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ANÁLISE CONTRASTIVA DE GÊNEROS TEXTUAIS COMO CONTRIBUIÇÃO PARA O ESTUDO DO PRODUTO TRADUTÓRIO

CONTRIBUTIONS OF CONTRASTIVE ANALYSIS OF GENRES TO MAPPING TRANSLATION PRODUCT

Resumo

Este artigo parte do conhecimento produzido pelos Estudos da Tradução com foco no produto – mais especificamente de base linguístico-funcional – e tem como objetivo propor um modelo da produção textual em línguas distintas, promovendo seu contraste. Assim, apresenta uma descrição contrastiva de tipos de texto, oferecendo por meio dessa descrição subsídios linguísticos para a pesquisa em tradução. O artigo utiliza a Linguística Sistêmico-Funcional como base das descrições, cria modelos de gêneros textuais e realiza seu contraste. O objeto são gêneros presentes em introduções de artigo acadêmico da área das Ciências da Saúde em português brasileiro e inglês. Os resultados indicam como a análise contrastiva contribui para explicar diferenças nas preferências das línguas por suas formas particulares de organizarem a produção de textos, bem como a variação no comportamento dos textos em uma língua em comparação com a outra – fato que permite o mapeamento de aspectos particulares do fenômeno tradutório, uma vez que aponta especificidades das línguas exclusivamente quando são contrastadas.

Palavras-chave
Estudos da Tradução orientados para o Produto; Descrição Contrastiva; Linguística Sistêmico-Funcional; Modelagem de Gênero Textual

Abstract

Our aim is to show how contrastive models of genres can inform research on translation product. We do so by deploying contrastive descriptions to analyze text production in different languages. Product-oriented Translation Studies are often grounded on language theory and description – in particular contrastive and typological descriptions, as translation involves more than one language. However, translation as phenomenon happens between texts, thus contrastive descriptions of particular text types could arguably serve translation more efficiently than generalized descriptions for whole languages. We provide a contrastive model along with a methodology for further exploration in translation. Based on the Systemic Functional Linguistics framework we provide a contrastive model of academic article introduction texts. Our results show how contrastive modeling explains typological differences in choice of resources and the variation in text behavior when languages are compared.

Keywords
Product-Oriented Translation Studies; Contrastive Description; Systemic Functional Linguistics; Genre Modeling

1. Introdução

Ao longo de seu desenvolvimento, a pesquisa nos Estudos da Tradução com foco no produto procura tomar como base teorias linguísticas capazes de instrumentalizar a observação complexa da tradução (Hatim and Mason 62Hatim, Basil. “Translation text in context”. In: Munday, Jeremy. (Ed.) The Routledge companion to translation studies. London & New York: Routledge, 2009.; Baker 16-7Baker, Mona. In other words: a coursebook on translation. London/New York: Routledge, 1992.; Hatim and Munday 3Hatim, Basil.; Mason, Ian (a). Discourse and the Translator. London: Longman, 1990.), fato este que se deve à tradução ser um fenômeno com diferentes níveis de análise, desde elementos básicos da constituição estrutural da língua até suas relações discursivas em contextos socioculturais (Steiner 292Steiner, Erich. “Translation evaluation – some methodological questions arising from the German translation of Goldhagen’s ‘Hitler’s Willing Executioners’”. In: Ventola, E. (Ed.). Discourse and Community: doing functional linguistics. Narr: Tübingen, 2000, p. 291-307.; Zhang and Munday 1Zhang, Meifang; Munday, Jeremy. “Innovation in discourse analytic approaches to translation studies”. Perspectives: Studies in Translation Theory and Practice. 26.2 (2018): 159-165. Portal tandfonline. Disponível em: https://www.tandfonline.com/doi/full/10.1080/0907676X.2018.1403740. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
https://www.tandfonline.com/doi/full/10...
).

Dada a natureza linguística do produto tradutório (House 247(b)House, Juliane (b). “Translation quality assessment: linguistic description versus social evaluation”. Meta: Translators’ Journal. 46.2 (2001): 243-257.; Hatim 36; Munday 2Hatim, Basil.; Mason, Ian (b). The Translator as Communicator. London & New York: Routledge, 1997.), ganham particular destaque as teorias que possibilitam a descrição contrastiva – mais especificamente quando oferecem conhecimento descritivo para o contraste tanto da organização interna das línguas quanto de sua funcionalidade em contextos sociais (Ellis 15Ellis, Jeffrey. Towards a general comparative linguistics. Amsterdam: Mouton & Co, 1966.; Matthiessen 538Matthiessen, Christian. “Descriptive motifs and generalizations”. In: Caffarel, Alice; Martin, James; Matthiessen, Christian. (Eds.) Language typology: a functional perspective. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 2004.; Martin and Quiroz 190Martin, James. R.; Rose, David (a). Working with discourse: meaning beyond the clause. 2 Ed. London: Continuum, 2007.).

