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Correção pelo outro e reparo como domínios distintos na fala-em-interação social

Other correction and repair as distinct domains in talk-in-interaction

RESUMO

A ação de corrigir alguém, já analisada em diversos cenários, principalmente em sala de aula (Garcez, 2006GARCEZ, P. M. 2006. A organização da fala-em-interação na sala de aula: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, 4(1), 66-80.; McHoul, 1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.), recebeu atenção de analistas da conversa particularmente como desdobramento do estudo da sistemática de reparo (Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.), sendo por muitos tratada como subtipo de reparo. Questionamentos sobre a pertinência de manter a ação de corrigir no domínio do reparo (Cheng, 2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.; Hall, 2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.; Macbeth, 2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) motivaram retomarmos trabalho anterior (Garcez & Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.) e rever a questão. Nesta retrospectiva, além de levantamento bibliográfico de estudos desde então, analisamos dois excertos de fala-em-interação em português brasileiro (um de sala de aula e outro de conversa cotidiana) e evidenciamos os trabalhos interacionais próprios desempenhados mediante as ações de fazer reparo (em sistemática fundamental para abordar e resolver problemas de intersubjetividade) e corrigir o interlocutor (ação despreferida para expor posições epistêmicas desiguais). Afinal adotamos a posição de que, mesmo podendo operar sucessivamente numa mesma sequência, essas são ações em domínios organizacionais distintos.

Palavras-chave:
conversa; correção; fala-em-interação; intersubjetividade; reparo

ABSTRACT

Described in several interactional settings, most notably the classroom (Garcez, 2006GARCEZ, P. M. 2006. A organização da fala-em-interação na sala de aula: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, 4(1), 66-80.; McHoul, 1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.), the action of correcting someone has received attention from conversation analysts particularly within the study of the systematics of repair (Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.), where it was treated by many authors as a repair subtype. Doubts about and challenges to the pertinence of understanding other-correction in the domain of repair (Cheng, 2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.; Hall, 2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.; Macbeth, 2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) have motivated us to resume previous work (Garcez & Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.) and revisit the phenomena here. In this retrospective, after a survey of relevant research, we analyze two excerpts of interaction in Brazilian Portuguese (one from classroom talk-in-interaction, one from ordinary conversation) to underscore the distinctive interactive work performed by participants when doing repair (within the foundational systematics designed to address and solve problems of intersubjectivity) and other-correction (a dispreferred first action to expose unequal epistemic stances). We thus adopt the position that, even though they may operate successively in one same sequence, these are actions in different organizational domains.

Keywords:
conversation; correction; intersubjectivity; repair; talk-in-interaction

1. Reparo e correção pelo outro: pautando a necessidade de revisão4 4 . Agradecemos ao CNPq pela concessão de bolsas de IC, mestrado e PQ em apoio à pesquisa relatada aqui.

Na fala-em-interação social, corrigir pode ser ação corriqueira (e.g., Garcez, 2006GARCEZ, P. M. 2006. A organização da fala-em-interação na sala de aula: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, 4(1), 66-80.; Haakana & Kurhila, 2009HAAKANA, M. & KURHILA, S. 2009. Other-correction in everyday interaction: Some comparative aspects. In: M. Haakana; M. Laakso & J. Lindström (orgs.). Talk in interaction: Comparative dimensions (pp. 152-179). Helsinque, Finlândia: Finnish Literature Society.; Hosoda, 2006HOSODA, Y. 2006. Repair and relevance of differential language expertise in second language conversations. Applied Linguistics, 27(1), 25-50.; McHoul, 1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.). Em sala de aula, essa ação foi observada em diversos países e línguas de interação, sendo muitas vezes considerada constituinte da instituição escolar, na instrução de novatos (Batista, 1997BATISTA, A. A. G. 1997. Aula de Português: discurso e saberes escolares. São Paulo: Martins Fontes.; Cheng, 2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.; Kääntä, 2014KÄÄNTÄ, L. 2014. From noticing to initiating correction: Student’s epistemic displays in instructional interaction. Journal of Pragmatics , 66, 86-105.; Koschmann, 2016______. 2016. “No! That’s not what we were doing though”: Student-initiated other-correction. Éducation & Didactique, 10(1) 39-48.; Macbeth, 2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.; Sinclair & Coulthard, 1975SINCLAIR, J. M. & COULTHARD, R. M. 1975. Towards an analysis of discourse: The English used by teachers and pupils. Reino Unido: Oxford University Press.) ou de interagentes ainda não competentes em algum domínio (e.g., Bolden, 2012BOLDEN, G. 2012. Across languages and cultures: Brokering problems of understanding in conversational repair. Language in Society, 41(1), 97-121.; Schegloff et al. 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 381; Theodórsdóttir, 2018THEODÓRSDÓTTIR, G. 2018. L2 teaching in the wild: A close look at correction and explanation practices in everyday L2 interaction. The Modern Language Journal , 102(1), 30-45.).

Na tradição de pesquisa em Análise da Conversa Etnometodológica (doravante ACE) (Sidnell & Stivers, 2013SIDNELL, J. & STIVERS, T. (orgs.). 2013. The handbook of conversation analysis . Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell .; Loder & Jung, 2008______. 2008a. Noções fundamentais: a organização de reparo. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Fala-em-interação social: Introdução à Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 95-126). Campinas, SP: Mercado de Letras.; Silva et al., 2009SILVA, C.; ANDRADE, D. & OSTERMANN, A. C. 2009. Análise da Conversa: uma breve introdução. ReVEL, 7(13).), o estudo da correção se desenvolveu principalmente em desdobramento do estudo de fenômenos interacionais na esfera da sistemática de reparo (Schegloff, 1997______. 1997. Practices and actions: boundary cases of other-initiated repair. Discourse Processes, 23(3): 499-545., p. 503). Nessa discussão, o termo “correção” diz respeito ora à substituição de um item por outro, ora à ação de corrigir alguém, o que queremos aqui distinguir.

Na literatura em ACE, a organização de reparo é muitas vezes apresentada como constituída por quatro trajetórias básicas (Hutchby & Wooffitt, 1998HUTCHBY, I. & WOOFFITT, R. 1998. Conversation analysis: Principles, practices and applications. Cambridge, Reino Unido: Polity Press., p. 61; Levinson, 1983LEVINSON, S. 1983. Pragmatics . Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press ., p. 340; Loder, 2006LODER, L. L. 2006. Investindo no conflito: a correção pelo outro construindo discordâncias agravadas [Dissertação de mestrado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/8035.
http://hdl.handle.net/10183/8035...
, pp. 32-34), dentre as quais figuraria o reparo iniciado e levado a cabo pelo outro, o mais raro e despreferido em conversa cotidiana. Apesar de Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 363) tratarem correção e reparo desde o início como fenômenos distintos - reparo como domínio abrangente, e correção como constituinte de reparo que ocorre em apenas algumas trajetórias -, nem sempre essa distinção foi empregada com clareza em estudos analíticos posteriores, havendo inclusive trabalhos em que os termos foram usados como sinônimos (e.g., Keating, 1993KEATING, E. 1993. Correction/repair as a resource for co-construction of group competence. Pragmatics, 3(4), 411-423.;5 5 . A oscilação fica evidente já no título do artigo (correction/repair). McHoul 1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377., p. 350).

Tais imprecisões não passaram despercebidas. Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) pôs em xeque essa relação: questionou o pertencimento de sequências de correção ao domínio organizacional do reparo e propôs que correção e reparo sejam vistos como fenômenos distintos e pertencentes a domínios organizacionais diferentes. Ademais, propôs que a distinção é válida não só para a fala-em-interação de sala de aula, mas em geral.

Tomando, então, por ponto de partida a proposta de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.), o presente Debate visa fazer uma retrospectiva para rediscutir correção e reparo a partir de um recorte específico: a análise das trajetórias protagonizadas pelo interlocutor (o outro em relação à fonte de problema). Assim, serão revisitados dados de nosso acervo com o objetivo central de verificar a propriedade da discussão levantada por Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) e tomar posição quanto à questão. Resgata-se também nossa abordagem anterior desses fenômenos em Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.), que se caracteriza como estudo complementar à presente retrospectiva, sendo ambas partes encadeadas de uma mesma discussão.

Após a revisão de literatura em ACE sobre as relações entre correção pelo outro e reparo, apresentamos dois excertos em análise - o primeiro de interação em sala de aula, e o segundo de conversa cotidiana, ambos em português brasileiro - para ilustrar que, conforme argumentamos, a proposta de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) procede.

Chamamos a atenção, portanto, para a necessidade de tomar a ação de corrigir alguém, mesmo que delicada, como ação de estatuto semelhante ao das demais, sendo fenômeno interacional distinto do reparo.

2. Aporte teórico: estudos sobre correção pelo outro

Desde cedo os analistas da conversa observaram que, no decorrer da interação, é possível que surjam problemas: alguém pode não ouvir bem o que o outro disse (problema de escuta), ou pode se enganar ao falar alguma palavra (problema de produção) ou pode simplesmente não entender o que o outro está querendo dizer (problema de entendimento) (Loder, 2008______. 2008a. Noções fundamentais: a organização de reparo. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Fala-em-interação social: Introdução à Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 95-126). Campinas, SP: Mercado de Letras.a; Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.). O estudo dos mecanismos mediante os quais os participantes de uma interação procuram dar conta desses entraves foi denominado organização de reparo. É recorrendo a essa sistemática que os participantes buscam manter o entendimento comum acerca do que estão dizendo e, principalmente, fazendo uns com os outros.

Essa construção de um mundo em comum que permite e sustenta a ação conjunta é referida como intersubjetividade, o “entendimento e coordenação mútua em torno de uma atividade comum”6 6 . As passagens reproduzidas em citação de obras das quais não conhecemos tradução publicada em português aparecem aqui na nossa tradução livre para os propósitos deste texto. (Duranti, 1997DURANTI, A. 1997. Linguistic anthropology. Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press, p. 255). Isso não é, contudo, apenas a convergência entre múltiplos intérpretes do mundo (em termos de substância ou de procedimento), mas a convergência potencial a ser verificada entre os “realizadores” de uma ação ou parcela de conduta e seus interlocutores, como coprodutores de um incremento de realidade interacional e social (Schegloff, 1992SCHEGLOFF, E. A. 1992. Repair after next turn: The last structurally provided defense of intersubjectivity in conversation. American Journal of Sociology, 97(5), 1295-1345., p. 1299). Trata-se, portanto, de uma condição para a ação humana, da qual a sistemática de reparo na fala-em-interação social é alicerce.

