Accessibility / Report Error

Avaliação comparativa do espaçamento anterior em nipo-brasileiros e leucodermas, na dentição decídua

Resumos

OBJETIVO: avaliar comparativamente a prevalência das características de espaçamento anterior em nipo-brasileiros e leucodermas, na dentição decídua. MÉTODOS: duas amostras de crianças com 2 a 6 anos de idade foram selecionadas: 405 nipo-brasileiros de 36 escolas do estado de São Paulo e 510 leucodermas de 11 instituições públicas da cidade de São Paulo. As variantes oclusais foram classificadas em quatro categorias, nas arcadas superior e inferior: espaçamento generalizado; somente espaços primatas; ausência de espaços; e apinhamento. Foi aplicada regressão logística para análise do efeito dos fatores idade, sexo e grupo étnico sobre a prevalência das características oclusais (α = 0,05). RESULTADOS: em nipo-brasileiros, o espaçamento generalizado foi a característica mais prevalente nas arcadas superior (46,2%) e inferior (53,3%). A frequência dos espaços primatas foi maior na arcada superior (28,2% versus 15,3%). Para a ausência de espaços (21,7-26,4%) e o apinhamento (4,0-4,9%), a variação entre as arcadas foi relativamente pequena. Em leucodermas, a ausência de espaços e a presença exclusiva dos primatas evidenciaram distribuição similar à observada nos nipo-brasileiros. O espaçamento generalizado foi diagnosticado em aproximadamente 50% das arcadas. A prevalência de apinhamento foi maior na arcada inferior (12,8% versus 3,9%). O único modelo de regressão logística que apresentou algum fator significativo foi o ajustado para a prevalência de apinhamento. Apenas o fator racial foi significativo (p < 0,001). CONCLUSÃO: sugere-se que as características de espaçamento anterior, na dentição decídua, não estariam condicionadas à idade ou ao sexo. Contudo, leucodermas teriam chances 2,8 vezes maiores de apresentar apinhamento na arcada inferior, em comparação aos nipo-brasileiros.

Oclusão dentária; Diastema; Dentição primária


OBJECTIVE: To carry out a comparative evaluation of the prevalence of anterior spacing characteristics in Japanese-Brazilian and white children in primary dentition. METHODS: Two selected samples of children aged 2-6 years were: 405 Japanese-Brazilians from 36 schools in the State of São Paulo and 510 white children from 11 public institutions in São Paulo city. The spacing features in the maxillary and mandibular arches were assigned to four categories: generalized spacing; only primate spaces; no spacing; and crowding. Logistic regression was used to analyze the effect of age, gender and ethnic group on the prevalence of the occlusal characteristics (α=0.05). RESULTS: In Japanese-Brazilians, generalized spacing was the most prevalent trait in the maxillary (46.2%) and mandibular (53.3%) arches. The frequency of primate spaces was higher in the maxillary arch (28.2% versus 15.3%). Concerning no spacing (21.7-26.4%) and crowding (4.0-4.9%), the variation between arches was relatively small. In white children, no spacing and exclusive presence of primate spaces showed distributions similar to that observed in Japanese-Brazilians. Generalized spacing was diagnosed in approximately 50% of the arches. Crowding prevalence was higher in the mandibular arch (12.8% versus 3.9%). The regression model adjusted for crowding prevalence was the only significant one. Only racial factor was significant (p<0.001). CONCLUSION: It may be suggested that anterior spacing features in primary dentition would not be influenced by age or gender. Nevertheless, white children would have 2.8 times more chances of presenting crowding in the mandibular arch, in comparison with Japanese-Brazilians.

Dental occlusion; Diastema; Dentition; Primary


ARTIGO INÉDITO

Avaliação comparativa do espaçamento anterior em nipo-brasileiros e leucodermas, na dentição decídua

Evandro Eloy Marcone FerreiraI; Eduardo Cardoso PastoriII; Rívea Inês FerreiraIII; Helio Scavone JuniorIII; Karyna Martins do Valle-CorottiIII

IMestre em Ortodontia pela UNICID

IIAcadêmico de Odontologia da UNICID

IIIProfessor Associado do Programa de Mestrado em Ortodontia da UNICID

Endereço para correspondência Endereço para correspondência Rívea Inês Ferreira Rua Cesário Galeno, 448 - Bloco A CEP: 03.071-000 - Tatuapé / SP E-mail: riveaines@yahoo.com

RESUMO

OBJETIVO: avaliar comparativamente a prevalência das características de espaçamento anterior em nipo-brasileiros e leucodermas, na dentição decídua.

