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Sendas e veredas da semiótica narrativa e discursiva

Towards a semiotics theory

Resumos

Este trabalho analisa o desenvolvimento de uma das teorias recentes do discurso: a Semiótica francesa. Mostra os princípios sobre os quais se constituiu, sua marcha no estabelecimento do percurso gerativo de sentido, os caminhos de complexificação do nível narrativo, com o estudo das modalizações do fazer e do ser, passando da constituição de uma teoria da dimensão pragmática da narrativa para a de suas dimensões cognitiva e patêmica. Em seguida, examina os caminhos atuais da investigação, em que se busca estudar um aquém e um além do percurso. Naquele, com os conceitos de estesia, aspectualização e modulação, investiga-se a recuperação no discurso do contínuo das pré-condições de significação; neste, examina-se o problema da relação entre plano do conteúdo e plano da expressão.

Semiótica; Percurso gerativo; Paixões; Semi-simbolismo; Aspectualização; Modalização


This work analyses the development of a recent discourse theory, namely French Semiotics. It refers to the principles that form the basis of that theory, its progress regarding the establishment of a meaning generative process, the course it has followed towards the complexification of the narrative level through a study of the modalizations of doing and being, ranging from the building up of theory concerned with the pragmatic dimension of the narrative to a theory focused on the cognitive and pathematic dimensions of the narrative. Furthermore, this work examines current paths of investigation which seek to analyse not only what underlies but also what goes on beyond discourse. In the first case, by means of the concepts of aesthesis, aspectualization and modulation, the recovering of the signification pre-conditions continuum in discourse is investigated; in the second case the problem of the relationship between the level of content and level of expression is examined.

Semiotics; Generative process; Passions; Semi-symbolism; Aspectualization; Modalization


RETROSPECTIVA/OVERVIEW

Sendas e Veredas da Semiótica Narrativa e Discursiva

(Towards a Semiotics Theory)

José Luiz FIORIN

(

Universidade de São Paulo)

ABSTRACT: This work analyses the development of a recent discourse theory, namely French Semiotics. It refers to the principles that form the basis of that theory, its progress regarding the establishment of a meaning generative process, the course it has followed towards the complexification of the narrative level through a study of the modalizations of doing and being, ranging from the building up of theory concerned with the pragmatic dimension of the narrative to a theory focused on the cognitive and pathematic dimensions of the narrative. Furthermore, this work examines current paths of investigation which seek to analyse not only what underlies but also what goes on beyond discourse. In the first case, by means of the concepts of aesthesis, aspectualization and modulation, the recovering of the signification pre-conditions continuum in discourse is investigated; in the second case the problem of the relationship between the level of content and level of expression is examined.

RESUMO: Este trabalho analisa o desenvolvimento de uma das teorias recentes do discurso: a Semiótica francesa. Mostra os princípios sobre os quais se constituiu, sua marcha no estabelecimento do percurso gerativo de sentido, os caminhos de complexificação do nível narrativo, com o estudo das modalizações do fazer e do ser, passando da constituição de uma teoria da dimensão pragmática da narrativa para a de suas dimensões cognitiva e patêmica. Em seguida, examina os caminhos atuais da investigação, em que se busca estudar um aquém e um além do percurso. Naquele, com os conceitos de estesia, aspectualização e modulação, investiga-se a recuperação no discurso do contínuo das pré-condições de significação; neste, examina-se o problema da relação entre plano do conteúdo e plano da expressão.

KEY WORDS: Semiotics; Generative process; Passions; Semi-symbolism; Aspectualization; Modalization.

PALAVRAS-CHAVE: Semiótica; Percurso gerativo; Paixões; Semi-simbolismo; Aspectualização; Modalização.

O caminhante faz seu caminho ao caminhar.

(Antônio Machado)

A Lingüística criou, a partir do século XIX, diferentes objetos teóricos: a langue, a competência, a variação, a mudança e o uso. Deste último ocupam-se as diferentes teorias pragmáticas, textuais e discursivas. Pode-se, com razão, perguntar se se trata de um objeto teórico ou de mais de um, dado que essas diferentes teorias, aparecidas na segunda metade do século XX, investigam esse objeto com fundamentos teóricos muito diversos, dialogam com quadros teóricos muito diferentes (a lógica, a antropologia estrutural, as ciências cognitivas, a psicanálise lacaniana, o marxismo, etc.) e apresentam graus distintos de formalização. Todos esses estudos, porém, têm algo em comum: ocupam o "vão entre pontos estáveis", embaralham diferenças bem estabelecidas pelos estudos lingüísticos anteriores (Barros, 1996: 184).

Abandonemos a pragmática, para nos determos nas teorias do discurso e do texto. Cinco têm sido as orientações teóricas mais praticadas no Brasil: a Análise do Discurso de linha francesa, a Análise do Discurso de extração anglo-saxã, a Análise da Conversação, a Lingüística Textual e a Semiótica Narrativa e Discursiva, também de origem francesa. Não é objetivo deste texto estabelecer as diferenças entre as distintas teorias discursivas e textuais, mas buscar estabelecer, de maneira crítica, o percurso de uma delas: a Semiótica Narrativa e Discursiva.

É preciso alertar que o fazer teórico da semiótica é aspectualizado imperfectivamente, o que significa que não constitui ela uma teoria pronta e acabada, mas um projeto, um percurso. Não está facta, mas in fieri. Por isso, a todo momento, está repensando-se, modificando-se, refazendo-se, corrigindo-se. É essa trajetória que vamos buscar.

Greimas começa sua obra fundadora, Semântica estrutural, mostrando que sendo a significação onipresente e multiforme (1973:15), a ponto de o mundo humano definir-se "essencialmente como um mundo de significação", de só poder "ser chamado `humano' na medida em que significa alguma coisa" (1973:11), o denominador comum das ciências humanas é a pesquisa acerca da significação (1973:11). Diz ele que "se as ciências da natureza se indagam para saber como são o homem e o mundo, as ciências do homem, de maneira mais ou menos explícita, se interrogam sobre o que significam um e outro" (1973:11). Assim, o problema da significação é central para as ciências humanas. Apesar disso, não se tinha, segundo ele, na época, uma disciplina científica adequada para tratar dessa questão, dado que "a semântica foi sempre a parente pobre da lingüística" (1973:12). A lingüística, que "teve a possibilidade de aparecer como a disciplina mais bem situada" para estudar a significação (1973:11), mostrou-se "de maneira geral, mais que reticente, até mesmo hostil a toda pesquisa semântica" (1973:12). A semântica, cuja denominação só se forjou em fins do século XIX, diz Greimas, "foi precedida, no quadro do desenvolvimento da lingüística histórica, inicialmente pela fonética, mais aprimorada, e depois pela gramática. Embora denominada e instaurada, a semântica procurou tomar emprestados seus métodos quer da retórica clássica, quer da psicologia da introspecção" (1973:12). "A lingüística estrutural seguiu, no seu desenvolvimento, a mesma ordem de prioridade. A Escola de Praga fundamentou solidamente a fonologia; a Escola de Copenhagen, que a seguiu imediatamente, preocupou-se com a elaboração da teoria lingüística, que procurava aplicar à renovação dos estudos gramaticais. O esquecimento da semântica é patente e voluntário" (1973:12-13), porque se discutiam as seguintes questões: se a semântica tem um objeto homogêneo, se a significação se deixa analisar estruturalmente, enfim, se se pode considerar a semântica uma disciplina lingüística (1973:13).

Segundo Greimas, são três os motivos que "explicam as reticências dos lingüistas em relação às pesquisas sobre a significação": "o retardamento histórico dos estudos semânticos, as dificuldades próprias à definição do seu objeto e a onda de formalismo" (1973:13). É preciso lembrar que o formalismo contra o qual se coloca Greimas é o formalismo behaviorista, que distinguia forma de conteúdo. Como se vai verificar, Greimas acolherá e operacionalizará a distinção forma e substância proposta por Hjelmslev (1968), bem como considerará formalismo diferente de formalização, sendo esta uma atitude científica que visa a construir modelos formais para explicar os dados da experiência e, principalmente, que utiliza sistemas formais baseados numa axiomática. Diz ele que a formalização é uma necessidade na elaboração de uma teoria científica.

Diante do fato de que o problema da significação é central para as ciências humanas e de que não havia uma disciplina científica adequada para tratar da significação, Greimas propôs "refletir acerca das condições pelas quais seja possível um estudo científico da significação" (1973:14). Em outras palavras, construir uma semântica. Essa semântica não seria uma semântica lógica, que se ocupasse do estudo das condições de verdade de uma frase, tendo em mira o exame dos aspectos vericondicionais de interpretação dos enunciados, ou seja, das condições requeridas para que os enunciados sejam verdadeiros. Ao contrário, seria uma semântica lingüística, que se ocuparia da análise da significação tal como é fornecida pelo código da língua. A Semiótica não se interessa pela verdade dos enunciados, mas por sua veridicção, isto é, pelos efeitos de sentido de verdade com os quais um discurso se apresenta como verdadeiro, falso, mentiroso, etc.

Essa semântica deveria ser gerativa, sintagmática e geral. É uma teoria sintagmática, porque seu escopo é estudar a produção e a interpretação dos textos. Aqui se produz o primeiro deslocamento produzido pela Semiótica. Sua totalidade não é o plano de conteúdo das línguas naturais, mas o texto. Assim, não se interessa em detectar o conjunto de categorias responsáveis pela criação dos sentidos das palavras de uma dada língua, como postulava Hjelmslev (1991:111-127), mas as diferenças produtoras do sentido do texto.