Do ponto de vista sequencial, a sistemática do reparo constitui-se primordialmente de duas partes: iniciação (apontamento de um problema interacional) e resultado (resolução do problema), realizadas pelo produtor da fonte de problema (o próprio falante, ou self) ou pelo interlocutor (o outro). Com base nisso, boa parte da literatura passou a operar com quatro trajetórias básicas de reparo7 7 . Posteriormente, foram descritas outras duas trajetórias de reparo (reparo em terceira e quarta posições) (Schegloff, 1992), consideradas as últimas oportunidades estruturalmente disponíveis para a defesa da intersubjetividade. Essas são desdobramentos sequenciais complexos da trajetória 1, isto é, reparo iniciado e levado a cabo pelo próprio produtor da fonte de problema. (Bolden, 2012BOLDEN, G. 2012. Across languages and cultures: Brokering problems of understanding in conversational repair. Language in Society, 41(1), 97-121., pp. 100-101; Fele, 1991FELE, G. 1991. L’insorgere del conflitto. Milão, Itália: FrancoAngeli., pp. 19 e 39-41; Garcez & Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312., pp. 286-287; Hall, 2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525., p. 513; Hutchby & Wooffitt, 1998HUTCHBY, I. & WOOFFITT, R. 1998. Conversation analysis: Principles, practices and applications. Cambridge, Reino Unido: Polity Press., p. 61; Levinson, 1983LEVINSON, S. 1983. Pragmatics . Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press ., p. 340; Koschmann, 2016______. 2016. “No! That’s not what we were doing though”: Student-initiated other-correction. Éducation & Didactique, 10(1) 39-48., p. 40; Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., pp. 364-365; Theodórsdóttir, 2018THEODÓRSDÓTTIR, G. 2018. L2 teaching in the wild: A close look at correction and explanation practices in everyday L2 interaction. The Modern Language Journal , 102(1), 30-45., p. 31), representadas na grade de quatro células abaixo:

Em razão da distinção técnica proposta por Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 363) entre “correção” (substituição de item considerado errado por item que seria o correto) e “reparo” (em que a fonte de problema não necessariamente envolve erro; pode ser inclusive a falta de um item), “reparo” passou a ser o termo usado para nomear o fenômeno de modo geral8 8 . Cf. Bolden (2012, p. 112), Dings (2012, p. 1510) e Theodórsdóttir (2018, p. 31). . Esse estudo seminal motivou diversos outros, alguns dos quais se valeram da relação reparo-correção tal como proposta em 1977. Contudo, uma breve seção final sobre “correção pelo outro” (pp. 378-381) talvez tenha levado muitos a ver ali não apenas a substituição de um item pelo outro, mas reparo iniciado e levado a cabo pelo outro (doravante RILCO) - nosso objeto de investigação em Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.) -, que ocorreria quando o interagente, além de apontar um problema no turno anterior do seu interlocutor, oferece resolução para tal problema.

Jefferson (1987JEFFERSON, G. 1987. On exposed and embedded correction in conversation. In: G. Button & J. R. E. Lee (orgs.). Talk and social organization (pp. 86-100). Hotwell Road, Bristol, Reino Unido: Multilingual Matters . ) analisou trajetórias de correção (iniciada e levada a cabo) pelo outro, mostrando que podem ser coconstruídas como ação exposta (em que o foco interacional se torna a correção em si) ou como recurso inserido (em que a correção é incorporada a outras ações já em andamento). A autora destacou que a correção exposta, mais do que apontar o que é certo e errado aos olhos dos interagentes, também “aborda especificamente lapsos de competência e/ou conduta” (p. 88) do falante da fonte de problema. Isto é, ao corrigir expostamente o outro, o interlocutor está pondo em xeque a legitimidade do falante da fonte de problema, imputando a ele ignorância sobre o tema9 9 . A esse respeito, ver também Goodwin (1990, p. 149), Loder (2006, p. 75) e estudos recentes que discutem a correção pelo outro como ação que evidencia diferentes posições epistêmicas dos interlocutores em relação à fonte de problema (e.g., Bolden, 2012; Kääntä, 2014, p. 90). . Por isso, a correção exposta, diferentemente da inserida, abre a oportunidade para outras ações relacionadas à correção, como justificativas, reclamações e brincadeiras em torno do “erro” e, consequentemente, da alegada (in)competência do falante da fonte de problema.

Investigando cenários de interação não pedagógica entre falantes referidos como nativos e não nativos de finlandês, Kurhila (2001KURHILA, S. 2001. Correction in talk between native and non-native speaker. Journal of Pragmatics , 33(7), 1083-1110. , 2006______. 2006. Second language interaction. Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins.) observou que, quando o “não nativo” produz um item linguístico/gramatical “errado/desviante”, nem sempre ele é corrigido pelo “nativo”. Nas correções pelo outro expostas que analisou, além de apontar a orientação para questões identitárias (de fato tornando interacionalmente relevante ser nativo ou não nativo), Kurhila observou que o falante que corrige muitas vezes passa imediatamente a uma nova ação, porque, “uma vez que o interlocutor [o que corrige] revela ter entendido o item reparável, negociações adicionais sobre ‘o que se queria dizer’ são desnecessárias” (Kurhila, 2006______. 2006. Second language interaction. Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins., p. 71)10 10 . A mesma observação consta em Kurhila (2001, p. 1103). . Mesmo não sendo problematizada por Kurhila, essa observação indica peculiaridade da ação de corrigir alguém, dado que não é evocada por um problema de entendimento, ou seja, não estaria a serviço de resolver um problema de intersubjetividade entre os interlocutores.

Também investigando interações cotidianas entre falantes de línguas de interação distintas (inglês e japonês), Hosoda (2006HOSODA, Y. 2006. Repair and relevance of differential language expertise in second language conversations. Applied Linguistics, 27(1), 25-50.) mostrou como a orientação dos participantes para suas identidades (de novato e experiente em uma determinada língua) é revelada em sequências de reparo (p. 29), particularmente de reparo levado a cabo pelo outro. O autor analisou sequências de verificação de vocabulário e de resolução de problemas de entendimento mútuo. Em ambos os casos, observou índices de (des)preferência e atrasos, sem, contudo, jamais distinguir reparo e correção, nem mencionar qualquer debate em torno dos termos, até usando “correção” e “reparo pelo outro” como sinônimos (p. 27).

Jefferson (2007JEFFERSON, G. 2007. Preliminary notes on abdicated other-correction. Journal of Pragmatics , 39(3), 445-461.) retornou ao estudo da correção pelo outro para descrever sequências em que o interlocutor abdica de iniciar correção, registrando recebimento do turno com problema como aceitável (mesmo tendo subsídios para corrigir o outro), ao que se segue uma autocorreção do falante da fonte de problema e, na sequência, o interlocutor recebe o turno corrigido de modo idêntico, sem indicar ter notado qualquer erro antes. Jefferson apontou que isso se justificaria pelo fato de que “as correções podem ser feitas e são feitas em primeiro lugar porque um interlocutor [o outro] sabe o que se queria dizer” (p. 452). Portanto, para o ouvinte do erro, que ainda assim entende o turno inicial e opta por não corrigir, não haveria, de fato, novo entendimento após a correção. Tal como Kurhila (2001KURHILA, S. 2001. Correction in talk between native and non-native speaker. Journal of Pragmatics , 33(7), 1083-1110. , 2006______. 2006. Second language interaction. Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins.) sobre a relação entre “corrigir” e “entender”, Jefferson apenas observa a relação, sem explorar suas implicações detalhadamente.

Analisando correção iniciada e levada a cabo pelo outro em conversas cotidianas entre finlandeses, Haakana e Kurhila (2009HAAKANA, M. & KURHILA, S. 2009. Other-correction in everyday interaction: Some comparative aspects. In: M. Haakana; M. Laakso & J. Lindström (orgs.). Talk in interaction: Comparative dimensions (pp. 152-179). Helsinque, Finlândia: Finnish Literature Society.) observaram que, em sua maioria, essas correções não são moduladas, nem posicionadas após autoiniciações de reparo. Embora tenham incluído a correção pelo outro entre as trajetórias de reparo (p. 152), apontaram, na revisão de artigos clássicos sobre o tema, que “os estudos não parecem formar uma visão unificada e abrangente da correção pelo outro, e algumas afirmações são até mesmo contraditórias” (p. 155). Assim, apesar de não se aprofundarem nisso, indicam imprecisões na literatura a respeito da ação de corrigir alguém enquanto constituinte da organização de reparo e, portanto, a necessidade de rediscutir o fenômeno.

Em estudo sobre como interagentes tornam (ou não) aparentes suas identidades de gênero e desafiam a heteronormatividade em conversas telefônicas em inglês, Land e Kitzinger (2005LAND, V. & KITZINGER, C. 2005. Speaking as a lesbian: Correcting the heterosexist presumption. Research on Language and Social Interaction, 38(4), 371-416.) apontaram a correção pelo outro como um dos métodos usados, particularmente em interações institucionais. Embora enquadrem correção pelo outro exposta como trajetória de reparo, as autoras vacilam em uma das análises (p. 406): indicam que uma correção está inserida na ação principal em andamento, uma sequência de reparo. Assim, dão indicação de que, nesse dado, reparo e correção seriam ações distintas (uma sendo veículo para a outra). Embora as autoras não discutam o tema, sua análise parece evidenciar que as duas trajetórias não deveriam ser tratadas como um só fenômeno.

Recentemente, Theodórsdóttir (2018THEODÓRSDÓTTIR, G. 2018. L2 teaching in the wild: A close look at correction and explanation practices in everyday L2 interaction. The Modern Language Journal , 102(1), 30-45.), ao analisar conversas cotidianas, observou como as sequências de correção iniciadas por uma aprendiz de islandês e levadas a cabo pelo interlocutor revelam orientação para essa identidade de aprendiz. Nos excertos analisados, observou que, entre a iniciação da correção e sua conclusão, havia uma série de turnos dedicada ao resgate da intersubjetividade entre os interlocutores, uma vez que, “(...) antes de chegar a isso [ensinar vocabulário à interlocutora], ele precisa entender o que Anna está tentando dizer” (p. 37). Embora a autora considere correção como tipo de reparo, sem comparar sequências com e sem problemas iminentes de intersubjetividade, destaca a orientação dos interagentes para o fato de o entendimento mútuo ser condição para que possam produzir correção pelo outro.

Também a fala-em-interação de sala de aula foi enfocada em estudos sobre correção pelo outro/RILCO posteriores a Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.). Dentre eles destacamos McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.), muito citado por caracterizar as modificações da sistemática de reparo na fala-em-interação institucional de sala de aula, em que os participantes agem nas capacidades de “quem sabe mais e ensina” (professor) e “quem sabe menos e aprende” (aluno). Após turnos de fala com erros produzidos pelos alunos, McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.) observou que se mantém a preferência por autocorreção, embora predominantemente antecedida por iniciação pelo outro - o professor -, diferentemente da conversa cotidiana, em que a preferência é por autoiniciação (p. 353). Quanto à correção pelo outro (equiparada ao reparo levado a cabo pelo professor), observou que é tipicamente produzida depois de sucessivas iniciações pelo professor, que recusa respostas dos alunos sem corrigi-los diretamente (p. 365). Aderindo à leitura de que “reparo é um fenômeno sequencial geral do qual correções formam apenas uma parte11 11 . Em publicação bem mais recente, Gardner (2013, p. 604) mantém a leitura de que correção e reparo são fenômenos de mesma natureza: “correções, que podem ser vistas como um subgrupo de reparo, são sem dúvida mais prevalentes [em sala de aula] do que em conversa cotidiana”. ” (p. 350), McHoul concluiu que, em sala de aula, “as correções pelo outro são com frequência estruturalmente atrasadas (...), permitindo que (...) autocorreções ocorram” (p. 375). Portanto, para McHoul, a correção pelo outro na sala de aula configura-se como uma alternativa ao autorreparo, sendo o último recurso ao qual os participantes recorrem após tentativas frustradas de autocorreção pelo aluno.