MÉTODOS: duas amostras de crianças com 2 a 6 anos de idade foram selecionadas: 405 nipo-brasileiros de 36 escolas do estado de São Paulo e 510 leucodermas de 11 instituições públicas da cidade de São Paulo. As variantes oclusais foram classificadas em quatro categorias, nas arcadas superior e inferior: espaçamento generalizado; somente espaços primatas; ausência de espaços; e apinhamento. Foi aplicada regressão logística para análise do efeito dos fatores idade, sexo e grupo étnico sobre a prevalência das características oclusais (α = 0,05).

RESULTADOS: em nipo-brasileiros, o espaçamento generalizado foi a característica mais prevalente nas arcadas superior (46,2%) e inferior (53,3%). A frequência dos espaços primatas foi maior na arcada superior (28,2% versus 15,3%). Para a ausência de espaços (21,7-26,4%) e o apinhamento (4,0-4,9%), a variação entre as arcadas foi relativamente pequena. Em leucodermas, a ausência de espaços e a presença exclusiva dos primatas evidenciaram distribuição similar à observada nos nipo-brasileiros. O espaçamento generalizado foi diagnosticado em aproximadamente 50% das arcadas. A prevalência de apinhamento foi maior na arcada inferior (12,8% versus 3,9%). O único modelo de regressão logística que apresentou algum fator significativo foi o ajustado para a prevalência de apinhamento. Apenas o fator racial foi significativo (p < 0,001).

CONCLUSÃO: sugere-se que as características de espaçamento anterior, na dentição decídua, não estariam condicionadas à idade ou ao sexo. Contudo, leucodermas teriam chances 2,8 vezes maiores de apresentar apinhamento na arcada inferior, em comparação aos nipo-brasileiros.

Palavras-chave: Oclusão dentária. Diastema. Dentição primária.

INTRODUÇÃO

Em se tratando da dentição decídua, o espaçamento generalizado do segmento anterior é a característica mais comum1,2,4,9,10,12,15 e aceita por alguns pesquisadores como favorável ao alinhamento dos dentes permanentes anteriores3,4,8,15. Por outro lado, a presença de contatos interproximais, ou até mesmo o apinhamento, não representa um sinal inconteste para a predição de más oclusões decorrentes da falta de espaço na dentição permanente5,20,21. No entanto, alguns autores24 explicam que o apinhamento constitui um problema não somente do ponto de vista ortodôntico, mas também por ser um fator que predispõe a uma maior retenção de placa bacteriana. Um estudo16, ao mencionar que o apinhamento dos incisivos decíduos muito provavelmente é seguido pelo apinhamento dos incisivos permanentes, reforçou a concepção desse tipo de desvio como má oclusão. Além disso, apesar do crescimento e desenvolvimento promoverem alterações dimensionais e cefalométricas entre as fases das dentições decídua e permanente, algumas crianças podem afastar-se do padrão de normalidade20. Depreende-se, portanto, que a proservação até a dentição permanente, de crianças com apinhamento na dentição decídua, seria um método de Ortodontia Preventiva.

Vários estudos foram desenvolvidos com crianças brasileiras, objetivando determinar a prevalência das características de espaçamento anterior na dentição decídua6,7,9,20-23, porém, constata-se a escassez de pesquisas com populações de nipo-brasileiros. Ressalta-se que outras características oclusais foram avaliadas; inclusive sua associação com hábitos de sucção não nutritivos11. Entretanto, especificamente o espaçamento anterior ainda não foi estudado de maneira detalhada nessa população. Considerando que o fator racial pode exercer influência sobre o padrão oclusal, o presente estudo foi realizado com o objetivo de avaliar comparativamente, em nipo-brasileiros e leucodermas brasileiros, a prevalência das características de espaçamento anterior na dentição decídua.

MATERIAL E MÉTODOS

Esse estudo epidemiológico transversal foi desenvolvido em conformidade com as normas e os preceitos adotados pela Resolução 196/96 do Ministério da Saúde do Brasil, tendo sido aprovado pela Comissão de Ética em Pesquisa da Universidade Cidade de São Paulo (UNICID) sob protocolo n. 13259823.