Descrições de línguas distintas, mas de mesma base teórica – i.e., descrições contrastivas (Caffarel, Martin and Matthiessen 77Caffarel, Alice.; Martin, James.; Matthiessen, Christian. (Eds.) Language typology: a functional perspective. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 2004.) – atendem a uma necessidade fundamental da pesquisa sobre o produto tradutório, a saber, a análise conjunta de textos fonte e traduzido. O estudo da tradução, portanto, se relaciona àquele da linguística contrastiva de maneira dependente, em um primeiro momento, por a tradução ser uma forma de produção linguística; mas, em um segundo momento, divergem, porque a pesquisa em tradução tem como foco os textos fonte e traduzido, ao passo que a linguística contrastiva mantém interesse na manifestação de categorias teóricas em diferentes línguas (House 248House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.).

Por um lado, uma série de perguntas de interesse ao produto se refere ao comportamento contrastivo das línguas, em suas “relações comparáveis” – ou a medida pela qual os sistemas linguísticos operam de forma (não-)correspondente. Por outro lado, o interesse se concentra especificamente na “relação paralela” entre língua fonte e alvo (cf. Baker 8-9Baker, Mona. In other words: a coursebook on translation. London/New York: Routledge, 1992.).

Esta dependência se revela na medida em que “de fato, a tradução toma a linguística contrastiva como base. Afinal, muitos dos problemas de tradução podem ser mapeados a partir das diferenças que se estabelecem entre sistemas linguísticos distintos” (House 15House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.). O papel ocupado pelos estudos contrastivos na produção de conhecimento sobre tradução assume maior destaque uma vez que:

a linguística contrastiva se torna mais relevante ainda quando sua abrangência se amplia da descrição simples de formas linguísticas para a maneira como estas se empregam, segundo os padrões das diferentes línguas, para organizar a informação, desempenhar os atos comunicativos e expressar posicionamentos e valores

(House 15House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.).

O presente trabalho toma a Linguística Sistêmico-Funcional (LSF) (Halliday and Matthiessen 58) como sua teoria de base. Esta escolha ocorre devido à amplitude dos fenômenos linguístico descritos pela teoria de forma contrastiva (Caffarel Martin and Matthiessen 22Caffarel, Alice.; Martin, James.; Matthiessen, Christian. (Eds.) Language typology: a functional perspective. Amsterdam/Philadelphia: John Benjamins Publishing Company, 2004.; Mwinlaaru and Xuan 6Mwinlaaru, Isaac N.; Xuan, Winfred Wenhui. “A survey of studies in systemic functional language description and typology.” Functional Linguistics. 3.8 (2016): 1-41. Portal Springer Link. Disponível em: https://link.springer.com/article/10.1186/s40554-016-0030-4. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
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) e, destacadamente, por haver uma longa tradição de diálogo com os Estudos da Tradução (Halliday, McIntosh and Strevens 111Halliday, Michael. A. K.; Matthiessen, Christian. Introduction to Functional Grammar. 4 Ed. Oxford: Routledge, 2014.; Catford 1; House 36Catford, John. A linguistic theory of translation: an essay in applied linguistics. London: Oxford Univ, 1965.; Hatim and Mason 48-52(a)Hatim, Basil. “Translation text in context”. In: Munday, Jeremy. (Ed.) The Routledge companion to translation studies. London & New York: Routledge, 2009.; Baker 20Baker, Mona. In other words: a coursebook on translation. London/New York: Routledge, 1992.; Steiner and Yallop 13Steiner, Erich; Yallop, Colin. (Ed.). Exploring translation and multilingual text production: beyond content. Berlin & New York: Mouton de Gruyter, 2001.; House 247House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.; Munday 13Munday, Jeremy. Evaluation in translation: critical points of translator decision-making. London & New York: Routledge, 2012.; entre outros).

As pesquisas em tradução embasadas na LSF se concentram frequentemente em duas dimensões do sistema linguístico: a estratificação e a metafunção – nas quais se realizam a análise dos fenômenos tradutórios em grupos de sistemas – ideacionais, interpessoais e textuais; nos estratos da língua – gramática, semântica discursiva (Munday 42Munday, Jeremy. Evaluation in translation: critical points of translator decision-making. London & New York: Routledge, 2012.); bem como na relação com o contexto – registro e gênero (Hatim 36Hatim, Basil.; Munday, Jeremy. Translation: An advanced resource book. London & New York: Routledge, 2004.). Esse tipo de análise, entretanto, não contempla a relação dinâmica entre instanciações – ou as “produções paralelas” de textos fonte e alvo (House 248House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.).

Nesse sentido, alguns trabalhos (Evert and Neumann 2Evert, Stefan; Neumann, Stella. “The impact of translation direction on characteristics of translated texts: a multivariate analysis for English and German”. In: De Sutter, G.; Lefer M-A.; Delaere, I. (Eds.). Empirical Translation Studies: New Methodological and Theoretical Traditions. Berlin, Boston: De Gruyter, 2017, p. 47–80.) partem da dimensão da instanciação, na qual se investigam dinamicamente as sequências de escolhas que levam à produção textual e influenciam a tradução, de forma que se faz possível observar como as línguas sofrem processos de instanciação distintos. Porém, partir da instanciação é apenas um primeiro passo para a compreensão da relação dinâmica entre os textos.