É geral, porque se interessa por qualquer tipo de texto, independentemente de sua manifestação. Postula que o conteúdo pode ser analisado separadamente da expressão, uma vez que o mesmo conteúdo pode ser veiculado por diferentes planos de expressão (por exemplo, uma negativa pode ser manifestada pela palavra não ou por um gesto da cabeça ou do indicador). É, por conseguinte, uma teoria geral dos textos, quer se manifestem verbalmente, visualmente, por uma combinação de planos de expressão visual e verbal, etc. Num primeiro momento da análise, faz abstração da manifestação, para examinar o plano do conteúdo, e só depois vai estudar as especificidades da expressão e sua relação com o significado.

É uma teoria gerativa, porque concebe o processo de produção do texto como um percurso gerativo, que vai do mais simples e abstrato ao mais complexo e concreto, num processo de enriquecimento semântico. Isso significa que vê o texto como um conjunto de níveis de invariância crescente, cada um dos quais suscetível de uma representação metalingüística adequada. O percurso gerativo de sentido não tem um estatuto ontológico, ou seja, não se afirma que o falante na produção do texto passe de um patamar ao outro num processo de complexificação semântica. Constitui ele um simulacro metodológico, para explicar o processo de entendimento, em que o leitor precisa fazer abstrações, a partir da superfície do texto, para poder entendê-lo.

A noção do percurso gerativo de sentido radica-se no trabalho de Propp sobre a narrativa. Este busca as invariantes narrativas, os elementos que fazem que uma narrativa seja uma narrativa. Num procedimento semelhante ao do fonólogo, que se indagava, diante da imensa variedade da realização dos sons, como os falantes compreendiam sempre a mesma unidade fônica da língua, Propp desejava revelar as regularidades subjacentes à imensa variedade das narrativas; procurava apreender, em meio à diversidade imensa de modos de manifestação da narrativa (oral, escrita, gestual, pictórica, etc.), de tipos de narrativa (mitos, contos, romances, epopéias, tragédias, comédias, fábulas, etc.) e de realizações concretas, as invariantes narrativas. Separa dessa forma uma langue narrativa de uma parole narrativa. Como os fonólogos que distinguiram os fonemas, unidades da língua, dos sons, unidades da parole, diferencia as estruturas abstratas e invariantes dos seus revestimentos concretos, responsáveis pela "singularidade" de cada narração tomada individualmente (ver Barthes, 1971:18-19). Para Propp, por exemplo, o doador do objeto mágico é uma unidade dessa langue narrativa, enquanto o peixe que dá uma escama ao herói é uma unidade de sua parole. Para Greimas, a mesma coisa se passa em relação à aquisição do poder fazer e ao juntar dinheiro para comprar um apartamento. Em síntese, ambos buscam identificar um número finito de unidades diferenciais e de regras combinatórias responsáveis pelo engendramento das relações internas. Seu objetivo era, pois, definir a estrutura da narrativa: o conjunto fechado de relações internas que se estabelecem entre um número finito de unidades. Esse procedimento procurou transpor para além dos limites da frase, que era até então a unidade última para os lingüistas, os métodos da lingüística estrutural (Barthes, 1971:21-22).

Por outro lado, a idéia do percurso gerativo de sentido parte da constatação de que é preciso explicar o fato de que o discurso é da ordem da estrutura e do acontecimento. Assim, é necessário detectar invariantes, mas também descrever a variabilidade histórica que reveste essas invariantes. O modelo não é genético, mas gerativo, ou seja, busca ser preditivo e explicativo.

O projeto semiótico filia-se à tradição saussuriana. De um lado, tem por objeto não o significado, mas a significação, isto é, um conjunto de relações responsáveis pelo sentido do texto. Postula que o sentido não é algo isolado, mas surge da relação. Só há sentido na e pela diferença. Assim, os efeitos de sentido percebidos pelo falante pressupõem um sistema estruturado de relações. Por conseguinte, a Semiótica não visa propriamente ao sentido, mas a sua arquitetura, não tem por objetivo estudar o conteúdo, mas a forma do conteúdo. Em termos mais simples, poder-se-ia dizer que a Semiótica deseja menos estudar o que o texto diz ou por que diz o que diz e mais como o texto diz o que diz. De outro lado, procura realizar o projeto saussuriano, que preconiza que a Lingüística seria parte de uma ciência mais geral, a Semiologia, que, segundo o lingüista genebrino, estudaria os diferentes sistemas de signos e as leis que os regem (1969: 24). A Semiótica demarca-se da Semiologia e, por isso, assume outro nome, porque, ao incorporar o conceito saussuriano de valor, torna-se uma teoria da significação, que tem por escopo descrever a produção e a compreensão do sentido, e não uma teoria do signo. Enquanto a Semiologia buscava descrever sistemas de signo, como, por exemplo, o sistema de signos da heráldica (Mounin, 1970:103-115), a Semiótica visa a compreender o sistema de diferenças responsáveis pela produção de sentido de um texto.

Na Semântica estrutural, estava a idéia de que o discurso comporta níveis de invariância, mas não estava ainda constituído o percurso gerativo, tal como o concebe a Semiótica hoje. Analisemo-lo rapidamente.

O percurso gerativo é constituído de três patamares: as estruturas fundamentais, as estruturas narrativas e as estruturas discursivas. Vale relembrar que estamos no domínio do conteúdo. As estruturas discursivas serão manifestadas como texto, quando se unirem a um plano de expressão no nível da manifestação. Cada um dos níveis do percurso tem uma sintaxe e uma semântica.

Na Gramática, a sintaxe opõe-se à morfologia. Esta ocupa-se da formação das palavras e da expressão das categorias gramaticais por morfemas; aquela, da combinação de palavras, para formar orações, e de orações, para constituir períodos. Na Semiótica, a sintaxe contrapõe-se à semântica. Aquela é o conjunto de mecanismos que ordena os conteúdos; esta, os conteúdos investidos nos arranjos sintáticos. Observe-se, no entanto, que não se trata de uma sintaxe puramente formal, ou seja, não se opõem sintaxe e semântica como o que não é dotado de significado e o que tem significado. Um arranjo sintático é dotado de sentido. Por conseguinte, a distinção entre esses dois componentes reside no fato de que a semântica tem uma autonomia maior do que a sintaxe, o que significa que se podem investir diferentes conteúdos semânticos na mesma estrutura sintática.

Analisemos agora cada um dos patamares do percurso gerativo de sentido. O nível fundamental compreende a(s) categoria(s) semântica(s) que ordena(m), de maneira mais geral, os diferentes conteúdos do texto. Uma categoria semântica é uma oposição tal que a vs b. Podem-se investir nessa relação oposições como vida vs morte, natureza vs cultura, etc. Negando-se cada um dos termos da oposição, teremos não a vs não b. Os termos a vs b mantêm entre si uma relação de contrariedade. A mesma coisa ocorre com os termos não a vs não b. Entre a e não a e b e não b há uma relação de contraditoriedade. Ademais, não a mantém com b, assim como não b com a, uma relação de implicação. Os termos que mantêm entre si uma relação de contrariedade podem manifestar-se unidos. Teremos um termo complexo, quando houver uma unidade a + b; e um termo neutro, quando se estabelecer a união de não a com não b. Esse conjunto de relações é muito importante, para analisar a especificidade de alguns textos, cuja sintaxe fundamental se caracteriza pela presença de termos complexos ou neutros. É o caso, por exemplo, do mito. Mircea Eliade (270: 242) dizia que ele é a coincidentia oppositorum. Ora, se analisarmos seus mecanismos de estruturação do sentido, veremos que ele se define por operar com termos que unem opostos, ou seja, com termos que englobam elementos semânticos contrários. O mito grego do andrógino, por exemplo, conta que esse ser reunia a masculinidade e a feminilidade. No âmbito da mitologia cristã, Cristo junta a divindade e a humanidade; os anjos englobam a não humanidade e a não divindade; a Virgem Maria articula a maternidade e a virgindade.

Essa categoria semântica do nível fundamental é, então, o elemento mais simples e abstrato de ordenamento dos múltiplos conteúdos do texto. O discurso ecologista articula-se em torno da oposição semântica /civilização/ vs /natureza/. Estabelecer a categoria semântica de base não é, porém, o objetivo último da análise. É apenas apreender a articulação mais geral do texto. Para compreender, no entanto, toda a sua complexidade é preciso ir remontando aos níveis mais concretos e complexos do percurso.

Ainda no nível fundamental, os elementos em oposição transformam-se em valores. Isso é feito sobremodalizando-os com um traço de positividade ou negatividade, ou em termos mais precisos, com os traços /euforia/ e /disforia/. Dois textos podem, por exemplo, trabalhar com a mesma categoria semântica, mas axiologizá-la diferentemente e isso vai produzir discursos completamente distintos. Poderíamos, por exemplo, dizer que o discurso dos ecologistas sobre a Amazônia e o dos madeireiros sobre a mesma questão operam com a mesma categoria semântica /civilização/ vs /natureza/. Entretanto, enquanto aqueles consideram o primeiro termo da oposição negativo e o segundo positivo, estes fazem exatamente o contrário. O romance A cidade e as serras, de Eça de Queirós, constrói-se sobre a categoria /civilização/ vs /natureza/, contrapondo uma à outra. Na primeira parte, a civilização tem valor positivo e a natureza, valor negativo. Na segunda parte, a axiologia se inverte.

a) Toda a intelectualidade nos campos se esteriliza, e só resta a bestialidade. Nesses reinos crassos do vegetal e do animal duas únicas funções se mantêm vivas, a nutritiva e a procriadora. Isolada, sem ocupação, entre focinhos e raízes que não cessam de sugar e de pastar, sufocando no cálido bafo da universal fecundação, a sua pobre alma toda se engelhava, se reduzia a uma migalha de alma, a uma fagulhazinha espiritual a tremeluzir, como morta, sobre um naco de matéria; e nessa matéria dois instintos surdiam, imperiosos e pungentes, o de devorar e o de gerar. Ao cabo de uma semana rural, de todo o seu ser tão nobremente composto só restava um estômago e por baixo um falo! A alma? Sumida sob a besta. E necessitava correr, reentrar na cidade, mergulhar nas águas lustrais da civilização, para nelas largar a crosta vegetativa, e ressurgir reumanizado, de novo espiritual e jacíntico! (p. 379-380)

b) Mas eu, ávido pela história daquela ressurreição:

- Então não estiveste em Lisboa?... Eu telegrafei...