Grupos amostrais

A amostra de nipo-brasileiros compreendeu 405 crianças de ambos os sexos (203 do sexo feminino e 202 do masculino), na faixa etária dos 2 aos 6 anos, saudáveis e regularmente matriculadas em 36 escolas de educação infantil direcionadas à comunidade japonesa, de diversas cidades do estado de São Paulo: Arujá, Bastos, Botucatu, Campinas, Ibiúna, Marília, Mogi das Cruzes, São Paulo e Suzano. As crianças eram consideradas nipo-brasileiras se fossem nascidas no Brasil e apresentassem, no mínimo, 50% de ascendência japonesa direta, isto é, deveriam possuir, pelo menos, um dos pais, dois avós, ou quatro bisavós, maternos ou paternos, nascidos no Japão. Apesar da possibilidade de ocorrência de miscigenação no grupo de nipo-brasileiros, esse não seria um critério de exclusão da criança caso os 50% de ascendência japonesa direta fossem constatados. Para a verificação da ascendência das crianças, foi desenvolvido um levantamento genealógico, averiguando-se as nacionalidades de seus pais, avós e bisavós. Observou-se que aproximadamente 70% das crianças não eram miscigenadas, ou seja, possuíam 100% de ascendência japonesa direta. Essa amostra foi subdividida em dois grupos etários: 2-4 anos (n = 257) e 5-6 anos (n = 148).

A amostra de 510 leucodermas brasileiros presumivelmente saudáveis, de ambos os sexos (265 do sexo feminino e 245 do masculino), na faixa etária dos 2 aos 6 anos, foi selecionada de um total de 1.377 crianças provenientes de seis Escolas Municipais de Educação Infantil (EMEI) e cinco creches localizadas na Zona Leste da cidade de São Paulo/SP. Essa amostra também foi subdividida em dois grupos etários: 2-4 anos (n = 240) e 5-6 anos (n = 270). A seleção dessas crianças, para confrontar os resultados obtidos em nipo-brasileiros, foi respaldada por alguns estudos em que leucodermas eram avaliados como população-alvo ou amostra de comparação3,14,17,20,21. Convém esclarecer que, embora a amostra de leucodermas apresentasse miscigenação racial, foi escolhida por constituir um grupo que continha razoável número de integrantes e possuía uma característica racial em comum, isto é, a cor branca da pele.

Avaliação das características oclusais

Previamente ao início da fase de exame clínico, foi realizado um treinamento com os cinco examinadores. O treinamento incluiu o exame de oclusão em 24 crianças, por duas vezes, com um intervalo de 15 dias entre as avaliações. Esse procedimento foi efetuado com pré-escolares de uma das EMEI estudadas, em ambiente escolar, para a simulação do levantamento epidemiológico. O grau de concordância intraexaminador foi analisado por meio da estatística Kappa (coeficientes κ de 0,76 a 1,00). Em adição, foram aplicados testes de correlação de Spearman para avaliar a consistência dos diagnósticos realizados pelos examinadores, analisados dois a dois, durante os exames clínicos (Rs > 0,90).

Todas as crianças foram examinadas no próprio ambiente escolar, estando comodamente sentadas e direcionadas para uma fonte de luz artificial. Durante a inspeção visual das arcadas dentárias, os examinadores utilizavam espátulas de madeira descartáveis para afastar os tecidos moles bucais e solicitavam que a criança realizasse máxima intercuspidação habitual (MIH) e abertura máxima.

As arcadas dentárias superior e inferior foram classificadas separadamente em quatro categorias, de acordo com as características de espaçamento no segmento anterior9:

• Espaçamento generalizado: os dentes que compõem o segmento anterior apresentavam espaços interproximais generalizados, incluindo os espaços primatas, bilateralmente. Em caso de dúvida, o examinador considerava que as arcadas superior e inferior deveriam apresentar, no mínimo, 4 e 6 espaços, respectivamente, para serem classificadas nessa categoria.

• Somente espaços primatas: essas arcadas apresentavam espaços visivelmente perceptíveis e bilaterais entre os incisivos laterais e caninos decíduos superiores, bem como entre os caninos e primeiros molares decíduos inferiores.

• Ausência de espaçamento: os dentes que compõem o segmento anterior apresentavam contatos interproximais. Nessas arcadas, verificava-se ausência dos espaços interincisivos e primatas, bilateralmente.