Hauser (2010HAUSER, Eric. 2010. Other-correction of language form following a repair sequence. Pragmatics & Language Learning, 12, 277-296.), ao analisar comparativamente o desdobramento de sequências de correção pelo outro entre aprendizes de inglês em dois cenários instrucionais (sala de aula regular e clube de conversação), revela já no título o entendimento de que “correção” e “reparo” são fenômenos separados. Destacando excertos semelhantes aos que analisamos adiante, observou sequências de correção pelo outro exposta que se tornam relevantes apenas depois de reparo sobre um problema de entendimento (p. 280). Ou seja, depois do reparo, os interagentes podem “embarcar numa nova ação, nesses casos, correção” (p. 292).

Kääntä (2014KÄÄNTÄ, L. 2014. From noticing to initiating correction: Student’s epistemic displays in instructional interaction. Journal of Pragmatics , 66, 86-105.) analisou uma sequência incomum em sala de aula - correção iniciada pelos alunos sobre fonte de problema produzida pelo professor -, observando que o aluno não apenas exibe conhecimento, mas também promove uma reconfiguração momentânea na dinâmica de participação (p. 102). Sublinhou que, “neste artigo, a correção, tal como ocorre na interação institucional e instrucional em sala de aula, é vista como diferindo da noção de reparo cotidiano” (p. 90) por ter relevância condicional própria: “inicia uma atividade interacional pela qual um aspecto errôneo é explicitamente sanado. Por isso, [a iniciação da correção] também apresenta um caso explícito de ação social” mediante a qual não apenas se exibe a posição epistêmica de quem corrige, mas também se desafia a de quem é corrigido (p. 90). Assim, a autora discute “implicações epistêmicas” específicas de correção frente a reparo.

Nesses estudos após Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.) que tratam de correção pelo outro, portanto, enquanto alguns autores partem de uma leitura insuspeitada sobre a relação entre reparo e correção (como fenômenos de mesma natureza, um sendo constituinte ou subtipo do outro), outros apontam dúvidas quanto aos seus limites12 12 . A partir da leitura de Schegloff et al. (1977), Kurhila (2006, pp. 24-26) lembra que às vezes a diferença entre a iniciação de reparo e a correção direta pelo outro pode ser obscura (especialmente quando a prática de You mean/Você quer dizer é usada). Observação no mesmo sentido é feita por McHoul (1990, pp. 367-371, 375-376). e indicam aspectos peculiares da correção pelo outro no universo da organização do reparo, sem, contudo, esclarecê-las.

2.1. Controvérsias sobre a relação entre reparo e correção pelo outro

A relação controversa entre reparo e correção foi objeto de discussão detalhada em Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.). Além de focar a dinâmica interacional da instrução em sala de aula (composta, entre outros recursos, por sequências de correção exposta) a partir da revisão de McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.)13 13 . Referindo-se a McHoul (1990) como “um dos tratamentos mais diretos da ordem sequencial da correção em sala de aula até hoje” (p. 705), Macbeth (2004) aponta como problema fundamental o corpus restrito a ocorrências de correção para o exame da organização geral de reparo, levando a conclusões distorcidas acerca de preferência e organização sequencial dos fenômenos. , Macbeth também apresentou uma proposta conceitual: a possibilidade de os fenômenos “reparo” e “correção” figurarem em diferentes domínios, pondo em xeque o pertencimento de sequências de correção pelo outro ao campo organizacional da sistemática de reparo.

Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) argumentou que, para que o interlocutor aponte um erro e sua substituição na produção do outro, realizando, assim, a correção, é preciso que não haja problema de entendimento mútuo entre os interagentes, ou seja, é necessário que eles tratem suas produções e ações como entendidas para todos os efeitos práticos da interação, conforme observado também por Kurhila (2006______. 2006. Second language interaction. Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins.) e Jefferson (2007JEFFERSON, G. 2007. Preliminary notes on abdicated other-correction. Journal of Pragmatics , 39(3), 445-461.). Antes de corrigir, é preciso que os participantes assegurem-se de que estão se entendendo, e uma das maneiras de fazer esse monitoramento do entendimento comum é iniciar reparo. Assim, enquanto o reparo estaria relacionado ao resgate da intersubjetividade, a correção estaria vinculada a outras ações, como instrução (não apenas em sala de aula), discordância, reclamação e acusação (ver também Jefferson, 1987JEFFERSON, G. 1987. On exposed and embedded correction in conversation. In: G. Button & J. R. E. Lee (orgs.). Talk and social organization (pp. 86-100). Hotwell Road, Bristol, Reino Unido: Multilingual Matters . ), sendo uma entre outras possíveis ações sequencialmente relevantes. Para Macbeth, apesar de pertencentes a domínios diferentes, a correção e o reparo são fenômenos cooperantes na fala-em-interação social, já que o reparo propicia a base de entendimento comum sobre o que os participantes estão fazendo, que é condição para que se possa corrigir alguém.

Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) sustenta sua proposta, em grande medida, na releitura de algumas passagens de Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.). Uma particularmente central discute as implicações da ocorrência rara de correções pelo outro:

Quando a escuta/compreensão de um turno é adequada para a produção de uma correção pelo outro, ela é adequada para permitir a produção de um próximo turno sequencialmente apropriado. (...) Eis uma outra base para a raridade empírica das correções pelo outro: aqueles que poderiam fazê-la produzem, em seu lugar, um próximo turno sequencialmente apropriado. (Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 380)

Ou seja, se é preciso entendimento intersubjetivo para todos os fins práticos (até aquele ponto na interação) para se produzir um próximo turno sequencialmente relevante, esse entendimento é também condição para corrigir alguém. Se as práticas de reparo têm por finalidade remover problemas de escuta, produção ou de compreensão para que a interação possa prosseguir, não haveria problema de entendimento (portanto, não haveria reparo) nos casos em que o interlocutor foi capaz de entender o que o falante disse a ponto de poder identificar que houve um erro e ainda indicar a solução (produzindo correção).

Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) analisou apenas dois segmentos próprios seus de fala-em-interação de sala de aula, ambos sequências de Iniciação-Resposta-Avaliação (doravante IRA)14 14 . A respeito de IRA, ver Cazden (2001), Garcez (2006) e Mehan (1979). Embora Macbeth (2004) reconheça que sequências de instrução direta (como IRA) não são o único contexto em que se encontram correções na fala-em-interação de sala de aula (p. 710), sua escolha de dados parece ter sido motivada por estabelecer contraste direto com as observações de McHoul (1990), fundamentadas justamente em sequências IRA. . No primeiro, inserem-se duas sequências de reparo15 15 . A análise da primeira ocorrência como reparo (iniciado pelo outro) nos parece questionável, visto que o que seria a fonte do problema está inaudível para o analista. Assim, não é possível saber se o turno foi produzido corretamente, mas não foi ouvido pelo interlocutor (o que caracterizaria reparo), ou se foi equivocadamente produzido e corrigido pelo interlocutor (o que caracterizaria correção). À análise desse dado, portanto, parece faltar sustentação êmica contundente para asseverar que se trata de sequência de reparo. sem correção exposta, uma vez que o aluno apresentou respostas “corretas” às perguntas do professor; no segundo, há duas correções que sofrem autoiniciação de reparo16 16 . Embora essas análises de autocorreção e correção pelo outro (professor) nos pareçam acertadas, há um ponto questionável: o autor analisa autointerrupção (cut-off) necessariamente como índice de reparo (o que nem sempre é o caso, como lembram Schegloff et al., 1977, p. 367, nota 13). .

Na última seção do artigo, Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) acrescentou breves análises de excertos de interações cotidianas de corpora de outros pesquisadores para argumentar que sua proposta de distinção entre correção e reparo é válida para a fala-em-interação em geral, não apenas para a de sala de aula. Dos três fragmentos de conversa cotidiana que Macbeth discutiu, dois envolviam um tipo particular de sequência: o reparo em terceira posição17 17 . Embora Macbeth não diga explicitamente que o excerto 9 tem um reparo em terceira posição, sua redação revela claramente que se trata disso: “temos uma iniciação de reparo, [Nancy] iniciando reparo sobre a audição de Steven da primeira repetição de Susan” (p. 728). , “a última oportunidade estruturalmente disponível para a defesa da intersubjetividade na conversa” (Schegloff, 1992SCHEGLOFF, E. A. 1992. Repair after next turn: The last structurally provided defense of intersubjectivity in conversation. American Journal of Sociology, 97(5), 1295-1345., p. 1304)18 18 . Essa observação diz respeito à possibilidade de detecção e reparo antes da conclusão da ação em curso. Os participantes podem detectar problemas de entendimento na continuidade de suas vidas, mas, nesses casos, as ações produzidas sob o entendimento depois visto como equivocado já terão tido seus efeitos. Para o fenômeno em interações em português brasileiro, ver Loder et al. (2004). . Essa trajetória de reparo, por sua organização sequencial peculiar, é menos passível de confusão com correção, o que favorece e torna mais persuasivo o contraste entre correção e reparo.

Ao fim, Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) deixa claro que seu “propósito não é esboçar uma estrutura formal de sequências de correção” (nota 23, p. 733) e que “coletar e examinar instâncias de correção para descobrir regularidades organizacionais (...) está bem além do caráter preliminar” do que pretende (p. 726). Em vez de leitura definitiva, propõe o debate conceitual sobre a interface reparo/correção19 19 . Conforme a conclusão do artigo: “Pode haver, então, tanto distinções conceituais quanto organizações técnicas que separam correção de reparo. A discussão aqui foi amplamente conceitual” (p. 730). .

Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.) também observou inconsistências no emprego das noções de “reparo” e “correção” particularmente em pesquisas sobre fala-em-interação de sala de aula. Partindo de estudos que combinam interesse em aquisição de segunda língua e em ACE, a autora apontou que, sob um mesmo termo (“correção”), são enquadradas atividades interacionais muito distintas: a restauração do entendimento entre as partes em conversa (correção como parte da trajetória de reparo) e a remediação de erros produzidos pelo aprendiz quanto ao conhecimento em pauta (correção como componente de trajetórias de instrução, particularmente em sequências IRA). Em reanálise de excertos de fala-em-interação de sala de aula examinados por outros pesquisadores (todos originalmente tratados como correção enquanto reparo), evidenciou reiteradamente não haver problemas de entendimento entre alunos e professores, mas sim o andamento normal de sequências instrucionais IRA, em que o professor sabe as respostas corretas de antemão e insiste que os alunos as produzam. Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.) destacou que tratar esses usos de “correção” como equivalentes, de modo que o segundo seja enquadrado como variação do primeiro, acaba por confundi-los, o que “esconde o trabalho distinto e importante que cada um faz” (p. 522). Assim, chama atenção para a importância de manter a precisão conceitual diante de “termos aparentemente semelhantes” (p. 523) e concorda com Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) que os fenômenos devem ser “mais apropriadamente compreendidos como ‘organizações cooperantes’” (p. 723).

