) “Eu percebi que com as novas portarias teve uma nova organização de fluxo um pouco melhor, porque antes a gente conseguia no favor mesmo (...) hoje a gente tem uma rede desenhada, então a gente consegue saber para onde ir e fica muito mais fácil para onde encaminhar” (GMP5)	A contratualização dos prestadores privados como forma de acesso a novos recursos financeiros emerge como dispositivo importante da regulação da assistência, fortalecendo as práticas de gestão. Os gestores nem sempre tomam decisões de enfrentamento dos poderes locais, principalmente dos representantes dos hospitais privados, mantendo relações e práticas já instituídas.
Acesso	“Teve a centralização da regulação da Urgência/Emergência na CROSS (Central de Regulação de Ofertas de Serviços de Saúde) (...) tem a questão da falta do contato, da equipe de lá conhecer o lugar, a região, mas algumas coisas que eram muito fortes na RUE, como a regulação de leitos, não se efetivou. O CROSS não regula leitos, ele regula porta, e a gente não teve força aqui para bancar essa discussão” (GEC3) “A emergência depende muito da regulação. Começou uma discussão de sair da CROSS e criar de novo regulação nas regiões, voltar algumas coisas para a região” (GEC1) “A gente criou recentemente com os hospitais, uma possibilidade com o teleagendamento (...) a pessoa era triada lá, classificado o risco já sai com o agendamento da sua consulta na sua unidade mais próxima” (GMP2) “Nós ampliarmos o atendimento na rede básica para demanda espontânea, tentar reduzir ao máximo os agendamentos para deixar para aquelas situações que efetivamente se pode agendar, e aí poder atender a demanda espontânea e isso facilitando o acesso das pessoas porque a gente sabe que tem muita condição sensível à atenção primária que acaba chegando nos hospitais” (GMP3) “Normalmente quem carrega o paciente é o bombeiro, não é a SAMU. Qual a dificuldade que a gente tem, a regulação (...) é muito demorado. As vezes a gente fala com três, quatro atendentes antes de chegar no médico que vai definir” (GMP5) “A regulação do SAMU acaba viabilizando esse tipo de coisa: vai ter vaga zero e o hospital vai aceitar” (GH3) “Eu acho que uma grande conquista foi a utilização dos protocolos de classificação de risco pelas portas de urgência. Com a ampliação das UPAs, essa cultura da classificação foi entrando para dentro dos municípios e dos serviços. Agora, regulação de leitos, NIRs, protocolos de cuidados não aconteceram” (GEC3) “Você imagina você ter um hospital onde você teria o núcleo interno de regulação, do Município, que estaria controlando o acesso a esses leitos? Fazendo toda a gestão desses leitos? O hospital quer morrer!” (GE3)	A gestão do acesso é efetuada pelos próprios hospitais, em função da centralização e fragilidade (Região Metropolitana de Campinas) ou ausência (Região Planalto) das Centrais de Regulação. A existência de uma central de regulação centralizada e impermeável às necessidades dos gestores municipais (Região Metropolitana Campinas) ou inexistente (Região Planalto) limita a regulação do acesso e de leitos hospitalares. UBS, UPA e SAMU acabam cumprindo de forma relativa seu papel na RUE e se apresentam fundamentalmente como agenciadores da demanda para os serviços hospitalares. O atendimento à demanda espontânea nas UBS, embora enunciado, não reduz o atendimento nas portas de urgência e emergência. A população é ‘responsabilizada’ pela busca de atendimento em UPAs e hospitais, mesmo que para questões simples, devido a questões culturais atribuídas. Na Região Planalto, a centralização da Regulação do SAMU na capital do estado e o protocolo de avaliação, aumentam o tempo-resposta induzindo a população à busca preferencial pelo atendimento “mais ágil” dos bombeiros. O sistema de classificação de risco nas portas de urgência e emergência emerge como legado da política, com potencial transformador do acesso, qualificando-o e promovendo a humanização do cuidado em saúde. A implantação de um NIR em cada prestador é apontada como solução e parece ser o único arranjo induzido pela política que foi efetivamente incorporado em uma das regiões (Região Planalto). Emerge como dispositivo “central” de regulação nas mãos dos gerentes dos serviços hospitalares. Apesar das resistências ao possível controle externo público do acesso e de leitos, ao ser operado à parte da regulação governamental, torna-se um sistema de autoproteção do próprio hospital e não um arranjo para garantia do acesso. Em uma das regiões, a regulação oficial burocrática obstrui o acesso dos usuários ao cuidado, tornando-se um mecanismo gerador de filas. Acaba colaborando para a organização de um sistema que induz o acesso aos serviços privados. A imposição de condicionantes para o acesso do usuário ou de critérios regulatórios próprios viabiliza o oferecimento de “parcerias econômicas”. Arranjos da regulação governamental de acesso embora tenham potencial para a produção de cuidado em rede, podem ser capturados pelo regime de regulação mercantil.