• Apinhamento: além da ausência de espaços interproximais, um ou mais dentes decíduos encontravam-se desviados para vestibular e/ou lingual em relação aos respectivos processos alveolares.

As crianças incluídas nos grupos amostrais atenderam aos seguintes critérios:

» Termos de consentimento livre e esclarecido assinados pelos pais/responsáveis.

» Dentição decídua completa, sem dentes permanentes irrompidos ou em erupção.

» Sem lesões de cárie extensas, destruições coronárias ou restaurações proximais que alterassem a largura mesiodistal dos dentes.

» Sem perdas precoces de dentes decíduos.

» Ausência de anomalias dentárias de forma, número, estrutura e erupção.

» Sem síndromes ou fissuras labiopalatais.

» Nunca submetidas a tratamento ortodôntico e/ou fonoaudiológico.

Tratamento estatístico

Realizou-se a distribuição das frequências relativas às características oclusais sob estudo de acordo com a faixa etária e o sexo, para cada grupo étnico, e os dados foram submetidos a uma avaliação comparativa por meio do teste qui-quadrado com correção de Bonferroni. Subsequentemente, executou-se a análise dos efeitos dos fatores grupo etário (2-4 anos e 5-6 anos), sexo (masculino e feminino) e grupo étnico (leucodermas e nipo-brasileiros) sobre a prevalência de cada uma das características relacionadas ao espaçamento anterior nas arcadas superior e inferior. Para tanto, foram ajustados modelos de regressão logística múltipla (α = 5%).

RESULTADOS

Os Gráficos 1 e 2 apresentam a distribuição das características pesquisadas nas arcadas superior e inferior, respectivamente, para nipo-brasileiros e leucodermas. Em nipo-brasileiros, a característica mais prevalente correspondeu ao espaçamento generalizado. Destaca-se que, na arcada superior, os espaços primatas foram mais frequentes do que na inferior. Os valores relativos à prevalência de apinhamento foram bastante próximos em ambas as arcadas, variando de 4% a 4,9%. Em leucodermas, a característica mais prevalente também correspondeu ao espaçamento generalizado. Novamente, na arcada superior, os espaços primatas foram mais frequentes do que na inferior. Contudo, a prevalência de apinhamento foi mais elevada na arcada inferior (12,8% versus 3,9%).



Ao analisar cada característica separadamente, nas arcadas superior e inferior, observou-se que não houve diferenças significativas entre os grupos etários e os sexos, tanto para os nipo-brasileiros como para os leucodermas.

Foram executadas análises de regressão logística para cada uma das características de espaçamento anterior avaliadas nas arcadas superior e inferior, separadamente. Os fatores analisados foram: faixa etária, sexo e grupo étnico. O único modelo que apresentou algum fator significativo foi o ajustado para a prevalência de apinhamento na arcada inferior. Apenas o fator racial foi significativo (p<0,001). Conforme as Tabelas 1 e 2, os leucodermas revelaram uma razão de chances 2,81 vezes maior para o desenvolvimento de apinhamento na arcada inferior em comparação aos nipo-brasileiros.

DISCUSSÃO

A avaliação dos padrões oclusais de diferentes grupos étnicos torna-se, além de interessante, bastante útil do ponto de vista clínico. Diversos pesquisadores nacionais e estrangeiros empreenderam investigações comparativas sobre as características oclusais na dentição decídua. Em um estudo desenvolvido na década de 199014, observou-se que as crianças melanodermas apresentaram uma taxa significativamente menor de apinhamento em comparação às finlandesas, de origem caucasiana. Essa constatação foi posteriormente ratificada3. Para expor dados de um mesmo país com marcantes traços étnicos, cita-se o estudo em que foram examinadas crianças dos três maiores grupos étnicos da Nigéria (Yoruba, Ibo e Hausa)18. O espaçamento foi mais frequente nas crianças da etnia Ibo (48,4%) e menos diagnosticado na Hausa (19,8%), p<0,001. A distribuição de espaços primatas bilaterais também evidenciou diferenças significativas para a arcada inferior, sendo mais prevalente nos Ibo (49,4%) do que nos Hausa (21,3%) e nos Yoruba (29,3%), p<0,001.