A instanciação é sensível a cada texto produzido, visto que lida com as escolhas que de fato acontecem em textos individualmente. Por isso, um problema para a análise dinâmica é justamente generalizar a descrição da instanciação de um texto particular para um grupo de textos, um tipo textual, ou um gênero como um todo. Uma forma de organizar a descrição da instanciação, que é capaz de contribuir para a solução deste problema – tanto na metodologia de análise quanto na descrição – é a modelagem da dinâmica textual (Lemke 3Lemke, Jay, L. “Text Production and Dynamic Text Semantics”. In: Ventola, E. (Ed). Functional and Systemic Linguistics: approaches and uses. Berlin: Mouton de Gruyter, 1991, p. 23-38.; Figueredo 18-41 (b))Figueredo, Giacomo (b). “Uma metodologia de perfilação gramatical sistêmica baseada em corpus.” Letras & Letras. 30.2 (2014): 17-45. Portal de Periódicos do ILEEL. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/letraseletras/article/view/27731. Acesso em: 20/10/2019
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.

Partindo da concepção de que “modelo” assim se define como a representação de um sistema complexo a partir de suas características mais relevantes para a reprodução do comportamento desse sistema, a modelagem da dinâmica textual inclui a descrição de um corpus generalizado a partir de textos particulares considerando a variação que distingue os textos e a acomodação do intervalo de variação (Oliveira, Campolina and Figueredo 418-47Oliveira, Francieli. S. (a). “Comparação linguística e perfilação gramatical sistêmica em um corpus combinado.” Revista de Estudos da Linguagem. 23 (2015): 727- 768. Portal de Periódicos Letras UFMG. Disponível em: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/relin/article/view/8917. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
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; Oliveira 35-125 (b)Oliveira, Fancieli. S. (b). Modelagem e Comparação Linguística: o ambiente multilíngue de produção de introduções de artigos acadêmicos da área de Enfermagem em inglês e português brasileiro. Dissertação (Mestrado em Linguística Aplicada) – Belo Horizonte: Faculdade de Letras, UFMG/PosLin, 2018.).

Diante da necessidade por modelos de instanciação comparáveis, o presente trabalho tem como objetivo apresentar o contraste entre dois modelos de tipos de texto de forma que sirvam como subsídio para futuras investigações do fenômeno tradutório. Mais especificamente, iremos trabalhar com introduções de artigo acadêmico da área das Ciências da Saúde sob o domínio experiencial diabetes mellitus, classificados no Qualis-CAPES como A1 e A2, em inglês e português brasileiro (PB).

O tipo de modelagem contrastiva aqui proposto se justifica por servir à tradução ao (a) tomar o texto como base da descrição, em lugar da língua como um todo; (b) considerar a língua em uso, uma vez que os padrões descritivos não são estáticos; (c) contemplar a covariação de sistemas de diferentes estratos e seus padrões de produção de textos, e não apenas de um único sistema. Além disto, permite ainda que a tradução tenha o aporte da descrição contrastiva de modelos de texto, e não apenas de textos isoladamente, por um lado, ou de descrições contrastivas para a toda a língua, por outro.

2. Descrição contrastiva de gêneros textuais

A descrição linguística se define como a apresentação dos fenômenos de uma língua, pautada por uma teoria de base, juntamente com a explicação do comportamento desses fenômenos. A descrição contrastiva inclui a apresentação e explicação dos fenômenos em mais de uma língua, segundo uma mesma teoria de base. Com isto, torna-se possível estabelecer os contrastes entre os comportamentos dos fenômenos nas diferentes línguas.

Para os Estudos da Tradução com foco no produto, a descrição contrastiva sempre se revelou relevante para a análise, uma vez que a tradução é um tipo de relação entre línguas (Baker 10Baker, Mona. In other words: a coursebook on translation. London/New York: Routledge, 1992.; Hatim and Mason 161Hatim, Basil. “Translation text in context”. In: Munday, Jeremy. (Ed.) The Routledge companion to translation studies. London & New York: Routledge, 2009.; Munday 31Munday, Jeremy. Evaluation in translation: critical points of translator decision-making. London & New York: Routledge, 2012.).

Os trabalhos de descrição contrastiva pautados pela LSF, por sua vez, demonstram a importância de se considerarem diferentes dimensões de análise, uma vez que as línguas podem ser contrastadas não só em sua formalidade (i.e., fonologia e gramática), como também no conteúdo (semântica e discurso). Soma-se ainda um fator importante para a tradução, que é a funcionalidade contextual (registro e gênero).

Uma vez que a tradução é um fenômeno entre línguas, que se manifesta na forma de texto – devendo-se, portanto, considerar formalidade, conteúdo e funcionalidade –, as descrições contrastivas de base sistêmico-funcional permitem uma amplitude elevada ao escopo da análise, fato que se demonstra pelo número de investigações em tradução que tomam descrições contrastivas como parâmetro. Considerando-se as diferentes dimensões do sistema linguístico, citam-se como exemplo trabalhos pioneiros (Quadro 1):

Quadro 1
Trabalhos sobre tradução de abordagem contrastiva com base na LSF.