REGIME DE REGULAÇÃO	RELATO DOS ENTREVISTADOS	ANÁLISE SÍNTESE DOS RESULTADOS
Profissional	“A gente tem um grupo de WhatsApp, só dos médicos nossos e dos médicos da emergência. É informal, não é oficial. Então, o caso já é mais ou menos discutido antes de enviar, eles já fazem essa troca de informações” (GMP7) “Tem uma enfermeira que aceita paciente paliativo, que se aproximou, entendeu? Está personalizado nesse sentido. E heterogêneo porque em outras UPAs que você manda, pede apoio pra paciente paliativo e dizem: ‘não, não tem o que fazer com o paliativo aqui’” (G7C) “Os filhos da casa, quando saem formados daqui, eles já sabem como funciona, ele sabe os caminhos, ele sabe onde que ele vai insistir. Aí, o ex-aluno faz o que? ‘Professora, me ajuda!’” (G1E) “Tem alguns funcionários que trabalham aqui e trabalham na UBS também. Então, tem um contato pessoal maior e avisa: ‘olha, estou com um paciente assim e estou mandando pra vocês’” (G4C) “Não posso deixar essa pessoa com um derrame passar na fisioterapia só daqui um mês. ‘Ah, tem que entrar na fila’. Não tem que entrar na fila coisa nenhuma, ele vai passar na frente. Até hoje a gente consegue ter alguns frutos ainda dessa insistência e justificativa de que precisa passar antes, que não dá para esperar” (G1E) “Daí eles até fazem esse primeiro atendimento. A gente fala: ‘tu quer um desconto pela prefeitura? Vai pro SISREG [Sistema de Regulação] e aí vai demorar’ (...) Eu tenho aqui no posto uma autorização que é um valor diferenciado pela prefeitura. Hoje, uma consulta gira em torno de R$ 150,00 com esse encaminhamento” (G2M) “Às vezes a gente liga. Agora, implementaram o NIR nos hospitais, Núcleo Interno de Regulação. Deu uma melhorada, mas a gente ligava e falavam que traumato ficava numa fila, número X da fila. No outro dia, tu ligava, não sei como, tu não era mais aquele número na fila, teu número tinha ido pra trás” (G1D)	A ação autônoma dos trabalhadores da saúde, principalmente dos médicos, cria fluxos e regras informais, mais ágeis e resolutivas. A implantação dos NIR tornou a ação regulatória ainda mais complexa, mudando a lógica vigente que era centrada fundamentalmente na regulação profissional. Exercida por profissionais que se movimentam como híbridos, estabelece um regime de regulação intermediário entre profissional e governamental, em que os usuários encaminhados passam a ser regulados pelo NIR, cujo controle é do hospital e em função dos seus interesses. A utilização de aplicativos de telemensagem em movimentos de regulação profissional é crescente e produz mudanças na dinâmica e nos tempos do processo regulatório. O WhatsApp se apresenta enquanto ferramenta estratégica na gestão dos serviços de saúde pelo compartilhamento e integração de informações em tempo real. Há indicativos de que arranjos operados a partir do regime profissional podem criar fluxos de circulação mais ágeis e resolutivos, possibilitando o cuidado ao conectar as equipes dos vários pontos da RUE e a produção de redes vivas de cuidados a partir das necessidades em saúde (“regulação a quente”). Porém, a regulação profissional também pode ser capturada por interesses privados e produzir relações mercantis de assistência à saúde.
Clientelista	“O cara liga e não é demanda de urgência para o SAMU. Daí eu falo: ‘aqui não é ‘Samuber’. Daí chama vereador, prefeito...” (G3H) “São cargos políticos que às vezes a pessoa que assume a gestão até ela ter um pouquinho de conhecimento (...) se ela estudar ela vai ter conhecimento, se ela não estudar… ela vai achar que tá tudo bem e vai ficar lá né, recebendo salário e fazendo o mínimo ou fazendo aquela política mais paternalista, né, e não pensando em implementar outras ações” (GEP2)	A operação precarizada ou a inexistência da regulação governamental, em contexto de necessidades marcadas pela percepção dos usuários e de seus familiares de urgência na resolução de problemas, abre espaços substantivos para a produção de “atalhos” aos fluxos formais, que podem resultar na interposição de interesses particulares e na produção de iniquidades ou favorecimentos para determinados grupos de usuários, a partir de intervenções de agentes políticos.
Leiga	“Mas é tanto tempo que a gente tem isso, que tu já sabe quando tá com a diabetes alta, sabe quando tá com a pressão alta (...) a gente vai pegando experiência da coisa” (UP2) “Não estava tomando o remédio para pressão. A médica tinha receitado. Depois que deu o AVC nela, daí, agora ela está tomando direito. Porque, assim, ela nunca quis ir no médico, tem medo” (U2I) “Ele começou fazer fisioterapia numa clínica do SUS em outra cidade. Mas tudo o que ele fazia lá, nós fazemos aqui em casa. Não foi mais. Ele já está andando” (U1I) “Me recomendaram que eu não afirmasse o pé. E eu andava ‘puc puc’ por aí. Não pode erguer peso, não pode isso, não pode aquilo (...) eu cheguei aqui fui cuidar do meu filho, fazer minhas coisas e nunca senti nada” (UP2) “O médico dizia: ‘a gente pode operar, ela pode ir e não voltar mais’. Então, eu falei pro doutor: ‘faz assim, eu trago ela de volta pra casa, vou cuidando até a hora que Deus quiser levar ela, mas eu vou levar ela embora’” (U2I) “Eu não posso me queixar: já vou com aquele meu jeitinho assim, o médico já me atende e eu tenho amizade com as enfermeiras, sempre tive” (UP2) “A gente sabe o SAMU demora, né, que a hora que liga daí tem que falar um monte de coisa (...) sempre demora mais. Na hora da pressão, do medo, do susto (...) e aqui nós temos o corpo de bombeiros. A primeira coisa que quer, é chegar rápido” (UD1) “A partir do momento que abriu essa porta, da rede de urgência e emergência, muitos que tem plano de saúde acessam via emergência e não utilizam o seu plano” (GMP7) “Para fazer a tomografia tem que pagar uma diferença, o SUS não cobre. Aí eu paguei a diferença. No que fez a tomo, já foi chamado o traumatologista. E aí tu paga uma nova diferença pro traumatologista vir atender o paciente, porque também não tem pelo SUS total. Como sou é pintor e fiz alguns serviços no hospital e na casa desse médico, aí consegui não pagar nada da cirurgia. Aí operou” (UM3)	O agir dos usuários permite a construção de seus próprios mapas de cuidados, inclusive pelo uso combinado de serviços públicos e privados. Usuários e seus familiares utilizam saberes acumulados e produzem seus próprios caminhos em atendimento às suas necessidades de saúde, compondo novos arranjos, geralmente agenciados por concepções de saúde provenientes do modelo biomédico hegemônico e por interesses econômicos. Movimentos autônomos dos usuários incluem: decisões sobre adesão ou não a tratamentos prescritos e recomendações profissionais, escolhas sobre as portas de acesso e produção de diferentes caminhos para o cuidado, inclusive mediante pagamento direto.