No estado de São Paulo concentra-se a grande maioria dos descendentes de japoneses, compreendendo aproximadamente 76% do total de residentes em território brasileiro11. Esse indicador elevado justifica o desenvolvimento de estudos epidemiológicos comparativos com os integrantes dessa população que, por terem nascido no Brasil e apresentarem uma forte herança genética de japoneses (no mínimo, 50% de ascendência direta) são denominados nipo-brasileiros.

De fato, já foram realizadas pesquisas sobre as características oclusais em nipo-brasileiros. Contudo, uma avaliação do espaçamento anterior na dentição decídua ainda não havia se tornado pública. Ademais, se o espaçamento anterior não representasse um aspecto importante da oclusão, não haveria trabalhos clássicos4,10,17 e outros mais atuais3,9,18 sobre o tema.

Tanto na amostra de nipo-brasileiros como na de leucodermas, a presença de espaços generalizados foi a característica mais prevalente. Esse achado está de acordo com os resultados de outros estudos1,4,8,9,13,19,22. Contudo, as prevalências evidenciam variabilidade notável - para a arcada superior, de 86,65%22 a 37,7%19; e para a inferior, de 79,96% a 44% - também nas referidas investigações científicas. Os dados que mais se aproximam dos obtidos no presente estudo são os de uma pesquisa com crianças egípcias8.

A segunda característica mais frequente nos grupos étnicos associou-se à presença dos espaços primatas, especificamente na arcada superior. Se, além das frequências relativas à presença exclusiva dos espaços primatas, forem observados os valores obtidos para a prevalência de espaçamento generalizado, admite-se que os resultados dessa pesquisa concordam com os de vários estudos que apresentaram valores de prevalência dos espaços primatas para mais de 60% das amostras1,3,6,13,17,19,23. A explicação residiria na agregação de valores percentuais. Os resultados do presente estudo são corroborados por duas pesquisas8,9, em diferentes países, que empregaram classificação similar durante o diagnóstico e observaram valores percentuais bem mais elevados dessa característica na maxila.

A ausência de espaços, embora menos comum, não é um aspecto que caracteriza anormalidade na dentição decídua. Nessa pesquisa, as frequências de arcadas que apresentavam ausência de espaços variou de 21,7% a 26,4%, em nipo-brasileiros, e 22,9% a 23,3%, em leucodermas; sendo que os percentuais mais elevados foram observados para as arcadas inferiores. Similarmente, outros autores8,10,19 verificaram maior predominância da ausência de espaços na arcada inferior. A avaliação comparativa com algumas pesquisas1,2,4,12,19 torna-se dificultada pelo agrupamento de duas variáveis: ausência de espaços e apinhamento. No presente estudo, optou-se por segregar essas variáveis, uma vez que o apinhamento foi apontado como um desvio da oclusão decídua clinicamente satisfatória24,25. Em adição, há evidência científica baseada em estudos longitudinais para suportar a proservação de crianças com apinhamento na dentição decídua como conduta válida, objetivando detectar e interceptar precocemente os reflexos nas dentições mista e permanente5,21.

Para leucodermas, tal como acontece na dentição permanente, a prevalência de apinhamento foi maior na arcada inferior (12,8% versus 3,9%). Esse resultado apresenta-se em concordância com o observado em um outro estudo realizado com crianças que possuíam diferentes características étnicas9. Notavelmente, na amostra de nipo-brasileiros, os valores relativos à prevalência de apinhamento foram bastante próximos, variando de 4%, na arcada superior, a 4,9% na inferior. A diferença entre os dois grupos amostrais foi ratificada pela análise de regressão logística (Tab. 1, 2). As crianças leucodermas revelaram uma razão de chances 2,8 vezes maior para o desenvolvimento de apinhamento na arcada inferior, em comparação aos descendentes de japoneses.

Não houve dimorfismo entre sexos para as características de espaçamento anterior em nipo-brasileiros e leucodermas. Ao avaliar aspectos relativos ao espaçamento anterior, vários autores também não evidenciaram diferenças entre meninos e meninas2,6,7,9,22,24. Entretanto, outros pesquisadores mencionaram esse tipo de dimorfismo1,3,23. Os espaços primatas seriam significativamente mais amplos e frequentes em meninos do que em meninas1,3.