Mais recentemente, Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.) resgatou o que foi proposto por Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) e ecoado em Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.). Embora reconheça que a discussão ainda não alcançou consenso, também se propôs a “repensar a relação entre reparo e correção de uma perspectiva da ACE” (p. 194). Analisando encontros em cenário escolar (aula de mandarim como segunda língua), observou sequências de “reparo e correção iniciados pela professora” (p. 175) sobre uma fonte de problema de um aluno e discutiu, em seções separadas, sequências de reparo (iniciado pela professora e levado a cabo pelo aluno falante da fonte de problema) e de correção (iniciada e levada a cabo pela professora). A autora conclui, alinhada com Macbeth e Hall, que “reparo e correção atingem fins interacionais distintos” (p. 194), já que, enquanto o reparo “torna visível o contingente processo de garantir a intersubjetividade, a correção serve para monitorar a produção linguística dos alunos e realizar o trabalho de ensinar” (p. 175), sem que haja “qualquer demonstração de entendimento problemático entre os participantes” (p. 178). Além disso, destaca a interdependência dos fenômenos: “(...) a intersubjetividade deve ser garantida antes que a correção ocorra, porque é na presença da intersubjetividade que a correção revela sua relevância para a instrução” (p. 194).

Assim, enquanto Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) e Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.) propõem que “correção” e “reparo” sejam termos usados para nomear fenômenos distintos (de modo que ações de correção deixem de ser consideradas trajetórias de reparo), Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.) propõe adjetivações a “correção” para marcar distinção semelhante20 20 . Respectivamente, por “correção instrucional” e “correção ACE”. . Opções terminológicas à parte, caminhos diferentes conduzem esses autores ao mesmo ponto: não apenas reconhecem imprecisões em torno das noções de “correção” e “reparo” tal como empregadas na literatura, mas também abordam isso centralmente em suas reflexões e apresentam propostas explícitas de reentendimento dos seus limites, visando contribuir para a clareza e precisão do debate acadêmico.

2.2. Correção pelo outro e RILCO em português brasileiro

Investigando interações cotidianas em português brasileiro, Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.) constataram a raridade do fenômeno (28 ocorrências em um universo de 15 horas de interações cotidianas), atrasos antes de RILCO e modalizações no turno do corretor, observações semelhantes às já disponíveis na literatura até então (tendo por base principalmente interações em inglês norte-americano). Adicionalmente, discutiram duas características de RILCO: a proximidade com a ação de discordar - já observada por Goodwin (1983GOODWIN, M. H. 1983. Aggravated correction and disagreement in children’s conversations. Journal of Pragmatics , 7(6), 657-677.) e discutida centralmente em Loder (2006LODER, L. L. 2006. Investindo no conflito: a correção pelo outro construindo discordâncias agravadas [Dissertação de mestrado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/8035.
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) - e o desdobramento sequencial após o turno corretivo: dada a exposição do lapso do falante da fonte de problema, os participantes se orientam para que o corrigido tome a palavra e se explique de alguma maneira (justificando a produção do erro, registrando o item correto como novidade etc.).

Embora apontassem esses aspectos peculiares ao RILCO em conversa cotidiana, Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.) equiparavam-no à correção pelo outro, sugerindo que a organização de reparo estaria calcada na “grade de quatro células” (discutida acima). Foi apenas na continuidade dos estudos sobre reparo e correção pelo outro, com desdobramentos posteriores (Loder, 2006LODER, L. L. 2006. Investindo no conflito: a correção pelo outro construindo discordâncias agravadas [Dissertação de mestrado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/8035.
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; Kanitz et al., 2010KANITZ, A. 2010. Rediscutindo correção e reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na fala-em-interação de sala de aula [Trabalho de conclusão de curso de graduação]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/25990.
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; Kanitz, 2010KANITZ, A.; LODER, L. L. & GARCEZ, P. M. 2010. Correção e reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na fala-em-interação de sala de aula: retomando o debate. XXII Salão de Iniciação Científica (Livro de resumos). Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/45993.
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) à luz de trabalhos mais recentes de outros autores (p. ex.: Macbeth, 2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.; Land & Kitzinger, 2005LAND, V. & KITZINGER, C. 2005. Speaking as a lesbian: Correcting the heterosexist presumption. Research on Language and Social Interaction, 38(4), 371-416.; Hall, 2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.; Cheng, 2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.), que se foi estabelecendo a revisão aqui em retrospectiva.

Assim, o seu enquadramento como trajetória de reparo é o que merece reanálise, o que ora propomos, em discussão encadeada com Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.).

3. Análises: fazer reparo e corrigir alguém em interações de ocorrência natural

Ao buscar, no acervo de registros audiovisuais de fala-em-interação21 21 . Registros de interações obtidos com o consentimento informado dos participantes (Loder, 2008b, pp. 147-149; Garcez et al., 2014). do Grupo de Pesquisa Interação Social e Etnografia22 22 . Em atividade desde 2001 no Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq. , potenciais ocorrências de correção pelo outro, reunimos uma coleção de segmentos de conversa, parte da qual já havia subsidiado Garcez e Loder (2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.), a que foram acrescidas ocorrências de correção pelo outro em sala de aula. Dessa coleção ampliada, escolhemos dois segmentos para exame detalhado aqui. O primeiro é excerto de interação institucional face a face em sala de aula (ver Garcez, 2006GARCEZ, P. M. 2006. A organização da fala-em-interação na sala de aula: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, 4(1), 66-80., p. 73), não implicado em sequência IRA. O segundo excerto é de conversa face a face registrada em áudio. Rediscutir os fenômenos de reparo e correção pelo outro a partir de sequências (institucionais e cotidianas) em que os participantes não estivessem já de antemão orientados para a produção de correção23 23 . Entretanto, é relevante lembrar, com Macbeth (2004), que “se a (re)produção de conhecimento é a tarefa da instrução em sala de aula, a produção de conhecimento correto e, portanto, de correção, inevitavelmente torna-se parte da organização prática e profissional do cenário e uma das orientações prevalentes dos participantes na sala” (p. 721), de modo que a correção está, a todo tempo, iminente em sala de aula. (diferentemente dos dados de trabalhos anteriores, ver seção 2.1) nos pareceu escolha adequada para propiciar contribuições ao debate.

As ocorrências foram transcritas conforme as convenções da ACE (Psathas & Anderson, 1990PSATHAS, G. & ANDERSON, T. 1990. The ‘practices’ of transcription in conversation analysis. Semiotica, 78(1/2), 75-99.; Gago, 2004GAGO, P. C. 2004. Questões de transcrição em Análise da Conversa. Veredas, 6(2), 89-113.; Loder, 2008b______. 2008b. O modelo Jefferson de transcrição: convenções e debates. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Fala-em-interação social: Introdução à Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 127-161). Campinas, SP: Mercado de Letras.) para a análise sequencial detalhada a seguir.

3.1. “Não é bules, é bule”: reparo e correção pelo outro na fala-em-interação de sala de aula

Nesta seção, retomamos e ampliamos a análise, já empreendida por Salimen e Conceição (2009SALIMEN, P. M. & CONCEIÇÃO, L. E. 2009. Reparo, correção e avaliação na fala-em-interação de sala de aula. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 99-122). Campinas, SP: Mercado de Letras .)24 24 . Embora seu foco analítico fossem os diferentes modos de “fazer sala de aula”, Salimen e Conceição (2009) já dão passos na direção do que propomos aqui ao fazerem distinção entre corrigir e fazer reparo, sinalizados como fenômenos de naturezas diferentes. , de um excerto de interação em sala de aula de uma turma do terceiro ano do segundo ciclo (equivalente a 6º/7º ano do Ensino Fundamental), em que Sílvia, depois de ter se engajado em sequência de reparo com interlocutores acerca de um item, aponta-o como problemático e propõe sua substituição. Os participantes estão divididos em grupos, trabalhando na resolução de uma lista de 26 charadas destacadas por Sílvia do livro Brincando de adivinhar, de Ricardo Azevedo, cuja obra vinha sendo estudada pela turma no âmbito de um projeto de aprendizagem. Neste momento da aula, enquanto Sílvia circula pela sala e conversa com um grupo, os participantes de outro grupo (Alex, Hélio e Álvaro) solicitam sua ajuda (com Alex balançando a folha de papel com os exercícios). Sílvia se aproxima do grupo:

Aproximando-se do grupo e olhando para um dos integrantes que balançava a folha com as charadas, Sílvia, na linha 01, produz o quê que é isso, orientando-se para o recurso que Alex usa para chamar sua atenção. Depois de um turno de fala de Alex inaudível para transcrição, Sílvia instrui (linha 4) que as respostas devem ser redigidas a caneta, não a lápis. Hélio registra recebimento do turno de Sílvia (linha 5), que toma o turno novamente, produzindo fala parcialmente inaudível ((° °) mas não belisca). A seguir, Alex produz mais um turno inaudível (linha 8), em resposta ao qual Sílvia produz uma confirmação (é. esse aí. o segundo.).

Depois de uma pausa, Alex (linha 10) inicia o que parece ser uma busca por confirmação de entendimento sobre o turno de Sílvia, introduzindo, para isso, o item bules. Em lugar de (des)confirmar o entendimento, Sílvia, após atraso na linha 11, inicia reparo de classe aberta (q- o quê?, na linha 12). Alex, a seguir, produz outro turno inaudível (linha 14), que é respondido por Sílvia na linha 15 (n(h)ão, o outro.), parecendo indicar que a resposta de Alex (linha 14) fugiu do foco do questionamento de Sílvia em 12.

Em resposta à solicitação de Sílvia, Hélio e Álvaro (linhas 16 e 17) se autosselecionam e respondem em sobreposição, dizendo bules, repetindo o item anteriormente mencionado por Alex na linha 10. Após atraso25 25 . Novamente, tal como antes, nas linhas 11-12, os atrasos revelam a despreferência pela iniciação de reparo pelo outro, conforme destacaram Salimen e Conceição (2009, p. 107). Ver também Schegloff et al. (1977, p. 376). , Sílvia, ainda perseguindo o item inicialmente produzido por Alex e repetido por Hélio e Álvaro, inicia reparo novamente (linha 19), agora mediante prática que localiza a fonte de problema, passando de um o quê? genérico (Drew, 1997DREW, P. 1997. ‘Open’ class repair initiators in response to sequential sources of troubles in conversation. Journal of Pragmatics , 28(1), 69-101.) para uma repetição do item reparável26 26 . O excerto analisado em Cheng (2014, p. 181) tem desdobramento semelhante: sucessivas iniciações de reparo com iniciadores progressivamente mais precisos na localização da fonte de problema. . Álvaro responde (é sora.), confirmando a propriedade do item. Pela terceira vez na sequência, Sílvia (linha 21) inicia reparo, agora focando bules. Mais uma vez, os participantes produzem o item, em sobreposição (Álvaro repete bules na linha 22, e Hélio leva a cabo o reparo, produzindo uma explicação da função do bules, linha 23). Tendo suas iniciações de reparo suscitado resultados confirmatórios do item bules por parte de Álvaro e Hélio, Sílvia propõe, então, a substituição desse item (incorreto) por outro (correto): não é bules, é bule (linha 24). Tal proposta de substituição é, por sua vez, imediatamente ratificada nos turnos seguintes pela repetição de Hélio e Alex (linhas 26 e 27) e, a seguir, justificada por Sílvia, na linha 28 (ali é só um bule, não tem mais de um bule ali).