[1] Correspondência
L. F. N. Tofani Universidade Federal de São Paulo. Rua Botucatu 740, São Paulo, SP 04023-062, Brasil. luis.tofani@gmail.com

Atores	Principais: representantes dos prestadores de serviços privados. Coadjuvantes: gestores municipais que realizam parcerias público-privadas oficiais ou “oficiosas”; profissionais de saúde agenciados pelos interesses privados; usuários, seus amigos e familiares que complementam pagamentos em atendimentos no SUS.
Controle de recursos	A estrutura hospitalar e ambulatorial dos serviços privados. O acesso hospitalar através dos NIR. O poder real e simbólico dos profissionais de saúde, em especial médicos, perante os usuários e a opinião pública.
Modos de operação	Parcerias com múltiplos gestores (overbooking). Seleção de demanda de acordo com interesses financeiros. Assédio aos usuários para pagamento ou complementação para bypass.
Produtos	Múltiplos contratos e parcerias público-privadas. Política de vouchers e descontos.
Resultados	Acesso seletivo de usuários do SUS a serviços de saúde mediante critérios mercantis. Iniquidade em saúde.

Brasil

Brasil

Dimensões e regimes da regulação na Rede de Atenção às Urgências e Emergências: um jogo de disputas entre o interesse público e o privado

Regulatory aspects and measures of the Emergency Care Network: a game of disputes between the public and private interests

Dimensiones y regímenes de regulación en la Red de Atención de Urgencias: un juego de disputas entre intereses públicos y privados