Quanto à investigação de possíveis alterações das características de espaçamento anterior com o avançar da idade, as análises estatísticas não indicaram diferenças entre os grupos etários. Em um estudo brasileiro, foi observado um decréscimo significativo do número de crianças apresentando espaços interproximais com o avanço da idade, sugerindo uma tendência ao fechamento dos espaços23. Outra investigação evidenciou uma frequência significativamente reduzida de espaços primatas para a faixa etária de 4 a 6 anos (p<0,05), em comparação ao grupo de crianças dos 2 aos 4 anos incompletos6. Um autor estrangeiro mencionou que a prevalência de apinhamento na região anterior aumentou com a idade, em crianças leucodermas (3-4 anos = 5%; 5-6 anos = 16%) e melanodermas (3-4 anos = 5%; 5-6 anos = 9%)14. Contudo, no que tange ao apinhamento, há pesquisadores que não demonstraram diferença estatística entre grupos etários24.

Para a avaliação das alterações no espaçamento anterior com o decorrer da idade, seriam preferíveis os estudos longitudinais. No entanto, as pesquisas prospectivas requerem mais tempo e estão sujeitas à evasão de muitos dos integrantes da amostra. Em se tratando da amostra de nipo-brasileiros, a demanda logística é ainda mais desfavorável, pois foram examinadas crianças procedentes de nove cidades no estado de São Paulo.

CONCLUSÕES

» Na amostra de nipo-brasileiros, o espaçamento anterior generalizado correspondeu à característica mais prevalente nas arcadas superior e inferior. A frequência dos espaços primatas foi mais elevada na arcada superior. Entretanto, para as características referentes à ausência de espaços e ao apinhamento, a variação entre os percentuais calculados para ambas as arcadas foi relativamente pequena.

» Na amostra de leucodermas brasileiros, as frequências das características relativas à ausência de espaçamento interproximal e à presença de espaços primatas demonstraram padrão de distribuição similar ao observado em nipo-brasileiros. Convém destacar que o espaçamento generalizado foi diagnosticado em aproximadamente 50% das arcadas. Todavia, a prevalência de apinhamento foi mais elevada na arcada inferior.

» Em ambas as amostras sob estudo, não houve diferenças significativas entre os grupos etários (2-4 anos e 5-6 anos), nem tampouco dimorfismo entre os sexos masculino e feminino.

» As crianças leucodermas, se comparadas às nipo-brasileiras, demonstraram uma razão de chances 2,8 vezes maior para o desenvolvimento de apinhamento na arcada inferior.