Como mostra o Quadro 1, as pesquisas se aprofundam, em sua maioria, nas dimensões da estratificação e metafunção. Contudo, cabe destacar que isto se deve ao próprio desenvolvimento da LSF que experimenta maior quantidade de pesquisas contrastivas precisamente para estas duas dimensões. Assim, as outras dimensões do sistema linguístico, a saber, instanciação, eixo e individuação são menos estudadas contrastivamente. Por isso, sabe-se menos aspectos da tradução segundo estas dimensões.

Nesse sentido, as descrições contrastivas que focalizam alguma dessas outras dimensões podem contribuir expandindo o arcabouço para futuras análises do produto tradutório. Ainda, uma vez que a funcionalidade contextual é um elemento fundamental a ser considerado para a tradução, logo a descrição contrastiva do registro e gênero se torna um elemento relevante que subsidia a tradução.

Esta pesquisa se concentra na descrição contrastiva de gêneros textuais em inglês e PB. Focaliza, portanto, a complementaridade entre as dimensões da estratificação e instanciação – da qual, para a LSF, o registro e o gênero são depreendidos.

Do ponto de vista da estratificação, o registro é um dos estratos do contexto e responde pela disposição dos sistemas da língua que estão disponíveis para uma determinada situação (i.e., campo, sintonia e modo de um contexto de situação). Uma determinada disposição dos sistemas opera, por sua vez, como o padrão de realização do registro.

O gênero é realizado por uma ou mais configurações de registro que possui uma função social reconhecida pela comunidade de falantes. Quando organizadas em um sequência determinada (i.e., estrutura genérica), estas configurações realizam então uma função social da língua em seu contexto (Zappavigna and Martin 30Zappavigna, Michele; Martin, James. Discourse and diversionary justice: an analysis of youth justice conferencing. Hampshire: Palgrave Macmillan, 2018.).

Do ponto de vista da instanciação, o registro se torna a configuração provável de escolhas nos sistemas da língua que, uma vez selecionadas, formam uma unidade de significado (denominada “instância” ou “texto”). A análise de uma configuração sistêmica revela um texto; a análise de um conjunto de textos de configurações semelhantes (i.e., um tipo textual) revela um registro.

O gênero, neste aspecto é, portanto, uma possibilidade (what-if) ou potencial de produção de significado, que pode se fixar na cultura caso funcione, ou ser substituído/corrigido quando não se identifica seu papel contextual. A análise do gênero permite compreender como os diferentes registros concebem e encenam tipos de práticas e contextos sociais distintos, assim como a investigação de sua estrutura genérica aumenta a delicadeza da análise textual, permitindo compreender como os registros estão sendo organizados de forma a compor um gênero.

Um modelo probabilístico de um tipo textual, desta forma, é uma descrição do registro, uma vez que inclui a configuração sistêmica provável em conjunto com uma margem de variação que separa um tipo textual de outros (Oliveira 35-125Oliveira, Francieli. S.; Campolina, Thaís. G.; Figueredo, Giacomo. “Modelagem topológica do perfil sistêmico-funcional de manuais de instrução no espaço gramatical.” Domínios de Lingu@gem. abr./ jun. (2017): 418-447. Portal de Periódicos do ILEEL. Disponível em: http://www.seer.ufu.br/index.php/dominiosdelinguagem/article/view/36939. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
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). Entendido como a representação do comportamento mais relevante de um sistema complexo, o modelo de um registro é construído a partir da análise de um conjunto de textos de um mesmo tipo através da disposição de sistemas que o realizam.

Uma vez que qualquer disposição de registro tende a variar, o modelo considera a variação no comportamento do registro e determina a quantidade aceitável dessa variação. O modelo contrastivo é, portanto, o conjunto dos modelos de cada língua envolvida no contraste, acrescido das semelhanças e diferenças na variação de uma língua relativamente a outras.

Para a tradução, a modelagem contrastiva é relevante, visto que permite atender a uma demanda complexa do campo disciplinar, a saber, o embasamento da análise da tradução em diferentes níveis, em particular (i) na funcionalidade situacional do registro (cf. House 36House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.) (ii) na configuração das instâncias (cf. Evert and Neumann 21) e (iii) no contraste entre textos, que são a unidade na qual a tradução acontece (cf. Hatim 37).

3. Metodologia

Para esta investigação, um corpus contendo dez introduções de artigos acadêmicos foi coletado, cinco em inglês e cinco em PB tendo como base a organização social da língua como um sistema de gêneros (Martin and Rose 16 (b)Martin, James. R.; Rose, David (b). Genre Relations: mapping culture. London: Equinox, 2008.). Mais especificamente, o corpus desta pesquisa pertence à família dos gêneros avaliativos, argumento, devido ao fato de as introduções avaliarem questões e pontos de vista no âmbito acadêmico e família de gêneros informativos, relato, uma vez que classificam e descrevem o tópico a ser abordado no artigo (Rose 4).