Por um lado, não parece haver controvérsia em torno da análise de que, entre os turnos das linhas 10 a 23, é coconstruída uma sequência de reparo. Há repetidas iniciações de reparo pelo outro (Sílvia), potencialmente indicando algum problema de audição ou de entendimento em relação ao item produzido pelos demais participantes. Valendo-se de práticas de iniciação de reparo cada vez mais precisas quanto à localização da fonte de problema, Sílvia indica repetidamente seu problema com uma mesma fonte (bules). Na resolução do reparo, Alex, Hélio e Álvaro acabam por formar um time, alinhando-se como conhecedores do que é bules. Se é Alex quem primeiro menciona o item problemático (linha 10), Hélio e Álvaro o retomam e repetem, sustentando sua adequação e, assim, alinhando-se a Alex. O alinhamento dos três como um time é observável também na dinâmica de tomada de turnos na sequência: Alex, Hélio e Álvaro se colocam como legítimos candidatos para autosseleção após cada nova iniciação de reparo de Sílvia.

Por outro lado, o que se passa a partir da linha 24 poderia ser mais controverso. A ação realizada por Sílvia quando diz não é bules, é bule. poderia ter sido analisada com instância de RILCO. Com bule, Sílvia estaria em um só turno apontando um problema em turno anterior (bules) - assim iniciando reparo - e oferecendo resolução para o problema por meio de correção (substituição de um item por outro) - levando a cabo o reparo. No entanto, um olhar pós-Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) e Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.) leva a análise distinta.

Considerando que os participantes se valem da sistemática de reparo fundamentalmente para contornar problemas de escuta, produção e compreensão que põem em risco a intersubjetividade, não parece ser essa a razão do turno de Sílvia da linha 24. Ao ser capaz de destacar o problema (não é bules) e propor bule como substituto de bules, ela demonstra ter escutado e compreendido satisfatoriamente o que foi dito pelos interlocutores (pelo menos nos turnos das linhas 22 e 23). Assim, no momento em que produziu a correção, Sílvia não tinha problema de entendimento que pudesse pôr em risco a intersubjetividade entre os participantes. Somente depois de se certificar, por meio de reparos apenas iniciados por ela nas linhas 12-23, de que o item bules era, de fato, sustentado por seus interlocutores como uma palavra correta (não havendo, portanto, nenhum problema de produção, nem de entendimento), Sílvia produz a correção na linha 24. Essa análise alternativa destaca que Sílvia só foi capaz de apontar o item problemático e corrigi-lo porque o entendeu. Nesse sentido, o que Sílvia faz ao propor a substituição de bules por bule configura-se simplesmente como correção pelo outro, antecedida por uma sequência de reparo iniciado pelo outro e levado a cabo pelo time falante da fonte de problema.

Cabe lembrar que, diferentemente dos dados de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.), esse excerto não se insere em sequência convencional na fala-em-interação de sala de aula (isto é, IRA). Tem-se aqui um pedido de ajuda do aluno dirigido a Sílvia (Salimen, 2016SALIMEN, P. G. 2016. A realização interacional de atividades pedagógicas em uma sala de aula de língua adicional pautada por projetos: reflexões para o planejamento de tarefas além do enunciado [Tese de doutorado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/150309
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; Jakonen, 2015JAKONEN, T. 2015. Handling knowledge: Using classroom materials to construct and interpret information requests. Journal of Pragmatics , 89, 100-112.; Stein, 2017STEIN, F. 2017. “O trabalho em grupo qualifica a aprendizagem”: realização de atividades pedagógicas colaborativas e construção conjunta de conhecimentos na fala-em-interação de sala de aula [Dissertação de mestrado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/170786.
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) do qual emergem o reparo e, depois, a correção pelo outro. Ainda assim, como em IRA, é Sílvia quem inicia um novo movimento (nesse caso, o reparo), são os alunos que produzem a resposta (o resultado do reparo) e, ao fim, é Sílvia quem avalia (nesse caso, com uma correção pelo outro), tornando-se, portanto, uma atividade de instrução [Sílvia inclusive explica por que o erro foi assim avaliado (linha 28)].

Desse modo, a sequência, que inicia com o que parece ser uma genuína verificação de entendimento/audição (linha 12), vai se tornando, pelas repetidas iniciações de reparo, um recurso para levar os alunos a expor seu domínio linguístico (ou falta dele), que, ao ficar claramente observável, é alvo de tratamento corretivo (linha 24). Observe-se que, neste turno, Sílvia não apenas instrui (papel alegadamente justificável da escola), provendo informação nova a seus interlocutores, mas, ao fazê-lo mediante uma correção pelo outro, também revela sua posição epistêmica, isto é, projeta ter mais acesso e conhecimento sobre um determinado domínio (no caso, a forma correta das palavras) do que seus interlocutores, como mais conhecedora (Heritage, 2013______. 2013. Epistemics in conversation. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The Handbook of conversation analysis (pp. 370-394). Malden, MA, USA: Blackwell-Wiley.)27 27 . Ver também Salimen e Conceição (2009, pp. 108-109) e Cheng (2014). .

Entretanto, o engajamento dos demais participantes na sequência, Hélio e Álvaro em especial, revela que eles não projetavam uma sequência de avaliação28 28 . Ou seja, eles não projetam a sequência de iniciação de reparo como pré-correção pelo outro. Para análise de iniciação de reparo pelo outro como pré-sequência de outras ações, ver Schegloff (2007, p. 103). . Diferentemente de sequências IRA, em que a insistência do professor em problematizar um item antes de proferir a avaliação pode ser indício da inadequação da resposta do aluno (levando-o a produzir respostas alternativas diversas)29 29 . Como destaca Macbeth (2004), em sequências de IRA, “rotineiramente repetição de perguntas são também ouvidas como marcas de uma resposta equivocada” (p. 719). , no presente excerto, os alunos insistem, com cada vez mais veemência, no item apontado por Sílvia desde o início como problemático, repetindo-o (linhas 16, 17 e 22) e parafraseando-o (linha 23). É apenas quando Sílvia faz a correção exposta (linha 24) e os demais registram seu recebimento (a partir das linhas 26 e 27) que todos se orientam para a sequência como um momento de instrução e avaliação. Ademais, ao dar recibo da correção sem protestos (linhas 26 e 27), os interlocutores ratificam a posição epistêmica de Sílvia, expressa no turno corretivo. Assim, a correção pelo outro traz, ao primeiro plano interacional, a exposição de diferentes posições epistêmicas, até então insuspeitas pelo menos para Alex, Hélio e Álvaro.

Mesmo que não seja sempre possível delimitar, nitidamente, até que ponto a sequência de reparo é usada estritamente para os propósitos de reparo a produção/entendimento e a partir de que ponto ela passa a ser empregada como “veículo ou instrumento” (Schegloff, 1997______. 1997. Practices and actions: boundary cases of other-initiated repair. Discourse Processes, 23(3): 499-545., p. 505) para outras ações (até porque, como se argumentou acima, esse entendimento não parece ser uniforme entre os próprios participantes), o excerto exibe com clareza o ponto analítico que queremos sustentar: a distinção entre corrigir e fazer reparo. Antes de Sílvia corrigir diretamente a produção de Álvaro, Hélio e Alex, houve sequência de reparo. Foi apenas após resolvido o reparo (com a explicitação do item “errado”) que a correção pelo outro pôde ser feita. Assim, a observação de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) de que fazer reparo e corrigir estão em domínios que operam em conjunto (p. 703), um dando subsídio para o outro, confirma-se na análise desse excerto de interação instrucional.

3.2. “Começou com um jogo de vôlei”: reparo e correção pelo outro na conversa cotidiana

No excerto de conversa cotidiana abaixo, duas jovens estão na cozinha de casa preparando o lanche da noite. O excerto inicia com Selma evocando uma narrativa de Mariana (linha 01), que, conforme Mandelbaum (2013MANDELBAUM, J. 2013. Storytelling in conversation. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The handbook of conversation analysis (pp. 491-507). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell ., p. 497), é uma das maneiras explícitas de sinalizar a suspensão da sistemática de tomada de turnos para garantir a oportunidade de narrativas.

Na caracterização do relato que Selma convida Mariana a fazer (história dos surdos no jogo, linha 02), Mariana identifica um problema de entendimento: após silêncio (linha 03), Mariana inicia reparo com que jo:go, (linha 04). Com isso, Mariana suspende a próxima ação sequencialmente relevante (o início do relato propriamente dito) para que se resolva o problema do referente, que é central para Mariana identificar, no rol de informações que têm, qual é a história esperada. Na sequência, em seguida de um silêncio, Selma refaz seu turno anterior rearranjando os termos que já constavam (surdos e jogo) a fim de esclarecer o problema de entendimento apontado por sua interlocutora: o jogo de futebol de surdos::: (linha 06). Em seguida de um silêncio longo (linha 07), Mariana toma o turno com um ah (com ênfases de volume de voz e prolongamento de som), que registra o recebimento do reparo30 30 . Trata-se de um change-of-state token (Heritage, 1984). Embora a presença desse elemento não seja obrigatória em encerramentos de problemas de entendimento, nem seja prova de que houve o pleno alcance da intersubjetividade, quando ocorre, sinaliza publicamente uma mudança de status informacional do participante. e, em seguida, inicia a correção sobre o turno anterior de Selma: não era só futebol (linha 08). Antes que Mariana possa concluir a correção, Selma se vale de um lugar relevante para transição de turno (ver Sacks et al., 1974SACKS, H.; SCHEGLOFF, E. A. & JEFFERSON, G. 1974. A simplest systematics for the organization of turn-taking for conversation. Language, 50(4), 696-735.) em meio à correção iniciada por Mariana para sinalizar uma preocupação com o registro sonoro da conversa (é que se tu ficar aí não va::i::-, na linha 10), já que Mariana aparentemente estaria a uma distância grande do gravador31 31 . Nesse contexto, poder-se-ia até especular que essa interrupção revela que Selma está mais preocupada com “gravar a conversa” (para cumprir a tarefa acadêmica da qual a gravação faz parte) do que com genuinamente ouvir o relato, mas explorar esta ilação está para além dos objetivos deste artigo. . A esta demanda de Selma, Mariana responde, se solidarizando com a (ou, pelo menos registrando o recebimento da) preocupação (com tá:), mas alegando impedimento de mudar de posição (eu tenho que cuidar a torr:ada minha querida:, linhas 12 e 13). Fechando essa sequência inserida, Selma produz um riso em volume baixo (linha 14) e, depois de uma pausa (linha 15), Mariana recicla a correção anteriormente iniciada (linhas 16 e 17): não era só futebol começou com jogo de vôlei-, que, de certo modo, ao mesmo tempo, já dá início à própria narrativa que havia sido evocada. A sequência segue, depois de um silêncio, com sobreposição entre a projetada continuação da narrativa de Mariana (linha 20) e nova provocação de Selma (linha 19), à qual Mariana responde (linha 22) e Selma comenta (linha 23).