Qual telégrafo! Qual Lisboa! Estive lá em cima, ao pé da fonte da Lira, à sombra duma grande árvore, sub tegmine não sei quê, a ler esse adorável Virgílio... E também a arranjar o meu palácio! Que te parece, Zé Fernandes? Em três semanas, tudo soalhado, envidraçado, caiado, encadeirado!... (p. 474)

Passemos agora ao segundo patamar: as estruturas narrativas. Uma narrativa mínima define-se como uma transformação de estado. Este organiza-se da seguinte forma: um sujeito está em relação de conjunção ou de disjunção com um objeto. Temos, pois, dois tipos de estado: um disjunto e um conjunto. Quando dizemos Pedro é rico, temos um sujeito Pedro em relação de conjunção com um objeto riqueza. Quando afirmamos Pedro não é rico, temos um sujeito Pedro em relação de disjunção com um objeto riqueza. A transformação é, por conseguinte, a mudança da relação entre sujeito e objeto. Se há dois tipos de objetos, as transformações possíveis serão também duas: de um estado inicial conjunto para um estado final disjunto e de um estado inicial disjunto para um estado final conjunto. Assim, o pequeno texto Um faxineiro de São Paulo ganhou um milhão de dólares na Sena é uma narrativa, porque contém uma transformação de um estado inicial disjunto, em que o sujeito faxineiro estava em disjunção com a riqueza, para um estado final em que o mesmo sujeito está em conjunção com o objeto.

As transformações narrativas articulam-se numa seqüência canônica, assim chamada, porque, de um lado, revela a dimensão sintagmática da narrativa e, de outro, mostra as fases obrigatoriamente presentes no simulacro da ação do homem no mundo, que é a narrativa. A primeira fase é a manipulação. Nela, um sujeito transmite a outro um querer e/ou um dever. Essa fase pode ser concretizada como um pedido, uma súplica, uma ordem, etc. Temos, por exemplo, uma manipulação por provocação, quando o manipulador diz ao manipulado que ele é incapaz de realizar uma ação, esperando que, como reação, ele a execute com vistas a provar que é perfeitamente capaz de fazê-la. A segunda fase é a da competência. Nela, um sujeito atribui a outro um saber e um poder fazer. Quando, num conto maravilhoso, uma fada dá a um príncipe um objeto mágico, que lhe permitirá realizar uma ação extraordinária, está dando-lhe um poder fazer, figurativizado pelo referido objeto mágico. A terceira fase é a perfórmance. Nela, ocorre a transformação principal da narrativa. Num conto de fadas em que a princesa foi raptada pelo dragão, a perfórmance será a libertação da princesa. A última fase é a da sanção. Temos dois tipos de sanções, a cognitiva e a pragmática. Aquela é o reconhecimento por um sujeito de que a perfórmance de fato ocorreu. Em muitos textos, essa fase é muito importante, porque é nela que as mentiras são desmascaradas, os segredos são desvelados, etc. A sanção pragmática pode ou não ocorrer. Pode ser um prêmio ou um castigo. Na chamada narrativa conservadora, porque tem a finalidade de reiterar os valores colocados na fase da manipulação, os bons são premiados e os maus castigados. Já numa novela como Justine, de Sade, cada vez que a personagem age segundo os ditames da moral cristã, recebe um castigo.

Essas fases mantêm entre si uma relação de implicação recíproca. Com efeito, se se reconhece que algo foi realizado, é porque efetivamente o foi ou, ao menos, parece ter sido. Para que um sujeito possa executar uma ação, é preciso que ele saiba e possa fazê-lo, isto é, seja competente para isso, e, ao mesmo tempo, queira e/ou deva fazê-lo.

A seqüência canônica não é uma fôrma onde se faz caber a narrativa. Ao contrário, inúmeras possibilidades devem ser levadas em conta, para permitir desvelar a forma específica que a narratividade assume num texto particular. Em primeiro lugar, é preciso notar que certas fases podem ser pressupostas. Se tomarmos o pequeno texto mencionado acima que relata que um faxineiro ganhou um milhão de dólares na Sena, veremos que estamos apenas narrando a perfórmance. No entanto, há uma fase de competência pressuposta: só pode ganhar quem tem um bilhete, que é, por conseguinte, um poder ganhar. Em segundo lugar, é necessário destacar que certos textos dão mais ênfase a uma fase que a outras. Por exemplo, o programa Aqui e agora e uma novela policial do tipo inglês narram crimes. No entanto, a diferença da abordagem dos dois textos reside no fato de que aquele acentua a perfórmance (como agiu o assassino, qual foi seu procedimento para matar a vítima, etc.), enquanto este evidencia a sanção (a descoberta da identidade do assassino pelo detetive). Em terceiro, cabe lembrar que uma narrativa complexa é constituída de inúmeras seqüências que se articulam por parataxe ou por hipotaxe, ou seja, uma pode-se colocar ao lado de outra ou estar subordinada a outra. Há uma relação hipotática entre as seqüências, por exemplo, na história da menina da bilha de leite. Há uma relação paratática, por exemplo, em contos maravilhosos em que o herói deve realizar inúmeras provas iniciáticas. Dizer que a narratologia formulada pela Semiótica é uma "camisa de força" ou que não se aplica a textos mais complexos é desconhecer os princípios dessa teoria narrativa.

Não é possível no espaço deste texto explicar toda a teoria narratológica que foi desenvolvida, a partir das formulações de Propp e de Lévi-Strauss, pela Semiótica francesa. O que importa é que se entendam os diferentes níveis de invariância do percurso gerativo de sentido. Há, porém, alguns elementos da semântica narrativa que devem ser destacados, depois de termos percorrido, de maneira muito sucinta, alguns aspectos da sintaxe narrativa.

Há dois tipos de objetos buscados pelos sujeitos: os objetos modais (o querer, o dever, o poder e o saber) e os objetos de valor. Os primeiros são os objetos necessários para a obtenção dos segundos, que são o objetivo último da ação narrativa. Assim, são objetos de valor a riqueza nas histórias do Tio Patinhas, a notoriedade nas ações de Lílian Ramos1 1 Lembramos ainda uma vez que as narrativas são simulacros das ações do homem no mundo. , o prazer nos 120 dias de Sodoma, de Sade. É exatamente nos conteúdos investidos nos objetos que se dá a articulação entre o nível fundamental e o nível narrativo. Os conteúdos do nível fundamental são concretizados nos objetos do nível narrativo. Quando se narra a história da compra de um apartamento, o dinheiro que se juntou não constitui um objeto valor, mas um objeto modal, porque ele é o poder comprar.

É preciso responder agora a uma dúvida, que deve estar presente na cabeça do leitor desde o momento em que leu que o percurso gerativo de sentido comporta um nível narrativo. Mas então todos os textos têm um nível narrativo? Para a Semiótica, sim. É claro que é preciso entender a narratividade como qualquer transformação de estado. Implícita ou explicitamente, todos os textos trabalham com transformações. Tomemos um que a teoria tradicional dos gêneros não poderia considerar, de maneira nenhuma, narrativo: um teorema. Esse texto articula-se em três partes: o enunciado do teorema, a demonstração e a afirmação de que a demonstração se fez (q.e.d., quod erat demonstrandum). Quando se faz a afirmação final, o que se está dizendo é que, no texto, se passou de um estado de não demonstrado para um de demonstrado. Teremos uma descrição, quando a transformação narrativa ficar implícita, ou seja, quando se trabalhar apenas com o estado inicial ou o estado final. Por isso, é que se diz que, na maioria dos casos, não temos descrições puras: em geral, elas servem para iniciar um texto, que, em seguida, será mudado em narração. Teremos a narração, quando se enfocar a transformação propriamente dita. Assim, uma descrição passa a narração, quando se explicita a transformação que está implícita na descrição.