A compilação teve como base os periódicos A1 e A2 do Qualis-CAPES (2017) no domínio experiencial (Halliday and Matthiessen 33Halliday, Michael. A. K.; Mcintosh, Angus; Strevens, Peter. The Linguistic Sciences and Language Teaching. London: Longmans, 1964.) diabetes mellitus. A análise da estrutura genérica foi realizada para seleção uniforme de textos com os estágios organizados na mesma ordem nas duas línguas (cf. Vian Jr 388Vian Jr, O. “Estruturas potenciais de gêneros na análise textual e no ensino de línguas”. Linguagem em (Dis)curso. 9.2 (2009): 387-410. Portal de Periódicos Unisul. Disponível em: http://www.portaldeperiodicos.unisul.br/index.php/Linguagem_Discurso/article/view/421. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
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para descrição de gêneros em PB; Martin and RoseMartin, James. R.; Quiroz, Beatriz. “Functional language typology: a discourse semantic perspective”. In: Martin, James; Doran, Yaegan; Figueredo, Giacomo (Eds.) Systemic functional language description: making meaning matter. New York/London: Routledge, 2020. 309 para descrição de gêneros em inglês), a saber, Introdução; Problema de pesquisa; Objetivo de pesquisa. Assim, mediante a alta frequência dessa estrutura nas introduções, ficou definida como critério de compilação do corpus (ver Quadro 2):

Quadro 2
Classificação das introduções de artigos acadêmicos.

Após a compilação, os textos foram etiquetados e armazenados segundo as regras de compilação do CALIBRA – Catálogo da Língua Brasileira. Em seguida, foram segmentados em orações de acordo com a LSF e salvos em planilhas eletrônicas em formato .xlsx. As Tabela 1 e 2 apresentam as etiquetas utilizadas para cada texto, incluindo a quantidade de tokens e orações.

Tabela 1
Dados referentes às introduções em inglês
Tabela 2
Dados referentes às introduções em PB

As orações foram analisadas segundo os seus principais sistemas (Figueredo 103-300Figueredo, Giacomo (a). Introdução ao perfil metafuncional do português brasileiro: contribuições para os estudos multilíngues. 2011. 385 f. Tese (Doutorado em Linguística Aplicada) Programa de Pós-Graduação em Estudos Linguísticos, Faculdade de Letras, Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 2011. para o PB; Halliday and Matthiessen 88-356 para o inglês) (ver Quadro 3). Esta análise foi registrada em planilhas eletrônicas para processamento no software estatístico R (R Core Team 2017R Core Team. “A language and environment for statistical computing”. R Foundation for Statistical Computing, 2017. Portal R-Project. Disponível em: http://www.R-project.org/. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
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) através de um script1 1 Os scripts utilizados nesta pesquisa podem ser encontrados em (Oliveira 131-40). . Este permitiu a análise de cluster gerando agrupamentos, e, consequentemente, a produção de um dendrograma; possibilitando a visualização topológica dos estágios do gênero das introduções dos artigos acadêmicos em inglês e PB.

Quadro 3
Categorias utilizadas na análise do corpus

4. Modelagem das orações da estrutura genérica em inglês e em PB

A análise dos estágios do gênero em inglês e em PB permitiu o mapeamento da quantidade de orações que são utilizadas na estrutura genérica “Introdução” ^ “Problema de pesquisa” ^ “Objetivo de pesquisa” (ver Tabelas 3 e 4).

Tabela 3
Quantidade de orações pelos estágios do gênero em inglês
Tabela 4
Quantidade de orações pelos estágios do gênero em PB

As Tabela 3 e 4 mostram que a estrutura genérica em inglês e PB possui estágios distintos, tanto na mesma língua, quanto em inglês e em PB. Na mesma língua, uma vez que a “Introdução”, o “Problema de pesquisa” e o “Objetivo de pesquisa” possuem diferentes frequências relativas de orações. E em línguas distintas, visto que mesmo que os estágios da estrutura genérica possuem o mesmo rótulo, “Introdução” ^ “Problema de pesquisa” ^ “Objetivo de pesquisa”, eles são diferentes, uma vez que a quantidade de orações solicitadas em cada língua possui frequência distinta.

Comparando os estágios dos textos em INGLÊS e PB, o PB utiliza-se de mais 10,6% de orações a mais que o inglês para compor a “Introdução”. Já o inglês utiliza-se de mais 7,1% de orações para desenvolver o “Problema de pesquisa” que o PB, como também, dispõe de 3,5% de orações a mais para o “Objetivo de pesquisa”.

As frequências de orações apresentadas Tabela 3 e Tabela 4 também apontam que não só os estágios da estrutura genérica em cada língua e entre as línguas são distintos, mas também mostram que eles compõem registros (Martin and Rose 11Martin, James. R.; Rose, David (b). Genre Relations: mapping culture. London: Equinox, 2008.) particulares, posto que eles se configuram de diferentes formas não somente pela quantidade de orações, mas também pelas suas escolhas realizadas na ordem da oração no estrato da gramática (ver seção 5).