Observe-se que o item jogo torna-se alvo de duas ações distintas, mas que se colocam em sequência neste excerto. Das linhas 02 a 08, as participantes constroem uma sequência de reparo (iniciada pelo outro em 04, resolvida pelo produtor da fonte de problema em 06 e recebida pelo outro em 08) pautada sobre um problema de intersubjetividade: Mariana não pode produzir o relato sem antes ter claro o referente de jogo. É apenas depois disso resolvido (o que está sinalizado pelo recibo de Mariana na linha 08) que se torna relevante uma outra ação, ainda preambular ao relato propriamente dito: Mariana identifica um erro na concepção de Selma sobre o evento a ser narrado. Assim, das linhas 06 a 17 (descontando-se a sequência inserida das linhas 10 a 14), constrói-se a correção pelo outro. Desse modo, as ações de reparo (de um referente) e correção (de uma informação) se mostram interdependentes: a segunda só pode ocorrer uma vez encerrada a primeira. Observe-se ainda que, esclarecido o problema de entendimento, Mariana poderia iniciar a narrativa já na linha 08, “deixando passar” a informação imprecisa (cf. Jefferson 2007JEFFERSON, G. 2007. Preliminary notes on abdicated other-correction. Journal of Pragmatics , 39(3), 445-461. e Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 380) ou até fazendo uma correção inserida (cf. Jefferson, 1987JEFFERSON, G. 1987. On exposed and embedded correction in conversation. In: G. Button & J. R. E. Lee (orgs.). Talk and social organization (pp. 86-100). Hotwell Road, Bristol, Reino Unido: Multilingual Matters . ) durante a narrativa. Entretanto, ela produz a correção exposta, que é antecedida de uma longa pausa (linha 07): mesmo que possa ser, aos olhos de Mariana, informacionalmente relevante (talvez no intuito de ajustar as expectativas da plateia quanto ao iminente relato, isto é, os fatos extrapolam jogo de futebol), a correção pelo outro é produzida com atraso, indiciando a atenção de Mariana ao caráter delicado da correção, que, por imputar ignorância ao interlocutor, poderia ser entendida como grosseria ou implicância (ver também seção 4).

Ao longo desse excerto também se revela a orientação das participantes para suas diferentes posições epistêmicas, o acesso desigual à narrativa. Selma, ao iniciar a sequência convidando Mariana a tomar à frente e ao dirigir-lhe perguntas (linhas 1, 2 e 19), projeta a expectativa de que ela saiba mais. Mariana, ao aceitar a incumbência, ratifica essas posições. E, ao corrigir o outro, amplifica essa desigualdade, sublinhando novo foco de desconhecimento de Selma e trazendo-o à tona antes da narrativa: Selma não só ignora o enredo (como foi o jogo), mas também a(s) modalidade(s) esportiva(s) envolvida(s). Sem protesto à correção de Mariana, Selma chancela a posição de mais conhecimento da interlocutora.

Por fim, é relevante destacar que esse excerto difere daquele analisado na seção 3.1 em termos de número de participantes e turnos (aqui tanto reparo quanto correção se resolvem em poucos turnos), entendimento dos participantes sobre “o que estão fazendo” (aqui parece não haver diferença entre eles) e implicações para a continuidade do encontro (aqui, sem interface com questões pedagógicas). Difere também quanto ao surgimento de questões epistêmicas ao longo da sequência: lá as posições desiguais são exibidas apenas quando da correção pelo outro; aqui, desde o princípio, os participantes sinalizam posições desiguais32 32 . Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por esta observação. , mas elas são amplificadas com a correção pelo outro.

Apesar disso, ambos os excertos se assemelham fundamentalmente pela organização estrutural: envolvem sequência de reparo iniciado pelo outro (resolvendo problema de entendimento) imediatamente seguida de sequência de correção pelo outro (expondo/sublinhando posições desiguais), a segunda ação condicionada à resolução da primeira. Ambos evidenciam, portanto, o trabalho distinto em cada uma dessas ações. Espera-se, com isso, ter revelado como o ponto analítico levantado no início deste Debate se aplica também à conversa cotidiana.

4. Retomando a caracterização dos domínios de reparo e correção pelo outro

Nos excertos analisados, destacamos a organização sequencial das ações de fazer reparo e corrigir o outro, apontando sua interface e suas distinções. Fundamentalmente, observamos que, enquanto a ação de fazer reparo é coconstruída em torno de efetivo problema de intersubjetividade, a ação de corrigir o outro parte da presunção de que houve entendimento, para todos os fins práticos, quanto ao que esteja sendo “corrigido”. Em caso de suspeita de que o entendimento intersubjetivo esteja comprometido, os participantes, como vimos, iniciam a negociação desse entendimento (reparo) para, apenas depois, produzir outras ações relevantes (a correção pelo outro entre elas). Assim, a proposta de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) para caracterizar correção pelo outro e distingui-la de reparo revelou-se, de modo geral, adequada também aos nossos dados (tanto em conversa cotidiana quanto em fala-em-interação de sala de aula), com o reparo resultando em ajustes para o entendimento mútuo, e a correção, em exposição de posições epistêmicas desiguais.

Recordemos que, conforme o próprio Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) explicita, é de ordem conceitual a proposta de distinção que fez entre reparo e correção. Portanto, nossa discordância de alguns pontos das suas análises (conforme seção 2.1 acima) não impede que concordemos com a parte conceitual de sua proposta. Neste artigo, analisamos excertos que, esperamos, mostram isso.

Uma particularidade sequencial distingue nossos dados dos de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.): nos nossos, as ações de fazer reparo e corrigir não acontecem concomitantemente, mas sim sucessivamente. Antes da sequência de correção, os participantes coconstruíram uma sequência dedicada ao reparo, visando ao restabelecimento da intersubjetividade. Assim, a condição para poder corrigir o outro foi, antes, fazer reparo (ver também Hauser, 2010HAUSER, Eric. 2010. Other-correction of language form following a repair sequence. Pragmatics & Language Learning, 12, 277-296.). O fato de não haver de antemão expectativa por correção pelo outro (diferentemente das sequências IRA, foco de análise de Macbeth, 2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) reforça, uma vez mais, o argumento: também em sequências em que reparo e correção pelo outro são produtos emergentes, a proposta dos fenômenos como distintos se mantém.

Ademais, o fato de que os dois fenômenos estavam observáveis em cada um dos excertos, espera-se, facilitou a visualização sintética das diferenças e cooperação entre eles. Isso não significa, no entanto, que toda instância de correção pelo outro deva ser antecedida de reparo, nem toda instância de reparo seguida de correção. Uma vez compreendido o fundamento da distinção proposta, as análises de ocorrências desses fenômenos em qualquer contexto interacional passam a ser também independentes.

Observamos também que, embora a correção pelo outro possa estar relacionada “ao caráter normativo do trabalho típico de contextos instrucionais” (Käänta, 2014KÄÄNTÄ, L. 2014. From noticing to initiating correction: Student’s epistemic displays in instructional interaction. Journal of Pragmatics , 66, 86-105., p. 9033 33 . Também Cheng (2014, p. 195). ), ela não é peculiar à fala-em-interação de sala de aula. Sua ocorrência em conversa cotidiana também implica domínios desiguais de conhecimento, podendo eventualmente carregar inclusive “uma insinuação de instrução, até mesmo censura” (Koschmann, 2016______. 2016. “No! That’s not what we were doing though”: Student-initiated other-correction. Éducation & Didactique, 10(1) 39-48., p. 40). Assim, independentemente do cenário e de eventuais informações contextuais, a construção da correção pelo outro sinaliza e torna sequencialmente relevantes essas posições epistêmicas desiguais.

A recepção das ideias de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) sobre a distinção de que nos ocupamos aqui, até onde pudemos localizar, parece bastante limitada. O artigo é quase sempre citado, em breves linhas, por seu enfoque principal: a organização do discurso de sala de aula (Gardner, 2013GARDNER, R. 2012. Conversation analysis in the classroom. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The handbook of conversation analysis (pp. 593-611). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell., p. 604; Haakana & Kurhila, 2009HAAKANA, M. & KURHILA, S. 2009. Other-correction in everyday interaction: Some comparative aspects. In: M. Haakana; M. Laakso & J. Lindström (orgs.). Talk in interaction: Comparative dimensions (pp. 152-179). Helsinque, Finlândia: Finnish Literature Society., p. 155; Hauser, 2010HAUSER, Eric. 2010. Other-correction of language form following a repair sequence. Pragmatics & Language Learning, 12, 277-296., p. 278; Hellermann, 2011HELLERMANN, J. 2011. Members’ methods’, members’ competencies’: Looking for evidence of language learning in longitudinal investigations of other-initiated repair. In: J. K. Hall; J. Hellermann & S. Pekarek-Doehler (orgs.). L2 Interactional Competence and Development (pp. 147-172). Hotwell Road, Bristol, Reino Unido: Multilingual Matters., p. 149; Kitzinger 2012KITZINGER, C. 2012. Repair. In J. Sidnell & T. Stivers (Orgs.), The handbook of conversation analysis (pp. 229-256). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell ., p. 256; Koole, 2012KOOLE, T. 2012. A conversation analytic study of gestures that engender repair in ESL conversational tutoring. In: G. Rasmussen; C. E. Brouwer & D. Day (orgs.). Evaluating cognitive competences in interaction (pp. 43-66). Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins., p. 43; Lehti-Ekhlund, 2013LEHTI-EKLUND, H. 2013. Code-switching to first language in repair - A resource for students’ problem solving in a foreign language classroom. International Journal of Bilingualism, 17(2), 132-152., p. 137; Mondada, 2011MONDADA, L. 2011. Understanding as an embodied, situated and sequential achievement in interaction. Journal of Pragmatics , 43(2), 542-552., p. 545; Radford, 2008RADFORD, J. 2008. Practices of other-initiated repair in the classrooms of children with specific speech and language difficulties. Applied Linguistics , 31(1), 25-44., p. 26; Seo & Koshik, 2010SEO, M-S. & KOSHIK, I. 2010. A conversation analytic study of gestures that engender repair in ESL conversational tutoring. Journal of Pragmatics , 42(8), 2219-2239., p. 2219), particularmente quando se fala na sequência IRA ou em correção. Em alguns casos, há menção ao fato de que Macbeth questiona o status da correção como reparo (Gardner, 2012GARDNER, R. 2012. Conversation analysis in the classroom. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The handbook of conversation analysis (pp. 593-611). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell., pp. 604-605; Koschmann, 2013KOSCHMANN, T. 2013. Conversation analysis and collaborative learning. In: C. E. Hmelo-Silver; C. Chinn; C. K. K. Chan & A. O’Donnell (orgs.). The international handbook of collaborative learning (pp. 149-167). Londres, Reino Unido: Routledge., p. 162; Mori & Zuengler, 2008MORI, J. & ZUENGLER, J. 2008. Discourse and Education. In: M. Martin-Jones; A. M. de Mejía & N. H. Hornberger (orgs.). Encyclopedia of Language and Education, 2a. edição, volume 3. pp. 15-26). New York: Springer., p. 19; Zemel & Koschmann, 2011ZEMEL, A. & KOSCHMANN, T. 2011. Pursuing a question: Reinitiating IRE sequences as a method of instruction. Journal of Pragmatics , 43(2), 475-488., pp. 486-487), mas raras são as apreciações (problematizações, oposições ou questionamentos) explícitas à provocação conceitual de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) a propósito da interface reparo/correção, de modo a fazer a questão avançar34 34 . Conforme destacado nas seções iniciais, temos notícia apenas de Hall (2007) e Cheng (2014). .