Passemos agora para o terceiro nível, o discursivo. Esse patamar é aquele em que se revestem as estruturas narrativas abstratas. Suponhamos que tivéssemos a seguinte estrutura narrativa Um sujeito A, que estava em conjunção com o objeto vida, entra em disjunção com ele. Essa estrutura poderia ser concretizada como assassinato, se o sujeito operador da disjunção for concretizado como um ser humano diferente de A; como suicídio, se o sujeito operador da disjunção e A forem concretizados como a mesma personagem; como morte por acidente, se o sujeito operador for concretizado como um desastre ou uma catástrofe natural, etc. Esse é um primeiro nível de concretização. Depois, essa concretização primeira é suscetível de uma nova concretização. O assassinato pode ser concretizado como um tiro dado por ladrões durante um roubo ou como espancamento realizado por policiais numa Delegacia. Temos, então, dois níveis de concretização das estruturas narrativas: a tematização e a figurativização. Se a concretização parar no primeiro nível, teremos textos temáticos; se vier até o segundo, teremos textos figurativos. Os primeiros são compostos predominantemente de temas, isto é, de termos abstratos2 2 A tradição escolar ensina que concreto/abstrato é uma categoria classificatória que se aplica aos substantivos. Na verdade, ela refere-se a todos os lexemas, pois abstrato é o termo que não remete a algo considerado existente no mundo natural, mas a uma categoria explicativa dos existentes, enquanto concreto é o termo que se refere a elementos existentes no mundo natural. É preciso entender bem o que significa mundo natural neste contexto, não é aquele mundo que os sentidos dão por natural, mas são os mundos que o discurso dá como existentes. Então, fada é concreto, porque é considerado um ser existente no mundo natural criado pelo universo discursivo do conto maravilhoso. Já orgulho é uma categoria explicativa de uma série de atitudes concretas tomadas por seres efetivamente existentes em mundos naturais criados por universos de discurso. Da mesma forma, branco é um adjetivo concreto, enquanto terno é abstrato. ; os segundos, preponderantemente de figuras, ou seja, de termos concretos. Cada um desses tipos de texto tem uma função diferente: os temáticos explicam o mundo; os figurativos criam simulacros do mundo. Por exemplo, uma tese que discutisse a situação de penúria e as péssimas condições de trabalho dos operários franceses nas minas de carvão no século XIX, a questão da produção da mais valia e as lutas para melhorar essas condições de vida seria um texto temático; já o Germinal, de Zola, que trata desses mesmos assuntos, é um texto figurativo, pois faz uma representação de tudo isso. A dissertação é temática, enquanto a descrição e a narração são figurativas. Compreender um texto figurativo é, antes de mais nada, entender o componente temático que subjaz às figuras.

O percurso gerativo é composto de níveis de invariância crescente, porque um patamar pode ser concretizado pelo patamar imediatamente superior de diferentes maneiras, isto é, o patamar superior é uma variável em relação ao imediatamente inferior, que é uma invariante. A mesma estrutura narrativa, Um sujeito que entra em disjunção com o objeto vida, pode ser tematizada como assassinato, suicídio, morte por acidente, etc. O mesmo tema pode ser figurativizado de diferentes maneiras. Assim, o tema da evasão pode ser figuratizado pela ida para um mundo imaginário, como a Pasárgada de Manuel Bandeira, ou por uma viagem pelos mares do sul. As fotonovelas e as telenovelas trabalham quase sempre com a mesma estrutura narrativa e geralmente com os mesmos temas (ascensão social, realização afetiva, etc.) figurativizados de maneira diferente.

Entra aqui a questão das diferentes leituras de um texto. A Semiótica denomina isotopia a recorrência de traços semânticos que determinam um dado plano de leitura. Um texto pode ter várias isotopias e, por conseguinte, vários planos de leitura. Um texto como O ferrageiro de Carmona, de J. Cabral, pode ter uma leitura relativa ao trabalho com o ferro e uma concernente ao trabalho com a linguagem. Essa segunda leitura transforma o poema num metapoema. Isso significa que, para a Semiótica, um texto pode ter várias leituras, mas elas já estão inscritas nele. Não resultam da subjetividade do leitor, mas de organizações semânticas que se entrecruzam e se superpõem no texto.

A sintaxe do discurso compreende as projeções da enunciação no enunciado e os procedimentos que o enunciador utiliza para persuadir o enunciatário a aceitar o seu discurso. Aquelas abarcam a temporalização, a espacialização e a actorialização. Sendo a enunciação, como mostrava Benveniste, a instância do ego-hic-nunc, o processo de discursivização não existe sem a instauração de pessoas, espaços e tempos. Todas as pessoas, espaços e tempos instalados no enunciado estão de alguma forma relacionados ao eu-aqui-agora da enunciação. Além disso, há um componente aspectual, que projeta no discurso pontos de vista de um observador sobre as categorias enunciativas.3 3 Observe-se que a Semiótica trabalha com uma concepção ampliada de aspecto. Tradicionalmente, o aspecto era considerado um ponto de vista que sobredeterminava o tempo, indicando se o processo que se desenrolava no tempo era pontual ou durativo; em sendo durativo, se era contínuo ou descontínuo (iterativo), etc. Ora, numa perspectiva enunciativa, o aspecto é um ponto de vista que incide sobre cada uma das categorias da enunciação, a saber, o tempo, o espaço e a pessoa. O que importa é determinar os efeitos de sentido gerados pelas diferentes projeções da enunciação no enunciado. Por exemplo, é preciso analisar qual é o efeito de sentido criado pela ausência do eu no discurso narrativo, quando, então, como acontecia no naturalismo, os fatos parece narrarem-se por si mesmos. Por outro lado, ao recusar o ponto de vista da Teoria da Informação de que a comunicação é uma transmissão de "novidades" entre dois pólos neutros, a Semiótica considera que um componente determinante do processo comunicacional é o fazer crer. Por isso, o componente argumentativo adquire um relevo muito grande na teoria. Argumentação é qualquer mecanismo pelo qual o enunciador busca persuadir o enunciatário a aceitar seu discurso, a acolher o simulacro de si mesmo que cria no ato de comunicação.

Como foi dito acima, desde a obra inaugural da Semiótica francesa, estava presente a idéia de que o discurso tem invariantes, que se realizam de maneira variável. Assim, a mesma estrutura fundamental pode ser narrativizada de várias maneiras; as mesmas estruturas narrativas podem ser discursivizadas de modos variáveis; o mesmo tema pode ser figurativizado diferentemente. Portanto, a idéia do percurso gerativo de sentido já se achava embrionariamente esboçada na Semântica estrutural. No entanto, esse arcabouço hoje conhecido por percurso narrativo foi se esboçando ao longo do tempo, para dar conta, como já se disse, do aspecto variante e invariante do discurso. Ele não é uma camisa de força, em que se devem enfiar todos os textos, mas um modelo de análise e de previsibilidade, que, ao mesmo tempo, expõe generalizações sócio-históricas (invariantes) e especificidades de cada texto (variantes).

Mantida a concepção do percurso gerativo, é preciso dizer que, por razões históricas, o nível narrativo foi o mais bem explorado até hoje, o que não significa, porém, que os outros níveis não tenham tido desenvolvimento. Na primeira fase, a da constituição do percurso gerativo, a Semiótica aplica-se a estudar os simulacros da ação do homem no mundo presentes nas narrativas. Elabora assim uma teoria da perfórmance. A narratividade é entendida como "uma transformação de estado, operada pelo fazer transformador de um sujeito que age sobre o mundo em busca de determinados valores investidos no objeto" (Barros, 1995:85). Analisa os conflitos entre sujeitos que buscam o mesmo objeto. Para desenvolver essa teoria da ação, transformou a noção proppiana de função na noção de enunciado narrativo (Barros, 1995:82-85). O conceito de função em Propp diz respeito a unidades sintagmáticas constantes sob a multiforme superfície das narrativas. A sucessão dessas invariantes constitui o relato. Essa noção foi precisada com o conceito de enunciado narrativo. Para a Semiótica, como já se mostrou, há dois tipos de enunciados elementares, o de estado e o de fazer, que derivam da existência de duas relações-função: a junção (conjunção e disjunção) entre um sujeito e um objeto e a transformação, que é a mudança de uma relação de junção. Dessa noção de enunciado narrativo decorre o fato de que é possível prever organizações hierarquizadas de enunciados. Estes organizam-se em programas narrativos (um enunciado de fazer regendo um enunciado de estado), em percursos narrativos (encadeamentos lógicos de programas narrativos em que um programa pressupõe outro) e em seqüências narrativas (em que se organizam os percursos narrativos). Com isso, constrói-se uma sintaxe narrativa hierarquicamente organizada e não uma simples sucessão de unidades sintagmáticas, como previa o modelo proppiano. Nessa sintaxe, vai-se do programa ao percurso e deste à seqüência, estabelecendo um modelo de previsibilidade da narrativa, que pode dar conta da especificidade de cada relato singular, dado que esses níveis são empregados recursivamente e que têm um desdobramento polêmico. De um lado, programas, percursos e seqüências podem ser repetidos indefinidamente, encaixando-se, sucedendo-se, etc.; de outro, toda narrativa tem uma dimensão polêmica (cf. Barros, 1995:83): a um sujeito corresponde um anti-sujeito; a uma apropriação, um desapossamento. Isso quer dizer que um relato pode ser feito de dois pontos de vista: um roubo pode ser contado do ponto de vista do ladrão ou da vítima; a história da Gata Borralheira pode ser relatada do ponto de vista da órfã submetida a duros trabalhos e da madrasta e suas filhas, do príncipe que procurava uma esposa e da moça que perdeu o sapatinho. Essa sintaxe vai do mais simples ao mais complexo.

Apesar do salto dado pela teoria narrativa proposta pela Semiótica, esse modelo apresenta uma limitação muito grande. Seu âmbito de aplicação são as narrativas da chamada pequena literatura (Barros, 1995:85). Com efeito, um modelo que considera a narrativa como a busca de valores, como ação do homem no mundo, só pode aplicar-se àqueles textos que apresentem um componente pragmático muito forte: por exemplo, as narrativas folclóricas.

Ao compreender a limitação dada pelo alcance das aplicações, a Semiótica vai passar para uma segunda fase, em que vai interessar-se pela competência modal do sujeito que realiza a transformação. Nessa fase, as investigações incidem menos sobre a ação e mais sobre a manipulação (Barros, 1995:85-88).