Enviado em: 8 de outubro de 2008

Revisado e aceito: 9 de março de 2009

  • 1. Abu Alhaija ESJ, Qudeimat MA. Occlusion and tooth/arch dimensions in the primary dentition of preschool Jordanian children. Int J Paediatr Dent. 2003;13(4):230-9.
  • 2. Alexander S, Prabhu NT. Profiles, occlusal plane relationships and spacing of teeth in the dentitions of 3 to 4 year old children. J Clin Pediatr Dent. 1998;22(4):329-34.
  • 3. Anderson AA. The dentition and occlusal development in children of African American descent. Angle Orthod. 2007;77(3):421-9.
  • 4. Baume LJ. Physiological tooth migration and its significance for the development of occlusion: I. The biogenetic course of the deciduous dentition. J Dent Res. 1950;29(2):123-32.
  • 5. Bishara SE, Jakobsen JR. Individual variation in tooth-size/arch-length changes from the primary to permanent dentitions. World J Orthod. 2006;7(2):145-53.
  • 6. Carvalho KL, Valença AMG. Prevalência das características normais da oclusão decídua em crianças de 2 a 6 anos. Pesqui Bras Odontopediatria Clín Integr. 2004;4(2):113-20.
  • 7. Dinelli TCS, Martins LP, Pinto AS. Mudanças dimensionais dos arcos dentários em crianças entre 3 e 6 anos de idade. Rev Dental Press Ortod Ortop Facial. 2004;9(4):60-7.
  • 8. El-Nofely A, Sadek L, Soliman N. Spacing in the human deciduous dentition in relation to tooth size and dental arch size. Arch Oral Biol. 1989;34(6):437-41.
  • 9. Ferreira RI, Scavone-Jr H, Castro RG, Nascimento MAS, Romero CC. Assessment of interdental spacing in the anterior segment of deciduous arches. Rev Odontol Univ Cid São Paulo. 2005;17(2):101-10.
  • 10. Foster TD, Hamilton MC. Occlusion in the primary dentition. Study of children at 2 ½ to 3 years of age. Br Dent J. 1969;126(2):76-9.
  • 11. Ito C, Sato VCB, Scavone-Junior H, Garib DG, Ferreira RI. Associação entre hábitos de sucção não nutritivos e as relações oclusais ântero-posteriores em crianças nipo-brasileiras. Ciênc Odontol Bras. 2008;11(1):19-26.
  • 12. Joshi MR, Makhija PG. Some observations on spacing in the normal deciduous dentition of 100 Indian children from Gujarat. Br J Orthod. 1984;11(2):75-9.
  • 13. Kabue MM, Moracha JK, Ng'ang'a PM. Malocclusion in children aged 3-6 years in Nairobi, Kenya. East Afr Med J. 1995;72(4):210-2.
  • 14. Kerosuo H. Occlusion in the primary and early mixed dentitions in a group of Tanzanian and Finnish children. ASDC J Dent Child. 1990;57(4):293-8.
  • 15. Kharbanda OP, Sidhu SS, Shukla DK, Sundaram KR. A study of the etiological factors associated with the development of malocclusion. J Clin Pediatr Dent. 1994;18(2):95-8.
  • 16. Leighton BC. The early signs of malocclusion. Eur J Orthod. 2007;29(1):189-95.
  • 17. Moorrees CFA, Chadha JM. Available space for the incisors during dental development: a growth study based on physiologic age. Angle Orthod. 1965;35(1):12-22.
  • 18. Onyeaso CO. Occlusion in the primary dentition. Part 1: a preliminary report on comparison of antero-posterior relationships and spacing among children of the major Nigerian ethnic groups. Odontostomatol Trop. 2006;29(114):9-14.
  • 19. Otuyemi OD, Sote EO, Isiekwe MC, Jones SP. Occlusal relationships and spacing or crowding of teeth in the dentitions of 3-4-year-old Nigerian children. Int J Paediatr Dent. 1997;7(3):155-60.
  • 20. Rossato C, Martins DR. Alterações dimensionais e cefalométricas em jovens leucodermas brasileiros, com e sem espaçamento anterior na dentadura decídua. Estudo longitudinal da dentadura decídua à permanente. Ortodontia. 1994;27(2):19-30.
  • 21. Rossato C, Martins DR. Espaçamento anterior na dentadura decídua e sua relação com o apinhamento na dentadura permanente. Estudo longitudinal. Ortodontia. 1993;26(2):81-7.
  • 22. Silva Filho OG, Rego MVNN, Silva PRB, Silva FPL, Ozawa TO. Relação intra-arco na dentadura decídua normal: diastemas, ausência de diastemas e apinhamento. J Bras Ortodon Ortop Facial. 2002;7(42):501-9.
  • 23. Soviero VLM, Bastos EPS, Souza IPR. Dentição decídua: estudo da prevalência dos espaços interproximais em crianças brasileiras. Rev Odontol Univ São Paulo. 1999;3(2):159-65.
  • 24. Thomaz EBAF, Ely MR, Lira CC, Moraes ES, Valença AMG. Prevalência de protrusão dos incisivos superiores, sobremordida profunda, perda prematura de elementos dentários e apinhamento na dentição decídua. JBP: J Bras Odontopediatr Odontol Bebê. 2002;5(26):276-82.
  • 25. Thomaz EBAF, Valença AMG. Prevalência de má-oclusão e fatores relacionados à sua ocorrência em pré-escolares da cidade de São Luís - MA - Brasil. RPG: Rev Pós-Grad. 2005;12(2):212-21.
  • Endereço para correspondência
    Rívea Inês Ferreira
    Rua Cesário Galeno, 448 - Bloco A
    CEP: 03.071-000 - Tatuapé / SP
    E-mail:
  • Datas de Publicação

    • Publicação nesta coleção
      03 Jan 2012
    • Data do Fascículo
      Out 2011

    Histórico

    • Recebido
      08 Out 2008
    • Aceito
      09 Mar 2009
    Dental Press International Av. Luís Teixeira Mendes, 2712 , 87015-001 - Maringá - PR, Tel: (55 44) 3033-9818 - Maringá - PR - Brazil
    E-mail: artigos@dentalpress.com.br