Uma consequência importante dessa proposta de releitura Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) é o fato de que a “grade de quatro células” (ver seção 2 acima), por muitos tomada como síntese do entendimento sobre a organização do reparo35 35 . Inclusive por nós, em trabalhos anteriores (Loder et al., 2004; Garcez & Loder, 2005). , é posta em xeque, uma vez que a célula correspondente a RILCO deixaria de figurar entre as trajetórias de reparo, para ser, agora, mais bem enquadrada como fenômeno de outra natureza. Na verdade, Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.) não chegam a apresentar um tal quadro de quatro células (apesar de darem vazão a essa leitura pela apresentação resumida das combinações de iniciação e resolução do reparo, pp. 364-365). Tampouco parecem interessados em fazer um levantamento exaustivo de todas as possíveis trajetórias de reparo, mas sim analisar centralmente os autorreparos (sua coconstrução e a orientação dos participantes de privilegiar sua ocorrência, revelando-se, assim, preferida), deixando a discussão da correção pelo outro para uma brevíssima seção final. Embora, em artigo mais recente, Schegloff et al. (2002SCHEGLOFF, E. A.; KOSHIK, I.; JACOBY, S. & OLSHER, D. 2002. Conversation analysis and applied linguistics. Annual Review of Applied Linguistics , 22, 3-31.) explicitem que é possível alguém fazer correção sem se engajar em uma sequência de reparo (por exemplo, correção inserida)36 36 . Kitzinger (2012) também observa que “as falantes têm maneiras de ‘corrigir’ ou ‘desambiguar’ a própria conversa e a de outras pessoas sem envolver a tecnologia de reparo (...). As várias maneiras pelas quais as pessoas ‘corrigem’ possíveis problemas ao falar, ouvir ou entender, ao mesmo tempo que evitam que elas subam à superfície da conversa como reparo aberto, merecem muito mais exploração” (p. 255). , não chegam a resgatar (e, eventualmente, reelaborar), na íntegra, a caracterização de correção de 1977.

Apesar de seu reenquadramento fora do domínio da organização do reparo, a caracterização da correção pelo outro (sua estrutura e suas implicações sequenciais), tal como descrita na literatura em ACE, permanece. A correção pelo outro segue sendo uma ação delicada e custosa para os interlocutores, já que poderia ser interpretada “como uma desfeita, um insulto ou [...] até mesmo ser mencionada como evidência de grosseria deliberada, o que, a seguir, pode comprometer a harmonia ou a conciliação” do encontro (Hutchby e Wooffitt, 1998HUTCHBY, I. & WOOFFITT, R. 1998. Conversation analysis: Principles, practices and applications. Cambridge, Reino Unido: Polity Press., p, 68). Isso é evidenciado por atrasos e mitigações na construção da correção (ver Garcez e Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312., pp. 295-300). Nos excertos aqui analisados, os atrasos se dão justamente pela coconstrução da sequência de reparo: após a produção de um item problemático (seja o item bules, seja o item jogo de futebol), a correção pelo outro não é produzida imediatamente, mas sim apenas após o encerramento da sequência de reparo. No excerto 2, a existência de atraso mesmo depois de encerrado o reparo é mais uma evidência da atenção dos participantes para isso. Mantém-se, assim, o entendimento de que a correção do outro é uma ação despreferida (de acordo com a acepção de despreferência em ações iniciais caracterizada principalmente por evitamento, conforme exposto em Pomerantz e Heritage, 2013POMERANTZ, A. & HERITAGE, J. 2013. Preference. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The handbook of conversation analysis (pp. 210-228). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell ., p. 217). Contudo, em vez de contrastar com outras trajetórias de reparo, a correção do outro está em relação com outras ações alternativas que tenham relevância condicional numa determinada sequência. Numa leitura atenta de Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.), observa-se que essa concepção já estava lá: “Quando a escuta/compreensão de um turno é adequada para a produção de uma correção pelo outro, ela é adequada para permitir a produção de um próximo turno sequencialmente apropriado” (p. 380; ver também seção 2.1).

A correção pelo outro também permanece revelando imputações de lapsos na produção do participante corrigido, ao mesmo tempo em que alça o corretor à posição de mais conhecedor sobre a questão em pauta (definição de bules versus bule e jogo de futebol versus começou com jogo de vôlei) (ver também Jefferson, 1987JEFFERSON, G. 1987. On exposed and embedded correction in conversation. In: G. Button & J. R. E. Lee (orgs.). Talk and social organization (pp. 86-100). Hotwell Road, Bristol, Reino Unido: Multilingual Matters . , Garcez & Loder 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312., pp. 301-5), o que, mais recentemente, passou a ser nomeado em ACE como “posição epistêmica” (Heritage, 2013______. 2013. Epistemics in conversation. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The Handbook of conversation analysis (pp. 370-394). Malden, MA, USA: Blackwell-Wiley.). Por conta disso, muitas vezes, a correção pelo outro “cria [um trabalho extra] para o interlocutor corrigido (...) de ter que lidar interacionalmente com a exposição de seu lapso” (Garcez & Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312., p. 305), o que envolve novo turno do corrigido logo após a correção pelo outro para apresentar um recibo (no sentido de incorporar o item corrigido, de desculpar-se, de justificar-se etc.)37 37 . Conforme análise de interessante excerto de Cheng (2014, p. 187), o fato de o interlocutor corrigido ter repetido o item correto (encerrando assim a correção) “não deve ser tratado como um indicador de compreensão da parte do aluno” (p. 187), uma vez que se observa, logo em seguida, que ele comete o mesmo erro que havia sido alvo de correção. Também Osvaldsson et al. (2012) analisam excerto (nº 6) em que uma fonte de problema (aparentemente resolvida) é retomada mais adiante na interação, o que sinaliza que o encerramento de uma sequência de correção pode ser explorado como “um procedimento que permite que a interação siga, em vez de ser suspensa por detalhes que podem não ser consequentes” naquele momento e resgatados em algum momento adiante na interação (p. 217). como se observa no excerto 1 (linhas 26, 27, 30 e 32-33). Isso se reforça pelo imediatismo (pouco ou nenhum atraso) na produção dessa resposta por parte do participante corrigido (no excerto 1, micropausa na linha 25), revelando que o corrigido aproveita a primeira oportunidade sequencial para refazer seu turno (ver também Loder & Garcez, 2003LODER, L. L. & GARCEZ, P. M. 2003. Lidando com o reparo feito pelo outro: um estudo exploratório das ações dos interlocutores ao serem corrigidos. XV Salão de Iniciação Científica (Livro de Resumos). Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/65992
http://hdl.handle.net/10183/65992...
).

Como já assinalado em Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., pp. 368 e 378-379), há semelhança estrutural entre a sequência que eles chamaram de “verificação de entendimento” (reparo apenas iniciado pelo interlocutor, submetido à confirmação ou rejeição do falante da fonte de problema) e a correção pelo outro modalizada, sendo muitas vezes difícil traçar uma linha divisória clara entre elas (também Garcez & Loder 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312., p. 289). Apesar de Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) não tematizar isso, nos parece que essa semelhança permanece, aproximando não mais duas trajetórias de reparo, mas dois fenômenos distintos. Nesse caso, a fronteira difusa entre os dois fenômenos não invalida sua distinção, mas revela que, muitas vezes, nem mesmo para os interagentes no aqui-e-agora o limite é claro (meu interlocutor está querendo verificar seu entendimento do que eu disse? Ou entendeu o que eu disse e está me corrigindo?), configurando-se como casos-limite (boundary cases, Schegloff, 1997______. 1997. Practices and actions: boundary cases of other-initiated repair. Discourse Processes, 23(3): 499-545.).

A exposição e análises empreendidas aqui, em suma, esclarecem que a ação de corrigir alguém, mesmo que delicada, tem estatuto semelhante ao das demais, ao passo que ações de fazer reparo se prendem à defesa da intersubjetividade. A partir disso, cremos que se possa abordar com mais precisão o que diz respeito aos fenômenos fundamentais da organização da fala-em-interação, como reparo, e as ações cruciais em atividades de instrução, ou em que se observam disputas em torno de posições epistêmicas dos participantes, como correção.