Parte-se da constatação de que só pode executar uma ação quem possuir pré-requisitos para isso, ou seja, de que o fazer exige condições prévias. Só pode realizar uma ação o sujeito que quer e/ou deve, sabe e pode fazer. É isso que se chama competência modal do sujeito. A modalização do fazer é a sobredeterminação de um predicado do fazer por outro predicado (querer/dever/saber/poder). Ao reconhecer isso, a Semiótica começa a realizar uma tipologia muito mais fina dos sujeitos. Pode haver sujeitos coagidos, que devem, mas não querem realizar uma ação; sujeitos que afrontam o sistema (heróis que agem sozinhos), que querem, mas não devem; sujeitos impotentes, que querem e/ou devem, mas não podem e assim por diante. Com a modalização do sujeito, a Semiótica passa a analisar também seu modo de existência: sujeitos virtuais, os que querem e/ou devem fazer, sujeitos atualizados, os que sabem e podem fazer; sujeitos realizados, os que fazem. Uma gama muito grande de textos passa agora a ser explicada pela teoria: aqueles em que há personagens sonhadoras, mas que são incapazes de passar à ação; aqueles em que há personagens realizadoras, etc.

Nessa fase, o estudo das modalizações está ainda muito ligado à ação, pois o que se investiga são as condições necessárias para sua realização. No entanto, isso representou um salto muito grande, pois, se se pensar não apenas no sujeito que tem sua competência modal alterada, mas naquele que realiza essa alteração, passa-se do estudo da ação ao da manipulação, ou seja, do fazer ao do fazer fazer. Agora, não se procura mais apenas explicar as relações entre sujeito e objeto, mas entre sujeitos, o que leva a uma concepção de narrativa como uma sucessão de estabelecimentos e rupturas de contratos (Barros, 1995:86). Aqui começa todo um exame dos procedimentos de manipulação. Estudam-se a provocação, o desafio, a tentação, a sedução, a intimidação, etc. Por outro lado, começa-se a aprofundar o estudo dos mecanismos da sanção, seja ela cognitiva ou pragmática. O percursos da manipulação e da sanção constituem a dimensão cognitiva da narrativa e enquadram sua dimensão pragmática.

Com o estudo da dimensão cognitiva, a Semiótica mostra que a organização da intersubjetividade é articulada por meio de estruturas polêmicas e contratuais. Por exemplo, enquanto a teoria marxista vê a História como uma estrutura polêmica (lembremo-nos de que o Manifesto comunista se inicia afirmando que a história da humanidade é a história da luta de classes), a concepção liberal enfatiza os aspectos contratuais da constituição do Estado. Além do exame dessas estruturas, o estudo da manipulação abre caminho para o estudo de sujeitos manipulados por sistemas de valores diferentes. Por exemplo, na tragédia clássica, o herói trágico sofre uma manipulação por valores contraditórios. Antígona deve optar entre a lei divina, que determinava que os mortos fossem sepultados, e a lei do Estado, que instituía que quem morresse, lutando contra a cidade, deveria permanecer insepulto.

Apesar de o campo de textos abrangido por essa teoria narrativa ter aumentado, possuía ela ainda um problema em relação ao domínio de aplicação. A teoria narrativa explicava o que se poderiam chamar estados de coisas, mas não o que se denominariam estados de alma. Até este ponto de seu desenvolvimento, a teoria trabalha com textos em que há transferência de objetos tesaurizáveis ou com textos em que há estruturas diversas de manipulação e de sanção. No entanto, há narrativas que operam com outros tipos de objetos. Dom Casmurro, de Machado de Assis, não é um romance sobre a traição, mas sobre o estatuto veridictório dos fatos, sobre certezas e incertezas, sobre a criação do objeto e a atribuição subjetiva a ele de um valor de verdade; Gobseck, de Balzac, trata da avareza e dos prazeres proporcionados pela posse da riqueza; Otelo, de Shakespeare, aborda o ciúme e a manipulação dos estados de alma de outrem; Il Gattopardo, de Tommaso di Lampedusa, discute a recusa e a aceitação da mudança; o episódio do ferimento do príncipe Andrei, em Guerra e Paz, de Tolstoi, delineia o sutil problema da vergonha do medo e do medo da vergonha; o filme Salò, os 120 dias de Sodoma, de Pasolini, mostra como a exacerbação do medo faz ruírem as normas da vergonha. Poder-se-ia continuar a citar textos em que se trata de estados de alma, em que se discute o valor veridictório do objeto. Como operar com as "paixões de papel", os estados de alma narrados?

Para tratar dessa questão, a Semiótica passa por mais duas fases. A primeira examina as modalizações do ser (Barros, 1995:88-91). Foi mostrado acima que, para a Semiótica, existem dois tipos de enunciados elementares: o de estado e o de fazer. O exame das modalidades do fazer levou ao estudo das condições modais necessárias para a realização da ação. No entanto, é preciso verificar que o sujeito de estado (um enunciado de estado estabelece uma relação de conjunção ou de disjunção com um objeto) pode ser também modalizado. Não se tem, nesse caso, modalizações do fazer (querer fazer, dever fazer, saber fazer, poder fazer), mas modalizações do ser (querer ser, dever ser, saber ser e poder ser). O sujeito de estado, por exemplo, quer entrar em conjunção com um dado objeto. Nesse caso, o objeto é desejável para o sujeito, enquanto ele é um sujeito desejante. Por isso, poder-se-ia afirmar, com mais propriedade, que a modalização do estado incide sobre o objeto, ou mais particularmente, sobre o valor nele investido e que isso repercute sobre a existência modal do sujeito. É o objeto desejável que faz o sujeito desejante; é o objeto impossível que faz o sujeito impotente e assim por diante.

A categoria euforia/disforia do nível fundamental converte-se em traços modais que modificam as relações entre sujeito e objeto. Assim, um valor marcado euforicamente no nível fundamental converte-se, por exemplo, em objeto desejável no nível narrativo, enquanto um valor disfórico torna-se, por exemplo, um objeto temido no nível narrativo.

Por outro lado, há um outro tipo de modalização do ser, que se diferencia, pelo lugar em que incide, daquela até agora exposta. Enquanto, no caso acima, a modalização recai sobre o objeto, neste caso, que passamos a expor, a modalização incide sobre a relação de conjunção ou de disjunção que liga sujeito e objeto. Trata-se de modalidades veridictórias e epistêmicas. As veridictórias articulam-se como estrutura modal em ser vs parecer e aplicam-se à função-junção. Mostra-se que um enunciado é ou parece ser. No entanto, essa modalização não diz respeito a nenhuma relação referencial, mas a algo criado pelo texto. Ser é o estatuto veridictório exposto pela própria narrativa ou, em outros termos, pelo narrador; parecer é o estatuto veridictório atribuído a um estado por uma personagem. Seixas, personagem de Senhora, de Alencar, é visto como um homem rico (parece ser rico), mas o narrador mostra ao leitor que ele é o filho de uma modesta costureira (ser). Temos, então, uma mentira: ele não é rico, mas parece sê-lo. As modalidades veridictórias permitem estabelecer o estatuto veridictório dos estados: verdade, falsidade, mentira, segredo. Os enunciados modalizados veridictoriamente podem ser sobredeterminados pelas modalidades epistêmicas do crer: um sujeito crê que um estado parece verdadeiro ou é verdadeiro, etc. A modalização epistêmica resulta de uma interpretação, em que um sujeito atribui um estatuto veridictório a um dado enunciado. Nela, o sujeito compara o que lhe foi apresentado pelo manipulador com aquilo que sabe ou aquilo em que crê. O estatuto veridictório de um enunciado é dado por um julgamento epistêmico, em que o crer precede o saber, o que implica reconhecer o caráter ideológico da operação de interpretação. Para a Semiótica, crer e saber pertencem ao mesmo universo cognitivo e a distinção entre a adesão fiduciária, regida pelo crer, e a adesão lógica, comandada pelo saber, é o estabelecimento de uma separação entre dois tipos de racionalidade, que, na interpretação, quando aparecem situações, como em Dom Casmurro, de Machado de Assis, de verdade ou falsidade das certezas, de dúvida da verdade, etc., confundem-se, misturam-se, entrecruzam-se (Greimas, 1983:115-133).

O estudo da modalização do ser permite estabelecer tipologias de culturas (por exemplo, há culturas que valorizam mais o querer do que o dever e outras que fazem o contrário), dar representações mais adequadas da aplicação dos códigos sociais de caráter normativo, como regras gramaticais, regras de polidez, etc. (nelas, combinam-se dever e saber: o excesso de zelo no código de polidez aproxima-se da hipercorreção em gramática, quando a um dever fazer não corresponde um saber fazer, mas um não saber fazer) (Greimas, 1983:88-90).

Todo esse estudo das modalizações do ser passa ainda pelo exame das compatibilidades e incompatibilidades entre as modalidades. Por exemplo, o dever ser é compatível com o poder-ser, ao passo que é incompatível com o não poder ser. Com efeito, o que é necessário deve ser compatível com o que é possível, mas não com o impossível. No entanto, cabe lembrar que as compatibilidades e as incompatibilidades nada têm a ver com o aparecimento de certas combinatórias modais nos textos. Os sujeitos de estado podem ser modalizados por modalidades compatíveis ou incompatíveis entre si. Um sujeito pode querer o que pode ser, mas pode querer o que não pode ser. A percepção dessas compatibilidades e incompatibilidades abre caminho para o estudo das paixões.