5. Análise contrastiva dos estágios do gênero em inglês e em português original

A análise das funções linguísticas selecionadas nas orações da estrutura genérica permitiu realizar uma análise contrastiva entre os estágios das introduções de artigos acadêmicos em inglês e PB. Esse contraste foi realizado no ambiente computacional R (R Core Team 2017R Core Team. “A language and environment for statistical computing”. R Foundation for Statistical Computing, 2017. Portal R-Project. Disponível em: http://www.R-project.org/. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
http://www.R-project.org/...
) e apresentado através de um dendrograma.

O dendrograma é um tipo de diagrama que organiza variáveis mediante uma análise estatística de dados, que nesse caso, foram as anotações das orações realizadas em planilhas eletrônicas. A organização das variáveis apresentadas pelo dendrograma é gerada pelo método quantitativo e um algoritmo de clustering que gera agrupamentos hierárquicos ascendentes. Essa hierarquia indica a proximidade entre os dados (ver Figura 1).

Figura 1
Dendrograma com os estágios da estrutura genérica em inglês e PB.

O dendrograma permite uma análise de dados disposta em árvore de forma a organizar topologicamente os dados. No caso da presente pesquisa, revela os padrões de organização linguística semelhantes entre estágios do gênero. Por exemplo, os estágios “Introduction”, “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa” conservam maior proximidade entre si (indicada pelos retângulos que delimitam os estágios na Figura 1).

Os estágios em cada língua foram agrupados segundo o método Ward2 2 O método Ward, também chamado de método da variância mínima, é um procedimento de agrupamento hierárquico realizado pela maximização da homogeneidade dentro dos grupos. , portanto, quanto maior a semelhança nas escolhas linguísticas, mais próximos eles estarão no dendrograma. Esta proximidade é medida em níveis de similaridade (Hair et al. 427Hair, Joseph; Black, William C.; Babin, Barry B.; Anderson, Rolph E.; Tatham, Ronaldo L.; Análise Multivariada de Dados: análise de Agrupamentos. Tradução de Adonai Schlup Sant’Anna. Porto Alegre: Bookman, 2009.), que significa o resultado final dos cálculos de distância entre os dados. Na Figura 1, refere-se à escala de altura (height) visível entre os níveis 5 e 30.

Nas próximas seções serão apresentadas as funções linguísticas determinantes pelos agrupamentos.

5.1 Primeiro agrupamento

O primeiro agrupamento, “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa”, encontra-se no nível 7.6273 e foi o único agrupamento que envolveu estágios em ambas as línguas. Esse agrupamento foi motivado por ambos selecionarem, em grande parte, as mesmas opções dos sistemas analisados, como também por esse estágio selecionar uma diversidade menor de opções sistêmicas em inglês e PB (ver Quadro 4). Isso pode ser confirmado pela quantidade de orações utilizadas, que é reduzida quando comparada com os demais estágios (ver seção 4).

Quadro 4
Opções selecionadas pelo “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa”.

O Exemplo 1 apresenta as opções do sistema de dêixis compartilhadas entre inglês e PB:

Exemplo 1
“Aim of the paper”

“Objetivo de pesquisa”

Apesar de serem línguas com organizações gramaticais distintas, a similaridade entre os estágios pode ser explicada pela restrição das opções selecionadas pelo PB, uma vez que é frequente a seleção de mais opções gramaticais em PB, se comparado com o inglês (Oliveira 727-64). Portanto, enquanto o PB selecionou uma variedade menor de funções gramaticais no “Objetivo de pesquisa” com relação ao seu potencial de seleção, o “Aim of the paper” selecionou suas opções recorrentes.

5.2 Segundo agrupamento

A “Introduction” formou o segundo agrupamento do dendrograma com “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa” no nível 17.6649. Ela selecionou as mesmas opções dos sistemas que o “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa” selecionaram juntos em algumas orações, por esse motivo, os três formam um agrupamento. O Exemplo 2 mostra os três estágios compartilhando as mesmas opções gramaticais com relação ao sistema de tema.

Exemplo 2
“Introduction”

“Aim of the paper”

“Objetivo de pesquisa”

A “Introduction” também selecionou opções que não foram selecionadas pelo “Aim of the paper” e “Objetivo de pesquisa” juntos. Ela selecionou para o sistema de dêixis as opções [temporal: presente], [temporal: passado], [não finito] e [modal: obrigação]. O “Objetivo de pesquisa” selecionou as opções [temporal: presente], [temporal: passado], [não finito]. E o “Aim of the paper” selecionou somente [temporal: passado], [não finito] e [modal: probabilidade].