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    » http://hdl.handle.net/10183/170786
  • THEODÓRSDÓTTIR, G. 2018. L2 teaching in the wild: A close look at correction and explanation practices in everyday L2 interaction. The Modern Language Journal , 102(1), 30-45.
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  • 4
    . Agradecemos ao CNPq pela concessão de bolsas de IC, mestrado e PQ em apoio à pesquisa relatada aqui.
  • 5
    . A oscilação fica evidente já no título do artigo (correction/repair).
  • 6
    . As passagens reproduzidas em citação de obras das quais não conhecemos tradução publicada em português aparecem aqui na nossa tradução livre para os propósitos deste texto.
  • 7
    . Posteriormente, foram descritas outras duas trajetórias de reparo (reparo em terceira e quarta posições) (Schegloff, 1992SCHEGLOFF, E. A. 1992. Repair after next turn: The last structurally provided defense of intersubjectivity in conversation. American Journal of Sociology, 97(5), 1295-1345.), consideradas as últimas oportunidades estruturalmente disponíveis para a defesa da intersubjetividade. Essas são desdobramentos sequenciais complexos da trajetória 1, isto é, reparo iniciado e levado a cabo pelo próprio produtor da fonte de problema.
  • 8
    . Cf. Bolden (2012BOLDEN, G. 2012. Across languages and cultures: Brokering problems of understanding in conversational repair. Language in Society, 41(1), 97-121., p. 112), Dings (2012DINGS, A. 2012. Native speaker/nonnative speaker interaction and orientation to novice/expert identity. Journal of Pragmatics, 44(11), 1503-1518., p. 1510) e Theodórsdóttir (2018THEODÓRSDÓTTIR, G. 2018. L2 teaching in the wild: A close look at correction and explanation practices in everyday L2 interaction. The Modern Language Journal , 102(1), 30-45., p. 31).
  • 9
    . A esse respeito, ver também Goodwin (1990______. 1990. He-said-she-said: Talk as social organization among Black children. Bloomington, Indiana, EUA: Indiana University Press., p. 149), Loder (2006LODER, L. L. 2006. Investindo no conflito: a correção pelo outro construindo discordâncias agravadas [Dissertação de mestrado]. Repositório Digital da Universidade Federal do Rio Grande do Sul. http://hdl.handle.net/10183/8035.
    http://hdl.handle.net/10183/8035...
    , p. 75) e estudos recentes que discutem a correção pelo outro como ação que evidencia diferentes posições epistêmicas dos interlocutores em relação à fonte de problema (e.g., Bolden, 2012BOLDEN, G. 2012. Across languages and cultures: Brokering problems of understanding in conversational repair. Language in Society, 41(1), 97-121.; Kääntä, 2014KÄÄNTÄ, L. 2014. From noticing to initiating correction: Student’s epistemic displays in instructional interaction. Journal of Pragmatics , 66, 86-105., p. 90).
  • 10
    . A mesma observação consta em Kurhila (2001KURHILA, S. 2001. Correction in talk between native and non-native speaker. Journal of Pragmatics , 33(7), 1083-1110. , p. 1103).
  • 11
    . Em publicação bem mais recente, Gardner (2013GARDNER, R. 2012. Conversation analysis in the classroom. In: J. Sidnell & T. Stivers (orgs.). The handbook of conversation analysis (pp. 593-611). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell., p. 604) mantém a leitura de que correção e reparo são fenômenos de mesma natureza: “correções, que podem ser vistas como um subgrupo de reparo, são sem dúvida mais prevalentes [em sala de aula] do que em conversa cotidiana”.
  • 12
    . A partir da leitura de Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383.), Kurhila (2006______. 2006. Second language interaction. Amsterdã, Países Baixos: John Benjamins., pp. 24-26) lembra que às vezes a diferença entre a iniciação de reparo e a correção direta pelo outro pode ser obscura (especialmente quando a prática de You mean/Você quer dizer é usada). Observação no mesmo sentido é feita por McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377., pp. 367-371, 375-376).
  • 13
    . Referindo-se a McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.) como “um dos tratamentos mais diretos da ordem sequencial da correção em sala de aula até hoje” (p. 705), Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) aponta como problema fundamental o corpus restrito a ocorrências de correção para o exame da organização geral de reparo, levando a conclusões distorcidas acerca de preferência e organização sequencial dos fenômenos.
  • 14
    . A respeito de IRA, ver Cazden (2001CAZDEN, C. B. 2001. Classroom discourse: The language of teaching and learning. Portsmouth, Nova Hampshire, EUA: Heinemann.), Garcez (2006GARCEZ, P. M. 2006. A organização da fala-em-interação na sala de aula: controle social, reprodução de conhecimento, construção conjunta de conhecimento. Calidoscópio, 4(1), 66-80.) e Mehan (1979MEHAN, H. 1979. The structure of classroom discourse. Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press .). Embora Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.) reconheça que sequências de instrução direta (como IRA) não são o único contexto em que se encontram correções na fala-em-interação de sala de aula (p. 710), sua escolha de dados parece ter sido motivada por estabelecer contraste direto com as observações de McHoul (1990MCHOUL, A. W. 1990. The organization of repair in classroom talk. Language in Society , 19(3), 349-377.), fundamentadas justamente em sequências IRA.
  • 15
    . A análise da primeira ocorrência como reparo (iniciado pelo outro) nos parece questionável, visto que o que seria a fonte do problema está inaudível para o analista. Assim, não é possível saber se o turno foi produzido corretamente, mas não foi ouvido pelo interlocutor (o que caracterizaria reparo), ou se foi equivocadamente produzido e corrigido pelo interlocutor (o que caracterizaria correção). À análise desse dado, portanto, parece faltar sustentação êmica contundente para asseverar que se trata de sequência de reparo.
  • 16
    . Embora essas análises de autocorreção e correção pelo outro (professor) nos pareçam acertadas, há um ponto questionável: o autor analisa autointerrupção (cut-off) necessariamente como índice de reparo (o que nem sempre é o caso, como lembram Schegloff et al., 1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 367, nota 13).
  • 17
    . Embora Macbeth não diga explicitamente que o excerto 9 tem um reparo em terceira posição, sua redação revela claramente que se trata disso: “temos uma iniciação de reparo, [Nancy] iniciando reparo sobre a audição de Steven da primeira repetição de Susan” (p. 728).
  • 18
    . Essa observação diz respeito à possibilidade de detecção e reparo antes da conclusão da ação em curso. Os participantes podem detectar problemas de entendimento na continuidade de suas vidas, mas, nesses casos, as ações produzidas sob o entendimento depois visto como equivocado já terão tido seus efeitos. Para o fenômeno em interações em português brasileiro, ver Loder et al. (2004LODER, L. L.; GONZALEZ, P. C. & GARCEZ, P. M. 2004. Reparo em terceira posição e intersubjetividade na fala-em-interação em português brasileiro. Veredas , 6(2), 115-122.).
  • 19
    . Conforme a conclusão do artigo: “Pode haver, então, tanto distinções conceituais quanto organizações técnicas que separam correção de reparo. A discussão aqui foi amplamente conceitual” (p. 730).
  • 20
    . Respectivamente, por “correção instrucional” e “correção ACE”.
  • 21
    . Registros de interações obtidos com o consentimento informado dos participantes (Loder, 2008b______. 2008b. O modelo Jefferson de transcrição: convenções e debates. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Fala-em-interação social: Introdução à Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 127-161). Campinas, SP: Mercado de Letras., pp. 147-149; Garcez et al., 2014GARCEZ, P. M.; BULLA, G. S. & LODER, L. L. 2014. Práticas de pesquisa microetnográfica: geração, segmentação e transcrição de dados audiovisuais como procedimentos analíticos plenos. DELTA, 30(2), 257-288.).
  • 22
    . Em atividade desde 2001 no Instituto de Letras da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, cadastrado no Diretório de Grupos de Pesquisa do CNPq.
  • 23
    . Entretanto, é relevante lembrar, com Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.), que “se a (re)produção de conhecimento é a tarefa da instrução em sala de aula, a produção de conhecimento correto e, portanto, de correção, inevitavelmente torna-se parte da organização prática e profissional do cenário e uma das orientações prevalentes dos participantes na sala” (p. 721), de modo que a correção está, a todo tempo, iminente em sala de aula.
  • 24
    . Embora seu foco analítico fossem os diferentes modos de “fazer sala de aula”, Salimen e Conceição (2009SALIMEN, P. M. & CONCEIÇÃO, L. E. 2009. Reparo, correção e avaliação na fala-em-interação de sala de aula. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 99-122). Campinas, SP: Mercado de Letras .) já dão passos na direção do que propomos aqui ao fazerem distinção entre corrigir e fazer reparo, sinalizados como fenômenos de naturezas diferentes.
  • 25
    . Novamente, tal como antes, nas linhas 11-12, os atrasos revelam a despreferência pela iniciação de reparo pelo outro, conforme destacaram Salimen e Conceição (2009SALIMEN, P. M. & CONCEIÇÃO, L. E. 2009. Reparo, correção e avaliação na fala-em-interação de sala de aula. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 99-122). Campinas, SP: Mercado de Letras ., p. 107). Ver também Schegloff et al. (1977SCHEGLOFF, E. A.; JEFFERSON, G. & SACKS, H. 1977. The preference for self-correction in the organization of repair in conversation. Language , 53(2): 361-383., p. 376).
  • 26
    . O excerto analisado em Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200., p. 181) tem desdobramento semelhante: sucessivas iniciações de reparo com iniciadores progressivamente mais precisos na localização da fonte de problema.
  • 27
    . Ver também Salimen e Conceição (2009SALIMEN, P. M. & CONCEIÇÃO, L. E. 2009. Reparo, correção e avaliação na fala-em-interação de sala de aula. In: L. L. Loder & N. M. Jung (orgs.). Análises de fala-em-interação institucional: a perspectiva da Análise da Conversa Etnometodológica (pp. 99-122). Campinas, SP: Mercado de Letras ., pp. 108-109) e Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.).
  • 28
    . Ou seja, eles não projetam a sequência de iniciação de reparo como pré-correção pelo outro. Para análise de iniciação de reparo pelo outro como pré-sequência de outras ações, ver Schegloff (2007______. 2007. Sequence organization in interaction: A primer in conversation analysis. Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press., p. 103).
  • 29
    . Como destaca Macbeth (2004MACBETH, D. 2004. The relevance of repair for classroom correction. Language in Society , 33(5), 703-736.), em sequências de IRA, “rotineiramente repetição de perguntas são também ouvidas como marcas de uma resposta equivocada” (p. 719).
  • 30
    . Trata-se de um change-of-state token (Heritage, 1984HERITAGE, J. 1984. A change-of-state token and aspects of its sequential placement. In: J. M. Atkinson & J. Heritage (orgs.). Structures of social action (pp. 299-345). Cambridge, Reino Unido: Cambridge University Press .). Embora a presença desse elemento não seja obrigatória em encerramentos de problemas de entendimento, nem seja prova de que houve o pleno alcance da intersubjetividade, quando ocorre, sinaliza publicamente uma mudança de status informacional do participante.
  • 31
    . Nesse contexto, poder-se-ia até especular que essa interrupção revela que Selma está mais preocupada com “gravar a conversa” (para cumprir a tarefa acadêmica da qual a gravação faz parte) do que com genuinamente ouvir o relato, mas explorar esta ilação está para além dos objetivos deste artigo.
  • 32
    . Agradecemos a um dos pareceristas anônimos por esta observação.
  • 33
    . Também Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200., p. 195).
  • 34
    . Conforme destacado nas seções iniciais, temos notícia apenas de Hall (2007HALL, J. K. 2007. Redressing the roles of correction and repair in research on second and foreign language learning. The Modern Language Journal, 91(4), 510-525.) e Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200.).
  • 35
    . Inclusive por nós, em trabalhos anteriores (Loder et al., 2004LODER, L. L.; GONZALEZ, P. C. & GARCEZ, P. M. 2004. Reparo em terceira posição e intersubjetividade na fala-em-interação em português brasileiro. Veredas , 6(2), 115-122.; Garcez & Loder, 2005GARCEZ, P. M. & LODER, L. L. 2005. Reparo iniciado e levado a cabo pelo outro na conversa cotidiana em português do Brasil. DELTA , 21(5), 279-312.).
  • 36
    . Kitzinger (2012KITZINGER, C. 2012. Repair. In J. Sidnell & T. Stivers (Orgs.), The handbook of conversation analysis (pp. 229-256). Hoboken, Nova Jersey, EUA: Wiley-Blackwell .) também observa que “as falantes têm maneiras de ‘corrigir’ ou ‘desambiguar’ a própria conversa e a de outras pessoas sem envolver a tecnologia de reparo (...). As várias maneiras pelas quais as pessoas ‘corrigem’ possíveis problemas ao falar, ouvir ou entender, ao mesmo tempo que evitam que elas subam à superfície da conversa como reparo aberto, merecem muito mais exploração” (p. 255).
  • 37
    . Conforme análise de interessante excerto de Cheng (2014CHENG, T.-P. 2014. The interactional achievements of repair and correction in a Mandarin language classroom. Chinese as a Second Language Research, 3(2), 175-200., p. 187), o fato de o interlocutor corrigido ter repetido o item correto (encerrando assim a correção) “não deve ser tratado como um indicador de compreensão da parte do aluno” (p. 187), uma vez que se observa, logo em seguida, que ele comete o mesmo erro que havia sido alvo de correção. Também Osvaldsson et al. (2012OSVALDSSON, K.; PERSSON-THUNQVIST, D. & CROMDAL, J. 2012. Comprehension checks, clarifications and corrections in an emergency call with a nonnative speaker of Swedish. International Journal of Bilingualism , 17(2), 205-220.) analisam excerto (nº 6) em que uma fonte de problema (aparentemente resolvida) é retomada mais adiante na interação, o que sinaliza que o encerramento de uma sequência de correção pode ser explorado como “um procedimento que permite que a interação siga, em vez de ser suspensa por detalhes que podem não ser consequentes” naquele momento e resgatados em algum momento adiante na interação (p. 217).

Datas de Publicação

  • Publicação nesta coleção
    29 Mar 2021
  • Data do Fascículo
    2021

Histórico

  • Recebido
    18 Jun 2020
  • Aceito
    14 Jan 2021
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