Chega-se, então, à quarta fase da Semiótica. A paixão é entendida, inicialmente, pela Semiótica como efeitos de sentido de qualificações modais que alteram o sujeito de estado, o que significa que é vista como um arranjo das modalidades do ser, sejam elas compatíveis ou incompatíveis. Por exemplo, a obstinação define-se como um querer ser aliado a um não poder ser, enquanto a docilidade reúne um querer ser a um poder ser. O obstinado é aquele que quer, apesar da impossibilidade evidente, enquanto o dócil limita-se a desejar o que é possível.

A história modal do sujeito de estado (transformações modais que vai sofrendo) permite estudar outros tipos de textos narrativos, aqueles fundados sobre um processo de construção ou de transformação do ser do sujeito e não apenas do seu fazer. Os efeitos de sentido passionais derivam de arranjos provisórios de modalidades, de intersecções e combinações entre modalidades diferentes. Por exemplo, a vergonha define-se pela combinação do querer ser, não poder não ser e saber não ser. Os arranjos modais que têm um efeito de sentido passional são determinados pela cultura.

A noção de paixão como arranjo de modalidades permite estabelecer uma diferença entre o atualizado (apreensão de um predicado do ponto de vista das condições de realização) e o realizado. A distinção entre querer morrer e morrer reside no fato de que, no primeiro, uma série de roteiros é possível, enquanto no segundo, não. A diferença entre o atualizado e o realizado permite, pois, estabelecer potencializações, o que possibilita analisar fatos que parece contrariarem a lógica narrativa (cf. Fontanille, 1995:175-190). São exemplos disso o apego que perdura após a morte do ser amado, objeto de fina análise em Memorial de Aires, de Machado de Assis; o ciúme, sentimento indiferente ao fato de o outro ser fiel ou não.

A título de exemplo das possibilidades a que chegou a Semiótica com o estudo das paixões, vamos analisar, de maneira ainda pouco formalizada, para que o entendimento seja maior, alguns percursos patêmicos do conto Noite de almirante, de Machado de Assis (1979:v. II:446-451). O conto é bastante complexo do ponto de vista dos estados de alma nele desenvolvidos, porque entrelaça modalidades que incidem sobre o objeto com modalidades veridictórias e mostra que os sujeitos têm existência modal diferente.

O marinheiro Deolindo, ao voltar de uma longa viagem de instrução, "levava um grande ar de felicidade aos olhos", porque uma grande "noite de almirante" o esperava em terra. Três meses antes de começar a viagem, conhecera Genoveva, ambos apaixonaram-se perdidamente e ele partira em viagem, depois de um "juramento de fidelidade" recíproca. Há aqui uma situação de espera fiduciária. Deolindo quer estar em conjunção com a fidelidade e crê que Genoveva deve, por força do contrato, realizar a conjunção desejada. A espera não é tensa, pois o sujeito não apresenta o efeito patêmico da aflição. Ao contrário é relaxada, pois Deolindo está feliz. A felicidade é um efeito de satisfação produzido pelo saber poder ser (possível) a conjunção desejada. Ao mesmo tempo, essa paixão indica que Deolindo tinha confiança (crer ser) em que Genoveva cumpriria o contrato.

O narrador modaliza o ato de celebração do contrato como verdadeiro. "Não havia descrer da sinceridade de ambos: ela chorava doidamente, ele mordia o beiço para dissimular".

Quando Deolindo, depois de descer a terra, chega à casa em que morava Genoveva, "a velha Inácia" diz-lhe que ela estava com outro, residindo na Praia Formosa. Altera-se, então, a existência modal de Deolindo. Agora, sabe que Genoveva não cumpriu o contrato, mantendo a fidelidade. O sujeito crédulo e confiante passa a ser um sujeito insatisfeito e decepcionado. Aparece o sentimento de falta. Adquire, então, uma outra competência modal: querer fazer o mal. Assim, começa o percurso da reparação da falta: o da vingança. "As idéias marinhavam-lhe no cérebro, como em hora de temporal, no meio da confusão de ventos e apitos. Entre elas, rutilou a faca de bordo, ensangüentada e vingadora".

Quando Deolindo chega à Praia Formosa, Genoveva recebe-o com maneiras francas. Novamente, entram em cena as modalidades veridictórias. Genoveva não tem o que esconder, está no domínio da verdade (ser + parecer). Deolindo volta a ter esperança, reassume a confiança. A velha poderia ter mentido ou ter-se enganado, relatando um parecer que não corresponde a um ser, fazendo uma interpretação não verdadeira dos fatos. Altera-se sua existência modal. Crê poder realizar a conjunção desejável. Mas Genoveva não manifesta "nenhuma comoção nem intimidade", ou seja, mantém-se indiferente e distante.

Diante desse estado passional, altera-se novamente a existência modal de Deolindo. Passa do crer ao não crer poder realizar a conjunção desejada. Com isso, ressurge o querer vingar-se. "Em falta de faca, bastavam-lhe as mãos para estrangular Genoveva, que era um pedacinho de gente, e durante os primeiros minutos não pensou em outra coisa". Contém seu desejo e diz-lhe que sabia tudo. Ela não mente. Deolindo tem um ímpeto, o querer vingar-se retorna novamente; ela fá-lo parar com a ação dos olhos; diz-lhe que, "se lhe abrira a porta, é porque contava que era homem de juízo", isto é, que não se deixava levar por estados patêmicos intensos. Em seguida, conta-lhe o amor que sentira por ele, mas diz que seu coração mudara. Mudara o objeto de seu querer. O narrador modaliza veridictoriamente suas palavras dizendo: "Não sorria de escárnio. A expressão das palavras é que era uma mescla de candura e cinismo, de insolência e simplicidade, que desisto de definir melhor. Creio até que insolência e cinismo são mal aplicados. Genoveva não se defendia de um erro ou de um perjúrio; não se defendia de nada; faltava-lhe o padrão moral das ações." O que ela diz é verdadeiro, pois ela crê não ser culpada de nada. Por isso, não quer criar um parecer que oculte o ser.

A questão da culpa distingue as duas personagens. Elas vêem o contrato firmado entre elas de maneira diferente. Para Deolindo, o juramento é aspectualizado durativamente ("O pobre marujo citava o juramento de despedida, como uma obrigação eterna"). Ao rompê-lo, Genoveva fora perjura e ingrata, pois passara a querer não fazer o bem a quem devia obrigação. A gratidão é uma paixão de benevolência que se articula numa reciprocidade. Para Genoveva, o juramento é aspectualizado com a pontualidade. Não poderia ser perjura, porque "quando jurou era verdade". Não era ingrata, pois a gratidão implica que se esteja obrigado a alguém e ele, durante a viagem, não devia ter-se lembrado dela ("E ele que tanto enchia a boca de fidelidade, tinha-se lembrado dela por onde andou?"). Ela crê que ele pode não ter mantido o contrato, o que também a desobrigaria de cumpri-lo. A resposta dele foi dar-lhe um pacote de presentes onde estavam uns brincos. Ela ficou confusa, por "receber um mimo a troco de um esquecimento". Está, então, modalizada por um saber que Deolindo não pode não ter mantido o juramento e por saber que ela não o manteve. Ao mesmo tempo, tem as paixões da satisfação (contentamento e deslumbramento) por saber que está em conjunção com a fidelidade de Deolindo, figurativizada pelos brincos.

Renasce a esperança em Deolindo. De novo, tranforma-se sua existência modal. Passa do não crer ao crer poder realizar a conjunção desejada. As razões para esse ressurgir da esperança estão no fato de pensar que o juramento pode ser aspectualizado com a pontualidade e, nesse caso, se ele fora violado quando estava ausente, pode ser rompido, estando o outro ausente, ou com a duratividade e, então, não seria negado, dado que talvez ela não tivesse jurado nada ao outro.

Ela pede que Deolindo lhe conte as aventuras que vivera em terras longínquas. Demonstra um enorme interesse por elas. Está modalizada por um querer saber. Quando Deolindo percebe que o objeto de sua solicitude eram seus relatos e não ele, passa novamente a um estado de crer não poder ser ("A esperança (...) começava a desampará-lo").

Ela mostra a uma amiga os brincos que ele lhe dera. Esta elogia muito o presente. Deolindo tem um momento de satisfação, sabe ter podido realizar uma conjunção desejada ("durante alguns segundos, saboreou o prazer exclusivo e superfino de haver dado um bom presente; mas foram só alguns segundos").

Sai cabisbaixo e lento, sem o ímpeto com que chegara. Estava tomado pelo estado patêmico da infelicidade, por um saber não poder ser. Mas que é que ele não podia ser? A resposta virá em seguida. Genoveva entrou em casa alegre e barulhenta, estava modalizada por um saber poder ser. Conta à amiga que ele dissera que iria suicidar-se. De certa forma, suicidar-se era realizar a vingança desejada, pois infligiria a Genoveva a dor do remorso, reequilibrando, assim, a situação patêmica. Diante do espanto da amiga, Genoveva mostra que sabe que ele não pode fazer o que prometera, pois não é dotado das paixões fortes e durativas que levam o sujeito a tornar-se competente para a vingança, aquelas que o modalizam com o poder fazer. Ao contrário, é apenas dotado das paixões fracas da malevolência, que instauram um sujeito operador com a modalidade do querer vingar-se, mas não o atualizam com o poder vingar-se ("Qual o quê! Não se mata, não. Deolindo é assim mesmo, diz as cousas, mas não faz. Você verá que não se mata. Coitado, são ciúmes."). No ciúme, há um não querer não ser, isto, não querer não estar em conjunção com um objeto amado. Deolindo é modalizado pelo querer, mas não pelo poder, é aspectualizado pela pontualidade (ímpeto), mas não pelo duratividade (persistência), é modulado pela baixa intensidade.