Portanto, as opções [temporal: passado] e [não finito] são compartilhadas entre os três estágios e o “Aim of the paper” é o único que não seleciona a opção [temporal: presente]. As opções [modal: obrigação], [temporal: presente] e [modal: probabilidade] não são compartilhadas entre os três estágios. Apesar da realização das opções [modal: obrigação] e [modal: probabilidade], respectivamente, na “Introduction” e “Aim of the paper”, elas ocorreram somente em uma oração dos estágios, ou seja, ocorreram em baixa frequência.

Por conseguinte, a “Introduction” forma o segundo agrupamento com o “Aim of the paper” e o “Objetivo de pesquisa”, uma vez que ela escolhe as mesmas opções dos sistemas nas três metafunções que o “Aim of the paper” e o “Objetivo de pesquisa” selecionaram juntos. As opções gramaticais da “Introduction” que não são utilizadas no “Aim of the paper” e o “Objetivo de pesquisa” são utilizadas por pelo menos um deles na maioria dos casos.

5.3 Terceiro agrupamento

A “Introdução” e o “Problema de pesquisa” formam o terceiro agrupamento no nível 20.6662. Eles agruparam-se por selecionar as mesmas opções nas três metafunções na maioria das ocorrências (ver Quadro 5).

Quadro 5
Opções selecionadas pela “Introdução” e “Problema de pesquisa”.

O Exemplo 3 apresenta a mesma seleção para o sistema de tipo de processo na “Introdução” e do “Problema de pesquisa”.

Exemplo 3
”Introdução”

“Problema de pesquisa”

Poucas opções não foram selecionadas pela “Introdução” e o “Problema de pesquisa” juntos. Um exemplo dessas seleções seria as opções [modal: probabilidade] e [temporal: futuro] do sistema de dêixis que ocorreram somente no “Problema de pesquisa”. Apesar dessas opções não terem sido realizadas na “Introdução”, elas ocorreram no “Research problem”. Logo, esse resultado aponta que [modal: probabilidade] e [temporal: futuro] são seleções atribuídas ao registro em inglês e PB.

Para tanto, a “Introdução” e o “Problema de pesquisa” agruparam-se por compartilhar mais opções em comum do que incomuns. Elas apresentam escolhas que são frequentemente encontradas no PB (Figueredo 171-91; Oliveira, Campolina and Figueredo 426-43), como as seleções [impessoal] do sistema de responsabilidade, [não recuperável] do sistema de pressuposição do sujeito e seleção frequente de até duas circunstâncias na oração.

5.4 Quarto agrupamento

O quarto agrupamento entre a “Introdução”, “Problema de pesquisa” e “Research problem” está localizado no nível 26.4184. As opções selecionadas pela “Introdução” e “Problema de pesquisa” juntos, em sua maioria, são selecionadas pelo “Research problem”. O Exemplo 4 mostra seleções comuns do sistema de sujeitabilidade entre os estágios.

Exemplo 4
“Research Problem”

“Introdução”

“Problema de pesquisa”

Algumas opções foram selecionadas pelo “Research problem” que não foram selecionadas pela “Introdução” e “Problema de pesquisa” juntos, por exemplo, a opção [continuativo] do sistema de tema textual 2 ocorreu no “Research problem” e no “Problema de pesquisa”. Esse resultado pode apontar que essa seleção é prototípica do registro tanto em inglês e quanto PB.

A opção [avaliação: comentário] do tema interpessoal foi selecionada somente pelo “Research problem” (ver Exemplo 5). Essa ocorrência pode mostrar que as introduções de artigos acadêmicos em inglês são mais passíveis de avaliação do falante, se comparado com as introduções PB.

Exemplo 5
“Research Problem”

Para tanto, o “Research problem” agrupou-se com a “Introdução” e o “Problema de pesquisa” por ele compartilhar a maioria das seleções da “Introdução” e o “Problema de pesquisa” juntos, como também, por selecionar algumas opções encontradas no “Problema de pesquisa”. No entanto, o “Research problem” não selecionou opções que foram selecionadas pelo PB e algumas opções que não foram selecionadas pela “Introdução” e o “Problema de pesquisa” juntos, por esse motivo o quarto agrupamento foi realizado somente após uma altura de 5.7522.

5.5 Quinto agrupamento

O quinto e último agrupamento localiza-se no nível 30.6204, que representa o local onde os estágios do gênero em inglês e PB se agrupam. Por se agruparem, os estágios selecionam opções em comum nas três metafunções (ver Quadro 6).

Quadro 6
Opções selecionadas por todos os estágios em inglês e PB.

Essas seleções dos estágios do gênero em inglês e PB apresentam escolhas comuns às línguas, ou seja, escolhas multilíngues.

5.6 Contribuição para o estudo do produto tradutório

Os resultados apresentados até aqui na seção 5 mostram como a análise contrastiva possibilita a observação do comportamento dos textos em cada língua, além da variação nas escolhas sistêmicas para cada registro. Desta forma, o modelo contrastivo contribui como um suporte para a tradução, uma vez que consegue revelar padrões de variação entre as línguas quando estas entram em contato. Mais especificamente, quando este contato acontece de forma restrita a um determinado registro.