No dia seguinte, diante de seus colegas, Deolindo manifesta o estado patêmico da satisfação, derivado do saber estar em conjunção com o objeto desejado. Nota, no entanto, o narrador que se trata de uma mentira. Deolindo parece satisfeito, mas não está. Por que mentiu? Porque parece que tivera vergonha da realidade. Vergonha é "um sentimento penoso de sua inferioridade, de sua indignidade ou de sua humilhação diante de outrem, de seu rebaixamento na opinião dos outros". Deriva de uma sanção cognitiva negativa, a reprovação própria ou alheia. Essa reprovação gera a vergonha. A vergonha é, assim, um estado de alma da ordem do saber: o sujeito sabe que não possui a competência para um fazer exigido pelo simulacro de membro de um determinado grupo social ou que fez algo em desacordo com a deontologia grupal. Por outro lado, é preciso também que esse sujeito aceite esse simulacro ou essa deontologia como um ideal a ser seguido, pois, se não dá nenhuma importância a eles, não será atingido pelo sentimento de vergonha. Assim, é necessário, para que esse estado de alma ocorra, que o dever fazer e o dever ser se tornem também um querer fazer e um querer ser. Se o sujeito é modalizado por um não querer, age diferentemente do simulacro sem ser atingido pela vergonha. Aparecem, então, os comportamentos atrevidos e insolentes. O sintagma modal do efeito patêmico da vergonha é dever ser/fazer; querer ser/fazer; saber não poder ser/fazer ou saber (outro) saber que a competência requerida pelo simulacro não existe ou que a perfórmance não corresponde ao dever.

Voltemos a Deolindo. Diz o narrador: "A verdade é que o marinheiro não se matou. No dia seguinte, alguns dos companheiros bateram-lhe no ombro, cumprimentando-o pela noite de almirante, e pediram-lhe notícias de Genoveva, se estava mais bonita, se chorara muito na ausência, etc. Ele respondia a tudo com um sorriso satisfeito e discreto, um sorriso de pessoa que viveu uma grande noite. Parece que teve vergonha da realidade e preferiu mentir." A vergonha de Deolindo opera sob o signo do segredo. Ele faz uma sanção negativa de sua perfórmance de não se vingar. Não realiza a vingança, porque não possui a modalidade atualizante do poder-fazer, que seu grupo social atribui ao homem. A traição da mulher deve implicar necessariamente a vingança realizada pelo homem. Deolindo, porém, é dotado apenas das paixões fracas do querer. Para não permitir que sua vergonha seja exposta, opta pela mentira. No nível do parecer, mostra satisfação; no do ser, insatisfação e decepção. A decepção, entretanto, não é com Genoveva, mas consigo mesmo.

A análise de textos de diferentes épocas e culturas que pintam paixões de papel (o ciúme, a avareza, a cólera, a indiferença, etc.) mostrou que as paixões variam de uma cultura para outra, de uma época para outra. Por exemplo, a configuração da avareza é distinta em Molière e Balzac. Enquanto no primeiro, o avaro caracteriza-se pelo entesouramento, no segundo, aparece algo que é próprio da formação social capitalista, a idéia de que o dinheiro produz dinheiro. Isso significa que, embora as paixões se caracterizem fundamentalmente pelo arranjo das modalidades, a modalização não é suficiente para produzir efeitos passionais, pois as mesmas organizações modais podem gerar ou não sentidos patêmicos. Ora, isso obriga a introduzir novos elementos teóricos.

Poderíamos dizer que o que caracteriza hoje a pesquisa semiótica são duas direções: a) a análise do que está além do percurso gerativo de sentido em sua formulação clássica; b) o estudo do que está aquém dele e, por conseguinte, propicia sua constituição. Esse exame do além e do aquém do percurso determina seu reexame, a revisão de seus níveis.

Façamos uma resumo das novas direções, cujos princípios foram esboçados há mais ou menos tempo e que têm apresentado cada vez mais resultados.

No estudo do além do percurso, analisa-se o problema dos sistemas semi-simbólicos. A semiótica estabeleceu, a partir da distinção hjelmsleviana entre semióticas monoplanas e biplanas, a diferença entre sistemas simbólicos e sistemas semióticos. Para entender essa distinção, é preciso observar uma característica dos símbolos: são grandezas isomorfas à interpretação, isto é, elementos dotados de conteúdo, mas não passíveis de uma análise em unidades menores constitutivas de uma forma da expressão correlacionada a uma forma do conteúdo. Há, nos sistemas simbólicos, uma correspondência termo a termo entre o plano da expressão e o plano do conteúdo, o que significa que existe uma conformidade total entre esses dois planos. Assim, por exemplo, a cruz gamada é o símbolo do nazismo. Este é seu conteúdo. No entanto, sua expressão não é constituída de unidades menores, cuja relação estabeleceria uma forma da expressão. Seu conteúdo, do mesmo modo, não se constitui de unidades menores. Da mesma forma, a foice o martelo são o símbolo do comunismo. Esse símbolo não se deixa analisar em unidades menores, mesmo que, historicamente, a foice simbolize o campesinato; o martelo, o proletariado e o cruzamento dos dois, a união dessas duas classes. Na verdade, constituído o símbolo, adquire ele um valor global e deixa de ser analisado em unidades menores.

Já nos sistemas semióticos não há uma conformidade entre o plano da expressão e o do conteúdo. Com efeito, o conteúdo deixa-se analisar em semas (por exemplo, touro analisa-se em /bovino/, /macho/, /reprodutor/) e a mesma coisa ocorre com o plano da expressão, que se decompõe em femas. Não há, entretanto, correspondência entre as unidades menores da expressão e as do conteúdo.

Os sistemas semi-simbólicos são aqueles em que a conformidade entre os planos da expressão e do conteúdo não se estabelece a partir de unidades, como nos sistemas simbólicos, mas pela correlação entre categorias (oposição que se fundamenta numa identidade) dos dois planos. Assim, na gestualidade, a categoria da expressão /verticalidade/ vs /horizontalidade/ correlaciona-se à categoria do conteúdo /afirmação/ vs /negação/. Os sistemas semi-simbólicos constituem a base dos textos poéticos. São eles que explicam os efeitos de sentido gerados pelas aliterações, pelo ritmo, pelas rimas, etc. Observemos um exemplo. Nos versos de Tibulo que seguem, nota-se uma oposição entre a concentração de oclusivas no segundo verso e sua pequena proporção no primeiro. Essa oposição da expressão está correlacionada a uma contraditoriedade do conteúdo: ausência do tropel dos netos diante dos avós vs presença do barulho que fazem.

Hic ueniat Natalis auis prolemque ministret,

ludat et ante tuos turba nouella pedes (II, 2, 21-22)

Que venha o Gênio e aos avós conceda netos,

e a jovem turba brinque diante de ti.

O estudo dos sistemas semi-simbólicos estabelece as relações entre o sensível e o inteligível, pois, ao examinar as correlações entre categorias da expressão e do conteúdo, está desvelando "os mecanismos reveladores da transfiguração das sensações em manifestações sígnicas" (Teixeira, 1998:3). O estudo do semi-simbolismo tem um alcance teórico e um, analítico. De um lado, permite discutir, com profundidade, o papel da percepção sensorial na produção do sentido; de outro, possibilita o exame acurado das relações entre expressão e conteúdo (Teixeira, 1998:5-6), o que permite compreender melhor os textos poéticos (não só das poéticas verbais, mas também das poéticas visuais), que se caracterizam pela presença do semi-simbolismo; as semióticas sincréticas (aquelas, como o cinema, cujo plano de conteúdo é manifestado por diferentes planos da expressão); o processo tradutório, seja a tradução intra-semiótica dos textos poéticos, seja a tradução intersemiótica. Em todos esses casos, é preciso não perder de vista a importância das correlações entre conteúdo e expressão.

No exame do aquém do percurso, é preciso examinar as pré-condições do aparecimento do sentido. Se a significação se apresenta sob a forma de unidades discretas, é preciso considerar que essa discretização opera sobre um contínuo, que constitui uma potencialidade de sentido. Portanto, é necessário introduzir a instabilidade e o deslizamento sob a estabilidade do discurso. A linguagem é uma tensão permanente entre estabilidade e instabilidade, indiferenciação e diferenciação; é uma relação de equilíbrio precário derivado de forças estabilizadoras e desestabilizadoras. Como diz Jacques Fontanille, em elegante fórmula, depois da fonologização da semântica, chegou o momento de sua prosodização. A formulação teórica das pré-condições de significação permite, de um lado, compreender melhor a dimensão estética e, de outro, a dimensão patêmica da linguagem. Comecemos por discutir rapidamente a questão da experiência estética.

Em seu livro De l'imperfection, Greimas analisa a questão da experiência estética. Na primeira parte, intitulada La fracture, examina cinco textos, de diferentes escritores (Tournier, Calvino, Rilke, Tanizaki e Cortázar), que relatam experiências estéticas, para mostrar o que é a estesia. A experiência estética é um evento extraordinário enquadrado pela cotidianeidade (1987:19), é uma surrealidade englobada pela realidade (1987:32). Nela o tempo pára, o espaço fixa-se (1987:15-16) e ocorre um sincretismo entre sujeito e objeto (1987:31), que estão disjuntos na temporalidade de todos os dias. Rasga-se o parecer imperfeito e aparece a "nostalgia da perfeição", "oculta pela tela da imperfeição", que constitui a realidade cotidiana (1987:17). A estesia é o vislumbre do contínuo, da fusão anterior à discretização, perdida pela constituição da significação.