Estes resultados contribuem para os Estudos da Tradução por meio da análise das introduções de artigos acadêmicos, a partir da qual apresentou-se um modelo contrastivo de seleções gramaticais feitas nos textos de língua fonte. Esse modelo permite compreender a forma pela qual o ambiente multilíngue composto pelo inglês e PB funciona e, consequentemente, fornece conhecimentos relevantes para a compreensão do produto tradutório.

O contraste apresentado pelo dendrograma mostra que a “Introdução” não agrupou-se com o estágio “Introduction” e nem o “Problema de pesquisa” com o estágio “Research problem”. E, apesar de o “Objetivo de pesquisa” ter agrupado com o “Aim of the paper”, isso é justificado pela quantidade de orações desse estágio ser reduzida relativamente ao número de orações dos demais estágios e, consequentemente, pela quantidade menor de funções gramaticais selecionadas.

Por conseguinte, o dendrograma revela que apesar de inglês e PB possuírem os mesmos rótulos de estágios para as introduções, o funcionamento gramatical em cada língua e a distribuição das orações para cada estágio são particulares e distintos.

São particulares por utilizarem opções gramaticais próprias que podem ser agrupadas pela língua, por exemplo, as seleções de [impessoal] e [não recuperável] que são prototípicas do PB. Como também, seleções agrupadas pelo tipo de estágio, por exemplo, a seleção de [modal: probabilidade] e [temporal: futuro], que são atribuídas aos estágios “Research problem” e “Problema de pesquisa”.

São distintos pelo fato de que cada estágio nas línguas utiliza uma porcentagem individual de orações para compor o registro. Além disso, apesar de os registros serem agrupados pelo dendrograma, por serem registros e em línguas diferentes, possuem configurações exclusivas, como por exemplo a seleção da opção [avaliação: comentário] no sistema de tema interpessoal realizada somente no “Research problem”.

6. Considerações finais

Este trabalho utilizou a LSF como base teórica e descritiva para realizar uma análise contrastiva de introduções de artigos acadêmicos em inglês e em PB. A análise permitiu compreender como os textos constroem significados pela gramática e, como consequência, propor um modelo de produção textual em línguas distintas de forma a contribuir para os Estudos da Tradução com foco no produto.

Partindo de estudos anteriores que apontam determinadas características do produto tradutório – tais como o fato de a tradução acontecer entre textos (e não línguas), ser contextualizado (portanto gênero-dependente) e provável (formando padrões de probabilidade recorrentes) – o presente artigo objetivou produzir um modelo contrastivo de textos de forma a ser empregado como subsídio para o estudo da tradução.

A partir da metodologia de modelagem – a qual inclui análise linguística dos textos, de seu contexto, bem como de sua frequência e variação – possibilitou realizar o contraste das estruturas genéricas dos textos nas línguas analisadas.

O contraste da estrutura genérica, por meio do dendrograma, exemplificou precisamente como as duas línguas possuem organizações gramaticais particulares, como também, a sua variação interna com relação aos registros. Esse conhecimento, por sua vez, pode contribuir para os Estudos da Tradução, tanto para os estudos puros quanto para os estudos aplicados.

Para o ramo puro das pesquisas, este trabalho contribui com o mapeamento de sistemas linguísticos distintos, que pode servir como base para (i) futuras descrições do produto e processo tradutório, a medida que mostra as relações multilíngues construídas entre o PB e inglês e (ii) o desenvolvimento de uma teoria da tradução que possua uma teoria linguística como estrutura.

Para o ramo das pesquisas aplicadas, o modelo contrastivo desta pesquisa pode igualmente contribuir, uma vez que (i) explicita a complexidade da prática tradutória, visto que é um trabalho que envolve um ambiente multilíngue com sistemas linguísticos diferentes; (ii) mostra como os registros em cada língua estão sendo construídos, auxiliando no desenvolvimento da tradução e na solução de problemas de tradução (House 15House, Juliane (a). Translation Quality Assessment: a model revisited. Tübingen: Narr. 1997.) e (iii) oferece ferramentas para a tradução, dado que apresenta as funções linguísticas mais frequentes em língua original.

  • 1
    Os scripts utilizados nesta pesquisa podem ser encontrados em (Oliveira 131-40Oliveira, Francieli. S. (a). “Comparação linguística e perfilação gramatical sistêmica em um corpus combinado.” Revista de Estudos da Linguagem. 23 (2015): 727- 768. Portal de Periódicos Letras UFMG. Disponível em: http://www.periodicos.letras.ufmg.br/index.php/relin/article/view/8917. Acesso em: 20 de outubro de 2019.
    http://www.periodicos.letras.ufmg.br/ind...
    ).
  • 2
    O método Ward, também chamado de método da variância mínima, é um procedimento de agrupamento hierárquico realizado pela maximização da homogeneidade dentro dos grupos.

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Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    28 Ago 2020
  • Data do Fascículo
    May-Aug 2020

Histórico

  • Recebido
    23 Jan 2020
  • Aceito
    05 Abr 2020
  • Publicado
    Maio 2020
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