A leitura dessas cinco análises, no entanto, chama a atenção para o fato de que o objeto estético não tem nelas o mesmo estatuto. O próprio Greimas, ao iniciar a análise do texto de Cortázar, Continuidade dos parques (1972, 11-13), chama atenção para isso, dizendo que, com o autor argentino, há uma mudança de problemática, pois, nos outros textos, "a experiência estética aparecia como a apreensão e a reassunção diversa de algum fragmento do mundo natural", enquanto o objeto que se dá a perceber, neste caso, é um "artefato, um objeto literário construído" - não o texto de Cortázar, mas o texto no texto - "que, progressivamente, consegue ocupar o lugar da `realidade' contextual descrita" (1987:55). Nas quatro primeiras análises, o objeto estético é "natural", enquanto, na quinta, pertence ao domínio dos objetos culturais. Por exemplo, no de Italo Calvino, é o seio nu de uma moça deitada na praia; em Rilke, é o perfume do jasmim que vem do parque; em Tanizaki, é a cor das sombras. Em Cortázar, ao contrário, o objeto estético é o texto literário.

O conto narra que um fazendeiro começou a ler, de maneira intermitente, um livro. Um dia, depois de se ocupar dos negócios, pôs-se a ler os últimos capítulos. Tomou todos os cuidados para tornar sua leitura o mais confortável possível. Aos poucos, começou a afastar-se, "linha a linha, daquilo que o rodeava" e "a fantasia novelesca absorveu-o" (1972, 11),. Essa personagem do plano da enunciação enunciada penetra no enunciado, na ação romanesca, participando como testemunha do encontro das personagens do livro que estava lendo. O homem vai matar alguém. Chega a uma casa, entra e encontra a personagem a ser morta. "A porta do salão, e então o punhal na mão, a luz dos janelões, o alto respaldo de uma poltrona de veludo verde, a cabeça do homem na poltrona lendo um romance" (1972, 13),. A personagem do enunciado penetra no plano da enunciação enunciada e vai matar o leitor. O conto é uma narrativa da leitura de um romance, ou mais extensamente, é o relato da leitura da literatura, ou mais amplamente ainda, é o raconto da leitura do objeto artístico. Essa narrativa contém um esboço de uma teoria da experiência estética. A ilusão romanesca é uma força que se apodera do sujeito prestes a acolhê-la (1987:57). O sujeito afasta-se da realidade enfraquecida e evanescente e é absorvido pelo mundo da ilusão (1987:59). Há, pois, uma fusão do sujeito com o objeto. A ficção é uma surrealidade que acolhe em seu interior, quando da apreensão estética, o sujeito (1987:64). Esse ato de matar suspenso é "a representação simbólica do impacto produzido pela obra trágica sobre o espectador, isto é, da catarse aristotélica" (1987:67). A "eficácia suprema do objeto literário - ou mais amplamente, estético - sua conjunção assumida pelo sujeito, não está na sua dissolução, na passagem obrigatória pela morte do leitor-espectador - pergunta Greimas (1987:67)?

Essa fusão é, na verdade, uma mudança de plano enunciativo. O sujeito passa do plano da enunciação enunciada para o do enunciado enunciado. Em A rosa púrpura do Cairo, de Woody Allen, a mulher, maltratada pelo marido brutal, refugia-se no cinema para esquecer as agruras de sua vida triste. Sua fusão com o objeto fílmico é figurativizada pela entrada na ação do filme, para viver uma história de amor, uma vida cheia de aventuras, com o galã do cinema. Nessa outra dimensão enunciativa, o sujeito deixa a realidade da existência, para viver, durante o tempo da experiência estética, uma surrealidade, uma segunda vida. Esses exemplos mostram a fecundidade da questão teórica das pré-condições da significação, para a compreensão de certos tipos de textos.

Por outro lado, a dimensão passional permite analisar, por meio dos procedimentos da convocação enunciativa, a retomada do contínuo no discurso. As configurações modais estão sobredeterminadas por uma modulação, que gera efeitos de sentido patêmicos. Passa-se, no estudo do componente patêmico, da modalização à aspectualização e à intensidade. O conceito de aspectualização, entendida não apenas como processo lingüístico, mas como processo discursivo, não é somente uma sobredeterminação do tempo, mas uma sobredeterminação de todas as categorias de enunciação, o tempo, o espaço e a pessoa. Aparece também o conceito de foria, que, conjugando a intensidade e a extensão, produz, ao projetar-se no espaço e no tempo, efeitos de andamento e de ritmo discursivos. O estudo das paixões passa a convocar, simultaneamente, grandezas discretas e categoriais (modalizações), mas também grandezas contínuas e articuladas (aspectualização e intensidade).

A aspectualização caracteriza tipos passionais: por exemplo, temos as paixões da duratividade, como o ressentimento; paixões da pontualidade, como a ira; paixões da perfectividade, como o remorso. Ao mesmo tempo, as paixões apresentam uma intensidade. A depressão exibe um andamento lento, enquanto a agitação tem um andamento acelerado. O avaro é modalizado por um querer ser, mas um querer ser que ultrapassa o simples querer não gastar. Distingue-se do econômico, porque a economia do avaro vai além do necessário. É uma economia excessiva, desnecessária, incoerente. A impulsividade define-se por um querer fazer, ao mesmo tempo que pela incoatividade e pela intensidade.

Estudada dessa maneira, a paixão não se opõe à razão, mas constitui uma forma de racionalidade discursiva, permitindo analisar, de maneira bastante fina, a aspectualização, a intensificação e a quantificação, consideradas não como categorias da língua, mas como procedimentos de discursivização. Na medida em que o contínuo e suas modulações passam a fazer parte da teoria ultrapassa-se o estruturalismo, fundado no discreto e no categorial.

O caminho da Semiótica começa pela proposição de uma semântica gerativa, geral e discursiva; passa pela constituição do percurso gerativo de sentido; em seguida, pela sua complexificação, com o estudo, no nível narrativo, das modalidades do fazer e do ser e o estudo das paixões e, no nível discursivo, com a pesquisa dos procedimentos de figurativização e das projeções da enunciação no enunciado (temporalização, espacialização e actorialização); chega ao exame do além do percurso, com a análise dos sistemas semi-simbólicos, e do aquém do percurso, com a investigação sobre as pré-condições de significação. A constatação de que, nessas pré-condições, estão presentes o contínuo, o indiferenciado, obriga ao estudo das categorias discursivas da aspectualização, da quantificação e da intensificação. É um projeto que busca analisar, primacialmente, os mecanismos intradiscursivos de constituição do sentido, embora não desconsidere a interdiscursividade.

O discurso científico não atua como o discurso religioso, que apresenta uma explicação total e definitiva para o mundo, mas, ao contrário, faz aproximações sucessivas do objeto. Diferentemente do discurso religioso, que não precisa da comprovação dos fatos, o discurso científico precisa do teste da realidade e, por isso, é da sua natureza a publicidade dos resultados, o debate, a crítica e a contradição, para que esse conhecimento vá aproximando-se da verdade. Por confrontar-se com os fatos da realidade (no nosso caso, da realidade discursiva) é da natureza do discurso científico, dos projetos teóricos da ciência, a mudança. É necessário sempre alterar os modelos, para que possam abranger novos fenômenos, descrevendo-os e explicando-os. Por isso, a história é inerente ao fazer científico. Mesmo diante de dogmatismos que se criam onde não deveriam ser produzidos, por exemplo, na Universidade, é preciso acreditar, como Galileu, que eppur si muove. Como mostra Camões:

Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades.

Muda-se o ser, muda-se a confiança;

Todo o mundo é composto de mudança,

Tomando sempre novas qualidades.

(Recebido em maio de 1998; Aceito em julho de 1998)

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  • 1
    Lembramos ainda uma vez que as narrativas são simulacros das ações do homem no mundo.
  • 2
    A tradição escolar ensina que concreto/abstrato é uma categoria classificatória que se aplica aos substantivos. Na verdade, ela refere-se a todos os lexemas, pois abstrato é o termo que não remete a algo considerado existente no mundo natural, mas a uma categoria explicativa dos existentes, enquanto concreto é o termo que se refere a elementos existentes no mundo natural. É preciso entender bem o que significa
    mundo natural neste contexto, não é aquele mundo que os sentidos dão por natural, mas são os mundos que o discurso dá como existentes. Então,
    fada é concreto, porque é considerado um ser existente no mundo natural criado pelo universo discursivo do conto maravilhoso. Já
    orgulho é uma categoria explicativa de uma série de atitudes concretas tomadas por seres efetivamente existentes em mundos naturais criados por universos de discurso. Da mesma forma,
    branco é um adjetivo concreto, enquanto
    terno é abstrato.
  • 3
    Observe-se que a Semiótica trabalha com uma concepção ampliada de aspecto. Tradicionalmente, o aspecto era considerado um ponto de vista que sobredeterminava o tempo, indicando se o processo que se desenrolava no tempo era pontual ou durativo; em sendo durativo, se era contínuo ou descontínuo (iterativo), etc. Ora, numa perspectiva enunciativa, o aspecto é um ponto de vista que incide sobre cada uma das categorias da enunciação, a saber, o tempo, o espaço e a pessoa.
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      20 Jan 2000
    • Data do Fascículo
      Fev 1999

    Histórico

    • Aceito
      Jul 1998
    • Recebido
      Maio 1998
    Pontifícia Universidade Católica de São Paulo - PUC-SP PUC-SP - LAEL, Rua Monte Alegre 984, 4B-02, São Paulo, SP 05014-001, Brasil, Tel.: +55 11 3670-8374 - São Paulo - SP - Brazil
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